O último Beijo escrita por andy_1993


Capítulo 2
A Casa - Parte 2


Notas iniciais do capítulo

Espero que esteja melhor que o primeiro :)



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Estar naquele avião, começava a me deixar atordoada, irritada, e ligeiramente desconfortável. Depois do meu sonho, o garoto dos olhos castanhos esverdeados, não voltou a me olhar, nem por um segundo que fosse.


Mas isso não significava que eu também teria que parar de observá-lo.


Seu jeito era esquisito, mal se mexia, não havia comido e nem bebido nada até aquele momento.


Ele estava mais pra uma múmia do que para um ser vivo.


Devo admitir uma múmia muito bonita!


 


O remédio de dor de cabeça não fez nenhum efeito. A dor continuava forte e intensa.


Nunca havia a sentido assim tão forte. Eram raras as vezes que eu tinha dor de cabeça. Quase nunca. E nas vezes que eu teria, eram totalmente diferentes. A minha dor “comum” costumava a ser bem fraquinha e doía em toda a cabeça. Essa latejava acima dos meus olhos e me fazia sentir como se fosse uma boneca de pano sem vida. Quase insuportável.


Longas horas se passaram até finalmente pousarmos. Ele e seus companheiros foram os primeiros a se levantar. Na porta de saída do avião, quem estava lá era Vivian e em seu rosto, estava colado exatamente aquele sorriso perfeito.


Suas bochechas estavam mais rosadas, e seu batom vermelho sangue retocado. Impossível não estar bonita.


Mas ao passarem por sua frente notei seu sorriso se desfazendo, ela olhou para o garoto dos olhos castanhos esverdeados e não piscou, e tive a impressão que nem respirava, ficou branca de uma forma que pareceu que tinha visto algo abominável. Estava com medo, eu pude perceber. Ao saírem finalmente, fechou os olhos e soltou um longo suspiro, voltou a sorrir como se nada tivesse acontecido. Pelo visto era a única que havia notado.


 


Fernando que ainda parecia preocupado, se ofereceu para carregar minhas malas. Mesmo eu tendo insistido que não precisava. Atrás de nós conseguia ouvir os risinhos de minha mãe e Sophie. Fernando também notou, pois a cada segundo virava o rosto para olhar pra elas, que fingiam não ter feito nada de errado. Ele não se incomodou tanto quanto eu. Apenas sorriu e riu também.


Calma... – Eu dizia a mim mesma por pensamento.


Chegando ao portão de desembarque, insistiu em pegar o número do meu celular, caso não nos víssemos mais. Despediu-se com um beijo bastante molhado em minha bochecha. – Que depois tive que passar a manga da minha blusa várias vezes para tirar a sensação de sentir minha bochecha encharcada de baba – Tinha certeza que aquele momento minha mãe nunca iria esquecer, principalmente Sophie. Se tivessem a chance, tirariam uma foto, mas isso só se quisessem ficar subterradas vivas debaixo da terra.


- Mal chegou e já tem um namoradinho é? – Perguntou Sophie, sem olhar para mim, escondendo um riso de satisfação.


Naquele ponto eu já tinha me esquecido da raiva que eu estava dela e da minha mãe. Agora meus pensamentos estavam direcionados só aqueles garotos, eu não conseguia parar de pensar naquele olhar, e na expressão de Vivian, por isso nem ouvi a pergunta ou a suposta piadinha sem graça que Sophie acabara de fazer. Só andei silenciosamente por todo o aeroporto até chegar ao táxi.


O aeroporto, pelo o que minha tia havia contado para minha mãe, ficava agora um pouco mais longe de sua casa. Depois da separação de Silvia mesmo tendo ganhado a casa, não suportava mais viver ali por causa das suas lembranças. Por isso decidiu se mudar para outra e pelo o que eu teria escutado – Sim eu ainda escuto por trás da porta –, era enorme, a mais longe que fosse não gostava de lembrar-se de nada que teria vindo do seu ex-marido, e a casa obviamente ele teria dado a ela de presente de casamento.


 


Por toda nossa viagem, olhava pela janela, tudo parecia ser tão diferente, tão novo. Agora aquele era o meu lar e eu tinha que me conformar e principalmente, me acostumar com tudo que viesse pela frente.


Mesmo já estando na cidade desconhecida, com tudo mudando tão rápido, eu ainda pensava no garoto do avião, imaginava se eu o encontraria novamente. Perguntava-me se eu estava querendo aquilo, ou se apenas estava pensando na hipótese. Uma coisa rápida que se passa na mente.


Sacudi a cabeça.


Não, era apenas um pensamento bobo.


Quando estávamos já perto de sua casa, um colégio grande me chamou atenção. Ele era de quatro andares e largo. Nele, muitos entravam e saiam então à primeira pergunta que me veio em mente: Será que é esse é o meu novo colégio?


Foi então que minha mãe logo respondeu minha pergunta.


- Filha, esse é o seu novo colégio. Sua tia disse que você vai ficar na sala do seu primo. Não é maravilhoso? – Falou animada


Acho que quero me jogar em um poço – Pensei.


Sophie, pelo menos parecia bem mais animada do que eu. Especialmente pelo fato de o porquê não iríamos precisar usar uniforme nesse colégio. O que também me deixava aliviada.


 


- Vamos Anne! – Falou minha mãe quase gritando, que já estava fora do táxi – Só não me diga que você agora quer morar dentro de um táxi, por favor!


- Calma mãe, ela só deve está pensando no namorado novo – Provocou Sophie, dando um risinho malicioso.


- Que namorado? – Perguntei. Saindo do táxi.


- O ruivinho que ajudou você com ás malas bobinha.


- Ele não é meu namorado!


- Quem é seu namorado? - Perguntou minha mãe, se virando para me olhar.


- NINGUÉM!


Quando finalmente sai do carro. Engoli seco, meus olhos se arregalaram ao ver a enorme casa de minha tia. Nunca havia visto casa mais bonita que aquela. Toda branca, de dois andares, uma estrutura antiga que me encantou. O que eu mais amava, era casas com estruturas de antigamente, pareciam ser tão mais perfeitas dos que as atuais que parecem ser sem vida. Aquela eu diria que estava mais pro ano de 1737.


Havia no segundo andar duas varandas e ao lado direito, outra bem escondida pelas árvores, pude notar que um galho grosso á invadia.


A grama que a rodeava era brilhante e bem verdinha.


Sophie e minha mãe começaram a caminhar ate a enorme casa.


Mas eu permaneci parada como uma estatua. Paralisada com tanta fantasia que aquela casa trazia para meus pensamentos.


Uma gota acabou caindo na ponta de meu nariz, que me fez voltar a si. Olhei para o céu, e suas nuvens estavam acinzentadas, ao olhá-las, a imagem daquela lua veio em meus olhos.


Então a chuva começou a cair sobre mim.


- Anne! Saia da chuva! – Gritou minha mãe já em frente à porta da minha tia.


Mas não me movi um centímetro.


 


Quem atendeu a porta foi um rapaz. Uns 20 cm mais alto que eu, como ele estava sem camisa, vi seus músculos bem definidos sua pele bem bronzeada. Aproximei-me mais até poder vê-lo com mais clareza, vi nele alguma coisa bem familiar, mas não sabia o que. Dei mais alguns passos e depois de um tempo curto finalmente consegui reconhecê-lo.


Will, seus cabelos loiros queimados agora eram curtos, não vi mais nele nem a metade daquele menininho de antes.


Não entendia o motivo, mas não queria que ele estivesse completamente mudado, queria que ele me olhasse como olhava antes, que não desviasse seu olhar de mim nem por um segundo.


Estava sentindo atração física por ele?


Isso eu não esperava nem um pouco de mim. Tentei arrancar isso da minha cabeça a todo custo enquanto caminhava ate a porta, deixando a chuva me deixar mais molhada do que eu já estava.


- Anne! Veja como você está toda molhada! O que deu em você? – Reclamou minha mãe. – Quero vê se você pega um resfriado! – E voltou sua atenção para Will. – Querido, quanto tempo, veja como você cresceu! Está tão bonito... - Disse minha mãe, dando um leve tapinha em seu rosto – Você deve lembrar de suas primas, Sophie e Anne, não? Faz tanto tempo que vocês não se vêem...


Conclui naquela hora que minha mãe era uma pessoa muito estranha e esquisita.


Will devia ter percebido também, mas apenas fez que sim com a cabeça, e sorriu timidamente para nós.


Seus lábios, eram um pouco mais carnudos em baixo do que em cima, estava com a barba mal feita e seus olhos...


- Acredita que Anne não se lembrava de você? – Informou minha mãe.


Comentários desnecessários deveriam ser ignorados e esquecidos, isso daria uma boa lei.


- Christine! – Se ouviu o grito de Silvia dentro da enorme casa, correndo de braços abertos para abraçar minha mãe com toda a força que tinha.


As duas se abraçaram por longos minutos, parecia que ao invés de oito, não se viam há mil anos. Minha mãe sempre me dizia que ela e minha tia eram como eu e Sophie, melhores amigas. Quando pequenas, falavam que iriam morar juntas quando fossem maiores, mas o trabalho de Silvia acabou afastando as duas, mais do que se podia imaginar. Minha tia veio pra Belém, onde conheceu meu tio, e minha mãe ficou em São Paulo com meu pai, as duas acabaram perdendo muito contato por causa disso, minha mãe mal parava em casa por causa do trabalho, então não conseguia retornar as ligações de minha tia. Eram raras as vezes que conseguia, agora finalmente, depois de tantos anos, se reencontraram.


- Pensei que tinham mudado de idéia e não vinham mais – Disse minha tia.


Bem que eu queria – Pensei.


Depois do longo abraço, minha tia se dirigiu a mim e Sophie, ela nos agarrou em um único abraço, e nos apertou juntas, por um momento pensei que ela ia nos apertar ate eu e Sophie botarmos tudo para fora.


Silvia era extremamente forte, e quando estava emocionada ou empolgada, não sabia controlar sua força.


- Minhas queridas, como vocês cresceram! Anne você esta toda molhada! O que aconteceu? Vieram nadando até aqui? – Falou se segurando pra não rir da própria piada que fizera.


Sophie ainda tossia descontroladamente por causa do abraço.


Eu respirava devagar pela boca pra tentar controlar.


- É que ela esta meio lenta hoje – Comunicou minha mãe em seu ouvido, sorrindo para disfarçar. Colocando sua mão no meu ombro.


 


Olhei ao redor. Sua casa era de cair o queixo, linda, com um aroma de rosas pelo ar, cheia de quadros e principalmente flores de todas as cores e formas. As escadas de mármore eram gigantescas, o piso era um azulejo branco sem nenhum risco.


- Estão tão lindas... Aposto que as duas já têm namorados. – Comentou, apertando minhas bochechas até ficarem vermelhas.


A verdade, das mais puras por incrível que pareça, é que eu nunca havia tido um namorado, talvez alguns flertes, eu não tinha jeito pra coisa, eu não necessitava de saliva, e não era... Romântica, eu estava mais pra uma anti-romântica, mas Sophie sim. Namora desde os treze anos, quando deu seu primeiro beijo com um cara cinco anos mais velho que ela – O que não me surpreendeu. Sempre que estava com um namorado, ou de olho em alguém, eu era a primeira, a saber. Sentia-me a privilegiada.


- Anne conheceu o dela hoje! – Disse ela.


O que era isso? Vingança por deixá-las mofar no silêncio? Talvez nunca tivessem ouvido falar em vingança é um prato que se come frio.


- Eu não estou namorando NINGUÉM!


Mas Silvia apenas riu e deu uma piscadela para Shopie e minha mãe.


- Vá logo se trocar antes que pegue algum resfriado. Will mostra o caminho.


 


Will que ainda se mantinha calado todo esse tempo, e agora não ficava mais me encarando, ou pelo menos, bem discreto. Silvia fazia questão de ir pessoalmente mostrar o quarto de minha mãe, que ficava naquele mesmo andar, quase ao lado do dela. Estavam doidas para ficarem sozinhas desde a hora que se encontraram.


O meu quarto e o de Sophie ficava no andar de cima, o mesmo andar que o quarto de Will.


Nós subimos as enormes escadas de mármore. Quando chegamos, paramos em frente à primeira porta a esquerda.


O segundo andar era parecido com o primeiro, era cheio de portas brancas, com fechaduras de ouro brilhante, flores pra todo o lado


Quando a porta se abriu, me deparei com um palácio, o quarto era dez vezes maior que o meu em São Paulo. As paredes de cor rosa bem claro, a cama de casal, e um armário branco que ocupava toda a parede, havia uma escrivaninha simples e do lado dela um espelho pendurado na parede, sua moldura era banhada em ouro branco. Um pouco longe havia outra porta que dava para uma varanda, ela era grande de duas portas e de cada lado uma cortina branca a cobria, em sua parte superior, vidraças coloridas. Eu e Sophie entramos no quarto deslumbradas. Ela não perdeu tempo, pulou direto na cama onde enfiou o rosto entre os travesseiros, não escondendo sua felicidade.


- Nós duas vamos ficar nesse quarto? – Indagou ela com os verdes de seus olhos pegando fogo.


Mas Will não respondeu, deu um leve riso, apenas botou as malas dela na cama enquanto as minhas permaneceram em suas mãos, logo nos dois saímos do quarto e quando a porta se fechou, pude ouvir seu grito de felicidade.


Ele foi se dirigindo agora para a outra porta que ficava ao lado direito do quarto de Sophie, a porta a frente da sua. Para abrir a porta dessa vez, ele usou uma chave velha e enferrujada, o barulho da tranca se abrindo parecia tão alta que se dava para ouvir do lado de fora da casa.


Vendo-o por dentro, aquele quarto não parecia ser tão diferente, era do mesmo tamanho e tudo que havia lá tinha no outro quarto: a cama de casal, o armário, a escrivaninha e um espelho, mas notei que esse era maior, ao lado da cama tinha uma varanda, mas essa não tinha nenhuma porta apenas cortinas amarelas. Entrei no quarto, fui direto até ela, e um vento gostoso bateu na pele do meu rosto, e não entendi o porquê ele me fez sentir uma saudade de meu pai, foi como se eu pudesse senti-lo de novo, me abraçando, dizendo que eu era apenas sua.


Pude ver que um galho grosso a invadia, então percebi que essa era a mesma varanda escondida entre as árvores que eu havia visto.


- Anne? – Chamou uma voz atrás de mim.


Olhei para trás e vi Will, e atrás dele mais ninguém. Então aquela voz só poderia ter vindo dele, quase não acreditei, era primeira vez que eu a ouvia, algumas vezes eu teria imaginado que poderia ser mudo ou apenas tinha vergonha de sua voz, mas ela encantou meus ouvidos, como poderia sentir vergonha?


Ok. Eu sei que era quando ele era criança e que sua voz engrossou agora, mas não devia ser tão ruim.


Fiquei olhando para ele sem dizer nenhuma palavra. Meus lábios estavam meio abertos.


Dessa vez a muda era eu, não conseguia pensar em nada para dizer para ele.


Sua mão estava estendida segurando a chave.


- O banheiro fica no final do corredor. Meu quarto é o da esquerda da sua irmã, se você precisar de alguma coisa é só bater lá.


- Ah... – Foi o que eu consegui dizer.


- Então... A gente se vê no jantar.


Eu estava sem palavras, com certeza ele não era mais aquele menino calado.


 


Após ele sair do quarto. Dei novamente uma olhada naquele lugar. Até que poderia não ser tão ruim morar ali, mas mesmo assim ainda estava chateada por ter vindo. Fui até a frente do espelho e dei uma boa olhada para o meu reflexo e vi um rosto conhecido, uma garota de cabelos ate os ombros, cacheados e negros, olhos grandes de cor castanho escuro – Infelizmente puxei os cabelos de meu pai, mas o resto tudo da minha avó – magra, sem graça, azarada – De fato, meu pai tinha olhos azuis, minha mãe tinha verdes cor de meleca ( não tenho obrigação de saber o nome daquela cor), e eu nasci com olhos praticamente negros, ah, sim graças a minha avó – , vestida com roupas comuns – e molhadas – e tinha uma vida comum.


Melhor que isso eu não consigo ficar - Pensei.


Foi então que me aproximei, olhei para a moldura do espelho, sua moldura era prata cheia de desenhos de criaturas místicas esculpidas. Passei meus dedos de leve sobre eles, conseguia sentir seus rostos, todas as suas características. Estava tão concentrada na minha avaliação que tomei um susto quando ouvi um barulho vindo das árvores. Fui até a varanda, mas não havia nada além delas, olhei para o lado onde estava à rua, mas nada apareceu.


- O que estar procurando? – Surgiu Sophie.


Ao vê-la lá tão rápido e tão de repente. Dei um pulo pra trás quase caindo.


- Não sabe bater antes de entrar? – Suspirando rápido, com a mão no peito.


- E você? Já aprendeu a parar de ouvir atrás da porta? – Ai. – Calma, eu não quis assustá-la. Eu apenas queria...


- Mas assustou! – A interrompi.


- Você ainda ta brava por causa da mudança?


Eu não respondi.


- Anne. Me desculpe. Eu só estava pensando no que era melhor...


- Melhor pra quem? – A interrompi de novo.


Sai de perto dela e fui ate a minha mala que estava na cama.


Comecei a jogar as roupas dentro do meu novo armário, não me importando se ficariam amassadas ou desarrumadas eu ia bagunçar tudo de qualquer maneira.


Ela andou pelo quarto até finalmente se sentar na cama, do lado de minha mala aberta.


- Vai ficar quantos dias sem falar comigo? – Perguntou, pegando algumas roupas minhas e as dobrando com delicadeza como sempre fizera. Sempre foi a mais organizada também.


É eu sei, deu pra notar.


Dei uma olhada fria para ela, que estava de cabeça baixa fazendo bico enquanto ajeitava as roupas.


- Não adianta fazer bico! Isso não funciona mais – Pensava que não.


Ela me olhou, fazendo um bico maior ainda. Fingindo que a qualquer hora ia se afogar em lagrimas. Isto com certeza era um truque mais do que sujo. Revirei os olhos, desde pequenas sempre que eu ficava com raiva dela, ela fazia bico para mim, eu sentia um enorme sentimento de pena quando fazem bico pra mim. Eu odiava quando ela fazia isso.


- Odeio quando você faz isso pra mim...


- Eu sei - Agora ela já estava segurando o riso.


Joguei as roupas que eu segurava no chão e pulei em cima de Sophie. Sentando em seu colo. Afogando meu rosto em seus cabelos lisos enquanto meus braços a apertavam mais em mim, nós duas estávamos rindo de nós mesmas. Eu e ela não tínhamos capacidade de sentir raiva uma da outra por muito tempo, e eu sinceramente odiava não conseguir sentir raiva dela. Reconheci então que estava mesmo sendo egoísta com minha mãe, eu só queria vê-la feliz, e se a felicidade dela estava em Belém, o jeito era definitivamente aceitar.


 


*****


Quando todos nós estávamos reunidos na mesa de jantar, ficamos em silêncio enquanto minha mãe e minha tia conversavam sem parar. Desde que meu pai faleceu, nunca mais havia visto minha mãe tão alegre dando boas risadas como ela estava naquela noite. Sophie tinha mesmo razão, ela seria feliz aqui. Nós três só ficamos trocando olhares enquanto as duas tagarelas conversavam. Eu sentia vontade de sorrir ao ver minha mãe daquele jeito.


Como pude ter sido tão egoísta?


Resolvemos em seguida que iríamos jantar na cozinha para deixar as duas sozinhas.


 


- Já sabe o que vai fazer na faculdade Will? – Perguntou Sophie. Mergulhando sua colher em um sorvete de chocolate.


Desde que havíamos chegado Will mal me olhava. Parece que minhas orações antigas finalmente haviam sido atendidas.


- Não, ainda não me decidir.


- Eu estava pensando em fazer medicina, mas ainda não tenho a certeza.


- E você Anne, já sabe o que vai querer fazer? – Indagou ele. Lançando-me um olhar que talvez tenha me feito babar nem reparei.


- Ah, jornalismo, mas também ainda não tenho certeza. Minha mãe quer que eu faça algo que dê lucro.


- E ela tem razão Anne... – Completou Sophie.


- Minha mãe também fala a mesma coisa... Ela quer que eu mantenha essa casa, pra ela, essa casa é a vida dela, mas não consigo entender o que tem de tão especial aqui.


- Essa casa é enorme, se fosse minha também ia querer a mesma coisa - Disse Sophie se levantando. – Bem, eu já não sei vocês, mas eu já vou dormir.


Dizendo por fim e nos deixando sozinhos.


Nos entre olhamos por alguns minutos. Para ser honesta, também gostaria de saber, o que poderia ter de tão especial naquela casa, além do luxo.


Will também levantou, mas foi para retirar os pratos.


- Eu ajudo você – Me levantando, recolhi meu prato e o da folgada.


- Minha mãe não gosta de empregadas, há muitas coisas na minha mãe que eu não consigo entender.


- Ela pode ser apenas desconfiada.


- Depois do meu pai, acho que ela chega a ter realmente um motivo pra ser tão desconfiada.


- As pessoas podem mudar.


Ele me olhou, e sorriu o mesmo que havia dado quando nos recebeu.


- É. Acho que podem sim.


Sorri timidamente pra ele, enquanto colocava os pratos na pia.


- É a primeira vez que ouço sua voz. – Comentei.


- Eu era pequeno, eu estranhava muito as pessoas, na verdade eu ainda estranho só que tento ser mais educado e comunicativo. Não gosto de conversar com garotas, mas isso também era só quando eu era pequeno.


- Ah, isso explica porque não conversava comigo.


Ele riu alto, e fez uma careta de surpresa.


- O que foi?


- Nada de importante, apenas lembrei-me de uma coisa boba. Bem, acho que também já vou dormir, amanhã tem aula.


- Do que lembrou – Quis saber


- Você mandando língua pra mim e fazendo uma cara estranha.


Como é? Eu não me lembro disso.


- Eu mandava língua pra você?


- Quase o tempo todo.


Senti meu rosto corar, eu realmente não lembrava nada disso.


- Você esta na minha sala, não é? – Tentei mudar de assunto.


- É. Infelizmente perdi um ano no colégio por causa dos meus pais. Mas acho que foi ate melhor assim. Não me dou muito bem com os caras que são da sala de Sophie.


- Por quê?


- Coisa de garoto. – Disse sem me olhar.


- Bem vou indo. Não quero me atrasar logo no primeiro dia. Seria um péssimo começo pra mim – Abaixei o olhar e fui andando ate o hall.


- Anne...


O olhei.


- O primeiro dia não é tão ruim.


- Espero que não seja... Will... – O chamei.


Ele se virou e me olhou.


- Você vê seu pai?


- Às vezes sim, eu não gosto muito.


- Vamos ser honestos, ele foi um verdadeiro canalha com minha mãe, eu a vi sofrer a cada segundo porque ele resolveu que queria ter uma aventurinha com a secretaria.


- Mas ele continua sendo seu pai...


- De sangue, isso eu não tenho escolha.


Continuei olhando para ele. Perder um pai por morte, não temos escolha, temos apenas que aceitar, mas perder o pai porque ele errou, estava fora de cogitação pra mim.


Do outro lado, na outra sala, ainda podia ouvir um pouco da conversa da minha mãe e da minha tia. Falavam sobre bolos mal feitos. E cada comentário uma risada e um sorriso novo.


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Notas finais do capítulo

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