Não Chore Esta Noite escrita por AnaMM


Capítulo 29
O Dia Que Não Podia Piorar


Notas iniciais do capítulo

Enfim postando! Passei por vários dias de muito pra fazer e pouco tempo pra atualizar, mas aqui está! Volto ao sistema de rever cenas da novela sob outra perspectiva, mesclando com novas cenas e, em breve, mudará tudo novamente. Três palavras: jantar na Marcela. Aguardem.



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– Ei, pirralha, o que você tava falando com o Dinho?

– Não te interessa! Coisa nossa. Por que, tá com ciúme? - Tatá zombou.

Desconfiada, Lia voltou a atenção para o resto da família.

Em um balanço próximo, Adriano ainda pensava no que Lia e Tatá lhe haviam dito. O que valeria mais a pena? Perder Lia e ficar com Juliana, ou perder ambas? Jamais poderia ficar com Lia, e gostava de verdade de Juliana. Não era como o que sentia perto da roqueira, mas era mais do que o que sentia por outras garotas. Ainda assim, não tinha certeza se conseguiria estar perto de Lia sem que Ju desconfiasse de algo. Sempre acabava mexendo com sua marrentinha, nem que só por birra. Pensava na loira e a proposta de escolher a it-girl parecia impensável. Ainda assim, a única forma de ter Lia era voltando com Juliana e aceitando ser apenas amigo da roqueira. Sem joguinhos, sem cantadas, sem deslizes. Poderia? E se estragasse ainda mais a amizade das duas?

Não sabia há quanto tempo estivera olhando fixamente para Lia, apenas notara ao ver a família Martins desocupar a mesa. Precisava parar, para seu próprio bem. Havia conseguido controlar seus sentimentos desde o ano anterior, por que agora parecia tão difícil? Estivera perigosamente próximo de Lia nos últimos dias, e assim continuaria como namorado de Juliana. Como poderia ignorá-la? Focou em seus antigos métodos e ensaiou um pedido de desculpas e de reconciliação para Juliana.

–x-

– Oi? - Ju chamou hesitante da porta do quarto de Lia.

– Chega aí, tô terminando de me arrumar. - Lia respondeu desanimada, amarrando os cadarços do coturno.

– Então, o Dinho me disse que você falou com ele.

– Desculpa, amiga. - Lia suspirou. - Eu queria te ajudar, mas daí ele acabou ficando uma fera comigo. - Respondeu desanimada, ainda pensando na última tentativa... Dinho parecia mais calmo, mas ainda assim desinteressado em voltar com Ju.

– A gente voltou! - Confidenciou uma animada Juliana.

– Que? - Tinha conseguido. - Mentira!

Havia recuperado sua amiga. Não pôde conter a animação, gritando e abraçando Juliana. Giraram em comemoração, ainda abraçadas. Estava livre. Estava tudo bem novamente. Nem seus cortes doíam mais. A it-girl suspirou.

– Também queria te pedir desculpas por ter desconfiado de você. - Confessou a morena.

– Fala sério, imagina. Eu acho que no seu lugar eu teria ficado bolada também. Enfim, história meio bizarra, né? - Lia respondeu sem jeito.

– Lembra do nosso pacto? - Juliana perguntou erguendo seu mindinho e rindo.

– Eu juro que a nossa amizade nunca vai acabar por causa de um garoto! - Falaram ao mesmo tempo, rindo, com seus mindinhos entrelaçados.

– Claro, ainda mais por causa de um garoto arrogante e grosso que nem o Dinho. - Lia comentou rindo.

– Ah, não, ele não é nada disso, né? - Ju protestou.

– Ai, não, nada disso, só um pouquinho grosso.

– Não! - Juliana riu.

– E um pouco arrogante. - Lia continuou, com um sorriso desafiador.

Ju balançou a cabeça e voltou a abraçar a amiga, rindo. Poder voltar a ter Lia zoando seu namorado era um alívio. Pelo menos com a entonação que Lia acabara de usar. Não parecia haver restado tensão dos últimos acontecimentos com Dinho, apenas a birra infantil dos velhos tempos.

Estava tudo resolvido. Lia suspirou, enfim tranquila. Recuperou sua amiga, enfim. Dessa vez, com a amizade totalmente reestabelecida, sem a hesitação de Juliana dos últimos dias. Sua animação em recuperar a amiga era genuína. Se não podia ter os dois, que preservasse sua amizade. Difícil seria vê-los juntos todos os dias. Voltaria a controlar seus sentimentos por Dinho, seu ciúme ao ver o casal, como se nada tivesse mudado. Como se o maldito grafiteiro jamais a tivesse trancado com o garoto que odiava amar em uma sala de robótica. Apenas a caminho do colégio se deu conta de que recuperar a amizade vinha com um preço. Um preço que levou a preocupação de volta ao rosto de Lia.

O dia, no entanto, revelou que nem tudo estava resolvido. O próprio acaso reservou a Lia e Dinho suas brincadeiras.

Ao encontrarem Adriano a caminho do colégio, Lia precisou parar. Instruiu que o casal seguisse na frente, que tinha que falar com Severino. Era cedo demais para vê-los juntos novamente, precisava ir aos poucos. Deixou que o casal se afastasse, enquanto tentava digerir o que viria a partir da reconciliação. Ju e Dinho de mãos dadas, Ju e Dinho aos beijos... Sentiu os cortes, mas não podia chamá-lo. A dor, no entanto, a impedia de prestar atenção no casal. Seguiu em direção ao colégio, aproveitando o incômodo que embaçava sua visão.

Chegou à sala. Ju e Dinho haviam sentado lado a lado e conversavam com relativa proximidade. A roqueira tentou desviar, era demais para o primeiro dia. Se pelo menos pudesse continuar suspensa até o final do ano... Ou até que Ju desistisse do pegador e se interessasse por alguém melhor. Tensa, preferiu sentar perto à parede, afastada dos dois. Orelha não deixou passar.

– Ué, Lia, não vai se sentar do lado da amiguinha hoje, não?

– Me erra, Orelha.

– Que pena que o Mathias botou essas câmeras no colégio, né? Tava doido pra te convidar pra passar um dia trancada na sala de aula comigo de noite, ia ser ótimo!

Dinho não deixou de ouvir o que o melhor amigo dizia. Desconfortável e irritado, afastou-se um pouco de Juliana, tentando não brigar com o nerd.

– Puxa, mas que programão! Que pena, né? - Lia debochou.

– Pena... - Orelha comentou com certa honestidade.

Invejava um pouco a sorte de Dinho em ter ficado trancado com a "musa do rock". Ah, se tivesse sido ele... O nerd não deixaria passar, aproveitaria cada segundo com Lia.

Adriano parecia prever o que o nerd pensava. Soubesse ou não, ficava cada vez mais tenso. Ignorou o ciúme, jamais haveria algo entre Orelha e Lia. Ignorou também a vontade de ter realmente passado a noite com Lia como o nerd maliciava, e os sentimentos desconfortáveis que brotavam da lembrança da noite na sala de robótica. De Lia em seus braços, de sua conversa aberta, honesta, de seus pontos em comum, dos olhos de Lia nos seus... Focou no que Álvaro Gabriel sugeria com o convite, que teria de fato estado daquela forma com Lia, que teria traído sua namorada.

– Vem cá, com tanto lugar bom, assim, pra vocês namorarem, por que que ele escolheu esse chão sujo? - Fatinha botou lenha na fogueira.

Podia ser apenas para causar, como costumava fazer, mas, de fato, acreditava que algo havia rolado entre o casal. Sabia que rolava muito mais entre os dois do que os outros podiam perceber. Dinho, por sua vez, apenas ficou mais incomodado pelas palavras da periguete.

– Ele deu um pulo rapidinho lá, - Orelha apontou em direção a Lia. - mas já voltou pra Ju, relaxa. - Zombou.

Era o suficiente. Adriano enfim interviu.

– Qual foi, Orelha?

– Ah, desculpa, não consegui controlar, cara, foi mal.

A situação só piorava.

– Aí, chega, né? - Dinho se irritou, erguendo-se da cadeira. - Parou com a palhaçada, tá? Já dá pra parar com essa brincadeira, que não tem mais graça nenhuma!

– Iiiih! Aí, na moral, bonitão? Quando eu crescereu quero ser que nem tu, garoto! - Pilha exclamou do fundo da sala. - O Dinho é mal, pega um, pega geral, oi!– Cantou, batendo na mesa para fazer ritmo.

Tão logo terminara o verso, Pilha foi acompanhado pelo resto da sala, que também batia nas mesas. Era demais também para Lia.

– Aí, chega! Chega! Agora sou eu que falo! - A roqueira gritou em pé em sua cadeira, calando os presentes. - Olha aqui, não tá rolando nada entre o Dinho e eu, nunca rolou, e nem nunca vai rolar, beleza?!

– Nunca rolou, não. Todo mundo viu o TV Orelha edição especial "Dinho: o pegador!". - Orelha lembrou, para a inquietação de Lia.

– Todo mundo viu, Orelha. - Dinho voltou a se levantar. - Sabe por que que todo mundo viu?

– Por que? - O nerd o encarou.

– Porque você é um babaca.

– Babaca?

– Um babaca que fica lembrando de coisa nada a ver. - Dinho completou.

– Nada a ver mesmo. - Lia confirmou de cima de sua cadeira.

Todos assistiam à cena atentamente e em silêncio.

– Ai, se arrependimento matasse. - Lia suspirou ao descer de sua cadeira.

– Eu já tava morto. - Dinho continuou.

– E eu enterrada. - Lia concluiu voltando a se sentar ao mesmo tempo que Dinho.

Fatinha, emocionada, bateu palmas para o "casal". Conhecia-os tão bem...

– Ai, que fofo, gente! Que lindo! - Soltou uma risadinha. - Mas... Quem implica, gosta. - Completou olhando diretamente para Lia. - Que que você acha, Ju?

Desafiadora, encarou Juliana, ansiosa pela reação da it-girl. Não só adorava Lia e Dinho juntos pela cena que havia visto no ano anterior. Também os apoiava pelas ilimitadas oportunidades de causar.

Desconfortável e acanhada, Juliana queria poder sumir naquele instante. Por sorte, Dinho anunciou seu namoro para a sala, ameaçando quem voltasse a brincar com o assunto. Orelha, claro, não deixou por menos e continuou. Fera e Pilha tiveram que se levantar antes que os melhores amigos iniciassem uma briga física. Lia tentou ignorá-los quando Ju tentou acalmar o namorado, beijando-o em seguida. Para sua sorte, a professora Isabela logo chegou à sala.

– Opa! Vamos parar, deixar pra namorar depois da aula... - Isabela anunciou sua presença dirigindo as palavras ao casal.

– É... Professora, desculpa, é que o Dinho não consegue, muito, não, ele tá com mania de namorar em sala de aula agora. - Orelha explicou do fundo da sala.

Cansado das acusações do amigo, Adriano se dirigu ao nerd enfurecido.

– Aí, Orelha, você tá pedindo, né, meu irmão? - Gritou.

– Gente! - Isabela exclamou horrorizada. - Que isso?

– Não entendi. - Orelha comentou inocentemente.

– Vamos deixar pra brigar depois da aula também, por favor? - A professora pediu. - Que que tá acontecendo entre vocês? Sabe o que que é bom pra acalmar? Poesia. Não tem nada melhor pra alma, pros nervos... Lia! - Isabela chamou. - Lê uma poesia pra gente, por favor.

A roqueira suspirou. Havia chegado a pensar que não fosse possível piorar sua primeira manhã de volta ao colégio Quadrante. Derrotada, seguiu em direção à professora. "Droga." pensou. Ou talvez tivesse falado.

– Oi? - A professora de literatura questionou. - Não ouvi.

– Nada. - Respondeu de forma curta.

– Tá bom. Página 27. - Indicou Isabela.

Sem saber o que a esperava, a roqueira pegou o livro. Riu ao ler o início do poema. Não podia ser verdade. Em sua cadeira, Dinho continuava inquieto.

– Professora, você tá de zoação com a minha cara, né? - Lia perguntou ainda mal acreditando.

– Zoação? - Isabela questionou confusa. - Não entendi.

– E-eu não posso ler isso, professora, geral vai cair pra cima de mim! - Hesitou.

– Ah, geral? Isso, Lia, é simplesmente Carlos Drummond de Andrade, o maior poeta brasileiro de todos os tempos. - Instruiu.

– Mas, Isabela, é que as coisas- - Como poderia explicar à professora o problema em questão? Precisava convencê-la a liberá-la da tarefa. Não podia ler, seria um desastre.

– Não tem mais nem menos, você é minha monitora! Leia! Alto! Sorrindo!

Lia bufou. Quase podia escutar cavarem sua cova em algum cemitério próximo. Infelizmente, nao tivera tempo para escrever bilhetes de despedida para Ju e para sua família. A última visão sua de sua amiga seria embalada por aquelas palavras culpadas, por aquele poema que descrevia em minúcias sua relação com Adriano. Fatinha e Orelha fariam a festa. Ju a mataria. Talvez matasse Dinho também, e o enterrasse na cova ao lado. Teria que aguentá-lo até mesmo quando morta. Ah, o triste destino de Lia Martins...

O chão é cama

O chão é cama para o amor urgente

Inevitavelmente, a sala inteira fez a associação que Lia temia. A maioria dos alunos começou a rir tão logo Lia terminara o verso. Todos menos Dinho e Ju.

– Que que foi, gente? - Isabela questionou, cada vez mais confusa. - Silêncio!

E os alunos riam cada vez mais. Fatinha não podia acreditar que até o poema causasse em relação aos dois naquele dia. Pela primeira vez, adorava estar no colégio.

– Gente, que isso?

Lia tentava enterrar a cabeça contra o quadro, sem sucesso. Queria sumir.

– Ô, meu deus, eu pensei que vocês tivessem maturidade para ouvir poesia! Diante disso, só me resta uma alternativa que é: pra cada um que interromper a Lia de novo, eu vou ter que dar um zero.

Enfim estavam todos quietos. Nada como a ameaça de um zero. Ainda desconfortável, Lia tornou a ler.

O chão é cama para o amor urgente

Amor que não espera ir para a cama

Adriano olhava repetidas vezes em direção a Orelha. Desconfortável, tentava ignorar o fato de que, apesar de não ter acontecido como todos imaginavam, o poema não estava muito distante do que acontecera na sala de robótica. Nem do que poderia acontecer se alguma vez se deixasse consumir pelos sentimentos por Lia. Não responderia por si.

Sobre o tapete ou o duro piso

A gente compõe

De corpo e corpo

A úmida trama

Ju queria fugir, queria estar surda por alguns minutos. Sabia o que todos pensavam ao escutar o poema, sabia também que não devia estar longe da verdade. Como fizera desde que começara a se interessar por Dinho, ignorou o desconforto de Lia e de Dinho. O poema não queria dizer nada. Ainda assim, o olhar do resto da sala era extremamente incômodo.

E para repousar do amor

Lia suspirou derrotada. Nem o zero os impediria.

Vamos à cama

Como esperado pela roqueira, a sala explodiu em risadas novamente. Dessa vez, com exclamações animadas, "uuuhs" e "aaahs", e a expressão confusa ainda presente no rosto de Isabela.

– Que isso? - A professora tentava entender.

Apenas os envolvidos não riam. Em especial, o garoto de cabelos encaracolados, que refletia melancolicamente. Era tudo tão fácil para Carlos Drummond de Andrade... Dinho o invejava mais a cada linha. Jamais poderia compor qualquer trama com Lia, jamais seriam corpo e corpo sobre o tapete ou o duro piso e jamais iriam à cama, mesmo que para repousar. A única realidade, contudo, era repousar. Repousar do que sentia, repousar de sua batalha interna diária, repousar das brigas, da tensão. Repousar da culpa que o corroía por estar atraído pela melhor amiga de sua namorada.

Lia levou a mão ao rosto. Fatinha, que chorara de tanto gargalhar, tentava se recompor.

– Qual é a graça? Um poema tão bonito! Né, Lia? - Protestou a professora.

– É. - A voz de Lia mal saiu, inaudível e chorosa. Por que voltara à escola?


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Notas finais do capítulo

http://globotv.globo.com/rede-globo/malhacao-2012/t/cenas/v/orelha-implica-com-dinho/2138034/
http://globotv.globo.com/rede-globo/malhacao-2012/t/cenas/v/lia-fica-constrangida-ao-ler-poema-em-sala-de-aula/2138050/
Agradeço os comentários e as favoritações e aguardo os novos comentários, espero que tenham gostado :) bjssss