Uma Grandeza Absoluta escrita por Kalhens


Capítulo 2
Memórias Inevitáveis


Notas iniciais do capítulo

Há! Não tenho leitores, não tenho beta, não tenho conhecimentos ou experiência, MAS MESMO ASSIM VOU ESCREVER ESSA COISA.

Por quê?

Porque eu quero.

Boa leitura o/



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Meu celular continua ali tocando, vibrando incessantemente em cima do travesseiro.

E eu aqui, na droga do Facebook, olhando as fotos do dia do resultado do vestibular de quando o Lucas passou.

Sim, eu estou descaradamente procurando a foto em que eu sei que ele aparece.

Sim, eu estou na fossa, dá licença!?


Achei.

Ali está ele. Um sorriso enorme no rosto, os cabelos negros empapados de tinta, ovo, bebida barata e algo que ele disse que achava que era chá verde, junto de um outro bando de gente que não me interessa. Acho que ele foi o aluno de letras mais imundo que eu já vi.


Não lembro da recepção. Eu tinha prova de Cálculo no dia seguinte e, mesmo que tivesse ficado lá mais do que a meia hora que fiquei, nem sabia que ele tinha passado na mesma faculdade que eu.


Me dei ao luxo de um suspiro, olhando o visor do celular. Umas dez das vinte ligações eram da Jéssica.


 



Atendi o telefone já sendo xingado.


– Matheus seu vadio, onde cê tá!? Eu estou com fome e-


Desliguei, enfiando o aparelho no bolso, perfeitamente bem com a ideia de ignorar toda e qualquer nova ligação.

Vem cá, que direitos que uma pessoa que simplesmente DECIDE que vai almoçar com você todas as segundas, quartas e sextas tem de ainda ficar reclamando se você se atrasa?

Isso depois de essa mesma pessoa quase invadir seu computador para te matricular numa matéria junto com ela.

Sim, eu estou reclamando. Muito.


– Desculpa se a minha aula termina depois da sua!


Cheguei no restaurante já jogando a mochila na cadeira, o barulho assustando Jéssica, que digitava furiosamente no próprio celular.

Sim, absolutamente proposital.


– ‘’Depois’’? Matheus, já são meio dia e quinze!


– É eu sei, fala isso pro meu professor...


Aquele era o terceiro dia de aula, e meu pulso já parecia que ia quebrar de tanto copiar fórmula e exemplo de sequência de termos infinitos.

Uma pequena benção era que ela me entendia. Eu faço engenharia mecânica, e ela mecatrônica.


– Tá, que seja. Tem planos hoje pra depois da aula?


– Sim, outra aula.


– Ótimo, estava contando com isso. É que hoje vai ter leilão de calouros da psicologia e uma amiga minha, a Regina, lembra?, vai estar lá.


– Massa. E o que eu tenho a ver com isso?


– Você pegar o seu lindo carrinho preto depois da sua aula, estacionar lá perto da sala da Psicologia e me dar carona até em casa, bonito.


Às vezes eu tenho a impressão de que a Jéssica não conhece os limites para o quanto uma pessoa pode ser folgada.

Triste mesmo foi eu ter acabado cedendo. Mas, olha, não é porque eu concordei em ficar de motorista, que ela pode me ligar no meio da minha aula!

O professor me olhou mais que feio quando ouviu as vibrações. O cara era legal, mas tinha algum bloqueio existencial com celulares. Tive que aproveitar o momento em que ele virou para começar uma nova demonstração, digitando uma mensagem correndo.


‘’Quer o que, madame? Minha aula acaba só as seis’’


A resposta veio tão imediata, que eu já sabia que era coisa ruim.


‘’Eu sei, desculpa. Mas será que você pode dar carona para um amigo meu, calouro? Ele está passando meio mal...’’


Ah, claro. Vou bem deixar um calouro recém saído de leilão da psicologia entrar no meu carro. Isso era pedir para ter vômito até o teto.

Nada contra, pessoas da psicologia. Mas foi num evento promovido pelo povo de lá que eu tive a oportunidade experimentar sorvete de morango com dose quadrupla de Vodka.


Mas que seja.


O problema mesmo era a quantidade de favor que eu devia para a Jéssica. Do primeiro semestre, quando eu estava sem carro e a irmã dela ainda não tinha batido o dela e o deixado inutilizável.


‘’Tudo bem. Mas se ele vomitar, você limpa’’.


Sai da aula me arrastando. Depois de passar por um bando de gente bêbada, outro bando cheio de tinta e alguns com cabelos descoloridos, finalmente encontrei a Jéssica.

Sentada num banco, com o provável calouro deitado no colo.


– É isso ai?


Olhei a carcaça caída. Um braço magro escapava pra fora dos limites do banco e o rosto estava escondido atrás de um monte de fios loiros embolados.


– Ele apagou enquanto a gente te esperava. Eu não tinha mais ninguém pra pedir carona, desculpa. A gente pode tentar acordar ele...


– Nah. Deixa. Sabendo endereço, só conseguir carregar ele até o carro. Tá bem ali...-

Querendo ou não, eu e ela tínhamos certa experiência em carregar gente bêbada. Não é tão difícil depois que se pega a pratica, e ele chegou até a ajudar, dando uns passos bem mal-dados.


– Você conhece ele de onde?- perguntei por perguntar. Dava uns vinte minutos até o endereço que ela supunha ser o certo.


– Teatro. Lembra que eu te contei que fiz no segundo e no terceiro ano?


– Saquei. Era esse o que queria psicologia? Psiquiatria, sei lá?- ela revirava meu porta-luvas, já se apossando do rádio. Intimidade dá nisso.


– Não. Ele nem é da psicologia. Parece que uma amiga dele tinha passado, e acabaram dando vodka com halls pra ele. O bicho não bebe, ai nem notou nada. Sorte que eu tava lá.


– Hum. Saquei.- ingênuo, loiro, alto, magro. Bela combinação. Só faltava ser bonito, que ia acabar desencaminhado completamente em meio semestre.


– Ele é aquele que você disse que conhecia, lembra? O Lucas. Ele passou foi pra letras e-


Passei uma marcha errada no susto, e o carro deu um pulo pra frente. Alguém buzinou atrás de mim, reclamando. Jéssica praguejou, tentando recuperar o rádio que caíra no chão.


– O Lucas que fazia teatro contigo!?


– É, ué. Me ajuda aqui, seu rádio não tá encaixando...


– Jéssica, por que você não me disse antes que era ESSE Lucas?


Ela me fez uma careta como se pretendesse dizer ‘’e dai?’’. Ah, claro. Quando eu contei que tinha estudado com ele, esqueci de falar sobre a parte imprópria da história.

Bati no volante, olhando pros lados.


Sabe. Eu realmente não estava psicologicamente preparado para dar carona para o meu primeiro e único namorado, bêbado e oxigenado depois de mais de três anos sem o ver, ainda mais considerando que por minha culpa ele quase tinha sido espancado na escola.

É, é, muita informação, eu sei.


ACREDITE, EU SEI!


Ok, Matheus, respira. Ele está desacordado, ele nem sabe que está no seu carro e, mesmo que soubesse, pff, quem disse que ele lembra de você?

Você só provavelmente está marcado como a pior lembrança da vida dele...


– Matheus, cê tá bem?


– Não, Jessi, eu definitivamente não estou bem- respirei fundo, olhando pelo retrovisor antes de mudar de faixa- mas a gente fala disso depois. Melhor, nunca. Melhor, nem na minha terceira encarnação!


– Matheus, sabia que quando você fica nervoso você fica afetado? Parece o Felipe falando... E ele é tipo, todo o estereótipo possível para artes cênicas. Ah, consegui! Que estação você quer, ou posso por qualquer uma?


Eu sei lá que estação ela botou. Só sei que quando uma música que eu realmente não me lembro o nome, acho que era do Maroon Five, começou a tocar, eu quase bati o carro.


Por quê?


Tente você dirigir enquanto uma mão simplesmente brota do branco de trás, mole e desgovernada, e agarra a sua orelha.


Foi a Jéssica quem segurou o volante enquanto eu tinha a pior reação possível, largando tudo e batendo nos dedos gelados que apertavam minha orelha e puxavam meu cabelo.


– PISA NESSE FREIO!


Pânico generalizado? Imagina. Enfiei o pé no meio e o carro parou cantando pneu bem num semáforo, morrendo e tudo.


– Por que a música não paaara....


A voz arrastava veio de trás, enquanto a mão continuava tateando minha cabeça.

Jéssica tirou o cinto e se virou para o Lucas.


– Qual o seu problema!?


– Meu celular tá tocando....Tá na hora de acordar, mas ele não para...


Ela mais socou do que apertou o botão do radio, desligando-o.

Meu rádio, só pra lembrar.


– Obrigado...


E eis que o nosso querido calouro de letras simplesmente se espreguiçou todo. Ou ao menos tentou, mas seus membros simplesmente não cabiam no meu modesto Gol preto.


– ONDE EU TO?


– Se você não se sentar lá atrás e botar o cinto como um bom menino, vai estar morto- Jéssica falando, oi.


– Jéssica? Ah...É... Eu.....Minha cabeça dói.


Alguém buzinou ferozmente atrás de mim. Dei partida no carro, o solavanco o jogando no banco.


– Você bebeu, Lucas. MUITO, pelo estado em que eu te encontrei. Você não pode sair bebendo o que os outros te oferecerem, muito menos o povo do campus!


– Sermão nãaao.... Eu to me sentindo doente Jessi...Eu to todo mole....


– Jéssica, manda ele ficar quieto de novo, por favor.


– Quem é você?- ele se agarrou no banco da Jéssica, tentando me olhar mais de perto.


Merda. Merda. Merda. Será que seu eu fizer sinais para a Jéssica sugerindo uma identidade falsa ela me entende? Tentei piscar um olho freneticamente, mas ela estava ocupada dando atenção pro bêbado assassino doloso.


– Vocês devem se conhecer, esse é meu amigo, Matheus. Ele faz mecânica.


– Maaaatheus? Não me lembro de Mateuses que você conhecesse...


– Jéssica, esquece. Depois a gente fala disso, ele tá bêbado, e a gente já está na quadra dele...- acelerei o carro apesar de estar em área residencial. Vamos, cadê o bloco desse infeliz...


– Ele disse que vocês estudaram juntos na...Quinta série? Ou era oitava?


Alguém, por favor, me dê um tiro.

Melhor, ALGUÉM DÁ UM TIRO NELA, DROGA!


Eu não estava vendo o rosto dele. Mas notei que calou a boca.

Finalmente, finalmente achei o bloco!


– Aqui, é aqui que você mora, né? Consegue sair sozinho do carro?


– Matheus? Matheus Rodrigues?- ele parecia estar fazendo um esforço supremo para dizer aquilo.


Não sei por algum motivo mais profundo e sentimental ou simplesmente pelo excesso de álcool mesmo.


– É.- mas depois a gente conversa com calma, Luh. Vamos, eu te ajudo a subir...


Ah, linda você, Jéssica. AGORA que a droga já tá feita você quer tirar ele do meu carro...

Chega, nada de carona pra ela até o fim do semestre.


– Eu já vou, Jéssica... Posso só falar com o Matheus um instante?


Até ela percebeu que tinha alguma coisa ali. Mas pelo menos finalmente resolveu entender meu código de sinais oculares. Eu estava tentando fazer uma seqüência que passasse a idéia de ‘’socorro’’.


– Lucas, você não está em condição de conversar com ninguém agora.- adoro quando a voz dela se torna firme assim.- vamos subir.


Ele parou para pensar por alguns instantes.


– Você- apontou desnecessariamente para mim, como se o carro não fosse apertado o bastante sem um braço a atravessá-lo - você sobe também. Você me deve isso, Matheus.


A Jéssica me encarou, curiosa e preocupada. Eu mordi o lábio. Um hábito que achava que já tinha perdido.

Aquilo... Aquilo tudo era repentino demais, droga. Isso, claro, ignorando a completa inutilidade em eu subir. Não é como se ele fosse ficar mais sóbrio alguns andares pra cima.

Mas...Ele me encarava tão decidido quanto podia, com aqueles profundos olhos negros.


Girei a chave, desligando o carro.


Vai ver, se a gente tinha que resolver isso, talvez fosse melhor com ele bêbado. Vai que ele é dos meus, e esquece tudo que fez depois?


Quê?


Um homem culpado ainda pode ter suas esperanças...



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Notas finais do capítulo

A história da Vodka é quase verídica.
Não o é, porque era uma dose tripla.

Sim, eu estou baseando muita coisa dessa história em fatos reais :3
A começar pelo nome das personagens -n

Adivinhem meu curso~

Enfim, enfim. Até uma próxima.



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