Sabe a maioria das coisas se resumem a uma questão de contexto. Se você me perguntasse ''Lucas, você não quer ver sua namorada que ficou em São Paulo e com a qual você não tem contato já há quase um mês?'' é obvio que eu responderia ''sim''.

Agora, se alguém viesse e dissesse ''Lucas, o que você acha de se encontrar com a sua namorada que resolveu te fazer uma visita surpresa depois de ficarem quase um mês sem se ver e que, olha, tentou te ligar 27 vezes no celular sem receber nenhuma resposta porque o seu aparelho estava em posse do seu ''ex-namorado''?'' eu sairia correndo.

Isso, claro, se tivesse essa opção. Mas não. Só fui descobrir a situação em que aquele imbecil do Matheus (porque a culpa é dele) tinha me enfiado quando eu encontrei a Larissa sentada na frente do meu apartamento com uma mochila de viagem gigante do lado.

Encarapitada em cima da pseudo-mala estava uma caixa de pizza da qual vinha um cheiro forte e melecado de chocolate e morangos.

– Achei que hoje suas aulas eram só de manhã, Luk.

No instante em que nossos olhos se cruzaram e ela me encarou por detrás das lentes de pouquíssimo grau enfiadas naquela armação preta e grossa, lambendo um dos dedos sujos de chocolate, eu senti que estava morto.

– Me desculpe por não ter ido te buscar na rodoviária! É que...

– ''Eu tinha perdido o meu celular e a minha querida amiga Jéssica só me devolveu ele naquela hora em que eu te liguei e descobri que você já estava aqui''. É isso?

Eu não teria dito melhor. Na verdade, acho que não teria dito nada. Muito menos o ''querida'' em relação a Jéssica.

– E ai, vamos entrar ou não? Eu tô morta, só quero tomar um banho.

Destranquei a porta da frente enquanto ela juntava suas coisas. Mesmo de costas dava pra sentir um olhar frio em cima de mim. Melhor que eu só podia estimar por alto o quão fudido estava usando todas as ligações perdidas que estavam no meu aparelho e o ''Matheus que achou'' que a Jéssica me disse quando o devolveu.

Me ofereci pra guardar a bolsa dela e recebi um arremesso direto no estômago. Deu pra ouvir o som dos pedaços que restavam da pizza pulando dentro da caixa quando ela a jogou na bancada da minha pseudo-cozinha.

– Fiquei feliz de você ter vindo me ver.

Já dentro do meu banheiro- depois de fazer questão de jogar as roupas que estava usando no chão em frente a porta fechada, ela não respondeu.

Duas pequenas dicas, para a vida. Faça teatro e leia livros que mulheres gostam. Assim você fala a frase certa com a entonação certa na hora certa. Funciona melhor do que chocolate, ás vezes.

E eu preciso que funcione. Que ela continue aqui.

Eu preciso da Larissa.

Preciso dela comigo. De um abraço, de um beijo. De uma porcaria de um ''bom-dia'' que seja. Eu precisava sair com ela e que ela fosse lá em casa de vez em quando. Que o meu pai soubesse que eu dormia com ela. Contar pra minha mãe que ela veio até aqui para me ver.

Já há três anos a gente vive assim e eu pretendia continuar desse mesmo jeito.

Estava terminando de arrumar a sala- tentando deixar meu sofá utilizável empilhando todas as coisas que antes estavam nele no chão- quando meu celular tocou.

Felizmente ela ainda estava debaixo do chuveiro e não teve como ouvir quando eu atendi.. Nem viu quando eu desliguei na cara dele.

''Lucas? Será que a gente podia conversar?''

Não. Não mesmo. Não agora.

De novo não.