Vitor terminou tudo com Lia quando a garota o encontrou no jardim. Alegou que a roqueira precisava de tempo para resolver as pendências com Dinho e decidir o que queria. Lia sabia o que queria: fugir de Adriano, puni-lo pelo que lhe fez meses antes e dar voz a sua razão, que lhe dizia para não confiar no garoto. Nunca mais. Nunca mais seria enganada daquele jeito, nem voltaria a sofrer por alguém daquela maneira. Compreendia o agora ex-namorado, não era justo usá-lo para se proteger de Dinho, por mais que Vitor gostasse de ajudar a todos e a qualquer um. Admirava o senso de justiça do moreno de olhos azuis, e justamente por ser um garoto tão digno e bom, não podia usá-lo como estava fazendo. Sabia que não se reconciliaria com Dinho, dele queria apenas distância, mas era verdade que tinha assuntos inacabados com o garoto e que precisava pôr um fim naquela história antes de magoar Vitor mais ainda por um cara que não valia nada.

Ao chegar em casa, avistou o pai conversando com Marcela. Ambos mudaram de assunto assim que perceberam a presença da garota, mas não foram rápidos o suficiente para que Lia não escutasse a última frase, que entregara o assunto.

-Vocês estavam falando do idiota do Dinho, não estavam? Por que essa preocupação toda com ele, hein, seu Lorenzo? Pensei que você o odiasse, até porque, caso você não se lembre, ele foi um canalha com a sua querida filha, ou você esqueceu?

Lia titubeou ao mencionar o grande erro de Dinho, mas conseguiu controlar a voz até o final da frase. Lorenzo olhou para Marcela, sem saber o que responder.

-Ah, Lia, eu estava só perguntando pro seu pai como o Dinho estava depois daquela situação ontem...

-Bem lembrado, Marcela! O que aconteceu com o Adriano e por que justo você estava com ele? Que história é essa de andar pra cima e pra baixo com o meu ex, que você supostamente detestava, desde que ele voltou?

-Er... Lia, por que você não pergunta pro seu ex, que pelo que eu saiba está atrás de você desde que chegou? Ele tem andado na sua cola, mas você fica fugindo e sobra pra mim! Eu agradeço se você der um ultimato naquele garoto de uma vez. Sentem pra conversar, resolvam a situação, que eu não sou porta-recados de ninguém.

-Eu não quero falar com ele! Eu quero mais é que ele morra!!! – Lia estava vermelha de raiva, sentindo-se impotente. Não estava feliz como uma vez fora, mas estava bem, já havia chorado tudo que havia para chorar por Dinho, pensava, e quando acreditava ter se recuperado, ele reaparecia, trazendo à tona o sofrimento e a montanha-russa de sentimentos que Lia tanto lutou por esquecer. Preferia que o garoto a tivesse abandonado de vez, a ter que rever o motivo de seu sofrimento. Seus hormônios e seu coração a traíam, mas a razão era enfática: queria Dinho longe, queria esquecer sua existência e viver sua pseudo- felicidade em paz.

A fala de Lia foi um baque para Lorenzo. Tentou se lembrar de que a garota não fazia idéia do que acontecia com o ex e que não falara com intenções literais de morte. Ainda assim, queria censurar a filha por desejar algo tão próximo e tão temido. Ouviu Marcela bater na madeira da mesa três vezes ao seu lado. Tentou se recompor, olhou para a filha e decidiu que pelo menos uma verdade podia deixar escapar.

-Que tivesse me falado antes, eu não teria impedido, mas agora o Dinho já desistiu da idéia!

Lia encarou o pai, chocada. Não conseguia acreditar no que entendera da frase. Desistiu da idéia... Dinho desistiu da idéia de morrer... Sua conclusão não podia ser mais dolorida. Tentou controlar o tsunami de emoções que a consumia ao questionar o pai.

-O Dinho tentou se matar? – sua voz falhou, algumas lágrimas escaparam e a fachada dura e insensível que Lia assumia ao falar do ex sumiu. Queria seguir impassível, cínica, mas a informação que recebera do pai talvez fosse demais até para alguém como Raquel. Não sabia o que pensar, sabia apenas que doía. Por que ele iria querer acabar com a própria vida? Ele não podia morrer! Já era difícil vê-lo todo dia sem poder tê-lo consigo, sem poder dar a ele uma segunda chance... Não queria se deixar levar, não queria ser enganada de novo, mas acima de tudo não suportaria perdê-lo para sempre, não daquele jeito. Pelo menos quando Dinho estava na África, Lia sabia que o garoto estava bem. Ainda o odiava, não pretendia perdoá-lo ou lhe dar outra chance, mas o coração a traía.

Lorenzo abraçou a filha, que estava em estado de choque.

-Aconteceu ontem, eu consegui impedir a tempo, e o Nando me ajudou a trazê-lo para cá. Sedá-lo seria a melhor maneira de impedir qualquer outra tentativa e seria melhor fazê-lo mudar de idéia quando acordasse meio tonto ainda... Pelo visto deu certo. – Lorenzo sorriu discretamente para a filha, com carinho, mas triste pela lembrança do dia anterior.

-Ele não queria que você soubesse, mas o que você falou foi muito grave, Lia. Você devia medir melhor as suas palavras antes de desejar algo que pode se concretizar. –Marcela se aproximou da enteada, ajudando Lorenzo a segurar a filha, que tremia e tentava conter as lágrimas.

-O Dinho está passando por uma fase muito difícil, Lia.

-É por isso que vocês insistem tanto? Vocês acham que se eu perdoar o Adriano ele vai ficar mais felizinho e vocês não vão se sentir culpados? – Lia perguntou incrédula.

-A gente só quer evitar mais sofrimento, a gente não quer que você se arrependa depois de não ter aproveitado essa chance, nem que seja para encerrar o assunto civilizadamente e seguir sua vida.

Lia ficou pensativa por um momento. Gil, que acabara de chegar da casa de Ju, resolveu tomar partido.

-O Dinho tá é fazendo teatrinho pra ter a Lia de volta. Aquele moleque não me engana!

Marcela balançou a cabeça, cansada do desrespeito de Gil em relação a Adriano. Percebeu a expressão confusa de Lia, que tentava decifrar se Dinho faria algo tão baixo. E por que a dúvida? É claro que faria, concluiu a roqueira.

-Se fosse teatro, ele teria ameaçado na frente dela, não acha? Infelizmente, Gil, o Lorenzo teve que tirar as pílulas do Dinho à força para que ele não as engolisse, teve que imobilizá-lo, com a ajuda do Nando e ainda sedá-lo para impedir que o Dinho fizesse uma bobagem. A Lia não estava nem perto na hora e ele só a viu quando acordou. Mas se você quer acreditar que o Dinho é canalha que poderia inventar algo assim para ter o perdão da Lia de volta, eu acho uma pena, mas depois a gente conversa sobre isso. Acho melhor vocês irem dormir, que amanhã tem aula.

Marcela se aproximou da enteada.

-Pensa nisso. É melhor encarar de uma vez que se arrepender depois.