A Rosa Que Sangra escrita por Wondernautas


Capítulo 4
Aquilo que uma rosa pode oferecer


Notas iniciais do capítulo

Finalmente um capítulo grande! Agora que a história começa pra valer, portanto espero que gostem ! Sem mais delongas e vamos para a leitura!



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Preciso esquecer... Preciso esquecer... Preciso esquecer... Preciso esquecer... Infelizmente, dizer isso para mim mesmo é fácil. O difícil é conseguir. Afinal de contas: por quê não consigo esquecer esse sentimento? O Manigold é e sempre será apenas meu amigo. E eu deveria me contentar com isso. Já é maravilhoso poder estar ao lado dele, poder ter um amigo de verdade após tantos anos de solidão. Não posso nem devo querer mais. Preciso me contentar com os laços que já criamos.

Apesar de, no meu ponto de vista, ainda estar cedo, as ruas já estão bem movimentadas. Enquanto caminho na calçada, pensativo, com o olhar para o chão e sob o agradável Sol das 10:15 da manhã, percebo que sou o centro das atenções de muitas pessoas, tanto mulheres quanto homens. Não só pelo fato de estar andando de pijama na região central da cidade, mas também pela minha beleza. Particularmente, não me importo com a imagem que os outros têm de mim. Em nada me interessa se me julgam belo ou feio, chato ou divertido, rico ou pobre, bondoso ou perverso... As aparências não remetem a mim valor algum, mas sim os meus próprios sentimentos e daqueles com quais convivo. Mesmo assim, sempre fui obrigado a viver entre pessoas que se importavam apenas o exterior. Muitos se aproximavam e ainda se aproximam de mim em razão dessa "beleza". Com o tempo, fui me fechando até me tornar, tecnicamente, antisocial. Parei de sair de casa, passei a evitar relações com aqueles ao meu redor e até mesmo a negar o afeto de quem, talvez, se importasse de verdade comigo. Como já disse para mim mesmo algumas vezes, decidi desde cedo que viver sozinho seria o melhor para o meu futuro. Sentimentos só me traziam dor, assim como a perda dos meus pais, que foi algo tão doloroso e complicado de superar.

Entretanto... há uma grande diferença entre querer e conseguir. Assim como jamais fui capaz de viver sem me envolver com alguém, nunca amei uma pessoa como ele. E nunca deixei de amá-lo. Ao ver seu corpo atraente bem diante dos meus olhos, sentir seu toque e ouvir sua voz lasciva mesmo que em uma simples brincadeira... Definitivamente, não o esqueci. Contudo, talvez seja a hora de mudar de "estratégia". Não devo me privar dos laços afetivos nem ignorar meu sentimento pelo Manigold. Devo, simplesmente, encontrar um novo amor.

A sensação de esbarrar em alguém e o perceptível som de algo caindo ao chão quebram meu "momento reflexivo". Levanto meu rosto e meu olhar, de imediato, se encontra com um encantador par de olhos azuis. Não só a cor se assemelha a dos meus próprios olhos, mas também a angustiante tristeza que carregam.

- Me desculpe, eu... - peço perdão ao voltar a realidade e perceber que o que caíra no chão foi o celular da bela loira que, por minha falta de atenção, acabei esbarrando.

- Não há problema algum. - diz ela, sorrindo.

A loira se agacha rapidamente e pega seu aparelho de volta.

- Ele já caiu tantas vezes que nada mais deve estragá-lo. - afirma, voltando a me encarar sorridente.

De certa forma, fico sem jeito diante dela. Provavelmente por ser  eu o responsável da queda do seu celular.

- Acho que nos conhecemos de algum lugar... - comento, percebendo que o rosto da loira não me é nada estranho.

Ela ri e, em um ato que realça ainda mais sua beleza, coloca o indicador esquerdo sobre os lábios. Fecha os olhos e fala:

- Eu não acho, tenho absoluta certeza.- afirma- Minha amiga Sasha está na mesma universidade que você e nos apresentou há alguns dias atrás.

- Ah, é mesmo! - me lembro da ocasião, envolvendo minha voz com uma alegria que nem mesmo eu suspeitava que tinha no momento - Yuzuriha, não é?

- Sim, acertou. - responde, reabrindo os olhos e retirando o dedo dos lábios - E você é o Albáfica, que adora passear pelas ruas de pijama.

O comentário retira de mim algumas suaves risadas, que cesso ao falar:

- Correto. Perdoe minha indelicadeza pelo que aconteceu. - digo um pouco mais sério, mas sem perder o ar de descontração - Mas acho que poderei me redimir. Claro, se você aceitar. -olho em direção a uma lanchonete do outro lado da rua.

Yuzuriha, por instinto, olha para a mesma direção. Compreendendo a "mensagem", a loira me diz:

- Todos merecem se redimir dos seus erros, se bem que o seu não foi assim tão grave.

Permito a mim mesmo rir por alguns segundos, outra vez. Em seguida, estendo meu braço direito na direção do ambiente que eu sugeri. Por ter aceitado meu convite, a amiga de Sasha toma a dianteira e caminhamos tranquilamente até o estabelecimento. Durante nosso trajeto, não trocamos nenhuma palavra. Sinto que sou guiado por algo inexplicável.  Talvez a necessidade de conhecer novas pessoas ou fazer inéditas amizades. Quem sabe ambos...

Para minha surpresa, na lanchonete não há ninguém além de três funcionários. Com o movimento lá fora, era de se esperar no mínimo alguns clientes.

- Sabe, Albáfica... - inicia ela, após entrarmos na lanchonete e nos sentarmos ao redor da primeira mesa que vemos -  ...hoje mais cedo, uma pétala rebelde foi me visitar enquanto eu apreciava o nascer do Sol. Coincidência ou destino? - pergunta, irônica e ao mesmo tempo, simpática.

- Uma pétala? - no início, não entendo o comentário e demonstro uma expressão de indiferença, mas logo consigo compreender e sorrio, entrando na brincadeira - Não me diga que minhas rosas lhe importunaram?

Escuto dela uma risada angelical, antes da mesma me responder:

- Não, longe disso. - nega, agradavelmente.

O vento assopra forte em nossa direção, jogando para o lado contrário os nossos cabelos. No mesmo segundo, a delicada mão direita da loira busca freneticamente suas madeixas, até agora soltas. Tomando em seus braços os próprios fios, Yuzuriha olha, pela primeira vez, de maneira direta nos meus olhos desde nossa entrada no local. Seus lábios se mexem, preparando-se para continuar a falar:

- Eu adoro as rosas. Talvez sejam minhas flores preferidas. Melhor dizendo: são minhas preferidas.

Permaneço, em silêncio, ouvindo o que ela tem a dizer. Sua voz é tão doce e agradável que tenho a sensação de que poderia ouvi-la por dias e dias sem interrupções. Contudo, o momento é interrompido.

- Bom dia. O que vão pedir? - pergunta o atendente que se coloca ao lado direito de nossa mesa.

Yuzuriha e eu olhamos para o funcionário, que tem em mãos um pequeno bloco de anotações e uma caneta.

- Eu aceito uma torta de morango... Minos. - ela especifica o que deseja para ele.

- Para mim, pode ser um suco natural de maracujá acompanhado de um pão-de-queijo.  -

- Você não parece fazer o tipo que gosta de pão-de-queijo. - comenta a loira, para mim, rindo.

O funcionário anota os pedidos, pede licença, se vira e caminha para o balcão do estabelecimento, enquanto continuamos:

- Você também não parece fazer o tipo que gosta de flores. - falo, sem segurar meus ligeiros risos - Mas então... você conhece ele? - pergunto, olhando rapidamente para o atendente que se afasta.

- Por quê?

- Bem... você falou com ele chamando-o de Minos. Então o conhece, certo?

Yuzuriha ri, um pouco mais alto do que antes. Instantes depois, explica:

- Não, na verdade não o conheço. Quem o conhece é a Sasha. Aquela ali conhece todo mundo da cidade- diz, revirando os olhos, o que me sai um tanto quanto engraçado- Mas nem me lembrava do nome dele. Apenas li o nome no crachá que está em seu pescoço.

- Ah, então foi isso...

Ambos permanecemos rindo por quase um minuto inteiro até ela interromper mais uma vez:

- Como eu ia dizendo... eu adoro as rosas. Não que eu seja exatamente o tipo de mulher que ame flores. Na verdade, eu não dou muita importância para elas.

O funcionário da lanchonete se aproxima mais uma vez. Consigo, traz um prato contendo uma faca, um garfo, a torta de Yuzuriha e o suco e pão-de-queijo por mim pedidos.

- Mais alguma coisa? - pergunta ele, após colocar o prato sobre a mesa.

- Não, obrigada. - diz Yuzuriha, olhando para o tal Minos, com doçura e gentileza, assim sendo sempre que fala algo.

Ele se afasta e retorna ao seu posto. Mal espero ele dar as costas para sair e pergunto, tomando um gole do suco:

- Por quê não?

Partindo um pedaço da torta com a faca e levando-o a boca com o garfo, a loira responde após saboreá-lo:

- Não vejo nada de especial nas flores comuns. Elas não me fascinam em nada. Porém, as rosas são diferentes.

- Diferentes como? - pergunto, desta vez exibindo um sincero sorriso após morder e comer um pedaço do pão-de-queijo.

- Bem...as flores são belas, admito. Mas é somente isso o que elas tem a oferecer: beleza. - explica, demasiadamente séria - Elas não podem simbolizar nada além disso. As rosas, ao contrário, são símbolos de força e bravura mesmo sem perder a beleza e perfeição. Suas pétalas são o seu encanto e seus espinhos, sua defesa. -  argumenta.

- Excelente analogia. - digo, contente.

Ela sorri outra vez e agradece:

- Obrigado. Mas não é necessário que elogie. Afinal de contas, se você admira a rosa, talvez por que compartilhe do mesmo ponto de vista que eu.- conclui, comendo mais um pedaço da torta.

- É...talvez. - falo, tentando manter um ar de mistério e suspense, mas acabo por falhar. Pelo menos, acho que minha tentativa é falha.

Yuzuriha, que segundos atrás, observava sua torta de morango, agora vira seu rosto em direção a rua. Instintivamente, faço o mesmo. Juntos, observamos as pessoas que vem e vão pela rua lá fora. Uma brisa, desta vez suave, assopra nossos rostos. Ela respira fundo e comenta:

- Gostaria de viver sempre momentos como esse.

- Como esse em que sentido? - pergunto, sem abandonar o olhar sobre o lado de fora da lanchonete.

Ela nada diz, deixando o silêncio reinar. Segundos depois, finalmente fala:

- No sentido de sentir na pele a liberdade, como se nada mais nesse mundo me importasse.

- Mas não seria ideal viver esse momento ao lado de quem ama?

- Provavelmente. Mas eu não tenho esse alguém.

Surpreso com a afirmação, mas sem deixar transparecer tal surpresa, desvio o olhar da rua e foco no rosto dela.

- Eu pensei que você tivesse um namorado. - comento.

- E tenho. - diz ela - Mas isso não quer dizer que o amo.- assim declara, também, olhando para mim.

Percebo que, nesse instante, a melancolia que notei na nossa primeira troca de olhar da manhã retorna para seus belos olhos. Sem sequer tentar me policiar, observo cada traço do rosto celestial de Yuzuriha. Contudo, ela vira seu rosto em direção ao interior do estabelecimento e, nitidamente tentando fugir do assunto, sorri dizendo:

- Algo me diz que ele gostou de você.

Sem entender, olho para a mesma direção e vejo o atendente por trás do balcão da lanchonete, disfarçadamente, olhando para a nossa mesa. Outra vez, o tal Minos.

- Quem garante que ele não esteja de olho em você? - pergunto, de modo cômico.

Mais uma vez, aquele gesto. Ela coloca o dedo indicador direito sobre os lábios enquanto ri. Será que Yuzuriha não percebe a sensualidade natural que esse ato exala? Creio que não, afinal é natural... No mínimo, é essa minha impressão: que seja uma sensualidade natural. E eu, por quê repito tanto na minha mente essa "verdade" ?

- Sinto muito, Alba. - uma sensação estranha toma conta de mim assim que ela me chama da maneira que somente Manigold já me chamou - Eu já estive aqui várias vezes e ele nunca olhou para mim. Mas isso não é de se estranhar.- afirma, comendo mais um pedaço da sua guloseima.

- Como assim, Yuzu? - olho de volta para ela e me aproveito para chamá-la pelo diminutivo de seu nome, assim como a mesma fez comigo.

Fitando a torta que, de fato está com uma "boa cara", ela retira mais um pedaço e diz, antes de levar o garfo a boca:

- Você é muito lindo e ele é homossexual. É só montar as peças para formamos o quebra-cabeça.- e abocanha o pedaço, ao concluir.

Apesar de não esperar ouvir isso, não me abalo e nem me incomodo. Eu, por minha vez, abocanho o que resta de meu pão-de-queijo. Assim que termino, calmamente, de comê-lo, falo mantendo o sorriso:

- Ele não faz meu tipo. - por fim, bebo o restante do suco e deixo o copo descartável sobre o prato.

- É uma pena, pois ele também é uma gracinha.- opina, olhando para meu rosto.

- Posso te fazer uma pergunta? - indago, desviando-me do assunto "Minos", que em nada me interessa.

- Claro.- responde, debruçando-se sobre a mesa, mas sem abaixar o rosto.

- Por quê se interessou em falar comigo? - pergunto, sendo direto e sem rodeios. Obviamente, não suponho que seja por um sentimento nem nada do tipo. Pelo meu tom sereno de voz, imagino que ela tenha compreendido minha verdadeira intenção nesse meu questionamento.

O telefone de Yuzuriha toca. Ele, agora dentro de sua bolsa, retira de mim a atenção que a loira estava me dando. Apressada, ela o atende.

- Alô? - diz, esperando a resposta de quem está do outro lado da linha - Oi Tenma, tudo bem? Trocou de número? - conversa, contagiante.

Sem querer me intrometer na conversa dos dois, volto a observar o movimento na rua. Acabo, por um momento, me lembrando que Manigold está agora com Pandora aproveitando o aniversário de namoro no apê. Sinto um aperto no meu coração ao imaginar o que eles estão fazendo juntos. Definitivamente, eu sei muito bem o que eles estão fazendo nesse exato instante!! E saber desse fato me angustia e me desperta uma certa... inveja dela. Quantas vezes sonhei em poder tocá-lo sem medo, desfrutar de seus lábios, tê-lo para mim assim como a Pan o tem agora?

- Albáfica, mil perdões... - lamenta Yuzuriha, guardando o celular  de volta na bolsa e fazendo-me olhar para ela mais uma vez. - ...Mas eu tenho que ir.

- Aconteceu algo?- pergunto preocupado.

- Parece que a Sasha não está muito bem e o namorado dela, Tenma, me ligou e pediu que eu vá até a casa dele.

- É grave? - fico ainda mais preocupado, demonstrando isso em meu semblante sério.

Yuzuriha se levanta da cadeira na qual segundos atrás estava sentada. Colocando a mão esquerda na bolsa enquanto a segura com a direita, me responde:

- Parece que não. Mas ainda sim me sinto na obrigação de ir até lá. Se importa?

- Não, não... você tem toda a razão em se preocupar. - digo, me levantando também.

Yuzuriha sorri. Da bolsa, retira sua carteira e se prepara para falar algo, mas a interrompo:

- Espere. Não precisa se preocupar com isso. Eu lhe convidei, portanto eu pago.

Ela fica sem reação por alguns instantes, até que a própria diz ainda sorridente:

- Tudo bem, obrigado... Até.

- Até. - digo, correspondendo-lhe o sorriso.

A loira se vira e dá alguns passos e sai para fora da lanchonete, no caminho que decide seguir para ir até a casa do namorado de Sasha. Contudo, já na calçada, mas ainda sim um pouco próxima a lanchonete, Yuzuriha me chama de costas:

- Alba...

Eu, que já chamava o atendente para pagar a conta, olho na direção dela. Havia pensado que ela iria embora sem falar nada mais, mas me enganei.

- Respondendo ao que você tinha perguntado... - Yuzuriha vira seu rosto para mim, sem sorrir, agora a alguns poucos metros de distância, mas suficientemente perto para que eu seja capaz de ouví-la - A razão por eu ter me interessado em falar com você é que seus olhos são como os meus: tristes e melancólicos.

Assim que termina de falar, ela segue o seu rumo com apressados passos. Continuo olhando para a loira, até que a mesma dobra a esquina, tornando para meus olhos impossível acompanhá-la. E por falar neles...

- Meus olhos? - pergunto para mim mesmo, tentando compreender essa realidade.

- Como é, senhor? - indaga o atendente, ao meu lado esquerdo, recebendo de mim, o pagamento.

- Não é nada. - digo, simpático, olhando para ele - Tenha um bom dia.

Assim, saio do local, seguindo meu caminho diferente do que Yuzuriha seguiu. Na mesa, o copo, os talheres, o prato e o pedaço solitário da torta de morango...


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Notas finais do capítulo

Meu Deus. Queimei todos os meus neurônios com ess capítulo, preciso arranjar mais T-T. Espero que tenha valido o meus esforço. Até mais !