Deuses e Diamantes escrita por André Tornado


Capítulo 26
Fusão.


Notas iniciais do capítulo

"Um guerreiro jovem a gritar
Sem tempo para dúvidas.
Com a dor e a raiva, não consegue ver uma saída.
Não estou a pedir muito, ouvi-o dizer.
Tenho de encontrar um futuro para mim
Sai do meu caminho."
Queen, I Want It All



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A técnica da Fusão tinha resultado bem à primeira tentativa, sem falhas. A energia combinada dos dois pequenos saiya-jin era muito superior à simples soma das partes e imensamente superior ao poder dos seus respetivos progenitores, quando tinham estado sobre aquele tatami. Número 17 estava impressionado. Nunca julgara os fedelhos capazes de uma tal demonstração de superioridade e de confiança. Estavam diante de um deus, exibiam o queixo bem levantado e o nariz bem empinado. A aura dourada envolvendo o pequeno corpo atlético e perfeitamente moldado faiscava e ondulava, tornando aquele que se chamava Gotenks, também uma sintetização dos dois nomes, um guerreiro temível.

Mas Valo não vacilara e nem demonstrara qualquer espécie de assombro, dúvida ou temor. Continuava a apostar na máscara da indiferença e da natural superioridade conferida pelo estatuto de divindade.

Número 17 desejava agora ver Gotenks em ação. Deveria ser formidável. Mesmo que continuasse a ser um fedelho de metro e meio de altura, teria truques capazes de rivalizar com Valo e de o debilitar ao ponto de lhe conseguir surripiar o diamante, ou o príncipe não lhe teria confiado essa tarefa, absolutamente convencido que o seu plano resultaria em pleno. Número 17 compreendeu porquê. Por um lado, o príncipe fora capaz de neutralizar Argia – ainda que tendo contado com a sua ajuda e a de Ozilia no derradeiro instante, aguentara o combate inteiro sozinho – e não tinha tanto poder quanto os dois fedelhos unidos. Por outro lado, Gotenks tinha lutado contra Majin Bu, um dos inimigos mais fortes que já tinha existido e a sua prestação roçara a perfeição. Ele não tinha assistido aos combates mas, de qualquer modo, sabia-o – o conhecimento estava impresso no seu cérebro, lembranças tão nítidas que era como se tivesse presenciado o que acontecera dois anos antes. Aliás, todos eles tinham enfrentado Majin Bu, em diferentes estados da sua evolução, pelo que não se devia subestimar qualquer um dos lutadores da galáxia do Norte. Se Valo, ou mesmo Lux, esperavam facilidades naquele torneio, eram ignorantes, soberbos ou simplesmente cegos. A queda de Argia não fora um mero acaso. Ozilia soubera escolher os seus campeões.

Junto ao tatami, Son Goku e o príncipe aguardavam pelo recomeço do combate, de braços cruzados, sérios.

Gotenks sorria para Valo, cabeça inclinada, punhos na cintura.

- Então? Estás à espera do meu ataque?

E como o deus não lhe respondeu, encolheu os ombros, revirou os olhos e disse:

- Oh!, está bem… Se queres assim…

Excessiva confiança ou superioridade natural? Número 17 dissecava o que se lhe apresentava, procurando extrair informação preciosa, despida de artifícios. Notou a leva mudança no ki de Son Goku. O diamante falava-lhe, ele tinha outro tipo de perceção naquele mundo dos deuses ao possuir, também ele, um diamante e certamente que estaria a receber vibrações de Valo que o fedelho unido não receberia.

O plano era simples: arrancar o diamante a Valo. Nem precisavam de derrotá-lo, ou feri-lo. Bastava simplesmente entretê-lo com a ardileza necessária para operarem o necessário deslize.

Mas aquele Gotenks era de uma têmpera diferente de um normal saiya-jin. Qualquer defeito estava aumentado um milhão de vezes, o que aumentava, na mesma proporção, as probabilidades de uma queda aparatosa. Son Goku sabia isso e ficava nervoso. O príncipe, também. Número 17 suspirou, absorvendo essa informação. Os saiya-jin poderiam ser guerreiros fantásticos, mas eram facilmente dominados pelas emoções.

Como Valo não se mexia, mexeu-se Gotenks.

Tentou alguns golpes, combinações de murros e de pontapés, mas o deus desviou-se sempre, deslizando pelos espaços concedidos pelo adversário, movimentando-se delicadamente, sem alterar a sua expressão impassível, sem deitar uma gota de suor. Quando Gotenks preparava o recuo, para recuperar o fôlego e fazer uma segunda investida, Valo derrubou-o com um movimento de braços que, à partida podia ter sido um murro, mas fora algo mais elegante e menos brutal, mas muitíssimo eficaz. Gotenks agarrou-se ao nariz e nas lajes brancas caíram dois pingos de sangue.

- Ei! O que é que foi isso?

Gohan sussurrou:

- Chegaste a ver, Piccolo-san?

O namekusei-jin negou com a cabeça.

Número 17 também não tinha visto nada.

O plano podia ser simples, mas o caminho para a resolução deste estava a revelar-se complicado e cheio de subtilezas. Valo não se iria distrair assim tão facilmente.

Gotenks recuperou depressa a atitude arrogante.

- Muito bem! Já percebi que não gostas de brincar…

Soltou uma gargalhada que soou demasiado deslocada. O príncipe e Son Goku mostravam-se irritados.

- Vamos passar a coisas sérias!

Enchendo as bochechas de ar, Gotenks susteve o fôlego por alguns segundos. A sua energia subiu de repente, multiplicando-se como se, para tal, tivesse apenas que se carregar num botão, quantas vezes fosse preciso para a aumentar. Duas, três, cinco vezes. Depois, Gotenks começou a soprar o ar, em intervalos regulares, formando nuvens brancas. Duas, três, cinco formas ondulantes que ganharam, a pouco e pouco, os contornos de pequenos fantasmas.

Número 17 nunca tinha visto nada parecido, estava curioso com o resultado daquela técnica que era digna de dois fedelhos lutadores, ingénua e imbecil, mas poderia ter alguma utilidade, pois tanto Son Goku, como o príncipe, pareceram acalmar a sua irritação.

- E aqui está o Super Ghost Kamikaze Attack!

Os pequenos fantasmas, cujo rosto pálido e de traços singelos era o de Gotenks, ululavam perto do seu criador. Se pretendiam ser assustadores, não estavam a passar a mensagem, já que Valo deu mostras, mais uma vez, que nada o perturbaria naquele combate.

Sorrindo como se fosse já o vencedor, Gotenks deu ordem de marcha ao primeiro par de fantasmas. Estes cruzaram o ar uivando e guinchando, compenetrados no seu papel de espectros, mas antes de alcançarem Valo, o deus utilizou a supervelocidade e desapareceu do tatami. Sem poder controlar a sua investida, os dois fantasmas atrapalharam-se, chocaram um contra o outro e anularam-se numa explosão que abanou o chão.

De repente, Gotenks saltou, com um repentino aumento de ki. As cabeças de todos os lutadores da galáxia do Norte voltaram-se para cima. Os três fantasmas seguiram o seu criador, mimando a mesma expressão tensa, a mesma linguagem corporal. Houve um estampido sonoro, uma esfera transparente de energia e Gotenks derrubou Valo com um pontapé.

- Ah! Excelente! – Exclamou Gohan vendo o deus embater contra o lajedo.

Número 17 remoeu, descrente:

- Mas continua a ser insuficiente…

- Apenas precisamos de uma distração, uma falha.

Olhou para a irmã que falara. Valo ergueu-se, uma coluna ganhando altura, num movimento suave e contínuo. Tinha um veio de sangue a escorrer do canto da boca, mas não fez qualquer esgar, careta ou perdeu uma gota de suor. A sua postura continuava a ser impecavelmente seca.

Mas assim que recuperou a posição ereta, os três fantasmas atacaram-no. Ainda se esgueirou de dois deles, desfazendo-os com um raio que vibrou nos ouvidos de número 17 – um golpe rápido e invisível, que resultou na explosão dos fantasmas. Mas o terceiro conseguiu chegar ao alvo. Abraçou Valo, rasgou um sorriso gigantesco que encheu de malícia os seus olhos vazios e rebentou, derrubando-o novamente.

A queda foi dramática – a coluna tombou pesada, assentando no piso com um baque ensurdecedor.

- Agora! – Ordenou o príncipe ansioso.

Gotenks aterrou no tatami. Aproximou-se confiante, passando um dedo pelo nariz. Mas antes mesmo de chegar ao deus tombado, a coluna derrotada e desfeita num desleixo vergonhoso, a carcaça que era supostamente de Valo foi varrida por uma rajada de vento que espalhou cinzas. O assombro foi sonoro. Número 17 ficou boquiaberto e Gotenks, parado de pernas abertas, não estava mais admirado.

Valo postava-se no centro do recinto, fresco e impecável, como se fosse começar aquele combate.

- Isto já está a demorar demasiado – disse Piccolo. Depois, gritou para o tatami: – Rapazes! Aumentem o vosso poder, passem para o nível seguinte e acabem depressa com ele. Vocês não podem brincar mais.

Com um trejeito mimado e irritante, Gotenks fez beicinho e protestou, com a sua dupla voz:

- Oh, Piccolo-san… Isto está a ser tão divertido!

Ozilia nada comentava.

Mas se as palavras do namekusei-jin tinham pouco peso e não conseguiam penetrar na carapaça de arrogância daquele saiya-jin esquisito, o ataque de Valo, inesperado e brutal, surtiu o efeito desejado.

Foi um ataque incomum. Num minuto, Gotenks estava a fazer beicinho. No minuto seguinte, arquejava de gatas sobre as lajes brancas que exibiam laivos de cor cinzenta, como se por estas tivessem passado línguas de fogo. As gotas de sangue davam o derradeiro efeito ao quadro, cinzento e encarnado. Gotenks estava a recuperar de algo que nenhum deles tinha conseguido seguir, vislumbrar ou sequer compreender. E Valo erguia-se tão altivo como sempre. Número 17 recordou-se das palavras do príncipe que indicava que os deuses utilizavam poderes místicos. Ele e Son Goku estavam novamente irritados.

Mas o ataque incomum teve o condão de irritar também Gotenks, ou provavelmente incutiu-lhe algum tipo de sensatez ou de clarividência. Ou simplesmente a humilhação estraçalhou a carapaça de arrogância.

O fedelho levantou-se, sobre as pernas trémulas. Tinha os punhos bem fechados, os braços dobrados pelos cotovelos. Lançou a cabeça para trás, cerrando fortemente os olhos, escancarando a boca num brado que reverberou pela paisagem alcançando as paredes de vidro do pequeno berlinde que número 17 guardava. Soube que isso acontecera, pois sentiu-o a vibrar no bolso das calças.

- Nani?

O brado converteu-se em energia impossível de quantificar.

Os cabelos de Gotenks desataram a crescer e a criar volume, as faíscas rodeavam-no, a aura dourada agitava-se e o corpo parecia não aguentar tamanha alteração.

Quando o brado terminou, tinha atingido o nível três dos super saiya-jin e era um fedelho totalmente diferente – os cabelos caíam pelas costas em grossos cachos loiros, as feições do rosto tinham-se esbatido e os músculos assemelhavam-se a aço moldado.

Mas Valo não se impressionou.

Número 17 retomou a respiração que tinha sustido, sem se aperceber. Espreitou Ozilia que estava como Valo, desdenhosamente impassível.

Gotenks já não queria brincar. A raiva fervia-lhe no sangue e desejava uma desforra, vingança, um sentimento negro que apenas ficaria satisfeito com a submissão do orgulhoso deus que ousava não sentir medo dele.

Atacou furioso com uma saraivada de esferas de ki. Desfez metade do tatami – nada de preocupante, pois haveria de ser reconstruído, como acontecera nas outras ocasiões. Descobriu que o adversário desviara mais esse ataque, não o deixou reposicionar-se. Voltou a atacar com dois murros que o derrubaram, abrindo uma cratera no já desfeito tatami. Uma bola roxa e azul, zunindo e palpitando, explodiu sobre o deus aparentemente atordoado. De seguida, outro ataque físico. Os dois joelhos enterraram-se no corpo de Valo. Pulou para o lado, puxou pelo braço do deus, lançou-o para a atmosfera. Intercetou-lhe o voo forçado com um pontapé. Segunda cratera. Outra bola roxa e azul que explodiu, aumentando o perímetro da cratera.

Gotenks aterrou com ambos os pés nos rebordos fumegantes do buraco aberto. Ainda chovia areia e pequenas pedras, ainda se sentia o efeito das ondas massivas de calor. Número 17 protegia a cara com os braços, espreitando os acontecimentos por uma fresta.

Valo esgravatava o chão, gemendo e o seu diamante piscava e tremeluzia, exibindo-se desprotegido sobre o peito arquejante do deus. Gotenks acercou-se.

- Não… – Escutou-se um gemido rouco, incrédulo.

Gotenks ergueu o braço, como se segurasse uma tocha mágica destinada a iluminar o mundo. Foi com um joelho ao chão e toda aquela energia gigantesca que exibira durante uns breves dez minutos, ainda que tivesse parecido mais de uma hora de espetáculo, esvaiu-se e a peculiar aparência de um super saiya-jin de nível três desapareceu. Na mão, em vez da tocha mágica, mas lançando raios de luz desesperados, por se sentir a fenecer e era inexplicável como uma pedra se podia sentir dessa forma, estava o diamante de Valo.

O deus arquejou, com a mão enclavinhada sobre o peito, esgravatando, com falta do diamante, uma espécie de coração e alma, tudo junto.

Número 17 espreitou Ozilia e viu-a derramar duas grossas lágrimas que ele teve a tentação de limpar. Nunca percebeu claramente a existência de lágrimas, ele nunca tinha chorado e nem saberia o que seria necessário para o fazer. Não devia ser nada de muito complicado convocá-las. Porém, ver a deusa chorar deixava-o ainda mais intrigado.

- Iá tá!!! – Gritou Son Goku socando o ar, saltando eufórico.

O príncipe sorria ufano e o namekusei-jin ordenou ansioso:

- Vamos, rapazes! Destruam o diamante!

Os sons foram, subitamente, aspirados e número 17 sentiu os ouvidos entupirem-se, a mesma reação quando subia a uma altura elevada demasiado depressa. A sensação perpassou por todos, viu-lhes isso nos rostos perplexos.

O diamante minguou na mão de Gotenks.

Valo ficou quieto.

Mas não era só isso…

O mestre-de-cerimónias gordo tinha desaparecido e o tatami estava reconstruído.

Mas não era isso.

Os músculos de número 17 retesaram-se todos ao mesmo tempo, imprimindo a sensação de se ter subitamente petrificado.

No balcão situado no centro da bancada vazia, postando-se diante do trono dourado, majestoso e incrivelmente divino, estava Lux.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo:
Imprevisível.



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