O Gelo e o Fogo escrita por Sídhe


Capítulo 2
Capítulo 1 - Trégua


Notas iniciais do capítulo

Aqui vai o primeiro capítulo, boa leitura!



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– Ele já partiu para um ataque direto!


– A Rainha do Gelo e o Incendiário juntos!


– Alguém segure os dois antes que esse lugar venha abaixo!


Leo ouvia as pessoas comentando, mas não fazia ideia do que aquilo significava, ele só sabia que alguém havia esbarrado nele, o fazendo cair no chão com a força.

Ele levantou a cabeça e viu uma garota. Ela tinha, definitivamente, os olhos mais fortes e penetrantes que Leo já tinha visto, nem Thalia poderia causar tanto desconforto nele, o analisando como se fosse ser devorado caso fizesse algo errado. Eram negros e pareciam com obsidianas. Tinha os cabelos pretos como ébano, caindo sobre o ombro dela em uma trança, as sobrancelhas finas e marcantes, a boca que parecia ter sido feita à mão.




Levantou-se e balançou um pouco a cabeça, tentando recuperar melhor os sentidos, enquanto ela continuava o fitando com raiva.


– Uh, me desculpe? - Sorriu nervoso - Até que não foi ruim ter esbarrado, você é bem bonit-




A Rainha do Gelo o empurrou para o lado com tamanha força que ele voltou a cair no chão.




– Com licença. - Disse educadamente, soando indiferente. Dirigiu um olhar frio a ele. Rainha do gelo. Sim, encaixava perfeitamente. Enquanto ele se levantava, pôde sentir o local onde sua cabeça doía da queda.




Aquele ano não estava começando tão bem assim. Queria revidar, dizer alguma coisa, mas o professor chegou na sala naquele exato momento. Era baixo, atarracado, lembrando ligeiramente um bode (na verdade, cheirava a bode). Leo entrou na sala logo após ele, se sentando e colocando a mochila ao lado.

– Aqueles que ainda não preencheram o formulário o entregarão diretamente na sala dos professores, cupcakes. - Disse Hedge, ao fim da aula, quando Leo tentou decidir se morreria de tédio pela aula ou nojo pelo apelido - Ouviu o que eu disse, Valdez?


– Ainda não sou mouco como o senhor, Treinador. - Bateu continência, sorrindo, fazendo o professor que insistia por ser chamado de treinador resmungar ao sair do local.


Um espirro próximo chamou atenção de Leo.




– Você está doente? Se atrasou hoje. - Ouviu a voz de Thalia dizer, nas carteiras mais à frente. A Rainha do Gelo espirrou novamente.




– Fui ao médico, ele disse que isso foi causado por excesso de pó dentro de casa. - Disse ela, aceitando um lenço que a outra lhe oferecia.




– Bem, se cuide, então. - Continuou a amiga.




A Rainha do Gelo era amiga de Thalia. Então, a pessoa problemática ali era ele, como sempre.




– Está bem? - Jason apareceu ao seu lado. - Vi que Reyna havia lhe empurrado. Ela é do conselho estudantil, mas pode ser meio bruta de vez em quando.




– Reyna é o nome dela? - Rainha, pensou, significava rainha em espanhol, língua que ele dominava. Seria ela latina também? Não parecera tanto, mas ele Leo não se importou, ponderando mais de onde veio o apelido Rainha do Gelo - Está me dizendo que aquela garota louca é do conselho estudantil?


Eles foram interrompidos por comentários vindos do fundo da sala.




– Viu Reyna e Leo Valdez? Ela praticamente deu um soco nele! - Disse um garoto, que sentava-se encima de uma mesa.


– Leo só parece ser perigoso, mas ele não chega colocando fogo em tudo. - Falou a garota ruiva que estava ali também.




Jason olhou para Leo, sorrindo.




– Acho que o mal-entendido do incêndio não precisa ser mais explicado, garoto em chamas.




– Passei de vilão da história para o mocinho, sendo maltratado pela maléfica Rainha do Gelo! - Disse Leo, articulando as mãos de uma forma que parecesse tramar um plano do mal.




Os dois riram, mas ele ouviu a voz de Thalia conversando novamente quando Reyna os olhou de sua carteira, as duas obsidianas fixas em Jason.




– O que foi? - Ela disse para Reyna, que cortou o contato visual com o loiro. Leo espiou as duas pelo ângulo favorável em que estava.




– Nada. - Falou a menina de trança.




– Ande, não me engana - Thalia disse, levantando uma sobrancelha e a encarando de uma forma que Leo gostava nela. - Desembucha.




Reyna suspirou.


– Estou apenas cansada, a doença me fragiliza. - Thalia resmungou, como se não acreditasse.


– Vamos ver um filme depois, então, talvez isso te anime. - Ela disse, pousando os cotovelos na mesa de Reyna.


– Não, obrigada. Só quero ir para casa. - Deu outro espirro.




Jason se voltou para Leo quando outro professor chegou.




– Se importa de trocar de lugar comigo? - Disse ele, pegando sua mochila quando Leo negou e sentou na outra cadeira.


Mais um horário se passou e a campainha do intervalo tocou, Leo foi até a sala dos professores, não preenchendo o formulário de interesses. Ele não queria fazer universidade, Leo não iria para lá para ver coisas que ele já sabia sobre mecânica, iria continuar com a oficina da mãe e fazê-la crescer. Hedge estava lá, com os pés encima da mesa, olhando os papéis à sua volta segurando um copinho plástico de café.




– Está sem rumo em relação a sua vida, não é, Valdez? - Disse, pegando um formulário que tinha o nome de Leo. Não havia nenhum dos empregos marcado. - Ainda assim precisa preenchê-lo.




– Eu não penso em ir para a Universidade... - Começou, mas Hedge o parou.




– Vai querer ser um Zé Ninguém? - Leo negou com a cabeça, rolando os olhos - Achei que não. Então faça um bom curso e sua vida está feita.




– Mas eu...




– Preencha. Me entregue amanhã - Bebericou seu café. - Agora suma daqui antes que queira ser suspenso por desobedecer um professor.




– É o senhor quem manda, Treinador. - Bateu continência em deboche e saiu correndo para sua sala, antes que a aula de Educação Física começasse. Ele não era o melhor em esportes, mas se faltasse estaria frito.




Abriu a porta. Cinco das cadeiras flutuavam a poucos centímetros do chão, para depois caírem com um baque ao lado de Reyna. Ela o encarou, fria como pedra, sem dizer uma palavra. Um vento gelado entrava e ela, com os cabelos agora soltos e esvoaçando levemente, deu um passo à frente.


– Certo, eu só vou pegar minha mochila e... - Leo foi com cuidado até a carteira, ao lado da de Jason, e pegou sua mochila intencionando tirar sua roupa de ginástica.




– Eu.... - Começou ela, parecendo confusa - Eu troquei... - Pegou o lado oposto da bolsa dele, puxando com força - ...As carteiras...


Então, de algum modo, eles começaram a brigar por ela, puxando com força, cada vez mais. Num momento, depois de Leo se perguntar de onde ela tirara tanta força para uma simples garota, Reyna espirrou, soltando-a, e Leo caiu com a mochila no colo. A de Jason continuava ao lado, intacta. Não, Reyna não era uma simples garota.




– Qual é a da mochila, huh? O que quer com ela? - Perguntou, passando a mão na cabeça pelo terceiro tombo que levara somente naquele dia.


Ela o encarou furiosa, caminhando até a porta. Ainda de costas, ela finalmente disse:




– Não importa. - Saiu dali, deixando-o sozinho e atrasado para a aula.




Leo continuou fitando a porta e as carteiras viradas e espalhadas.




– Ela é uma encrenca. - Disse para si mesmo - E essa sala também.

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A rua com poucos postes em frente à sua casa era fria e vazia naquele horário. Ele andava de volta para casa, pensando em tudo que lhe acontecera. O que Reyna queria fazer com sua mochila? Roubar? Não, ela não parecia do tipo.

Chutou uma lata de refrigerante amassada na calçada.

Leo não sabia no que deveria acreditar sobre ela, então não sabia dizer qual seria seu tipo. Mas ela era, todavia, muito bonita e perigosa. O pior de tudo: ele tendia a cair por garotas assim, como Thalia. Desde que conhecera ela tinha uma queda pela irmã de Jason. Quem iria querer Leo Valdez? O pobretão latino que fazia piadas sujas?

Pobretão. Hedge tinha razão, por mais que não gostasse. Leo não queria ser um Zé Ninguém. Quando abriu a porta de casa, percebeu que sua mãe continuava na oficina, as luzes estavam apagadas e ele se encontrava sozinho ali. Ela não terminara a escola, engravidara e agora tinha de passar noites em claro por isso. Não queria ter o mesmo destino, mas se trabalhasse quem sabe pudesse melhorar a vida deles. Foi para o quarto, colocando seus fones de ouvido e remexendo CDs nas gavetas.

Abriu uma e procurou por mais no fundo, mas o que achou foi outra coisa. Uma foto de sua mãe e seu pai. Esperanza estava falando a verdade quando dizia que se parecia com ele. Se seu pai era tão ruim assim para deixá-los, ele não entendia porque era parecido com ele. Nem porque motivo ele os deixou.




Depois de ouvir alguns CDs e deixar de lado aqueles pensamentos, foi pegar sua mochila e o questionário de Hedge para o dia seguinte. Ao abri-la, havia um cartão cor-de-rosa dentro, com um adesivo de simples e branco o fechando.

Para Jason – Leu, na frente do envelope - De Reyna? Então era isso que a Rainha do Gelo queria. - Riu, se deitando no chão com um dos braços atrás da cabeça - Mas colocou na minha mochila. - "Colocou isso na minha mochila por engano, não foi? Não tenho ideia do que é pois não bisbilhotei. Então apenas vou te devolver" – Treinou a fala, balançando a carta em sua mão livre.




O adesivo se soltou.


– Droga. - Disse, fechando rápido novamente. O deixou encima da escrivaninha. - Vou dormir.




O silêncio da madrugada de 3h da manhã foi quebrado por um som estranho.


– Minha mãe não deveria ter chegado - Disse, baixo - Ela só vem de manhã quando passa a noite na oficina. - Leo se levantou e foi até a pequena sala de estar. A janela estava aberta, e a cortina azul se movia conforme o vento. - Ei. - Falou, buscando a resposta de alguém. Foi até o batente, observando o prédio ao lado.




No reflexo do vidro, ele viu uma garota de cabelos negros o encarando. Reyna avançou em seu pescoço, o encurralando contra a janela prendendo com seu antebraço. Ele ainda se impressionava com a força dela.




– Esqueça aquilo.


- Esquecer o quê?! - Parou um segundo - Ah, você está falando da car... - Reyna rosnou de raiva.




– Você vai esquecer tudo daquela carta de amor. -Disse, a voz embargada de nervosismo.




– Calma, não-




– Vai esquecer tudo ou eu... - Pressionou mais, o fazendo sufocar.


– Eu não li... - Falou, quase sem voz, olhando-a nos olhos que brilhavam com o luar que entrava pelo vidro. Os olhos dela se abriram mais. O braço de Reyna pendeu, frouxo, e ela deslizou para o chão de joelhos, suspirando. Leo caminhou hesitante até o interruptor e acendeu a luz. Ela usava uma blusa solta e leve, com calça de um pijama qualquer, e parecia aliviada. - Teve sorte de eu não ter lido - Disse, ainda um pouco perplexo. Ela apertou a barriga entre os braços, e ele ouviu um ronco. Reyna estava... com fome? - Por que diabos sua barriga está roncando?




– Não é óbvio? Estou faminta. - Ela iria se levantar, mas ele a impediu. - Quero ir para casa, agora que já resolvi o que me interessava.


– Nem pense. - Foi para a cozinha, pegando uma panela do armário. - Me matando ou não, está com fome. Não come onde mora, não?




– Cozinhar não é uma das minhas qualidades, e a loja de conveniências me cansa. - Reyna se aproximou da mesa, receosa pela recepção dele. Ela não esperava que ele fosse a fazer algo para comer depois de o ameaçar, mas alguns minutos depois ela comia um prato de macarrão como se nunca tivesse comido na vida.




– Loja de conveniências? - Ele falou, sentando no outro lado da mesa - Seus pais não te... - Parou com o olhar dela, que pedia para que ele não continuasse a frase. Leo suspirou - Acho que todos nós temos problemas em casa.


A boca dela tinha um pouco de molho, Leo pegou um guardanapo e estendeu a mão para ela.




– Aqui. - Reyna o pegou e limpou seus lábios.





– Se tivesse entregue a bolsa mais cedo, não teríamos chegado a esse ponto. Como pretende recompensar isso?





O molho continuava em seu rosto.





– Ainda está grudado na sua cara - Disse, e ela irritada voltou a limpar-se com o guardanapo.





– Ouvir isso de alguém que só sabe colocar tempero no molho de macarrão... - Resmungou.





Leo queria provocar também.





– Ouça aqui... - Ela espirrou, o interrompendo. Parou quando viu que a garota não o encarava mais. Estava olhando triste para a mesa, visivelmente inconsolável. Suspirou, passando as mãos nas têmporas. - ... Como uma carta de amor pode ser embaraçosa? Não chega nem perto. Vem cá.





Ele se levantou e a guiou até o seu quarto. Leo puxou debaixo da escrivaninha uma caixa cheia de cadernos, cds e papéis aleatórios.





– O que é tudo isso? - Reyna perguntou, pegando um caderno qualquer e o abrindo.


– É uma lista de músicas que eu escolheria caso fosse fazer uma serenata para uma garota - A Rainha do Gelo o olhou sem crer no que ele dizia, e largou o caderno para pegar outro. - Isso é um poema que criei para ela sem nem perceber. Repulsivo, não? - Leo cruzou os braços se dando por vitorioso - Tenho planos para todas as estações do ano. Já que não tenho coragem para me declarar, tenho que imaginar desse jeito. Mas você foi diferente e tomou uma atitude. - Ele piscou um olho.


– Para Thalia Grace... - Reyna murmurou, lendo uma folha, e Leo se deu conta de que ela vira.





O quê?! - Tentara pegar a folha, mas ela era mais rápida.




– Você gosta da Thalia, que insolente. - Falou para si, olhando novamente o resto do texto. Leo ainda tentava arrancar dela aquele pedaço de papel. - Ponha-se no seu lugar.




– Ó sim, vossa majestade, devo lhe obedecer como um cão. - Olhou para o lado, o relógio marcando 4 da manhã. - Já está tarde assim! - Falou, se virando para ela - Somos farinha do mesmo saco. Não direi nada sobre a carta! Não pode esquecer isso?





– Seria uma trégua, Valdez? - Levantou a sobrancelha, numa voz sugestiva. - Me ajude com Jason, e eu não direi nada à minha melhor amiga.




– Não confia em mim? - Falou sorrindo.


Não.


– Ótima escolha - Disse, apertando a mão dela. Era gelada, percebeu. Reyna se encaminhou para a janela da sala, pulando a sacada com facilidade. Como ela conseguira entrar, Leo não sabia.




– Até breve - Ela disse, solene e de uma forma muito adulta para alguém de sua idade, e deu um olhar a ele.


– Quer que eu te leve em casa? - Perguntou ele.




– Não precisa, mas obrigada pela proposta, Leo. - Saiu andando, o garoto a observou durante todo o percurso na rua vagamente iluminada. Reyna parou em frente ao grande prédio vizinho à casa dele. Ela morava ali, pelo visto.


Leo pensou na última coisa que ela disse.


– Ela me chamou pelo meu primeiro nome?




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Notas finais do capítulo

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