Sparkly Angel. escrita por Katherine Marshall


Capítulo 2
Lembranças


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo talvez seja meio chatinho, são só as memórias dela voltando, mas fiquem atentos ao próximo que aí sim vai começar a história.



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Me acalmar? Ele estava mesmo me pedindo isso? Não pode ser... Se não fosse pela dor que eu sentia agora, não só fisicamente como emocionalmente, eu sairia correndo. Mas não posso. A única coisa que faço então, é exatamente nada, nada além de sentir as lágrimas arderem em meus olhos e deixar que elas caíam.

– Por favor, Dr. Harry, eu quero ir embora daqui, eu quero ver meu pai, por favor me deixe sair daqui.

– Não tem mais como vê-lo, querida. – Ele olha para o relógio, impaciente. – Está na minha hora. Tenho que ir, meus pêsames.

Vejo ele se afastar e ouço passos, um homem me segura com força para permanecer na cadeira onde estava, fazendo com que a dor que eu já sentia multiplicasse por dez, sem saber que, de qualquer modo, eu não conseguiria me mexer para escapar dali. Só consigo continuar acordada antes que ele me aplicasse outro sedativo a tempo suficiente de ver seus olhos, um era dono de um tom castanho escuro avermelhado e outro, quase branco, parecendo sem visão alguma.

(...)

Meses se passaram, eu tive mais incontáveis inúteis visitas com o Dr. Harry, que agora eu tinha absoluta certeza de ser o pior psicólogo do mundo. E eu estou completamente cansada desse lugar, mas hoje, finalmente recebi alta e sairei daqui. Estou cansada da dor que sinto, agora não mais fisicamente, já que os médicos me disseram estar quase cem por cento curada, a não ser pelas cicatrizes dos ferimentos que um dia desmancharam todo o meu corpo, e eles dizem que isso é um milagre, que eu tive sim, ferimentos gravíssimos que talvez nem pudessem ser curados um dia, mas que devido a grandeza do acidente era muito provável que eu perdesse as pernas, os braços, mas não aconteceu nada disso. E agora estou curada, viva, mas horrível. E vou permanecer assim, para sempre. Mas não é como se eu me importasse com beleza numa hora dessas, tudo que eu consigo sentir é a dor emocional causada pela perda do meu pai. Meu pai, meu herói, a única família que me restara. O único que nunca me abandonou, e que eu sabia que nunca iria abandonar... Mas aconteceu. E eu me pergunto porquê. Por que ele, e não eu?

Agora, com a memória totalmente recuperada eu finalmente consigo me lembrar do último dia, de tudo que acontecera antes do acidente.

(...)

Era o primeiro dia das férias de verão, e eu e meu pai viajaríamos para Califórnia, como todos os anos. Enquanto eu descia as escadas naquele dia após terminar de arrumar as malas senti um aroma delicioso de biscoitos de chocolates com manteiga de amendoim que meu pai sempre fazia pra mim em manhãs de finais de semana. Ele sabia ser um excelente cozinheiro.

– Bom dia, cheff.

– Bom dia querida, está com tudo pronto para nossa viagem?

– Como se você não soubesse, — Respondi sorrindo para ele animada e mordiscando um biscoito — sim, senhor, está tudo prontíssimo.

– Que bom, quanto antes formos, melhor. Termine de tomar café enquanto eu vou tomar um banho rápido e então partiremos.

– Tudo bem. — Respondi automaticamente, mas enquanto ele subia as escadas gritei — Pai!

– Sim, querida? — Ele gritou de volta.

– Eu queria me despedir de Brandon e Kate, antes. Posso?

– Tudo bem, mas seja rápida!

Terminei de tomar meu café da manhã rapidamente, tomando só metade do meu copo de leite e comendo apenas dois biscoitos da bandeja enorme que ele deixara ali. Podiam ficar para a viagem.

Sai as pressas de casa, levando apenas meu celular e ligando para Brandon — meu namorado — no caminho até a casa dele, para avisar que iria até lá.

Sorri ao avistá-lo em frente a casa me esperando, com uma bermuda preta apenas, deixando o tanquinho e os músculos a mostra. Ele sorriu de volta e abriu os braços para um abraço, e em seguida eu o beijei.

– Bom dia! — Disse olhando e tirando uma mecha de cabelo da frente de seus olhos — Eu já estou indo viajar, então... Vim me despedir.

– Ah... — Respondeu num tom de voz triste e com um meio sorriso sem graça no rosto. — Vou sentir saudades.

– Eu também, não imagina o quanto. — Abracei-o pela cintura, e recebi um beijo caloroso na testa — Agora tenho que ir, assim que chegar lá eu te ligo, e podemos nos falar por sms, ok? — Dei uma pausa para suspirar. — Até...

– Tudo bem, vou estar esperando. Até, se cuida.

– Você também.

Brandon sempre fora meu melhor amigo, mas a seis meses antes do acidente confessou que sempre foi apaixonado por mim. No início senti medo de perder a amizade dele caso começássemos a namorar e se eu o machucasse, ou vice-versa. Mas o que eu tinha a perder? Ele era bem bonito, aliás, lindo. Alto, forte, cabelo dourado e pele clara mesmo que levemente bronzeada. Olhos cor de mel e um sorriso lindo. E sem contar que é muito legal, seria o tipo de namorado perfeito. E eu o amava, talvez não o tipo de amor de cinema, do qual a mocinha não consegue se ver sem. Mas como um irmão, e também me sentia bem quando estava com ele, nosso namoro me fazia feliz, mas imagino que agora tudo tenha ido por água abaixo, já que desde que recuperei a consciência não tenho recebido mais as visitas que Dr. Harry disse que eram frequentes dele... Pensei em talvez ligar pra ele, mas a essa altura já esqueci seu número, e como meu celular sumiu depois do acidente realmente não teve como.

Depois disso fui a casa de Kate, minha melhor amiga. Quem me atendeu foi sua mãe, Esther. Que desde que minha mãe se fora, se tornou como minha segunda mãe.

– Claire! Pode entrar, a Kate está no quarto.

– Obrigada. — Respondi com um sorriso e fui em direção ao quarto de minha melhor amiga. — Olá!

– Claire! Oi! — Respondeu Kate com uma voz doce e acolhedora, deitada na cama com seu notebook, o cabelo longo e ruivo preso num rabo de cavalo, os olhos verdes cheios de rímel, e levantou para me dar um abraço. — Já está indo viajar? — Perguntou, parecendo triste.

– Já, vim me despedir.

– Ahhh! — Ela fez beicinho e se afastou. — Fica mais um pouco.

– Não dá, tenho que ir, meu pai já deve estar esperando.

– Tudo bem então, me mande sms ok? E nem pense em virar amiguinha de outra menina lá. — Disse séria, com seu jeito ciumenta de sempre me fazendo rir, e me sentir amada.

– Ok, ok, namorada!

– Exagerei, né? — Perguntou rindo junto comigo.

– Já estou acostumada. Enfim, tenho que ir mesmo, mesmo... Tchau.

– Tchau sua feia, se cuida. — Disse e me envolveu em outro abraço.

– Pode deixar.

Virei as costas para Kate e ia indo embora de sua casa, mas não antes de ouvir a pergunta que eu sabia que Esther faria:

– Mas já, Claire? Você acabou de chegar, brigou com a Kate foi?

– Não, nós não brigamos... É que eu estou indo viajar. — Respondi com um sorriso.

– Ah bom, que susto! Boa viagem minha filha.

– Obrigada.

Quando cheguei em casa meu pai já estava colocando as malas no carro e me pediu para entrar que já íamos indo, sentei no banco do passageiro, coloquei o cinto e esperei que ele também entrasse.

– Vamos indo, então?

– Claro. — Respondi meio desanimada ao pensar em minha mãe, em como eram legais nossas viagens juntas, não que com meu pai não fosse, é claro. Mas com nós três juntos... Diferente. Tinha mais amor, mais família ali. Eu era mais como uma menina normal do que essa versão meio bizarra de mim de hoje em dia. Quando ela foi embora eu fiquei tão, tão triste que me distanciei de tudo, comecei a ir mal na escola e a dormir a base de calmantes, só pensava nela, a única coisa que eu conseguia sentir, além de tristeza, era a constante falta que ela fazia. Era uma mãe tão presente, tão carinhosa, eu nunca esperava que um dia fosse acontecer isso, nunca esperava que um dia ela fosse me abandonar. Mas aconteceu. Um certo dia eu acordei esperando encontrá-la sorrindo pra mim na cozinha com seu velho avental laranja e seu cabelo bagunçado, fazendo bolo de cenoura ou panquecas, ou ajudando meu pai a preparar biscoitos. Mas a mesa estava vazia. Exceto por um jornal e um copo de café. E meu pai estava com a cabeça abaixada, apoiando a mão na testa. Ele me disse que tinha feito uma viagem de última hora e que ia voltar, mas ela nunca voltou. Então eu descobri que, ela simplesmente se foi, por vontade própria, pra viver com outro homem e... Construir outra família.

Tentei me distanciar desses pensamentos ao sentir as lágrimas queimarem meu olhos. Por sorte meu pai estava ocupado demais olhando a estrada e não havia visto... Peguei meu iPhone e meu fone de ouvido, e puis para tocar The one that got away, fechei os olhos e tentei me concentrar em coisas felizes, como minha festa de quinze anos, a última vez que fui ao cinema com Brandon para assistir uma comédia romântica, e da última vez que passei a tarde vendo filme de terror e comendo pipoca com Kate. Todas essas coisas simples eram a maior sensação de felicidade que eu conhecia. Eu não podia me imaginar, nunca, sem esses dois. E em meio a esses pensamentos, acabei adormecendo, imagino que com um sorriso no rosto.

E então, quando acordei com o grito de meu pai dizendo "Claire" foi só tempo suficiente para ver um farol queimar meus olhos, os vidros das janelas e da frente do carro se estilhaçando em mais de mil pedaços e de sentir a pancada em minhas costas e... Após isso, desmaiar e só acordar oito meses depois.


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