A Ilha De Circe: Fênix escrita por Daughter of Apollo


Capítulo 8
Sombras e Lobos




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– Por que isso está acontecendo? – Reclamou a jovem de Esparta. A situação tornara-se tão ruim desde o começo da guerra.

A terra nunca fora muito fértil para plantar, no entanto, com dedicação, colhiam bons resultados. Agora o solo morrera e nada mais dele nascia.

Suspirou a observar aqueles campos inóspitos e sem vida, onde anteriormente sua família prosperava.

Anteriormente, quando?

Ficou confusa. Às vezes sua mente pregava-lhe peças. Esporadicamente, sua memória vinha lhe questionar. Sentia... Como se tudo não fosse verdade. Como se aqueles não fossem seus parentes...

Ela tinha mesmo uma família?

Tudo estava tão errado... Incerto... Fora do eixo...

Deslocado.

Sentia-se assim. Não combinava com a paisagem. Mas o que estaria diferente?

A menina morara ali desde... Sempre? É isso?

Meneou a cabeça. Se seus problemas se resumissem a apenas esta sensação... Seus pais não a taxariam de louca, e pior de tudo, na idade de casar-se. Sem vontade, é claro.

Ninguém via nada do que ela via. Todas as sombras percorrendo o campo, os arredores de Esparta. Não conheceu uma alma que lhe ouvisse quando disse que elas engoliam as árvores e estas logo depois morriam. Ou na hora em que contou da Dríade, um espírito da floresta, que morreu implorando-lhe que a salvasse.

Um pouco tarde. A escuridão tomou seus olhos e ela não mais vivia.

E do mesmo modo que tentou informar dos caçadores corajosos que desapareceram no bosque, agonizando perante àquela massa escura. E de todas as visões de cidades em chamas que ela presenciara enquanto dormia.

Não, nenhuma pessoa acreditou.

Ali adiante, generais preparavam seus soldados. Dois em potencial. Os melhores. Todos confiavam neles. Com certeza Esparta levaria os louros.

Será mesmo?

Não passava uma pessoa senil tentando encontrar uma explicação. Uma garota deslocada tentando chamar atenção. A menina pensava ser assim.

E apenas ela via.

Aiden

– Parem de me olhar – implorei-lhes, sem receber colaboração. Caeliora não cedeu. Nem Bia.

– Circe sabe disso? – perguntaram simultaneamente.

– Ah... B-bem... – gaguejei, envergonhado. A verdade é que eu não contara para ninguém dali.

E eu odeio gaguejar.

– Aiden – falou Bia suavemente – Somos seus amigos. Deveria ter nos contado.

– Eu sei – suspirei – Temi que me rejeitassem.

As duas emitiram um som de descrença.

– Garoto, sei que não deseja compartilhar certas coisas do teu passado, mas Circe entenderia, e nós também. Foi um erro não ter informado a ela.

– Você realmente acredita nisso?

– Sim – responderam-me. Bia continuou:

– Você sabe que cultivamos a política de não-julgamento. Você ficou conosco durante estes meses, Aiden e confiamos em ti. Não é um fato vergonhoso. Você é da prole de Hades. Fim.

Suas palavras foram verbalizadas com tanta sinceridade que eu acreditei fielmente nelas. Queria que fossem verdadeiras.

Suspirei, resignado. Fugir de coisas que me assolavam não funcionava muito bem. No entanto, percebi que fugir não era necessário. Eu fora realmente aceito. Talvez.

– Quando retornarmos, vou contar diretamente a ela.

Elas exibiram sorrisos que logo murcharam.

– Se conseguirmos voltar. Afinal, onde estamos? – Caeliora perguntou o que nós mesmos pensávamos.

Dei de ombros.

– Até descobrirmos, é melhor seguir. Precisamos de informações.

– Tem razão. – Concordou Bia – Mas preocupo-me com os outros.

– É verdade. Só que o mais importante é...

– Quem e por que nos enviou para cá – completei.

Entreolhamo-nos.

– Vamos, vamos em frente, antes que o mundo acabe – ironizou Aurora.

Eu as segui.

Senti-me ligeiramente mais leve por não guardar mais este segredo. Ele já causou a mim grandes problemas.

Afastei as lembranças antes que chegassem. Precisávamos saber onde os outros foram parar – e nós mesmos também.

Aquelas explosões douradas nos haviam atingido e tivemos várias visões. Templos, floretas, palácios, pessoas... Até que me encontrei naquela trilha, com Bia e Caeliora desmaiadas. Não entendi por que não me afetou. Elas disseram sentir muita dor e enjoo. Seja o que for não me esquecerei das sombras ao meu redor quando tudo desapareceu.

Uma corneta soou. Adiante, bem distante do penhasco, havia um vilarejo.

Ariella

Antes de tudo dar errado, já íamos muito mal.

Leecher caminhava quieto e enfezado, cerca de dois passos de distância, à minha frente.

Não que eu desejasse conversa, ou algo do gênero, porém sentia falta de minhas irmãs. Eu era tão aberta com elas que falava bastante em certas ocasiões.

Olhos Negros bufou, irritado.

Não deixava de observá-lo um minuto sequer. Meus instintos dizendo-me para fazer isso, pois a qualquer instante ele se viraria e me atacaria. Pensei que o mesmo acontecia com ele, que checava-me a cada cinco segundos.

Andamos, andamos e andamos, até que fatiguei-me demais para continuar. Desabei no chão.

– Levanta, vamos seguir. – ordenou a minha companhia.

– Não. Quero descansar.

Havíamos chegado a uma linda clareira ensolarada, cercada por lindas árvores, repleta de flores e com a grama verde e alta em alguns pontos. Uma enorme macieira oferecia sua sombra para nos refrescarmos.

A macieira dava frutos.

– Eu mandei seguirmos! – Esbravejou ele, ameaçadoramente perto.

Ignorei-o. Ele agarrou meu pulso, erguendo-me do chão.

– Solta, agora! – Gritei.

Desvencilhei-me dele e recuei. O soldado devia estar acostumado a todos seguindo suas ordens...

Dei as costas a ele, encarando a árvore.

Decidi escalar os galhos para colher as maçãs. Leecher tentou me impedir, não obtendo êxito.

– Desça já! Se cair, eu também sofrerei as conseqüências, e eu não quero isso!

Não dei ouvidos, apenas pus-me a subir mais alto, onde os frutos mais maduros se encontravam.

Colhi o máximo que consegui, usando a barra da túnica curta para segurá-las. Leecher não parou de esbravejar lá embaixo enquanto eu me embrenhava nos galhos mais finos, onde ele não se capacitaria a subir por causa do seu peso.

– Criatura insolente! Meretriz!

Uma cobra verde clara deslizou por cima das minhas pernas. Quando toucou-me, não nego o susto que ocorreu-me. Porém ela simplesmente foi embora. Esquisito.

Desci da macieira, feliz por ter algo que comer.

Leecher fitava-me com ódio. Ri internamente com isso e espalhei pelo chão as frutas, sentando-me logo em seguida e convidando-o a fazer o mesmo. Ele enterrou a cabeça entre as mãos, suspirou exasperado.

Tentando ao menos ser sociável, por um motivo que no momento eu não compreendi, estendi-lhe uma maçã. Era bem vermelha e suculenta. Até mesmo ele não recusaria.

– Quer? – questionei, oferecendo-a. Ele estancou por um instante, pensando, e arrancou o objeto das minhas mãos.

Comemos em silêncio até nos satisfazermos. Agradeci a todos meus patronos por enviarem ajuda.

– Agora, será que podemos ir, Ariella? – Ironizou Leecher com o semblante irritado.

Suspirei.

– Tudo bem.

Antes que um de nós desse o primeiro passo, ouvimos um barulho de galho se quebrando. Nos colocamos a postos.
O vento agitou alguns arbustos, o som de passos se intensificou.

O que seria?

As costas fortes de Leecher tocavam nas minhas, tensas. Olhei para todas as direções, esperando alguém se fazer presente.

Da minha direita, algo surgiu dos arbustos, correndo.

Nós dois pulamos com a surpresa.

Um pequeno coelho branco.

– Mas o que... – Balbuciou Leecher.

Relaxamos visivelmente ao notar que nosso inimigo era apenas um animalzinho.

Curvei-me para acariciar o pelo macio do coelhinho.

Foi muito rápido.

Galhos se partindo.

Rosnados.

Leecher estava no chão.

Um enorme lobo cinza tentava morder seu rosto.

Fiz a única coisa que poderia. Corri para eles e usei toda minha força para empurrar a criatura longe, percebendo, amedrontada, que havia mais deles e eu estava desarmada.

Os lobos uivaram.

O soldado pôs-se de pé, rosnando como as feras que nos cercavam, pronto para usar as próprias mãos para lutar.

Ele mantinha a pose de líder, rondando com o olhar o perímetro. Cerca de uma dúzia de bestas havia ali. Leecher conseguiu pegar um robusto galho de árvore do chão, que usava para afastá-los.

Novamente, nos postamos um de costas para o outro, automaticamente, como se já soubéssemos o que faríamos. Desesperei-me à procura de algo que utilizar com arma, sem nada a encontrar.

Olhando suas presas, o medo invadia-me de uma forma que poucas vezes eu experimentei. Era nova e desconhecida, de algum jeito. Eu não entendia porquê. Tomava minha alma e aflorava em meu corpo, trazendo angústia e nervosismo.

Nunca enfrentei um perigo assim, e há uma notável diferença entre treinar e enfrentar. Sair-se bem na preparação não significa sair-se bem na realidade. É muito fácil travar de medo hora.

Eu não tinha meu amuleto, minhas armas, cajado, qualquer objeto necessário a realizar feitiços e aquelas bestas não agiam por racionalidade para que eu talvez pudesse confundi-las.

A única opção boa que eu dispunha não me tentava. Já causara estragos horríveis com ela e parara de experimentá-la há tempos.

Uma das bestas cogitou morder Leecher, mas foi rechaçada logo em seguida. Eles chegavam cada vez mais perto, caminhando pelas laterais, no limite do que eles viam ser o nosso território.

Um lobo cinzento saltou em direção ao meu rosto, rosnando alto. Com medo desviei e chutei-o nas costelas.

A hesitação deles não duraria muito, eu precisaria agir.

Fechei os olhos e cerrei os punhos, tencionando ainda mais os músculos, deixando Leecher desorientado.

Um calor arrebatador tomou o controle, arrastando-se por cada extensão do meu corpo tão veloz quanto eu podia pensar.

Não doía.

Antes que meu aliado se machucasse e meu parco domínio se esvaísse, direcionei a energia através de meus braços, estendendo-os para frente.

O fogo espalhou-se por eles sem demora, disparando em raios dourados e laranjas, assustando os animais que fugiram para longe das chamas. Afastei-os o máximo que me era permitido naquelas circunstâncias e deixei aberta uma passagem na floresta para que corrêssemos, pois os lobos se amedrontaram e abriram o caminho.

Com esforço tremendo, ordenei a mim mesma que parasse e os raios cessaram.

– Como você... – balbuciou Leecher, com assombro. Ele havia se virado para mim.

Num ímpeto instintivo, agarrei sua mão, ignorando as estranhas sensações que me transpassaram.

– Temos que ir – apontei a trilha, no entanto ele resistiu.

– Foi por aí que eles apareceram.

– Correto. Significa que o que precisamos encontrar está naquela direção, de outro modo não tentariam nos impedir.

Leecher não parou para raciocinar e, se o fez, foi rapidamente. Apertou com mais força a minha mão esquerda, puxando-me por entre as chamas e com os lobos uivando atrás de nós, na tentativa de nos perseguir.

Começamos a realmente correr.


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