1996 escrita por Manuzíssima


Capítulo 3
Exercendo tortura chinesa no rapaz...




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/353539/chapter/3

            Nesse momento eu não sabia gritava para minha mãe para ela ligar para a polícia ou se esperava mais revelações do meu novo amigo doente mental sentado ao meu lado.

            - Você estuda na mesma sala que eu? – repeti sabendo a resposta, mas queria entender a informação. Que diabos ele está fazendo aqui?

            - Isso mesmo, sou amigo da sua prima. – e apontou para a menina de vestido prateado no meio da pista.

            Sim e daí? Detesto esse abismo infinito nas conversas, parece que ninguém tem mais nada a dizer e fim, todo mundo levanta e vai embora. Mas ele não parecia disposto ao fim.

            - Sabia que quando a gente se apresenta a outra pessoa costuma responder dizendo seu nome e ambas apertam as mãos? – ele estava rindo enquanto falava e observei as covinhas no seu rosto. Gente, isso é coisa de criança! Bebês têm covinhas na bochecha enquanto sorriem, não esses doentes mentais que atrapalham sua noite de fossa no aniversário da tia.

            - Você não estuda na minha sala? Então, pelo menos três vezes por dia, nas trocas de professor, você ouve quando eles dizem meu nome.

            - Ok, Mariana, eu sei seu nome e olho para você todas as vezes que o professor faz a chamada. É engraçado! Você faz quase uma careta! Gostaria de saber porque.

            - Não gosto que olhem para mim.

            Aí ele não riu, ele gargalhou! Como assim? Ele jogou a cabeça para trás e seu cabelo espetado sacudia no ar com o balanço do corpo, ao mesmo tempo em que segurava a barriga.

            - Você parece minha irmãzinha. Ela também faz birra quando não gosta de alguma coisa.

            Definitivamente, ele era louco! Eu, fazendo birra! Ok, hora do nocaute e do “hasta la vista, baby”, já dei chance demais para esse moço.

            - Bom – eu disse enquanto levantava e pegava minha bolsa em cima da mesa – não foi um prazer saber da sua existência, boa noite e até nunca mais!

            Inesperadamente, ele segurou minha mão contra a mesa, com força demais quase esmagando meus dedos.

            - Não, senhora, você não vai agora. Levei muito tempo esperando e respeitando seu tempo de luto e enfado com o mundo. Senta aí, deixa de ser boba, vamos conversar! Ou você vai dançar ao som da Jovem Guarda que está na pista? Sua mãe não parece querer ir embora agora. Olha como ela está se divertindo! E você não vai estragar a noite dela, né? Além disso, você fica linda fazendo bico, não me prive dessa visão.

            Fiquei atordoada, após meses e meses alimentando meu equilíbrio, buscando sobreviver na selva dos meus sentimentos, e vem esse moço, para não dizer outra coisa, e me tira do sério desse jeito em poucos minutos? No ritmo em que processava as informações na minha mente, ia sentando.

            - Já pode deixar o sangue circular na minha mão! – falei alto demais.

            - Oh, desculpa, perdi a noção da força. Mas a culpa é sua querendo sair correndo assim de mim, nem fiz nada ainda. – havia um tom de graça e ameaça mal disfarçada na voz dele.

            Queria analisar o discurso dele, saber o que havia por trás daquele interesse súbito na minha “birra”. Eu não faço birra! Não sou mais criança! Mas eu não sabia o que dizer, de repente as palavras tinham sumido, traiçoeiras! Fiquei então perdida avaliando o rosto bronzeado, surfista talvez, o cabelo espetado e sem o gel que a maioria dos meninos da nossa idade estavam usando, mas eu devo ter sido detalhista demais na minha avaliação, pois ele percebeu:

            - Algo errado? – e passou a mão no rosto. Coitado, em duas palavras me deu cartas para jogar, não deveria ter demonstrado insegurança, baby, eu posso ser cruel, é o que sei fazer de melhor, pois o mundo me ensinou como é não ter piedade. E estou apenas começando.

            - Tem sim. – ok, ele vai morrer na dúvida, ficar calado o resto da noite ou sair correndo no meio de uma desculpa esfarrapada, assim espero.

            Mas ele não era tão facilmente manipulável como os que já tinham tentado se aproximar e tinham sido rechaçados. Ele era impossível!

            E então, ele aproximou demais o rosto do meu, fechou os olhos e disse:

            - Tira!

            Anh? Ele não está jogando meu jogo, ele sequer está se dando conta que estou jogando com ele, aliás, que quero jogá-lo para bem longe de mim, se possível em outra galáxia. Insuportável!

            Mas agora, perto demais, pude perceber que ele não tinha uma marca sequer de espinhas, que seu perfume era muito bom e que seus cílios tinham uma cor entre castanho claro e cobre. Ah, que raiva! No próximo segundo eu tinha levantado rápido demais para que ele me segurasse e ele ficou lá sentando, plantado feito uma batata no asfalto em pleno meio-dia... Estou fazendo comparações estranhas! Saí à procura da minha mãe pronta para implorar para irmos embora, ia inventar cólicas, dores na cabeça ou até mesmo um ataque de epilepsia, se fosse preciso, pois aquele moço estava me incomodando e perto demais da minha muralha da China tão bem construída.

            Foi quando ouvi no microfone do DJ:

            - Queridos, é hora dos parabéns!

            Sério? Sério mesmo?

           

            


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "1996" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.