As Nem Um Pouco Felizes Histórias De Amor. escrita por Yang


Capítulo 39
E o vencedor é...


Notas iniciais do capítulo

Gente, perdoem a demora, são várias as razões, entre elas a de que eu estou apaixonada, e você encontra meu amor no livro "A culpa é das estrelas" hsushsu ♥ sério, se tiverem tempo, leiam.
Mas, voltando a nossa princesa moderna e nosso bobo da corte, reviravoltas à vista e... UM NOVO PERSONAGEM *-------------*
Vocês irão conhecer agora... Um rapaz... Chamado...
Vão ler pra descobrir. BJBJBJBJBJBJBJBJBJBJBJBJBJ



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#Narrado por Diana#

Outubro: domingo do vestibular.

Acordei cedo para a prova. Estava marcada para começar uma hora da tarde, mas meus preparativos necessitavam de mais tempo.

Tomei banho, escolhi uma roupa descente para usar, até porque não há lógica em trajar um vestido curto estilo “tomara que caia”, com um salto agulha para fazer uma prova com duração aproximada de mais de quatro horas.

Escolhi meu velho e bom jeans desbotado, meu all star à La “não sou lavado há meses”, uma camiseta branca com detalhes de renda na parte de cima e um casaco azul.

– Vai pentear o cabelo? – perguntou Lucas enquanto folheava uma revista de moda na sua cama.

Olhei para ele pelo espelho. Seu olhar dizia “penteie o seu cabelo, faça esse favor a humanidade”. Procurei pela escova no armário e não a encontrei. Abri a nécessaire de Lucas (sim, ele tem uma nécessaire), e lá estava ela, limpa e radiante, pronta para arrancar alguns fios do meu cabelo assim que eu a passasse por eles.

– Ajudaria se você usasse um reaparador de pontas. – sugeriu Lucas.

– Eu não tenho isso. – disse.

– Ah, Diana. Me diga que você usa condicionador pelo menos! – exclamou ele com os olhos exaltados a mim.

Fiz um silêncio incômodo e disse:

– De vez em quando.

Ele parou de me encarar e voltou a sua revista de adolescente na fase da puberdade, com dicas de maquiagem e fotos de astros de boybands.

Fui a cozinha onde a minha mãe preparava uma ceia para mim antes de irmos para o local da prova.

– eu espero que coma tudo. – disse ela servindo-me uma porção de alimentos hiper saudáveis que, provavelmente, ela viu em algum programa de culinária.

– Como se chama tudo isso? – perguntei.

– Comida. – respondeu ela.

Ignorei a graça e comecei a devorar cada uma das coisas que ela despejava na mesa, até que cheguei ao ponto de dizer “chega, não há mais lugar para nada”.

– termine de se arrumar, espero você lá fora. – disse ela pegando a bolsa e saindo.

Voltei ao quarto onde Lucas continuava na mesma posição lendo sua revista. Olhei diversas vezes para ele, mas nenhum sinal de que ele se importava com a minha presença.

– Qual é, você tá chateado com alguma coisa? – questionei de braços cruzados.

– Não.

– Tem certeza? Porque eu não confio em pessoas de respostas curtas.

Ele tirou os olhos da revista por alguns segundos e me encarou. Seus lábios contraiam, como uma criança que repudia alguma bronca dos pais.

– Já disse que não.

– Fizeram algo com você de novo? – perguntei mudando o tom de voz para algo mais compreensivo.

Lucas não respondeu, mas seu silêncio e falta de atenção me serviram como resposta. Desde sexta-feira quando ele se abriu novamente comigo e com Daniel, as coisas com ele não andavam mais nos trilhos. Ele parou com os desenhos e faltou no sábado a sua aula de corte e costura. Não era de seu feitio passar o dia deitado na cama lendo uma revista da banca de jornal, e muito menos me ignorar como ele fazia agora.

– Seja lá o que você estiver passando, saiba que pode sempre contar comigo. – disse, mesmo sabendo que aquilo não era suficiente.

Lucas fechou sua revista e sentou-se na cama para dizer:

– Não quero passar o resto da vida jogando meus problemas pra você. Não se preocupe, eu me resolvo.

Fiquei calada observando Lucas aproximar-se para me dar um beijo da testa e depois sair do quarto carregando uma toalha em mãos.

***

Cheguei em frente ao prédio onde a prova seria realizada. Minha mãe ainda estava comigo, narrando tudo o que eu deveria fazer na prova.

– Não olhe para o lado. Não converse com ninguém. Não leia as questões em voz alta ou até mesmo sussurrando. – dizia ela.

– Tudo bem mãe, eu li um livro que dizia como se comportar em um vestibular. – afirmei.

– Hum, e como se chamava esse livro?

– “Como se comportar em um vestibular”. – respondi.

Nós rimos e ela me deu um beijo antes de ir embora e me deixar ali, sozinha, esperando o portão abrir. Na verdade, eu não estava literalmente sozinha. Havia umas cinquenta pessoas que chegaram cedo. Comprei uma garrafa de água e esperei.

Quando os portões abriram segui direto para a sala e entreguei meu celular a um dos instrutores que ficou me encarando como se eu fosse um animal sarnento. Talvez fosse o cabelo que, a essa altura, não estava lá essas coisas. Eu não ligava.

Lembrei-me do conselho da minha mãe que se subentendia em “não faça nada além de respirar”. Sentei na última cadeira da primeira fila e fiquei de cabeça baixa. Consegui até cochilar, acordando minutos depois com uma garota do meu lado me cutucando. Levantei a cabeça e ela sorriu:

– Você pode me dizer que horas são? – perguntou ela.

– Ah, eu não tenho relógio aqui. – respondi com a voz de uma doente, mesmo sabendo que havia um enorme relógio na parede, logo acima do quadro.

– Poxa, acho que ninguém aqui tem. – disse ela.

Um rapaz que estava na minha frente informou as horas a ela, apontando para o relógio na parede. Ela se sentiu envergonhada por não ter percebido antes, mas eu ignorei.

Fechei os olhos e encostei minha cabeça na parede. Meus pés estavam inquietos, como o de Daniel, e batiam compulsivamente na cadeira do meu colega da frente. Parei alguns minutos depois, pois sabia o quanto aquilo era incomodo.

A instrutora e o instrutor entraram na sala. Encararam-nos por uns cinco minutos e então olharam para o relógio. Já era a hora da prova começar. Tomei um gole de água da minha garrafa e a deixei debaixo da cadeira. Quando a prova chegou a mim, o instrutor me encarou novamente.

Eles deram um sinal de que podíamos começar a prova. Preparei a caneta e comecei.

***

Saí do prédio uma hora antes de a prova terminar. Apenas cinco pessoas restaram na sala. Segui para o ponto de ônibus e esperei. Esperei muito. Quase uma hora de fome e cansaço. Cheguei em casa me jogando no sofá.

– Eu imagino sua reação no ENEM semana que vem. – comentou minha mãe. – Esse foi só uma prova e você está desse jeito.

– Foi horrível, mas me saí bem. – disse. – to com fome, muita FOME!

– Preparei algo especial pra você. Vá tomar banho.

Antes de seguir direto para o banheiro, passei no quarto para dizer “olá” para Lucas. Ele estava dormindo, ou pelo menos fingindo.

Uma ducha gelada da cabeça aos pés. Meu corpo inteiro doía, como se eu tivesse sido espancada.

Peguei uma camiseta e vesti com um short jeans personalizado por Lucas. Penteei o cabelo em homenagem a ele e esperei que ele acordasse para que jantássemos todos juntos.

Ele espreguiçou-se e abriu aqueles olhos brilhantes ao me ver.

– Olá. – disse.

– Como foi na prova?

– Bem.

– Eu estou bem Di, não me olhe desse jeito. É incômodo. – ele levantou-se.

– Ok, parei.

Ouvimos o grito da minha mãe no quarto nos chamando para jantar.

– O short? – perguntou ele apontando para as minhas pernas.

– Sim, eu disse que nunca ia usar, mas não tive opção. – disse sorrindo. – Estou brincando, ele é bonito.

– Eu sei, eu quem fiz. – ele abriu a porta do quarto e saiu rebolando como uma miss. De fato, Lucas estava evoluindo no quesito “sou gay, não me julgue”.

Minha mãe colocava os pratos em sousplats enquanto eu e Lucas nos sentávamos à mesa. Passamos o jantar inteiro conversando sobre a prova. Contei sobre as questões que mais tive problemas, e como eu estava mal em matemática.

– Estou preocupada com o ENEM. Minha nota nesse vestibular pode até ser boa, mas eu preciso ser ótima no ENEM, de verdade. Preciso melhorar em matemática. – comentei.

– Daniel é bom em matemática, não é? – perguntou Lucas.

– Ele é, mas não a nível do Enem. – disse.

Minha mãe parecia pensativa a respeito do que eu falei sobre “melhorar em matemática”.

– Tenho uma amiga, a Juliana, lembra dela? – perguntou minha mãe.

– Ah, lembro sim, aquela que é professora de matemática, certo?

– Essa mesmo. Bom, ela não tem muito tempo, mas o Rafael tem.

– Ok, quem é Rafael? – perguntei.

– O filho dela. Ele faz faculdade de engenharia e está afastado do trabalho há alguns meses por causa de problemas na saúde.

– O que ele tem? – perguntei.

– Alguma coisa no rim. – respondeu ela.

– Ele é bom em matemática? – questionei ainda em dúvida.

– É ótimo. Posso pedir para ele lhe dar uma aula essa semana, antes do Enem. Ele não vai negar dinheiro. – continuou ela.

– Mas ele deve ser muito ocupado mãe.

– Já disse que ele não está trabalhando. – ela cortava a carne e levava até a boca, me encarando como quem diz “qual o problema agora”.

– Tudo bem então. Pode “contratá-lo”.

***

Fui até a casa de Daniel na segunda-feira após a aula. Ele me recebeu com um sorriso torto, de quem está feliz por ver alguém.

– Entra. – disse ele.

Enquanto a porta se fechava atrás de mim, senti a respiração ofegante de Daniel, que me abraçou por trás. Me senti insegura e me afastei discretamente.

Fomos até o quarto onde uma grande caixa de livros nos esperava. Conversamos sobre a prova da próxima semana, que a propósito era perto de seu aniversário, e contei a ele das aulas particulares que começaria a ter a partir de hoje.

Sentei pela primeira vez na cama de Daniel. Ele ficou logo a minha frente e aquilo não pareceu incômodo para nenhum dos dois. Revisamos algumas apostilas até me dar conta de que dona Amélia não vira me cumprimentar.

– Onde está dona Amélia? – perguntei.

– Curso de costura. – respondeu ele.

– Então estamos sozinhos?

– Sim. – ele deu outro sorriso, erguendo a sobrancelha direita, com o olhar pretensioso que ele sabia usar como ninguém.

Ele me beijou, e aquilo foi intenso. Um dos melhores beijos que já tivemos. Talvez porque estivéssemos prestes a dar um “salto” na relação. Entenda isso como quiser, mas a forma como nossos lábios “dançavam” literalmente, era descomunal.

– Não posso fazer isso. – sussurrei.

– Eu não vou fazer nada que você não queira. – disse ele.

Eu estava eufórica e atordoada ao mesmo tempo. Não esperava transar agora, mas a forma como estávamos nos enrolando naquela cama me dizia o contrário.

– Daniel. – sussurrei quase que em alerta ao sentir as mãos dele passarem por mim, tentando tirar a minha blusa. Eu o parei e ele me encarou.

– Ok, estou exagerando. – ele saiu de cima de mim “conformado”. Foi o que eu entendi de sua expressão, mas isso é quase inaceitável quando se trata de um garoto de dezessete anos com os hormônios a flor da pele.

Me recompus de um jeito a parecer que nada havia acontecido, mas a cama bagunçada atrás de mim dizia outra coisa.

– Sinto muito. – disse apertando o colchão da cama e franzindo a testa em sinal de reprovação contra mim mesma.

– Tá tudo bem. – afirmou ele querendo ser gentil comigo, mas eu não queria gentileza alguma.

– Você é virgem Daniel? – perguntei sem acreditar nas palavras que saíram da minha boca feito um trovão.

Ele riu e negou com a cabeça.

– Não. – respondeu novamente.

Eu deveria ter entrado em estado de choque, mas não foi o que aconteceu. Daniel não tinha e nunca teve pose de santo, isso é verdade.

– Quando você “perdeu”?

– Ano passado.

– Com quem?

– Qual é, CSI: Investigação criminal?

Nós rimos, mas eu mudei a expressão para algo sério novamente.

– Vai, responde.

– Foi uma amiga do Renan. Foi por diversão, só isso.

– Usou uma garota por diversão? – questionei intrigada e decepcionada.

– Ela não valia nada.

Silêncio. Meu olhar entregou a ele seu erro: ele havia falado algo de uma garota que não se diz para outra garota, principalmente quando se quer transar com aquela garota.

– Tem certeza de que ela não valia nada? Porque é você quem está dizendo que ficou com ela por “diversão”.

Daniel levantou-se e continuou em silêncio esperando que minha decepção aflorasse mais.

– Fale alguma coisa! – exclamei com raiva.

– Não consigo entender. Eu acabei de falar que a garota não vale nada e você fica com raiva. Isso aconteceu há um ano, quando eu nem ao menos sabia da sua existência. Quando eu era um cara que não me importava com nada! Diana, pare de complicar as coisas, isso acaba sendo irritante demais! – exclamou ele gesticulando com as mãos, como se me repreende-se.

– Não estou complicando as coisas, mas como espera que eu me entregue literalmente a você quando você me diz que transou com uma garota por diversão? Sabe o quanto isso soa grotescos? Eu esperava muita coisa de você, menos isso! – eu levantei da cama e saí de seu quarto.

Minhas pernas tremiam, eu procurava as chaves da casa dele no guincho próximo a entrada. Ele foi atrás de mim e me parou.

– Isso ficou no passado. Passado não volta.

– Passado não se apaga também.

– Está me culpando por algo que não tem importância nenhuma. – continuou ele.

– Você não sabe sobre isso... Pra mim tem importância. – repliquei tentando me soltar das mãos dele.

– Está chateada comigo? Por isso?

– Não estou chateada. Estou decepcionada. Agora me solta! – exclamei.

– O que há Diana? O que foi que eu fiz de errado, me diz?!

Eu não respondi. Encarei o chão.

– O que você tem é medo, não é? De eu fazer a mesma coisa com você. Te “usar” por diversão. Mas não foi por diversão que fiz as coisas que fiz por você. Não foi pra te levar pra cama. Não foi, não é e nunca será por isso. Se você interpretou dessa forma, eu sinto muito. – continuou ele.

– É, eu tenho medo Daniel. Tenho medo de você contar pra sua próxima namorada que me usou por diversão. – afirmei.

– Eu não quero uma próxima namorada.

Fiquei em silêncio, percebendo o quão patética eu era.

– Eu exagerei? – perguntei meio sem jeito.

– Sim.

Meu olhar implorava por desculpas. Ele me soltou e eu disse que seria melhor ir embora já que tinha estragado tudo.

***

Cheguei em casa com um grande “sou estúpida” estampado na cara. Lucas assistia “Diário de uma paixão”, e havia lágrimas em seus olhos.

– eu odeio filmes assim! – exclamou ele enxugando os olhos com a manga da camisa.

Olhei para ele e revirei os olhos.

Peguei um copo d’água da geladeira e tomei esperando me afogar e morrer.

– Filha! Pensei que fosse não fosse chegar a tempo para sua aula de reforço. – disse ela. – Rafael acabou de ligar e está perto daqui.

– Desmarque, estou sem cabeça para estudar.

– Mais nem a pau! – exclamou ela dando de ombros a meu pedido.

Tomei banho e meu cérebro trabalhava para pensar no ocorrido há algumas horas. Dizia para mim mesma: - pare de pensar nisso.

Abri o guarda-roupa e puxei uma velha camisa larga, com a estampa da bandeira da Inglaterra na frente. Puxei outro short personalizado por Lucas e o vesti. A camisa era tão grande que cobriu parte do short. Calcei os chinelos e sai pela casa enxugando os cabelos até sentar ao lado de Lucas. Sem olhar para mim, ele questionou:

– O que houve?

– Nada. – respondi.

– Não confio em gente de respostas curtas.

– Problema seu.

– Te ferra então.

– Ok.

– Ok.

Silêncio. E então a campainha toca. Levanto-me para abrir imaginando que fosse o “professor” que era filho de uma professora, que iria me dar aulas em troca de cento e cinquenta reais.

Abri a porta e meus olhos pararam nos de um rapaz por volta dos dezenove anos de idade. Atlético demais para se dizer que era adulto. Bonito demais para se dizer que era solteiro. Sorri.

– Olá. – disse ele. Sua voz era grossa. Sinal de que a puberdade havia sido justa com ele. – Diana?

– É. – Respondi. – Rafael?

– Isso mesmo. Prazer em conhecê-la. – ele me esticou a mão para cumprimentá-lo. Seu aperto de mãos foi forte. – Posso entrar?

– Pode. – disse.

Ele desviou-se de mim e entrou. Olhou para Lucas na sala e ficou parado esperando que eu falasse alguma coisa. Olhei para Lucas que olhava para ele que olhava para mim. Constrangedor demais.

– Olá! – exclamou Lucas.

– Oi. Cadê sua mãe? – perguntou Rafael a mim.

– deve estar no quarto. Vou chamá-la. Fica a vontade. – disse.

Bati na porta do quarto da minha mãe e ela me mandou entrar. Ela fazia as unhas dos pés na cama e franziu a testa ao ver minha expressão frenética.

– Ok. Por quê diabos a senhora não me disse que o tal do Rafael era um... – diminui o tom de voz e sussurrei. – gato?!

Ela riu e então levantou-se.

– Pelo visto ele chegou.

– Mãe! Eu não posso ter aulas com ele, de jeito nenhum. Eu não vou aprender nada. Você já reparou nos olhos dele? São castanhos claros. Castanhos. Claros. - continuei.

– Pensei que Daniel fosse “o cara”. – disse minha mãe.

– E ele é, mas estamos dispostos a conhecer pessoas interessantes todos os dias. Mesmo assim, é o Daniel quem eu amo. Mas que merda mãe! Porque tem um cara gato na nossa sala? Se livre dele agora!

– Mais nem a pau! – exclamou ela abrindo a porta e seguindo pra cozinha.

Eu ouvia de dentro do quarto os dois se cumprimentarem: “nossa, como você está bonito Rafael!”, “obrigado”, “e a faculdade?”, “está indo bem!”...

“Ok, foi apenas uma crush, nada demais... Às vezes nos sentimos atraídas por outras pessoas, isso é normal, certo? Mas em escala de 0 à 10, ele é só um pouco melhor que Daniel no aspecto físico. Tipo, ele é 10 e Daniel é 8. Mas quanto a sua personalidade? Ele deve ser um mala. Por isso, Daniel é o cara! Eu estou me desesperando a toa”, pensei.

Abri a porta devagar. Ele sorriu timidamente.

–Vocês podem estudar no quarto. Acho melhor. A Diana tem uma mesa de estudos lá. – sugeriu minha mãe.

Ele assentiu e me seguiu até o quarto. Puxei uma cadeira para ele (sim, eu puxei uma cadeira para um rapaz). Ele sentou-se e colocou a mochila sobre a mesa. Respirou fundo e ficou me encarando até eu conseguir me sentar também.

– Então... – disse. – Eu não sei muito de matemática, mas não se preocupe em ir devagar comigo. – merda, aquilo soou errado.

Ele riu.

– Você parece desconfortável. – comentou ele.

Eu estou, está tão na cara assim? Pessoas bonitas demais me incomodam.

– Não, eu estou bem. – disse.

– Bom, vou trabalhar com você desde álgebra até algumas funções geométricas, cálculos de coordenadas, te ensinar a trabalhar com gráficos... – dizia ele folheando um grande livro de capa grossa onde estava escrito “matemática do milênio”.

– Ah, ta bom. – afirmei.

– Vamos começar?

***

– Uma pessoa deitada ao nível do solo, observa o alto de uma torre sob um ângulo de 30˚. Ao se deslocar 50 metros em direção à torre, passa a observá-la sob um angulo de 60˚, conforme a figura... – dizia ele. – Pode resolver, como eu te ensinei.

Analisei a questão e consegui resolver.

– A resposta é vinte e cinco raiz de três metros? – perguntei.

– Exato! – exclamou ele com um sorriso no rosto.

– Uhu! – gritei erguendo as mãos em comemoração. Rafael riu.

– Você acaba de responder uma questão do Enem. – comentou ele. – Mas tem que treinar mais. Seu tempo foi cinco minutos. Você tem que responder em três!

– Ok, você está exagerando.

– Não, não estou. Minha pontuação no Enem foi de 870. – disse ele.

Eu temia estar boquiaberta, mas eu estava.

– Nossa, você estudou muito pra conseguir uma bolsa de engenharia. Onde você estuda?

– Na PUC. – respondeu ele com um largo sorriso no rosto. Ele só estudava em uma das melhores faculdades do Brasil. Só.

– Parabéns. – disse.

– Obrigado, DIANA. – agradeceu ele pronunciando meu nome errado propositalmente.

– Se escreve DIANA, mas se pronuncia como DAIANA. – continuei. Ele me olhou rindo. – Eu sei que é idiota, mas minha mãe era fã da Princesa Diana.

– E ela criou uma princesa pelo visto. – ele observava meu quarto e os livros nas prateleiras. – Já leu todos?

– Todos perguntam isso. Nem acho tanto livro. Mas respondendo a sua pergunta: sim.

– Caramba! – ele se levantou e começou a ver os livros, tocar nos livros, folhear os livros... – Gosto de ler também. Tenho todos os livros do Dan Brown. Ele é foda!

– Sim, ele é! – afirmei indo em sua direção. – Meu favorito é “O código da Vinci”.

– O meu também. – disse ele. Nós sorrimos. – Gosto de Harry Potter também. Tenho todos.

– Ah, não me faça inveja! – exclamei.

– Eu te empresto se você quiser. Pelo que estou vendo, você tem bastante cuidado.

– Obrigada.

Ele se aproximou olhando para mim com o livro na mão, e eu juro, ele me deu a impressão de que ia me agarrar bem ali, mas ele apenas esticou o braço e colocou o livro no lugar.

– Voltando para a matemática.

***

Agradeci a Rafael pela ajuda e nos despedimos com um “até amanhã”. Ele foi embora me deixando alguns exercícios para eu resolver. Fiz alguns no mesmo dia e o resto eu deixei para o dia seguinte.

Peguei o livro do dia: “As viagens de Gulliver”, e o li até cochilar.

Lucas me balançava na cama, tentando me acordar. Assustei-me com seus sussurros dizendo “Diana, seu celular não para de tocar!”. Revirei pela cama até encontrá-lo.

– Alô? – atendi sem ver o nome e com a voz sonolenta.

– Oi, sou eu. – a voz entregou ser Daniel.

*Silêncio*

– Não devia ter ido embora. – disse ele por fim.

– Eu precisava. Aula de reforço.

– E como foi?

– Foi ótimo. O cara ensina muito bem.

– Cara?

– é! Ele é filho de uma amiga da minha mãe.

– Hum... Ele é bonito? – perguntou.

*Silêncio*

– Defina bonito... – respondi. Daniel riu. – Eu te amo seu idiota. Te amo de verdade.

– Sua chata, metida, convencida, aspirante a literatura, patética, linda, quase perfeita, minha e minha... – ele fez uma pausa e escutei seu sorriso. – Te amo também.

– Agora, me faça um favor: não tente transar comigo de novo e depois falar de outra garota.

– Mas foi você quem... – eu interrompi.

– NÃO QUERO SABER! Sou chata.

Ele riu.

– Você é mesmo. Desculpa. Não vou mais fazer isso.

– Agora, qual era o nome da garota que você usou?

*silêncio* A respiração dele ficou quase inaudível.

– Rita. – respondeu ele.

– Ok, agora está tudo bem.

– Só isso? Só saber o nome?

– Ah, você não espera que eu pergunte como rolou, não é?

*Risos*

– Vai dormir, amanhã vejo você.

– IDEM! – exclamei.

Ele desligou, mas continuei com o celular no ouvido, ouvindo o silêncio. Depois, procurei meus fones de ouvido na gaveta do criado mudo e dormi.

***

– Gostaria de falar com Diana Lins. – disse a pedagoga na porta da sala. Todos olharam para mim.

Me levantei da cadeira absolutamente sem jeito, ouvindo cochichos de todos os lados. A porta da sala se fechou e a pedagoga Andrea mandou eu acompanhá-la até sua sala. Lá, mais outros dois alunos estavam sentados. Um menino que eu sempre via na biblioteca, e outra que parecia uma gótica.

Dona Andrea sentou-se em sua poltrona reclinável e fez um gesto para que eu me sentasse também.

– Quero dar os parabéns aos três. As histórias de vocês foram as selecionadas! Amanhã vocês saberão quem é o vencedor.

Um sorriso surgiu espontaneamente no meu rosto, e minhas mãos estavam frias. Os outros dois alunos sorriam um para o outro e depois sorriram para mim.

Andrea nos entregou um pequeno informativo para nossos pais assinarem, concordando com nossa participação na final.

Por conta do evento, não haveria aula.

***

– Nossa, Diana! Parabéns! Não sabia desse seu potencial. – disse Rafael.

– Obrigada. Estou muito animada para isso.

– Eu adoraria ler esse livro antes de ele ser publicado.

– Ele não vai ser... – fiz uma pausa.

– Pense positivo. – ele sorriu e me entregou os exercícios corrigidos dizendo que eu errei cinco questões das quinze que ele passou.

***

Daniel segurava minha mão enquanto vários convidados acomodavam-se na quadra que estava arrumada para o evento de despedida dos formandos, mas serviu como ornamentação para o anuncio do vencedor.

– Teremos que refazer tudo. – comentou Catharina.

– Por quê? – perguntei.

– Os formando viram os preparativos. Acabou a graça. – respondeu ela que no fundo tinha razão.

Não teve aula, mesmo assim alguns curiosos da minha sala decidiram vir saber por que eu, Diana Lins, fora convocada para o evento.

Minha mãe e Lucas chegam logo depois e sentam-se na cadeira dos convidados “hiper especiais”. Há uma mesa decorada com cinco cadeiras onde os jurados sentarão.

– Bem vindos alunos! – exclama a diretora. Ela começa um discurso monótono que não prende a atenção de ninguém. Então ela chama os jurados e um homem muito elegante senta na segunda cadeira.

– Boa sorte, tenho certeza que você vai ganhar. – diz Daniel.

Catharina ouve e nos olha de forma estranha, como se sentisse nojo daquilo, mas depois sorri.

Então, algo inacreditável acontece: vejo Rafael entrando na quadra e acenando para mim. Daniel muda sua expressão.

– Quem é?

– Meu professor.

Rafael vem em minha direção sorrindo.

– Vim prestigiar sua vitória, afinal, depois que você ficar famosa, terei que dizer a imprensa que você foi minha aluna. – ele ri e eu também.

Daniel aperta a minha mão e depois solta.

– Ah, Daniel. Esse é Rafael. Rafael, Daniel... Meu namorado.

– É um prazer conhecê-lo. – Rafael estica o braço e Daniel ignora-o, mas ele não se importa. – Vou me sentar com o Lucas e a Dona Daniela. Vejo você depois de sua vitória.

Os jurados começam seus discursos e então chamam os autores selecionados para falarem de suas histórias. A da garota gótica é sobre uma menina que sofre bullying na escola e se suicida. Ela conta que tentou alertar os perigos do bullying. A do garoto é sobre um menino que vive na periferia e sonha em ser jogador de futebol. Então, chega a minha vez.

– Minha história é sobre uma garota que sonha em conhecer os lugares listados por seu pai antes de morrer. Ela tem apenas quinze anos, e descobre junto com um amigo os prazeres nas coisas mais simples. Ela leva consigo os sonhos do mundo, e às vezes é necessário decidir entre abrir mão de algo para agarrar outro. Resume-se com a seguinte frase: quando se põe em prova o amor e os sonhos, a realidade predomina. E assim fica de fato o que realmente acontece na vida. E claro, ela tem um amor. Todo mundo precisa de um. – disse olhando para Daniel.

Depois do meu comentário, todos nos aplaudem e então os jurados começam a fazer comentários apontando as falhas e as perfeições de nossas histórias.

– Vamos anunciar o vencedor. – disse a diretora.

Nós três demos as mãos um para o outro e fechamos os olhos esperando ouvir nossos nomes.

– Em terceiro lugar: “As Cartas de Amanda”. – era o livro da garota gótica que se chamava Elena.

Ficamos apenas eu e Guto no palco. Eu esperei que, não importasse o resultado, ganharia o melhor.

– Em primeiro lugar: “Camisa 10!”. – gritou ela. Era o livro de Guto.

Eu entendi completamente sua vitória. Não se tratava apenas de um garoto que sonhava correr atrás da bola. Era um garoto negro, sem pai, com cinco irmãos, que morava na favela, não estudou, sofria opressão de traficantes e viu seu irmão mais novo morrer em seus braços. Era uma história digna de vitória.

Entregaram a mim um lindo buquê e uma medalha de prata. Desci do palco e abracei minha mãe e Lucas que diziam estar orgulhosos.

Enquanto éramos fotografados, um dos jurados veio em minha direção.

– Diana Lins? – perguntou ele. Minha mãe, Daniel, Lucas e Rafael o encararam.

– Sim, sou eu. – respondi.

– É um prazer imensurável conhecê-la. Meu nome é Charles Wilton. Sou editor de uma escritora... Fiquei muito impressionado com o seu livro. Meu voto foi pra você, mas infelizmente você não ganhou. A história do rapaz ali é ate impressionante, mas a forma como você me fez acreditar desde o início no que iria acontecer, e de repente acontecer outra coisa... Digno de uma grande escritora.

Todos sorriram.

– Obrigada. – disse.

– Não me agradeça. Me conceda a honra de conversar com meus sócios sobre seu livro. Posso fazê-los aceitarem um contrato com você. O que acha?

As palavras perdem o sentido às vezes. As pessoas também. Eu perdi naquele momento.


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