I Can't Feel You escrita por Nihaxy


Capítulo 5
V. Bad day


Notas iniciais do capítulo

*sopra poeira* I'm deeply and truly sorry #.#



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Jane sabia, por experiências anteriores, que quando não havia mais nenhum pacote de café instantâneo em nenhum de seus armários, um dia de cão a esperava.

Como se não bastasse ter de começar sem cafeína o dia em que mais se sentia necessitada ela, parecia que o universo resolvera tirar uma com a sua cara, e absolutamente tudo estava dando errado.

Depois de ter se revirado na cama pela maior parte da noite, ela finalmente conseguira pregar os olhos quando o sol já estava prestes a nascer. Como resultado disso, acabou não escutando o despertador, acordando completamente atrasada, com uma dor de cabeça dos infernos e um humor nada bom. Para melhorar a situação, ela havia se esquecido de colocar as roupas na lavanderia – uma das vantagens de se lidar com homicídio atrás de homicídio, esquecer essas tarefas domésticas -, e tivera de revirar todo o cesto à procura de alguma coisa decente para vestir. De preferência, uma que não estivesse manchada nem desse muito na cara que não havia sido lavada.

Provando ainda mais a capacidade irônica do destino, toda e qualquer mínima coisa que pudesse ter dado errado no intervalo de tempo em que ela acordou até chegar à delegacia, invariavelmente, deu. Desde pegar absolutamente todos os sinais vermelhos a bater o dedo do pé na quina da porta a chegar ao seu destino e perceber que a calça estava pelo avesso.

Porque, claro, como se não bastasse ela se encontrar afundada até o pescoço em todo o drama e as complicações de continuar nessa pseudo-relação com Casey e todas as repercussões que isso estava criando na sua amizade com Maura, ainda tinha de se adicionar ao pacote esses acontecimentos cotidianos irritantemente chatos.

No momento em que escutou a porta fechar, na noite anterior, a detetive sentiu como se o ar estivesse se extinguindo ao seu redor. Não devia estar acontecendo. Nada daquilo devia estar acontecendo. As coisas não deviam ter tomado o rumo que tomaram. Casey estava decidido a fazer uma cirurgia potencialmente letal, Maura parecia estar se afastando cada vez mais, e, mais importante, tudo parecia estar se fechando e sumindo ao seu redor, aprisionando-a numa cadeia de medo, decepção e fraqueza.

Tudo, simplesmente tudo parecia estar numa trajetória infinita em direção ao nada.

Ela queria ter tido forças para levantar do sofá e pedir para Maura não ir embora, para se desculpar por tudo o que dissera e fizera, para tentar consertar o que seu modo de agir ultimamente havia causado. Ela queria conseguir arriscar e dizer à loira tudo o que sentia.

Mas, apesar de Deus e o mudo pensarem o contrário, Jane preferia não arriscar quando se tratava da sua vida pessoal. Sim, ela ia para o trabalho todos os dias sabendo que podia, a qualquer momento, ser esmurrada ou esfaqueada ou baleada. Com a profissão que escolhera, não havia como separar o perigo da rotina diária. Riscos eram necessários Instintos, às vezes, se provavam mais eficientes que toda a tecnologia disponível. Para chegar aonde ela chegara, Jane tivera que doar uma grande parcela da sua vida ao trabalho.

Era exatamente por isso que ela simplesmente não conseguia arriscar em outras áreas. Precisava contrabalançar a instabilidade da rotina puxada com um equilíbrio emocional – apesar de esse ser, na maioria das vezes, completamente forjado. Ela precisara, para se manter viva e não enlouquecer, ter um ponto de equilíbrio em sua vida, um pequeno lugar particular onde ela sempre estaria segura. Ela achara que conseguira fazer isso com sucesso.

Até Maura aparecer;

E provar que não, Jane Rizzoli – primeira detetive mulher no BPD, mais jovem a ser promovida a Homicídios, defensora dos fracos e oprimidos e salvadora da pátria - não conseguia sempre controlar todas as suas emoções. Jane estava sempre numa linha tênue no que se relacionava a expressar sentimentos.

Mais do que tudo, ela não podia arriscar perder Maura

Além da possibilidade imensa de a legista não corresponder nem um pouco os sentimentos que ela nutria, ainda havia a probabilidade – também extremamente alta – num futuro próximo e idealizado onde elas tinham, de fato, uma relação, de Jane inconscientemente fazer o que sempre fazia e inconscientemente estragar tudo. A detetive não tinha, na verdade, um histórico bom no que se referia a romance, e invariavelmente assumira que todas as suas relações acabavam brevemente por sua causa, e não podia, de jeito nenhum, correr esse risco com Maura.

Era uma paranoia irracional e ridícula, mas fazia todo o sentido para Jane, de modo que, assim que a silhueta de Maura desapareceu atrás da porta fechada, a morena ficou estática no sofá, refletindo e repetindo milhões e milhões de vezes as palavras da outra, como se, fazendo isso, pudesse simplesmente chegar à solução de todos os seus problemas.

Tudo o que ela queria, na verdade, era tempo suficiente para organizar o turbilhão que eram seus pensamentos e emoções, e foi por causa disso que Jane ficou, até tão tarde, rolando na cama de um lado para o outro, incapaz de dormir mesmo estando extremamente esgotada.

Seu cérebro não conseguia parar de funcionar, e seu instinto – no qual ela sempre confiara, mas, sem nenhum motivo aparente, decidira ignorar no que dizia respeito ao quadro Maura vs. Casey – praticamente esbravejava que ela estava fazendo uma burrada sem tamanho.

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Chegar atrasada ao trabalho, passar a manhã sem seu sagrado café e preencher pilhas e mais pilhas de relatórios. Não surpreendia o humor de Jane estar extremamente irritadiço, e ela já descontara em Frost – quando lhe dirigira um ‘bom dia’ – e Korsak – quando comentara alguma coisa sobre um vídeo na internet.

Jane quase agradeceu aos céus quando apareceu um homicídio, até eles chegarem à cena e a perícia ser praticamente inconclusiva e inútil. Não havia restos de DNA nas imediações, nenhuma arma do crime e, é claro, Maura não iria ajudar com nenhuma hipótese.

Ah, claro, ainda havia o fato – como se o dia precisasse ser melhorado – de que Maura começara a sutilmente se afastar. Jane considerara a possibilidade enquanto divagava na noite anterior, mas não queria realmente acreditar que fosse verdade. Era o padrão de comportamento típico da legista, se afastar de situações que pudessem comprometer sua instabilidade emocional. Jane sabia que negar a conversa da noite anterior – e escolher não considerar o que fora dito nas entrelinhas – não era realmente o melhor plano de ação, mas por algum motivo foi o que ela escolheu seguir.

Voltar ao departamento de mãos praticamente vazias e ter de esperar Maura concluir a autópsia pareceria levar um tempo infinito. Enquanto Jane simplesmente encarava o computador à sua frente, como se a resposta para todos os seus problemas fosse aparecer do nada, Frost trabalhava o mais silenciosamente possível, o púnico barulho na sala sendo o digitar rápido e os cliques ocasionais dos aparelhos.

Algum tempo depois, a confusão mental de Jane foi interrompida por um pigarro baixo de Frost – já prevenido contra as reações adversas da detetive.

-Alguma pista, Frost?

-Achei no banco de dados um M.O. parecido com o da nossa vítima. – ele reposicionou o monitor a fim de que Jane pudesse ver. – Parece que temos um serial killer à solta.

Como que para comprovar, o telefone tocou segundos depois.

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Impossibilitada de seguir em frente com a investigação – o próximo passo seria conversar com as pessoas próximas à vitima e achar possíveis suspeitos, coisa que não poderia mais ser feita sem a presença do FBI -, Jane decidiu, após passar mais de vinte minutos preenchendo e apagando seu último relatório, descer até o necrotério. Talvez, assistindo à autópsia, a detetive conseguisse descobrir um modo de aliviar a tensão entre ela e sua melhor amiga.

Assim que botou um pé no corredor, porém, se achou idiota por ter cogitado a possibilidade de tamanha sorte.

Claro que, pela primeira vez na história desde que abandonara a fachada de Rainha dos Mortos, Maura escolhera exatamente esse dia para voltar a fechar o necrotério enquanto a autópsia estava sendo executada. Esse era o tipo de coisa que a legista fazia todas as vezes, assim que assumiu o posto, mas largara o hábito quando começara a se aproximar de Jane – que, mais vezes do que era necessário para o caso, descia até o necrotério e observava o procedimento, mais por ao fazer isso estar na presença da outra do que por qualquer outro motivo.

A detetive ficou andando de um lado ara o outro no corredor, impaciente por estar de mãos atadas, esperando Maura terminar a autópsia. No dia em que ela mais precisava de um pouco de ação para quebrar a monotonia e fazê-la esquecer, mesmo que por algumas horas, da bagunça que tomara conta da sua vida, parecia que tudo o que ela podia fazer era esperar. Esperar o FBI chegar para mandar em todos como se fossem mais importantes do que um departamento municipal, esperar Maura terminar o exame do corpo, completamente isolada e solitária, esperar uma ligação de volta de Casey, esperar, esperar, esperar.

Mais por hábito do que por qualquer outra coisa, tirou o celular do bolso, talvez com a esperança de as forças regentes terem mudado o rumo das coisas e Casey ter retornado uma de suas – mais de vinte – mensagens de voz. A essa altura do campeonato, Jane realmente não sabia se devia continuar perseguindo e insistindo nessa pseudo-relação – que claramente levava do nada ao lugar nenhum – ou simplesmente ir pelo instinto, mandar Casey e todos os seus não-me-toques pro inferno e tentar consertar o que sobrara de sua antiga relação com Maura.

Foi nessa hora que ela viu a luz amarela se apagar e imediatamente entrou no necrotério, apenas para ir de encontro à parede de gelo que Maura parecia emanar. A conversa que tiveram se resumiu ao âmbito profissional: a legista informou a causa da morte e disse que o exame toxicológico devia chegar no dia seguinte, enquanto a detetive atualizou-a nas descobertas de Frost.

Quando não havia mais nenhuma informação a ser compartilhada, o silêncio se instaurou pesado e desconfortável, durando segundos que pareceram horas.

-Você quer subir até o café pra comer alguma coisa, Maura? – as palavras escaparam da boca da morena muito antes que ela se desse conta do que estava falando.

-Eu... tenho alguns relatórios para terminar de preencher. – não era uma mentira, claro, até porque Maura se especializara, com o correr dos anos, a manipular a verdade e omitir pequenos fatos. No caso, omitir que o prazo de entrega dos relatórios em questão era para a próxima semana.

-Ok então, eu... te vejo depois. – disse a detetive, estranhamente acanhada e nervosa, e com uma sensação estranha de perda.

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Desanimada e taciturna, Jane se resignou a subir de volta à delegacia e mergulhar de novo na sua papelada. Ela tinha certeza que suas anotações beiravam a ilegibilidade, mas não dava a mínima para nada disso. Tudo o que estava fazendo era matando tempo até que o FBI chegasse e ferrasse com o que ainda restava de normalidade na sua vida.

Algum tempo indeterminado depois – podiam ter sido minutos ou horas, Jane realmente não prestara atenção -, ela ouviu uma pequena comoção na entrada da delegacia, e sabia que seu pesadelo estava prestes a começar. Dito e feito, minutos depois ela foi chamada para uma reunião de emergência, à qual apenas seu corpo compareceu, sentado na cadeira enquanto a equipe de agentes federais se apresentava e atualizava os detetives quanto ao caso em questão. Ela sabia que devia estar concentrada, que devia estar absorvendo todas as informações, mas simplesmente não conseguia fazer com que sua mente parasse o fluxo de pensamentos o suficiente para fazê-lo. Ela ouviu os nomes dos agentes que trabalhavam no caso, mas não memorizou nenhum, do mesmo jeito que não memorizou os detalhes dos outros assassinatos.

Quando a reunião acabou, Jane foi a primeira a sair da sala. A única coisa que realmente entendera de todo o tempo que passara na sala era que essa noite não seria passada na delegacia, pois não havia mais nada que pudessem fazer ali enquanto algo mais não acontecesse. Estava distraída de tal modo, porém, que mal notava o espaço à sua frente, e acabou esbarrando em alguma coisa enquanto se dirigia à porta.

-Jane Rizzoli?

A morena ergueu os olhos para a fonte da voz, e se viu em frente à mulher que presidira a reunião da qual acabara de sair. A chefe da equipe do FBI que se encarregara desse caso.

-Eu mesma. E você é...?

-Katherine Connors. Acredito que me apresentei na reunião à qual você acabou de comparecer, não? – replicou a mulher, enquanto estendia a mão para um cumprimento.

Jane não esboçou reação. A única coisa que talvez possa ter acontecido fora sua carranca ter se aprofundado.

-Deixemos isso claro de uma vez, detetive. – disse a agente, voltando o braço à posição original e assumindo uma postura infinitamente mais séria. – Eu sei exatamente que, nesse momento, tudo o que você mais quer é que eu e minha equipe voltemos para Quantico e deixemos vocês cuidarem do caso. Mas eu posso claramente ver que sua atenção à reunião não foi exatamente o que se esperava, então talvez você não tenha entendido a gravidade da situação. Esse assassino já é responsável por doze homicídios, e cada vez que pensamos estar nos aproximando dele, o maldito simplesmente desaparece. Então, eu realmente espero poder contar com um comportamento maduro da sua parte, que incluiu evitar discussões entre egos e simplesmente se focar no trabalho que temos a fazer. Esse é o único jeito de se livrar de nós, colocando em termos simples. Estamos entendidas?

Naquele momento, Jane sentiu a fúria prestes a tomar conta, as palavras se aglomerando em sua boca prestes a saírem numa enxurrada potencialmente destrutiva. Exigiu uma grande parcela de autocontrole e algumas respirações profundas, mas ela conseguiu sair do local apenas pronunciando um “que seja, então” – ao invés de um comentário sarcástico de quem essa agente pensava que era, para mal chegar e já querer mandar em tudo e todos. Só ia acabar piorando as coisas.

Aquele, definitivamente, não era o seu dia.


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