Accidentally escrita por Firefly Anne


Capítulo 4
Capítulo 3




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CAPÍTULO 3

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Na manhã seguinte, um sábado, Caleb bateu à porta de Melanie exatamente às dez e cinquenta da manhã. A pequena Luna, já desperta há algumas horas, assistia online no computador o episódio anterior de sua série favorita, Once Upon a Time. Assim que ouviu as batidas, ela pensou em acordar a irmã, alegando a chegada de alguém. Entretanto, Melanie parecia tão serena em seu sono que Luna ficou acanhada em acordá-la. Poderia levar em suas mãos o taco de beisebol que o pai a ensinou, há muitos anos, a usar caso algum estranho viesse lhe perturbar. No entanto, não fora preciso se munir com nenhuma arma, pois ao observar no olho mágico vira tão somente o amigo de Melanie; Caleb.

— Oi, Cale! — gritou Luna, animada com a chegada do rapaz.

Já estava acostumada à presença constante dele ali, até mesmo sugerira uma vez à irmã que ele deveria ser o seu namorado. Tão boa pessoa ele era. Mas Melanie afirmou veemente que “nós somos apenas amigos, Luna”. E Luna rebatera com um “quando crescer, eu quero que o meu namorado seja como o Cale”.

— Oi, Luna — respondeu Caleb, com o caderno em mãos. — A sua irmã está por aqui?

— Melanie está dormindo como uma pedra! — respondeu, indicando a porta do quarto dela. — Melly chegou bem tarde ontem.

— Então talvez seja bom eu voltar mais tarde.

— Ou você pode ficar e assistir Once Upon a Time comigo!

— Eu realmente acho que é bom eu voltar depois, Luna.

— Por favor, Cale! Eu prometo que você vai gostar da série. Não seja como a Melanie.

— Ela não gosta?

— Ela só assistiu aos dois primeiros episódios da primeira temporada.

Luna fez um biquinho com os lábios, amolecendo o coração de Caleb.

— Você conseguiu me convencer — disse. — Onde está passando?

— No meu computador! Vem.

Luna o arrastou até o velho e encardido sofá da sala, buscando em seu quarto o notebook que ganhara de presente no seu aniversário de nove anos, três meses atrás, de Lucia.

— Cale, você quer assistir ao primeiro episódio?

— Hum, não sei, o que você acha?

— Se você começar do primeiro, vai entender tudinho.

— Você já assistiu quantos?

— Já estou em Lady of the Lake, terceiro episódio da segunda temporada.

— Mas você já assistiu Lady of the Lake?

— Ainda não — respondeu a menina, procurando nos arquivos da pasta download o episódio que acabara de baixar.

— Tudo bem. Vamos assistir esse então!

Durante metade do episódio, Luna estava explicando a Caleb por que aquelas coisas estavam acontecendo, quem eram os personagens e outras coisas. Além de gargalhar ao saber que o nome da cidade fictícia onde os personagens do conto de fadas estavam — por causa da maldição na Rainha Má — se chamava Storybrooke. Nos cinco minutos que faltavam para acabar, Melanie acordou assustada, com a presença de Caleb em sua sala, assistindo algo no notebook da irmã.

— O que vocês estão fazendo? — perguntou Melanie, coçando os olhos. — E o que você está fazendo aqui tão cedo, Caleb?

— Você disse que estava tudo bem de eu vir aqui para você me tirar algumas dúvidas. Esqueceu?

— Sim, eu disse — resmungou, caminhando até a cozinha para buscar a garrafa de água. — Mas não precisava ser tão cedo.

— São onze e meia, Melanie — retrucou Caleb.

— Hum, ok, você venceu. — Derramou a água mineral no copo de vidro. — Você já tomou café, Luna?

— Já sim — respondeu a menina. — Achei um iogurte perdido na geladeira e comi com salgadinho.

— E por que você não comeu seu cereal com leite?

— Ah, Mel, deixa de ser chata, eu tinha que aproveitar que você tava dormindo pra comer besteirinhas!

— Vou tomar um banho. Quando eu voltar esteja com os livros abertos, Caleb. E vá escovar os dentes, Luna.

— Sim, senhora! — disse Caleb, batendo continência e em posição de sentido.

Caleb sempre fora péssimo no ensino médio, quando o assunto era economia. E lá estava ele, fazendo um curso extracurricular da matéria para obter créditos.

— Eu não sabia que você trabalhada no Roxy, Melanie. Por que você nunca me contou?

Melanie bebeu as últimas gotas do suco de laranja, antes de responder.

— Bem, você nunca me perguntou.

— Nós somos amigos, esqueceu?

— Não, mas amigos também têm segredos.

— Como você faz? — indagou, com o cenho franzido. — Digo, a universidade, seu trabalho e Luna?

— Você está sendo muito curioso, Caleb — resmungou. — Você aprendeu o suficiente. Termine os exercícios e já está liberado.

— Estou sendo expulso? — fingiu ofensa.

— Definitivamente você está sendo expulso!

•••

No domingo o Roxy Striptease Bar estava mais lotado que no sábado. Tudo isso porque Alicia faria uma apresentação completa, não apenas um pequeno show. Era apenas aos domingos que a mulata ficaria completamente nua em meio a vários homens excitados. A iluminação naquela noite também estava precária e, por isso, ninguém atenderia no salão. Os clientes viriam ao balcão buscar as suas bebidas. Melanie aproveitava que não havia nenhum cliente no balcão para observar mais atentamente ao malabarismo de Kitty, a bartender.

Por estar no balcão, o assédio por parte dos homens havia diminuído. Não havia muitas mulheres; a maior parte dos clientes pertencia ao sexo masculino, com idades entre vinte e cinco e quarenta cinco anos. Poucas mulheres frequentavam o Roxy aos domingos.

Maxton Clarke, claro, estava lá, juntamente com os outros dois garotos. Por ter conversado com Caleb na manhã do dia anterior, já sabia que o rapaz iria abdicar da distração noturna, pois precisaria estudar para um teste que seria aplicado na segunda-feira.

— É tão injusto, Mel — disse Nilley, aproximando-se dela.

— O que é injusto, Nilley? — perguntou Kitty, interessada no assunto, após concluir o seu espetáculo.

— A gente estar aqui, vendo essas mulheres tudo artificiais tirarem a roupa e não ter nenhum show masculino para alegrar e divertir a nossa noite.

Kitty riu.

— Você deveria dar essa sugestão ao Carson.

— Aquele ali só come na mão da Nina. Há boatos de que ele estão trepando.

— Nilley! — Melanie a repreendeu, preocupada que Nina estivesse em algum lugar, espionando a conversa das três.

— E por acaso eu estou falando alguma mentira? — resmungou.

— Não sei. Mas e se a Nina pega você falando dela assim? Ela pode te demitir, sabia?

— Sei, sei, sei — gesticulou com as mãos. — Mas não estou falando nenhuma mentira!

— Ótimo. Mas acho que devemos voltar ao nosso trabalho — argumentou Kitty.

Nilley bufou enquanto voltava para a adega, onde estava organizando as bebidas. Melanie, do balcão, arriscou um olhar para a mesa onde Maxton e os amigos estavam. Eles pareciam estar no meio de uma conversa muito interessante.

E foi naquele momento que os olhares de Maxton e Melanie se cruzaram. Ela não desviou; tampouco ele.

— Está sonhando acordada, Melanie? — perguntou Kitty estalando o dedo em frente aos olhos da garçonete para tentar despertar a colega de trabalho daquele transe.

— Você está imaginando coisas, Kitty.

— Assim como você babando aquele cara com o olhar? — ergueu as sobrancelhas, desafiando-a a negar. — Se bem que ele é bonitão mesmo... E eu não sabia da sua preferência por caras tatuados.

— Eu não prefiro...

— Oh, não? — zombou. — Então talvez seja o fato de ele ser um marombeiro?

— Kitty! — exclamou Melanie, constrangida. — Ao contrário do que você pensa, eu não acho Maxton nem um pouco interessante!

— Continue mentindo, Melanie. — Kitty bateu em seu ombro. — Sua sorte é que não estamos em um conto de fadas, caso contrário, seu personagem seria o Pinóquio.

A apresentação de Alicia começou minutos depois. Todos os homens — até mesmo Maxton — estavam com os olhos grudados e, talvez, de boca aberta, apreciando ao show de striptease da latina. Melanie não seria hipócrita ao dizer que a mulata não era bonita; era sim. E sabia como deixar os homens maluco por tocar em seu copo. O que apenas acontecia àqueles que estavam dispostos a pagar quase mil dólares por um show particular. A presença do pole dance do palco apenas contribuía para a sensualidade a partir do momento em que a dançarina esfregava as suas partes íntimas contra a barra de ferro, aguçando ainda mais a curiosidade das pessoas ali presentes. Carson, sentado a uma mesa ao fundo, com seu largo sorriso em direção ao palco das dançarinas, estava mais que satisfeito com o lucro que receberia.

Certa vez ele até mesmo estendera um convite a Melanie, para ela ser a sua dançarina. Lembrava-se bem das palavras do chefe.

— Você é bonita, Melanie. E tem um corpo, hum — ele parou sugestivamente, enquanto a observava de cima a baixo. — Pense bem, amor. Você receberia o dobro, o triplo ou o quádruplo do que eu te pago para servir essas bebidas.

— Obrigada pela oferta, Carson, mas eu estou muito bem trabalhando de servir bebidas.

— Prometa que vai pensar — ele acariciou seu queixo com os dedos. — Olhe para Alicia, você pode ser muito melhor do que ela.

— Já disse que estou satisfeita com o meu emprego.

Ela tentou novamente escapar.

— Mas prometa que vai pensar, Melanie.

Apenas porque queria fugir, ela respondeu.

— Está bem. Eu vou pensar.

Aquela conversa ocorrera há três meses e desde então Carson nunca mais tocara no assunto. Melanie estava tão distraída com os seus pensamentos, que não percebera a aproximação de certo garoto cercado por tatuagens.

— Um centavo por seus pensamentos.

Melanie pulou, assustada, com a chegada repentina de Maxton.

— Você me assustou.

— E é culpa minha se você anda tão distraída? — retrucou.

— Não. Não é. O que você quer?

— Hum, a resposta perfeita para a sua pergunta seria “você”, mas como eu sei que você é uma criatura muito arisca, neste momento eu quero uma dose de uísque.

— Só um minuto.

— Ei, Melanie, espere. Não precisa buscar agora — ele a interrompeu. O uísque era apenas uma desculpa para conversar com ela.

Maxton sentou-se em um dos bancos no balcão para que assim pudesse conversar mais à vontade com Melanie, embora o volume alto da música quase o tenha impelido a sugerir que fossem a lugar mais calmo.

— Fique mais um pouco — pediu. Melanie iria recusar, mas desistiu ao avistar o Bêbado Número Dois de sexta-feira, sentado a uma mesa próxima ao balcão. Era apenas Maxton se afastar para ele se aproximar. E ter aquele cara nojento era o que ela não gostaria. Por isso, virou-se para o rapaz e disse:

— Está bem. O que você sugere?

— Que a gente converse um pouco.

— Nós não somos amigos, Maxton.

— E não é assim que se começa uma amizade? Você já sabe o meu nome.

— E você também sabe o meu.

— Então algo sobre você que eu não saiba?

Não passou despercebido aos olhos de Melanie que ele estava curvado no balcão, muito próximo a ela. E, também, os dedos longos que acariciavam a sua mão.

— Que eu odeio trabalhar aqui.

— E por que não sai?

— Acha que é fácil encontrar um emprego? As coisas não estão fáceis, Maxton.

Melanie era uma mulher muito bonita, pensou Maxton enquanto a observava de mais perto. Os cabelos dela, castanhos tão escuros que chegavam a brilhar, combinando com os olhos esverdeados e a pele clara. Os lábios rosados e cheios que ele estava doido para experimentar, assim como passar com suas mãos pelo corpo perfeito dela; por todas as curvas que estavam o deixando louco.

Por que ela tinha que ser tão arisca? Seria mais fácil se ela fosse como as outras garotas, que se jogavam em cima dele. No entanto, sabia que era a dificuldade em conseguir Melanie que deixava a brincadeira mais interessante. Afinal, qual a graça em um jogo que se ganha fácil?

Entretanto, talvez por conta do álcool, Maxton não conseguira controlar os seus instintos. Ele precisava beijar Melanie. Naquele momento. E, ao curvar-se mais ao balcão, segurou-a pela nuca e puxou-a de encontro a si para juntar seus lábios aos dela.

— Me larga, Maxton!

Ela o empurrou para longe que, bêbado, cambaleou.

— Vem aqui, Abelhinha.

— Você está bêbado, Maxton? Que pergunta idiota, mas é claro que está!

— O que tem de mais em você me dar um beijo? A porra de um beijinho?

— Eu. Não. Quero — pontuou.

— Então vai ser assim? — resmungou ele, com os olhos que, se pudessem, estariam lançando chamas em direção à estudante de enfermagem.

— Provavelmente — respondeu, afastando-se ainda mais dele.

— Ok!

E rapidamente ele estava longe. A mesa em que ele estivera sentado com os amigos estava vazia. Inspecionou a boate com os olhos à procura da silhueta tatuada e musculosa daquele homem que, pela segunda vez, estivera tão perto de beijá-la. Quando Maxton entrou novamente em seu campo de visão, a cena a seguir a deixou tanto chocada quanto enojada. Havia próximo ao palco onde as strippers dançavam uma área protegida por uma grade de um metro e meio onde havia sofás em que os clientes pagavam para ter um show particular. Ao contrário de quando elas estavam no palco, ali eles podiam tocar o corpo das meninas.

Melanie sentiu algo em seu estômago embrulhar com a visão de Maxton sentado no sofá tal como um rei com Alicia sentada em suas pernas enquanto as grandes mãos dele passeavam livremente pelo corpo dela. Ela correu em direção ao banheiro para vomitar o que comera no almoço. Assim que acionou a descarga, ouviu passos.

— Melanie? — Reconheceu a voz de Nilley. — Eu sei que você está aqui. Não adianta se esconder... eu vou te achar!

Uma por uma as portas foram escancaradas enquanto Nilley procurava por Melanie; assistira a todo o espetáculo. Desde o quase beijo entre aqueles dois complicados até o garoto inconsequente e bêbado estar tocando o corpo de uma stripper enquanto seus olhos estavam grudados em Melanie. Era como se inconscientemente ele estivesse enviando um recado, do tipo: “você não quer, tem quem queira!”. Era uma infantilidade dos dois, sabia, mas o que podia fazer quando a amiga era tão cabeça dura?

— Vamos lá, Melanie, deixe de agir com infantilidade e vamos conversar como adultas.

Esperou por uma resposta, mas houve apenas o silêncio. Ela desacreditava de uma paixão, afinal eles se conheciam há tão pouco tempo, mas era a inegável a atração que havia entre os dois.

— Ótimo. Eu costumo conversar olhando nos olhos da pessoa, mas você não está facilitando. Tudo bem, vamos conversar com esta porta entre nós duas — parou para tomar fôlego, apoiando uma mão contra a porta. — Por que está chorando pelo Max?

— Não estou chorando, Nilley, deixe de ser besta.

— E o que faz aqui, trancada, sozinha e chorando?

— Em primeiro lugar, não estou chorando. — E não era mentira. Sentia-se apenas arrependida de ser tão burra.

— Ok. Eu confio em você. Pode me responder uma coisa?

— O que é?

— Tem muito tempo que você tomou as bolinhas?

— Umas vinte horas, eu não lembro. Por quê?

— Mel, eu não acho que você deva continuar a se drogar. Você sempre fica assim, toda deprimida quando a droga começa a perder efeito. Pare.

Sentindo-se mais segura de suas emoções, ela abriu a porta do cubículo do banheiro.

— Eu não posso. Luna precisa de mim. Eu preciso de dinheiro para que ela possa estudar e comer... Ontem à noite ela me perguntou por que eu nunca a levei a um McDonalds antes. E eu me sinto culpada de dedicar tão pouco tempo à minha irmã.

— Só... — Nilley suspirou, sem palavras. — Você sabe a razão de eu ter sido internada, não sabe? Eu não quero o mesmo para você, Mel, tente maneirar a dosagem da droga. E, por favor, tome os antidepressivos quando estiver na fossa.

— Eu não... Eu uso apenas aos finais de semana.

— Tem certeza?

Culpada, não respondeu.

— Lembre-se de sua irmã de nove anos que precisa de você, Mel, e não de uma viciada em droga.

Uma das razões de Melanie gostar tanto de Nilley era por considerá-la como a sua mãe. Uma mãe que a deixou há dois anos. Então era como estar abraçada à Sylvie quando a amiga a apertou em seus braços. O momento havia sido atrapalhado pela chegada repentina de Nina, exigindo que ambas voltassem a exercer as suas funções e não a estar discutindo assuntos não admissíveis no ambiente de trabalho.

Naquela noite enquanto pegava mais uma carona com Nilley, em seu carro popular, elas fizeram uma parada em um McDonalds que funcionava vinte e quatro horas. Estava com um sorriso no rosto em poder realizar um pequeno sonho da irmã, que a recebera alegremente quando lhe mostrara o lanche que havia levado aquela noite. Mesmo sendo quase três horas da manhã, Luna não se importou em comer o sanduíche tampouco as batatas.

— Obrigada, Melly. — Luna a abraçou. — Você é a melhor “irmãe” do mundo.

— “Irmãe”? — inquiriu confusa com o uso da palavra peculiar.

— Uma mistura de irmã e mãe. Obrigada.

•••

Às cinco horas da manhã em ponto daquela segunda-feira, Melanie já estava acordada e disposta a acordar Luna para levá-la para a escolinha onde ficaria até às cinco e meia da tarde. A tarefa de acordar a irmã não era muito fácil, o sono da pequena Luna era pesado.

— Luna? Luna, já está na hora de acordar, amorzinho — chamou Melanie, próxima à orelha da criança.

Luna se remexeu, as pálpebras dela tremularam um pouco; estava acordando. Não demorou muito até que abrisse os olhos por completo.

— Melly — disse a garota, espreguiçando-se.

— Ei, princesinha! Você já está quase atrasada.

Luna hesitou por alguns minutos na cama, mas não tardou a obedecer à irmã. Aos nove anos, ela era quase uma pequena-adulta. Tomava o banho e escovava os dentes sem a ajuda de um adulto, além de vestir-se. Enquanto a menina estava no chuveiro, Melanie dirigiu-se à cozinha para preparar o cereal com leite da irmã. Ao abrir o armário percebeu a falta de vários alimentos, sabendo a explicação para o sumiço, ela se dirigiu até um quartinho aos fundos, e lá estava ele. Santiago Dorchester, mais conhecido como o bêbado.

O pai de Luna e Melanie estava jogado, sem camisa, no centro da cama, roncando. Uma garrafa de bebida estava aos pés da cama, assim como a embalagem de salgadinhos. Fechou a porta em silêncio, e voltou para a cozinha. Luna estava com uma toalha e as gotas de água formavam uma poça no local em que ela estava parada.

— Luna! — advertiu Melanie. — Quantas vezes eu já lhe disse para se enxugar no banheiro?

— Acabou o condicionador, Melly. — Ela se explicou.

— E por que não me chamou?

— Eu chamei, mas você não ouvia.

— Desculpe, Luna. O papai está em casa.

— Ele tá em casa? — Os olhinhos de Luna brilharam.

— Está. Mas nem pense em ir vê-lo. Venha, vou te emprestar um pouco do meu condicionador.

Segurou a mãozinha de Luna para levá-la até o seu quarto.

— Não, Melly, o seu condicionador não tem cheiro de chocolate!

— Quando eu sair da universidade passo na farmácia e compro o seu condicionador com cheiro de chocolate, ok? Mas, enquanto isso, você terá que se contentar com o meu condicionador com cheiro normal!

Luna aceitou, muito a contragosto. Voltou ao banheiro para concluir o banho. Quando a mesa com o café da manhã estava pronta, Melanie discou uma rápida mensagem para Nilley.

Mensagem enviada às 5h35 AM

Preciso de você. Meus comprimidos acabaram. Saio para o almoço às 13h00.

Com a mensagem enviada, sabia que Nilley entenderia rapidamente sobre o que Melanie precisava. Fora Nilley quem a apresentara aos “comprimidos” capazes de tirar o sono e fazê-la exercer tantas atividades, como estudar pela manhã e à tarde e à noite trabalhar em uma boate até às duas horas da manhã.

Luna já estava pronta às 6h15 da manhã. Após deixar a irmã na escolinha, despediu-se da menina com um beijo na testa. O caminho até a universidade ela fez em um ônibus. As aulas naquela manhã passavam arrastadas e ela não via a hora de se encontrar com Nilley e ter em suas mãos o poderoso “comprimido mágico”.

•••

— Deixe-me ver se eu entendi... — começou Caleb. — Você levou um fora da Melanie?

Maxton cerrou os olhos para o amigo, que em resposta levantou as mãos em sinal de paz.

— Sua amiguinha é muito arredia, você sabia?

— Melanie é demais! — disse com um sorriso exuberante, apenas para provocar o amigo. — Eu ainda não acredito que ela dispensou você, cara. Você é Maxton Clarke! As garotas caem aos seus pés, levantam suas blusas e exibem seus peitos siliconados, e não chutam a sua bunda como se você fosse alguém como Caleb Walker.

— Não seja um imbecil.

Caleb mais uma vez riu.

— Como está a sua autoestima, amigo? Em frangalhos? Você precisa de um lenço para enxugar as suas lágrimas? Nunca pensei que viveria para ver o dia em que o deus Clarke perderia os créditos com as mulheres.

— Com uma mulher — corrigiu Maxton, irritado com as piadinhas do amigo. — Se você estivesse lá, teria visto o quanto Alicia parecia muito mais suscetível que a sua amiguinha.

— Alicia...? — a testa de Caleb se enrugou. — Alicia é alguém que eu conheço?

— Certamente não.

— Ok, vamos lá, estou esperando você começar a vomitar.

Os dois estavam na academia da casa dos pais de Maxton; uma mansão situada em um bairro nobre de São Francisco. Enquanto Maxton se ocupava com a musculação, Caleb apenas o observava e dava os seus palpites; ele não era muito afeiçoado a exercícios físicos e, talvez por isso, fosse tão magrelo.

— Alicia é uma stripper.

— Hum, ouvi dizer que as meninas do Roxy fazem programa, toma cuidado, cara.

Maxton rolou os olhos.

— Você está muito mole esta manhã — comentou Caleb, se afastando do balcão e caminhando até o local onde os pesos eram guardados. — Talvez eu devesse acrescentar mais dez quilos, está muito pesado para você, Max?

— Não enche o meu saco, Caleb.

— Vamos lá, deus Clarke! Você precisa de mais músculos para reconquistar o seu lugar como o garanhão de São Francisco!

— E o que você acha de eu acertar o peso bem no meio dessa sua cara?

Caleb se esquivou, temendo realmente receber o peso em sua face. Acariciou o maxilar com os dedos.

— Para que tanta violência, cara?

— Você está me atrapalhando, Caleb, porra!

— Está bem, está bem, vou ficar calado.

Os próximos quinze minutos foram regados ao mais puro silêncio. Foram interrompidos apenas quando uma das empregadas da casa surgiu na porta com uma bandeja e dois copões com vitamina. Assim que a mulher se virou para ir embora, Caleb a seguiu com os olhos, assobiando.

— A Sra. Clarke contratou outra empregada? Não conhecia essa beldade.

A mulher ainda não havia acabado de sair, de modo que ouviu o comentário de Caleb. Ela se virou e lançou um olhar fulminante para ele, que se encolheu. Maxton gargalhou.

— Jessica não é para você, cara.

— E eu disse algo, por acaso?

— Mas está pensando, eu tenho certeza.

— Você disse a mesma coisa no verão passado e, ainda assim, consegui passar duas semanas com... Como é o nome dela mesmo?

— Claire.

— Exatamente.

— O problema, meu caro amigo — começou Maxton, com ironia pingando em sua voz —, é que os gostos de Jessica são iguais aos seus. Você consegue me entender?

— Não estou... — Caleb se interrompeu, quando finalmente compreendeu. — Merda, ela é lésbica?

Exatamente.

— Ah, droga!

Por causa das portas de vidro, Caleb acompanhou a mulher atravessar o gramado seguindo em direção a casa.

— Como você e a Melanie se conheceram?

— De novo o assunto “Melanie”? Eu pensei que você já estava em outra, com a tal da stripper Alicia.

Maxton não lhe respondeu. Caleb suspirou.

— Já disse, nós tínhamos a mesma aula, economia, no ensino médio.

— E vocês eram apenas amigos?

— Posso saber por que tanto interesse?

— E você, dá para responder?

— Só amigos, Max, só amigos.

— E com isso eu posso supor que vocês nunca se apaixonaram um pelo outro.

— Deixa de ser absurdo! Melanie não é do tipo que namora. Ou se apaixona.

— A menos que ela goste de mulheres...

— Oh, não, você entendeu errado. Ela já namorou um cara, ou ainda namora, eu realmente não sei. Não sou do tipo que fico me metendo na vida sentimental dela.

Maxton não voltou a fazer nenhuma pergunta sobre Melanie ao amigo.

Continuava intrigado com a forma que Melanie o desprezou tão abertamente, ao negar o seu beijo por mais de duas vezes. Estava acostumado às garotas que o rondavam em busca de uma diversão, encontrar uma que não correspondia às suas expectativas era realmente excitante. Ainda que não gostasse de namorar, precisava de uma garota ao seu lado, nos rachas, para exibi-la aos adversários. Naquele meio, as garotas eram vulgarmente chamadas de “mascote”, e sempre era bom ter um para se gabar. E Melanie era quem ele desejava no momento; a mesma que parecia tão difícil de arrematar.

Faltando trinta minutos para as nove horas, a mãe de Maxton, Charlotte Clarke, abriu uma fresta da porta de vidro e disse aos garotos:

— Sua aula começa em vinte minutos, Maxton. Cuidado para não se atrasar. E não se esqueça da vitamina. — Ao perceber que o filho não estava sozinho, disse: — Ah, olá, Caleb. Cuidado para não se atrasar também.

•••

Melanie passou a manhã inteira, impaciente, ansiando mais do que nunca a chegada do horário do almoço. Durante toda a aula ela se conservava aos fundos da sala, totalmente alheia à explicação do professor sobre a matéria. Precisava urgentemente dos comprimidos! Assim que os alunos foram liberados para o almoço, Melanie fora a primeira a colocar a mochila sobre os ombros e escapar rapidamente da sala, em direção ao refeitório.

Nilley por ironia trabalhava na universidade, como copiadora.

Ela se sentou a uma das mesas, próximas à grade para apreciar com nostalgia o gramado do outro lado. A maioria dos estudantes preferia almoçar sentado na grama, mas ela não era uma daquelas.

— Tem muito tempo que você está aqui? — Nilley havia chegado. Tirou a bolsa dos ombros e se sentou na cadeira em frente à Melanie.

— Só uns quinze minutos.

— E enquanto isso, você não comprou nada para comer?

— Não estou com fome, Ni.

— Mel... — suspirou. — Receio que ficarei em débito com você. Eu adoeci você sabe. Não pude buscar os comprimidos. Eu sinto muito.

— E agora? — O tom de voz de Melanie subiu.

— Não se preocupe. Eu liguei para um amigo meu. Ele disse que você pode conseguir a anfetamina aqui mesmo, na sua universidade.

— Com quem? — perguntou, cautelosa.

Apenas Nilley sabia que usava anfetaminas para conseguir driblar o sono e conseguir equilibrar a rotina maluca que era a sua vida. Sem o estímulo da droga, não suportaria tanta responsabilidade.

— Você não deve conhecer — murmurou Nilley. Ela começou a abrir a bolsa, retirando um pedaço de papel amassado e o estendeu a Melanie. — O nome dele é um pouco estranho. Aqui.

Melanie pegou a folha de caderno, hesitante, em seguida lendo o nome escrito ali. O grito preso na garganta quase escapou ao ler:

Maxton Clarke.

— Maxton Clarke vende droga na universidade?

— Se ele vende, eu não sei. Talvez não. O meu contato disse que você poderia pedir a ele alguns comprimidos.

— Maxton usa drogas?

— Melanie, não seja cínica, você também usa. E, afinal, você conhece o cara?

— Ele foi ao bar ontem. Perguntou por você.

— Quem perguntou por mim?

— Maxton Clarke.

— Eu não conheço nenhum cliente chamado Maxton Clarke. Você está bem, Melanie?

— Estou ótima, Nilley. Tem certeza de que não o conhece? Tatuado, alargador na orelha, olhos e cabelo preto...

Nilley inclinou a cabeça para o lado, tentando associar a descrição a algum cliente.

— O Max tem essas características, mas...

— É ele! — Melanie a interrompeu.

— Ah, Mel, como você espera que eu associe um apelido ao nome verdadeiro? E Max poderia ser o diminutivo de tantos nomes... Agora eu preciso realmente ir. Diga “oi” ao Max.

Nilley a beijou na bochecha, deixando Melanie ali, sozinha.

Não estava com fome, então bebeu apenas uma vitamina de frutas.

Estava se preparando para voltar, até que um homem cheio de tatuagens, vestido em uma camiseta preta, que deixava seus bíceps à mostra e jeans interceptou o seu caminho.

— Quem bela coincidência! — disse Maxton, com falsa surpresa. — O que você está fazendo aqui, Mel?

— Talvez o mesmo que você — respondeu mordaz, procurando se afastar. Ainda não havia esquecido a cena dele tocando o corpo de Alicia.

— Hum... que interessante. Eu vim cobrar a sua dívida.

— Não tenho nenhuma dívida com você, Maxton. Agora, se me dá licença, eu preciso passar — respondeu, tentando ultrapassá-lo. No entanto, ele era muito maior e mais forte do que ela, impedindo-a de escapar.

— Não tão rápido, Abelhinha.

— Me larga, Maxton.

— Já disse que pode me chamar de Max. Eu gosto de ver a sua boquinha ao dizer “Max”, é excitante, sabia?

— Seu nome é Maxton. Agora me largue ou eu vou gritar!

Ele a soltou imediatamente.

— Deixa de ser tão arredia, Abelhinha. Talvez nós devêssemos ser amigos.

— Não dá pra existir uma amizade quando uma das partes quer, a todo o momento, arrancar as roupas do outro.

— E, de acordo com a sua teoria, eu sou aquele que arrancaria as suas roupas ou que teria as roupas arrancadas?

— O primeiro caso, Maxton.

— Então você não quer arrancar as minhas roupas? — alisou o peito, fazendo com que o olhar de Melanie baixasse até as mãos dele.

— Não, eu não quero — respondeu convicta. Ou quase. — Na verdade, eu quero uma coisa.

— E o que seria?

— Uma amiga minha me disse que você tem algo que eu quero muito. Eu posso comprar.

— E o que seria? — repetiu.

Melanie olhou ao redor deles para ver se havia alguém ouvindo a conversa, ao constatar que havia apenas eles dois, ela disse.

— Bolinhas.

Maxton ficou em silêncio.

— Você quer bolinhas? — ele cruzou os braços, destacando ainda mais os bíceps.

— Não só quero como preciso.

— E quem lhe disse que eu tenho?

— Nilley. Nilley disse que eu podia conseguir os comprimidos com você.

— Você se droga, Melanie?

— Não sou nenhuma viciada, se essa é a sua preocupação. Os comprimidos me ajudam a ficar sem sono. Eu tenho uma irmã de nove anos que estuda em uma escolinha em outro bairro. Estudo em tempo integral na universidade. À noite eu trabalho no Roxy, você viu a hora que eu saio? Sim, às duas e meia da manhã. Chego em casa às três, estudo até às quatro e meia e preciso estar acordada às cinco.

— Só é você e a sua irmã?

— Eu tenho um pai, mas ele é um bêbado e imprestável, então não conta. Eu sou quem o sustenta.

— Venha comigo. — Maxton a puxou pelo braço. Melanie hesitou. — Vamos para um lugar menos público. Não estamos em Berkeley ou Holanda onde fumar marijuana não é crime.

— Dá pra falar mais baixo? — repreendeu. — E não estamos indo fumar maconha!

— Tanto faz.

— Você vai me arranjar às bolinhas ou não? Tenho certeza de que sou capaz de encontrar outro fornecedor.

— E o que eu ganharia em troca?

— Nada.

Maxton suspirou.

— Ok. Vem comigo.

Maxton a levou ao antigo laboratório químico da universidade, que atualmente era um local abandonado. Sentaram-se no chão, recostados à parede enquanto ele tirava de dentro da mochila a droga.

— Bem, eu não tenho anfetamina em comprimido, apenas pó. Você já inalou alguma vez? — Melanie negou.

— Hum, não trouxe o papel. Você tem algum dólar na sua bolsa?

Melanie, ainda assustada, confirmou.

— É muito fácil, Melanie. Eu vou colocar o pó aqui, vai parecer um baseado — ele riu. — Você só precisa aspirar, ok?

Ela confirmou e ele a ensinou como era que se fazia. Assim que ele terminou, Melanie repetiu as mesmas coisas que Maxton havia feito.

Não era uma experiência agradável.


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Notas finais do capítulo

O que acharam do capítulo? Gostaram? Não gostaram? Usem a caixinha linda aí embaixo para me contar as suas impressões sobre o capítulo! :D
Perdão se eu esqueci de enviar o teaser a alguém. Minha última semana foi uma loucura! :(
Deixem o e-mail para receber o teaser do próximo capítulo;)
Ah, e obrigada a minha beta, Lis, e a sua memória fotográfica por consertar os meus errinhos ♥
Até breve!
Beijos.



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