A Ilha De Circe: Fênix escrita por Daughter of Apollo


Capítulo 24
O Rei da Tempestade




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Leecher

A água é fria contra minha pele quente. Borbulha deliciosamente nas palmas de minhas mãos. Estou inundado até a cintura, um pouco além.

Meus sentidos me alertam. Uma pétala macia toca minha mão. Ela é delicada. Há flores cor-de-rosa na água. Não sei o nome delas. Não conheço muitas flores.

Lírio. Há alguém que conheço que é harmonioso como um lírio. Há algum tipo de beleza nela.

Ouço um barulho. Ela esta ali na frente, de costas para mim. Seus cabelos são longos. Boiam na água. Um leque de luz do sol. Há névoa à nossa volta.

Ela vira o rosto e sorri para mim. Luz nunca foi tão luminosa. Ela pega uma das flores cor-de-rosa nas mãos e a beija levemente. Ariella. Lírio. Perfumada. Harmoniosa.

Linda.

Acordei com suor na testa. Confuso, até perceber Ari com a mão pousada no local. Por isso senti tanto calor no sonho.

Ela olhou para o outro lado. Nunca a havia visto fazer isso. Parecia envergonhada. Limpei a garganta.

– Ah... Bom dia. Como foi a sua noite?

Ela se afastou para o canto da cama, sem olhar na minha direção. Ergui-me para ficar sentado. Ambos estávamos constrangidos, mas não dispostos a nos afastar. Por orgulho talvez? Nos mostrarmos fortes demais para ficarmos constrangidos. De qualquer forma, eu não perguntaria por que ela tocava minha testa. Devo ter tocado cabelo dela enquanto sonhava, porque pensei ter sentido o toque de uma pétala.

– Muito boa, na verdade, se não houvesse sido interrompido.

– Desculpe por isso. Castor disse que está atrás de umas informações que nos contará em breve. Ele nos sugeriu que fôssemos ao mercado de Esparta que abre hoje. É um dos únicos aqui. Precisamos sair um pouco da casa. Vamos acompanhar Alus, Karsa e Aicós.

Sorri para ela. Um sorriso de verdade. Um sorriso natural, que eu não oferecia desde... Bem, eu não lembro a última vez que sorri daquela forma.

Baixei os olhos.

– Vou me aprontar, então, mas tire esse bicho da cama.

Ela nem precisou pegá-lo. O coelho – qual era o nome dele mesmo? Nalan? – pulou para seus braços imediatamente. Parecia um coelho muito magoado.

– Você o assustou. Ele ouviu você, não é só um bicho. Bom, deixa para lá. Vamos esperá-lo no pátio das colunas.

Alguns instantes depois, partimos atrás dos empregados. Ariella ria para Alus, um garoto ruivo e baixinho, enquanto ele contava alguma coisa a ela. Não prestei atenção. Ela tinha um riso musical. Já sabia disso.

O mercado estava apinhado de gente. Barracas contendo frutas, verduras, peles e alguns temperos que enchiam o ar com seu cheiro forte misturado ao de suor, fezes e animais. Tecidos vindos do oriente enchiam os olhos. Havia flores e artigos de botica junto com as mais variadas armas. Não era um grande mercado comparado aos mercados de cidades comerciais. Todavia, para Esparta, uma pólis com poucas relações comerciais, nenhum porto e má localização, se tratava de um enorme mercado.

Fomos atrás de Karsa, a velha, e enquanto ela escolhia tecidos nós olhávamos algumas urnas em outra tenda.

Peguei uma delas e analisei. A pintura em estilo grego retratava um rito fúnebre.

Curioso, perguntei para Ariella, que examinava um tecido verde brilhante familiar.

– Você sabe pintar vasos?

– Sei – Respondeu ela, sem parar o que fazia.

– Você sabe de tudo, por acaso?

Ari virou-se para mim com um olhar fugaz e um sorrisinho.

– Sei, é claro. Sei de tudo.

– Menos de cortar cabelo.

Seu sorrisinho desapareceu e deu lugar a uma expressão contrariada. Ari estreitou os olhos.

A princípio, a coisa veio e não pude controlar. O som saiu meio engasgado no início, por falta de prática, como se eu estivesse tentando contê-lo. A risada tomou espaço dentro de mim e logo eu não parava de rir, dobrado sobre minha barriga. Nem sabia por que ria. Ariella acompanhou-me, apesar da minha troça, que nem foi tão engraçada.

Alus nos chamou a atenção para irmos até a próxima tarefa. Ari disse algo em outro idioma que ele respondeu com um sorriso. Fenício.

– O que você acha disso? – Ari gesticulou para abranger a totalidade da cena.

Dei de ombros.

– Um pouco caótico para o meu gosto, mas não muito diferente do que já estou acostumado dentre os soldados. Ás vezes é assim.

– Você tem amigos lá?

Pensei em contar-lhe sobre minhas relações diplomáticas com os superiores que nunca vi na vida. Não. Seria muito mórbido. Em vez disso falei-lhe sobre Rui. Sobre como ele abandonara a vida de saqueador no mar para viver com o exército. Escolheu isso mais pelo ouro que pela honra, mas era um soldado melhor que a maioria.

– Se ele se esforçasse só um pouco mais poderia se tornar o segundo no comando. Quem sabe até substituir-me – disse, sem remorso – Mas ele não quer, e isso não é para ele.

– Não acho que alguém possa substituí-lo. Você já é um líder. Líder. Entende?

– Penso que entendo.

Ela estreitou os olhos, mirando adiante.

– E você quer o poder, Lee?

Balancei a cabeça.

– Não é o que eu quero, é o que eu preciso. Como você na qualidade de curandeira e arqueira, não gosta muito de luta corporal, a pratica porque é necessário.

– Tem razão. Não sabia que havia notado isso em mim.

Dei de ombros. Para mim era natural, tendo prestado atenção ao que Ari me contava e a como ela lutava.

– Como general é minha responsabilidade treinar os mais jovens e inexperientes. Você acaba aprendendo algo com isso. Reconhecer as fraquezas de um oponente em alguns instantes, por exemplo. Na floresta, quando os lobos vieram, você preferiu afastá-los ao invés de atacá-los diretamente com fogo. Junto de Licáon, no entanto, você usou facas para lutar, que são armas de confronto direto, normalmente.

Ariella permaneceu em silêncio durante alguns instantes, depois, soltou tudo numa exclamação admirada.

– Por Ares.

– Eu agradeço por isso?

– Agradece.

– Obrigado.

– Por nada.

Caímos no silêncio novamente. Havia uma dúvida incomodando meu inconsciente. Ponderei se devia expressá-la ou não. Até que decidi-me.

– Ari, posso perguntar uma coisa? – Ela levantou a sobrancelha, instigando-me a continuar – Quando eu fiquei com a perna machucada e cheia de veneno lá na floresta, por que você hesitou em me curar?

Ari virou a cabeça de um lado a outro antes de dar a resposta. Nos distanciamos um pouco dos outros. Quando falou, sua voz e seu rosto não tinham expressão.

– É uma longa história. Desde que cheguei à Ilha mostrei aptidão e interesse à arte da cura. Não queria esperar para aprender. Tinha desenvolvimento mental avançado. Entrei oficialmente para a escola de cura aos dez anos. Quando atingi quatorze, fui efetivada.

“Há três tipos de curandeiros: Os que treinam, os que têm o dom e os que treinam e têm o dom. Eu sou do último grupo. O problema é que o meu... O meu dom de cura é muito complexo. É difícil controlar tanta energia.

Quando tinha doze anos eu fui submetida a um simples teste. Só havia feito coisas mínimas até então. No dia da avaliação, P... Meu instrutor, Mestre de Poções, abriu um pequeno corte no antebraço e pediu que eu o curasse. Se eu conseguisse teria meu dom trabalhado.”

– E você conseguiu?

Ela fez sinal para eu esperar.

“Concentrei minha energia no tecido de sua pele, em suas veias, seu sangue, como aconteceu com você, na floresta. Minhas mãos aqueceram-se. Ardia, mas não queimava. O corte começou a se fechar rapidamente e mesmo a cicatriz desapareceu.

Porém... Porém não percebi o que havia causado de início. Parecia uma maravilha. Depois de alguns instantes examinando o braço foi que percebemos. Eu provocara uma superprodução de células que continuaram se reproduzindo em ritmo acelerado e formaram pequenas manchas na pele de meu instrutor.

Aquilo não era nada, mas representava algo maior. Não sei se você entende, eu poderia ter causado um nódulo. Esse tipo de doença é curável, eu sei, todavia, é grave e mata se não tratada. Compreende, Leecher? Eu tenho a capacidade de matar uma pessoa curando uma simples escoriação.”

Ela baixou os ombros. Aquele era um relato profundo, vindo de um lugar sombrio. Ari se mostrava tão vulnerável, fraca como nunca a vira antes. Ambos deixamos as máscaras se despedaçaram pouco a pouco, pensei. Agora, ela me via como eu era. Um homem inseguro e cheio de ódio, egoísta ao ponto de ver a liderança de um grupo honrado apenas como um passo para algo que eu desejava. Eu também a via de verdade, afinal. A garotinha de olhos azuis que escondia sentimentos e um passado de silêncio para ser forte e que se sacrificaria pelas pessoas a quem amava.

Arde e não queima.

– Eles a proibiram de exercer seu dom?

– Não – murmurou, desolada – Só desencorajaram. Sou apta para curar segundo o treinamento, oficialmente. Eu trazia sempre uma mochila com o material básico comigo. Ela desapareceu quando acordamos na floresta depois do ataque à Atenas.

– Mas você fez tudo direitinho quando precisei.

Naquela ocasião, lembrei, eu xinguei dizendo que qualquer macaco sabia fazer um curativo.

– Eu sei. É que, com você, consigo controlar melhor o que acontece comigo. Nossa ligação, o enlace, se provou um excelente catalisador.

– Fico feliz em ter me tornado tão útil.

– Disponha – Ariella rebateu. Nós sorrimos um para o outro.

A manhã passou e nós ajudamos Alus, Karsa e Aicós a barganhar produtos no mercado. Conseguimos tecido de boa qualidade por um ótimo preço, armas de alta qualidade e frutas frescas. Karsa perguntou-me, em nome do Rei, se eu não desejava uma nova espada. Neguei o presente. A espada do Lobo esperava-me onde eu a guardara e não haveria, para mim, arma melhor que aquela.

Castor voltou à noite, como fazia todos os dias que estávamos ali. Ari e eu expressamos nossa ansiedade em partir, todavia, o Rei mostrou-se resoluto e nos mandou esperar um pouco mais. Ele ficava cada vez mais nervoso e havia algo que ele queria nos contar, mas não contava. Guardava informação.

Ás vezes íamos até a parte mais extrema da propriedade e observávamos o acampamento dos aprendizes. Ari queria ver seus irmãos, pois não tinham permissão de deixar o acampamento. De modo que um aceno, quando a avistavam, era todo o contato com a família que ela recebia.

Talvez fosse estranho para ela. Eu até compreenderia, porém deixara minha família morta para trás há muito tempo. Já aceitara que aqueles soldados seriam tudo o que eu teria. Um amigo, talvez, com Rui, que partiria assim que a guerra presente acabasse e ele recebesse seus espólios e o soldo. Eu gastaria bastante tempo resolvendo questões governamentais e diplomáticas quando o momento chegasse para achar que estava ficando solitário. Porém... talvez eu não precisasse. De qualquer forma, ela nunca aceitaria.

Alguns dias depois, formou-se uma grande tempestade e Castor voltou mais cedo para casa. Ele vinha tropeçando e estava ferido na perna por algo que a carbonizara, inutilizando-a. Ariella correu, junto com os empregados, para ajudá-lo. O rei trazia consigo uma alta figura encapuzada em um manto cinza.

Ariella foi para diante deles. A figura misteriosa ajudava Castor a andar e o deitou no chão do pátio de colunas quando viu Ariella, parecendo saber que a garota iria fazer algo. Ari mal deu atenção, as suas forças voltadas para verificar o estado de Castor.

Como em equipe, eu sabia o que precisava fazer. Um trovão ribombou bem próximo da casa. Pedi a Alus que fechasse todas as entradas e que deixasse apenas Karsa com Ari, para que os outros empregados se concentrassem em barricar as portas e janelas.

Depois, voltei minha atenção ao visitante encapuzado. O manto cinzento ondulava. Ele olhava para Castor, que era examinado por Ariella com rapidez. Esta, por sua vez, dava ordens à Karsa para que trouxesse produtos específicos.

Voltei-me para o visitante.

– Quem é você?

A pessoa levou mãos delicadas até o capuz e o retirou, revelando um rosto feminino e longos cabelos castanhos. As pupilas de seus olhos eram muito claras. Ela mantinha uma expressão avaliativa e vestia-se com roupas simples, mas possuía a beleza de uma deusa.

Pus-me sobre o joelho esquerdo, lentamente em reconhecimento.

– General Leecher – ela disse – Eu sou Ártemis, a Senhora da Caçada. Por favor, levante-se, não temos tempo para isso. Precisamos discutir planos de ação.

A Senhora da Caçada era extremamente direta. Passou por mim e foi para a cozinha, esperando que eu a seguisse. A cômodo ficava suficientemente perto para que eu pudesse me distanciar de Ariella, de modo que o fiz.

– O que a Deusa deseja?

Um trovão sacudiu a casa. Ártemis parou perto da mesa e pousou a mão sobre ela. Parecia irritada consigo mesma. Seus olhos brancos eram perturbadores.

– Há um ataque vindo à Esparta. – Falou sem rodeios ou floretes na linguagem.

– Como pode ser possível? O outro Rei da cidade está combatendo fora daqui e os batedores de Castor nada viram muito próximo.

Ela balançou a cabeça e apontou para o teto. Prontamente, como se respondendo a ela, um raio atingiu a telhado e balançou as estruturas.

– Não é desse tipo de ataque que estou falando, embora ele também seja válido. Estou falando de um ataque sobrenatural, General. Você e sua Ariella devem partir logo.

– Para onde? – Perguntei.

– Continuem a Jornada para Leste, no deserto. Eu posso abrir um Portal para por alguns segundos e levá-los ao seu destino.

– Por que o deserto?

– Espere Ariella voltar, não quero ter que repetir.

A deusa tirou uma faca de seu cinto e cravou na mesa. Uma luz branca brilhou na lâmina e o barulho do vento rugindo diminuiu.

– É só um escudo em volta da casa – murmurou a deusa – Não posso acabar com a tempestade.

Ariella entrou nesse momento e fez um sinal de respeito à Ártemis, que sorriu para ela como quem sorri para uma filha. Ari tinha o coelho no colo e a deusa se aproximou dela para acariciar o bichinho, momentaneamente distraída.

– Faz muito tempo desde que nos vimos, menina. Vejo que ainda é devotada a mim.

– Sim, ainda mantenho meus votos. Não por muito tempo, eu creio.

A Senhora da Caça concordou. Para alguém com pressa, estava tendo uma boa conversa. Pigarreei, ignorado de qualquer forma.

– Ah, o tempo leva tudo, e principalmente nossos votos. O seu tempo chegará também, e o tempo de outras. Mas vamos ao que interessa. Posso lhes abrir uma passagem no mesmo lugar de onde vieram, vocês precisam ir para o deserto.

– O que há lá? – Perguntei.

– Primeiro, encontrarão o Labirinto de Areia, que devem atravessar na direção da lua para chegar até a corte de Dionísio. Lá pagarão o tributo para que ele entregue a arma a Ariella. Depois devem se dirigir à Heliópolis e recuperar o amuleto que vieram buscar, aquele que devem à Hécate.

– Que relação isso tem com o exército Macedônio?

– O líder deles, O Negro, está com um dos amuletos e procura as outras partes. Ele está vindo em direção a Esparta pois pensa que ele está aqui por causa da nossa presença – respondeu Ariella – Castor disse que ele sabe que estamos aqui porque controla a magia dos Portais.

– Por que estaríamos com ele? – Perguntei.

– Por causa de Ariella – Pronunciou-se Ártemis e dirigiu-se a Ari – Aconteça o que acontecer, não importa quem ou o que veja, não confie em ninguém e siga a trilha mágica. Não se deixe ser capturada de maneira nenhuma, entendeu?

– Sim – ela disse.

– Uma última coisa. Sua amiga, Dreah, vai reunir o exército que Leecher deixou, ela está viva junto de duas outras garotas que mandamos para cumprir a missão. Depois de Heliópolis, vocês precisam voltar para enfrentar O Negro, senão ele vai destruir o mundo inteiro, muito além do continente. Até o Arquipélago Encantado. Está entendendo? A diversão acabou.

– Caeliora está bem? – Perguntou Ariella, preocupada.

– Sei apenas do que consigo ver – Rebateu a Senhora da Caçada e bateu palmas.

De repente, eu estava vestindo uma armadura prateada com as armas que havia pego do lobo. Um escudo e a espada, junto agora de uma cota de malha, grevas, botas e braceletes. Ariella estava com praticamente o mesmo, mas, além da espada embainhada, trazia a faca presa ao cinto e coelho nas mãos. A única peça que faltava era o elmo, porém eu sabia que naquela situação seria inútil.

– Vamos agora. Precisaremos correr, não posso usar mais magia que isso, senão chamaremos atenção.

A deusa pegou seu punhal e corremos. Pudemos ouvir novamente o clamor da tempestade, levando telhados, árvores, animais e até pessoas. Castor nos acenava da janela, não mais desorientado.

– Quem está controlando a tempestade? – A voz de Ariella saiu baixa mesmo ela tendo gritado.

– Não sei. Tampouco sei se meu divino Pai, Zeus, a está assistindo. Estive ocupada percorrendo as Dimensões atrás de vocês e fugindo de espíritos poderosos. Essa foi minha última chance de encontra-los, pois as portas dimensionais estão sendo fechadas. A que farei provavelmente consumirá minha magia.

Corremos em meio ao caos na direção do campo. Ariella e Ártemis formavam um escudo dourado e prateado a cada raio que tentava nos acertar à medida que adentrávamos o campo e passávamos através do vento. Ao longe, podíamos ver o acampamento dos aprendizes, com todos correndo em direção a um grande amontoado de pedras que devia servir como prisão subterrânea.

Eu podia enxergar Nohan e Calais segurando a entrada do abrigo improvisado. Depois, não podia enxergar mais nada, pois a chuva começou a despencar e eu só podia seguir em frente por causa da luz que Ártemis e Ari emitiam.

Em uma das montanhas que circundavam a cidade, era possível ver uma forma espiral gigantesca de nuvens e vento tragar a formação rochosa. Raios violeta partiam e chocavam-se na terra como açoites. Do outro lado do vale, outros tornados menores formavam-se, como soldados respeitosamente vendo rei entrar em cena.

Ultrapassamos os portões. O rio que alimentava Esparta transformara-se em uma torrente caudalosa. Nós o seguimos por uma boa distância, vendo árvores e grandes animais sendo arrastados pela corrente. Chegamos até a grande árvores que vimos quando fugimos do Palácio de Licáon. Ártemis parou e nós a imitamos.

Ela gritou em meio à chuva:

– Não se esqueçam de manter a concentração e não se desviar, ou serão mortos!

Não havia necessidade, pois o enlace nos manteria unidos, todavia, Ariella e eu juntamos as mãos e esperamos que Ártemis fizesse sua mágica.

Foi como da primeira vez, depois de Atenas.

Estava tudo escuro e formas iam e vinham na escuridão. Eu não sentia mais Ariella ao meu lado.

A água é fria contra minha pele quente. Borbulha deliciosamente nas palmas de minhas mãos. Estou inundado até a cintura, um pouco além.

Meus sentidos me alertam. Uma pétala macia toca minha mão. Ela é delicada. Há flores cor-de-rosa na água. Não sei o nome delas. Não conheço muitas flores.

Lírio. Há alguém que conheço que é harmonioso como um lírio. Há algum tipo de beleza nela.

Ouço um barulho. Ela esta ali na frente, de costas para mim. Seus cabelos são longos. Boiam na água. Um leque de luz do sol. Há névoa à nossa volta.

Ela vira o rosto e sorri para mim. Luz nunca foi tão luminosa. Ela pega uma das flores cor-de-rosa nas mãos e a beija levemente. Ariella. Lírio. Perfumada. Harmoniosa.

Linda.

Há um outro tipo de flor em minhas mãos. É igual às outras, mas a cor é diferente. È vermelha. Ariella vira-se de costas novamente e vou até ela com a flor. Sorrio. Coloco a mão em seu ombro. Ela cai mole em meus braços. A flor vermelha boia na água, esquecida. Ari está pálida como o branco, os olhos cerrados. A flor tinge a água de vermelho. Tento proteger o corpo dela, em vão, pois tudo que nos cerca é contaminado. Estou com uma careta de terror. A água e as flores viram sangue e de repente olho para uma Ariella com os lábios cheios de sangue. As vestes brancas manchadas.

Acordei, desta vez, sem ninguém tocando em mim, o calor do ambiente fazendo-me suar. Ariella estava ao meu lado, deitada com a cabeça em meu peito e os cabelos cobrindo o peitoral da armadura. Nossos escudos estavam jogados de lado.

Uma de minhas mãos repousava na cintura dela como se houvéssemos caído assim. Esperei que ela, lentamente, acordasse. Ari piscou os olhos azuis e levantou-se, permitindo que eu fizesse o mesmo.

Havia areia por toda a nossa volta. Era noite e eu só podia distinguir que havia uma beirada na caverna. Do outro lado, a parede.

Ariella aproximou-se da entrada e olhou para baixo.

– Você não conseguiria ver, porém não é uma queda longa. Podemos descer agora mesmo. Eu forneço a luz.

Pegamos nossos escudos e jogamos lá embaixo. Fui primeiro, confiante pela luz que o corpo brilhante de Ari emanava. Chegamos lá embaixo rapidamente.

– E agora, para onde vamos?

– Creio que não sei. Este é o Labirinto de Areia, devemos atravessá-lo. Onde está a lua?

Procuramos no céu, onde conseguíamos ver, mas não havia lua nenhuma na noite.

– Estranho. Não era para ser lua nova nessa época do ano, mesmo nessa região – Falei com a confiança de alguém que já estivera nos desertos a Leste.

– Você sabe onde ela estaria?

– Sim. Siga-me.

Ariella obedeceu, ato que merecia algumas congratulações, mas ela não gostou muito quando falei isso. Estávamos nervosos e ela pensava em seus irmãos.

– Não era para ele estar no deserto, na verdade. – Ela disse.

– O que?

– O amuleto que procurávamos. O primeiro estava em Atenas, com a anciã que você matou – Ela disse, sem remorso, e eu não senti nenhum tampouco – O segundo iria ser revelado após o primeiro. E o terceiro após o segundo, porém, nenhum deles foi escondido no deserto.

– Você lembra do homem da visão, antes de tudo ficar escuro e viermos parar aqui?

– Qual? – Ela aparentou confusão.

– Aquele que lutou com um homem que vestia negro. Nós estávamos em um templo e o amuleto caído no chão. Corremos para pegá-lo.

Os olhos dela se iluminaram.

– Ah, sim, lembro.

– Os olhos dele me lembraram os olhos de Ártemis. Eles emitem a mesma luz.

– Ele podia ser Apolo.

– É verdade – pensei, depois dei e ombros – Isso não importa muito agora. Castor disse algo a você?

– Sim. Uma parte do exército negro está indo para o monte Olimpo. Essa parte contém um milhão de soldados, maior que todo o exército de Esparta.


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Notas finais do capítulo

Coisas a considerar: A flor que Lee viu era um lótus.
Esparta era uma cidade na Península do Peloponeso que não tinha portos. Era completamente militar.
Os aprendizes de soldado eram treinados a partir dos sete anos pelo governo e não pelos pais, por isso Nohan e Calais não visitavam Castor.
Pronto.
Beijos da mamãe.



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