The Hikers Dead - Infecção escrita por Gabriel Bilar


Capítulo 28
Planejado


Notas iniciais do capítulo

Desculpem a demora pra postar, andei meio ocupado nos últimos dias, enfim, espero que gostem do cap!



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POV – Ana

A promessa de esganar Claire quando voltasse ao apartamento era o que me mantinha seguindo em frente. O leve latejar na coluna era capaz de reforçar isso. Tentei me lembrar de tudo o que acontecera até que eu viesse parar ali, num corredor de uma casa comum, sustentando um homem adulto com a lateral do meu corpo enquanto este atira em três zumbis que avançam em nossa direção.

Victor não precisava da minha ajuda na maior parte do tempo, a ferida na perna esquerda obrigava-o a apenas se escorava em mim quando precisávamos correr ou quando ele resolvia disparar diversas vezes seguidas contra os infectados.

Os mortos pareciam não ter fim. Toda vez que nos virávamos tentando respirar por um ou dois minutos, acabávamos nos deparando com mais. E eles não estavam dispostos a perder a refeição, agarravam e procuravam morder qualquer parte desprotegida dos nossos corpos. A sorte era que Victor me protegia e vice-versa.

Se é que isso pode se chamar de sorte, pois por mais que eu o deixasse se escorar em mim e por mais que ele tenha me ajudado algumas vezes hoje, não conseguia confiar nele. Tentava mesmo acreditar que Claire estava certa e aquele homem era uma boa pessoa, mas não conseguia. Ao seu lado, sentia-me inevitavelmente inquieta.

- Ana? – chamou ele e nem percebi que havíamos parado de nos mover. – Tudo bem? Quer descansar um pouco?

- Não aqui. – respondi. O lugar parecia seguro depois que as criaturas foram erradicadas, mas eu vi o quarto de bebê duas portas atrás, e também reparei no papel de parede manchado de sangue, só isso bastou para me convencer de que toda aquela casa não era um bom lugar para descansar.

À luz do dia, os cabelos de um tom entre loiro e castanho de Victor pareciam diferentes do que vi dentro da casa, iluminada apenas por feixes de sol irregulares. Eles brilhavam, dando um ar feroz ao seu rosto. Ele reparou meu olhar e perguntou:

- Que foi?

Balancei a cabeça, quase o ignorando.

Aproveitei para recuperar um pouco o fôlego quando Victor e eu adentramos outra residência pequena, apenas um andar com dois quartos, sala, cozinha e banheiro. Victor arrombou a porta e foi direto na direção dos armários na cozinha, atirando em um zumbi magro sem pernas no caminho. Acomodei-me em um sofá, respirando com dificuldade, uma gota de suor escorreu pela lateral da face e me perguntei o quão longe estávamos de conseguir a quantidade suficiente de alimentos.

- Droga – exclamou Victor. – Já tiveram a brilhante ideia de levar os alimentos dessa casa. Não tem nada para nós aqui.

Era a terceira ou quarta vez que nos encontrávamos naquela situação. Os mercados já haviam sido saqueados ou estavam lotados de zumbis, de modo que nem compensava revistá-los, mas a situação nas residências também era complicada.

- Quanto já conseguimos? – perguntei e temia a resposta.

- Menos da metade, talvez um quarto do que precisamos. Não foi uma manhã muito produtiva.

- Jura? – perguntei ceticamente. – Não acho que vamos encontrar o que precisamos até o fim do dia.

Victor resmungou algo e em seguida disse para nos apressarmos. Levantei do sofá, sentindo um leve desconforto na perna esquerda, imediatamente puxei a barra da calça para cima, procurando por sinal de mordidas. Victor me olhava com atenção.

- É só uma dor muscular – falei irritada. – Vamos!

Enquanto atravessava o batente da porta, tive a ligeira impressão de que Victor resmungara: “Logo terei o que preciso para fazer meu dia valer a pena”.

Victor fuçou dentro da bolsa por um instante e me jogou uma maçã.

- Tome. Seu almoço. – disse ele.

Agarrei a fruta sem falar nada, sem me dar ao trabalho de agradecer.

A rua por onde passávamos agora, estava deserta, com exceção dos corpos, largados ali para expelir o cheiro de sua decomposição. Evitei olhar para aquelas cenas de morte e destruição, mas era impossível não gravar uma ou outra. Partes mutiladas, cabeças separadas por metros dos respectivos corpos, costelas à mostra; jovens, velhos, gordos, magros, ricos, pobres, todos vítimas da mesma tragédia. Ao mesmo tempo em que tentava engolir os pedaços da maçã, fazia um esforço considerável para não colocar tudo pra fora.

Victor e eu cruzamos a esquina despreocupadamente, e quase caímos para trás com a cena.

Desorientados, olhando para todas as direções sem nada ver realmente: Dezenas de infectados.

Victor começou a recuar imediatamente, na ponta dos pés, e imitei seus movimentos. Meu coração estava a mil e realmente acreditei que íamos nos safar dessa, quando um deles olhou na nossa direção. Apenas um. E avançou. Sorri, podíamos lidar com um zumbi sem dificuldade alguma. Mas então algo curioso aconteceu. As demais criaturas também se moveram, não em conjunto, mas algumas de cada vez, imitando o primeiro morto.

- Ana... – começou Victor.

- É. Eu sei. – Deixei Victor se apoiar em mim e passamos a uma caminhada rápida, com ele atirando para trás sem nem mirar direito.

- O que... vamos... fazer? – perguntei, com certo desespero na voz.

Ele olhou ao redor, os olhos ágeis vasculhando a fachada das casas e prédios. Por fim apontou para um prédio espremido entre duas outras construções e imediatamente aceleramos o passo naquela direção.  Sentia dor em locais que mal sabia que existiam e, pela cara de Victor, ele não estava nada melhor, a ferida na perna esquerda cobrava seu preço e quase senti pena do homem. Talvez eu estivesse sendo injusta com ele todo esse tempo.

Faltavam apenas uns poucos metros até a porta do prédio, logo estaríamos em segurança. Foi quando senti um peso me impulsionando na direção do chão, imediatamente levei as mãos à frente do corpo para aparar a queda, enquanto sentia Victor se afastando cada vez mais de mim. Pontos negros piscaram no meu campo de visão antes de tudo sumir de vez e eu entrar em desespero instantaneamente. O que estava acontecendo?

Voltei a mim da maneira mais confusa possível, meus ouvidos zumbiam preenchendo o vazio da minha mente e sentia o rosto ardendo, em algum lugar por perto, jazia uma maçã parcialmente devorada.

- Vic...? – tentei falar e senti um gosto ácido, aquilo fora a gota d’água para impulsionar minha ânsia.

Quando terminei, pensei que não podia estar mais ferrada. O arder no rosto fora provocado, percebi, pelos óculos espatifados com a queda, seria difícil, se não impossível, encontrar um substituto. Meu estômago ainda revirava e eu vomitaria uma segunda vez, se tivesse o que vomitar. Porém, só entendi a real gravidade da situação quando vi Victor caído, lutando com uma infectada magra de uns vinte e tantos anos. Deduzi que ela deveria ter nos feito cair. A queda nem era o problema real, e sim, a perda da vantagem que tínhamos antes, o restante dos mortos-vivos estava prestes a nos alcançar.

- Eu tenho um plano! – gritou ele enquanto se livrava da infectada com uma coronhada que lhe abriu o crânio podre, derramando líquidos suspeitos sobre o peito de Victor. Ele tornou a se levantar.

- Que plan... – Estava prestes a concluir a pergunta quando vi a arma de Victor apontada na minha direção e entendi o plano. O real plano, que estivera na cabeça de Victor desde que deixamos o apartamento aos primeiros raios de sol. O plano sobre o qual alertei Claire e ela não acreditou.

Um disparo...

POV – Claire

Tudo aquilo era tão... terrível, tão amedrontador. Encarei a tela do laptop sem acreditar, não podia ser verdade. Mas era, e o cômodo ao meu redor provava isso.

Victor e Ana haviam acabado de sair, para minha sorte, pois duvidava que fosse conseguir encarar Victor naturalmente depois daquilo.

Quando os dois já estavam longe, segui a seguinte linha de raciocínio: Se Victor não tiver nada a esconder, não há porque ficar bravo com a invasão do cômodo. Mas ele tinha, e não conseguia sequer imaginar qual seria sua reação quando soubesse que eu descobri seu segredo.

Ao entrar no cômodo, não esperei encontrar nada de mais, talvez um quarto para guardar coisas antigas, como fotos e livros velhos... Estava completamente enganada. Sim, havia fotos, antigas e recentes, mas não o tipo de foto que eu gostaria de ver.

Ainda mais espantada fiquei ao notar o notebook em uma escrivaninha de canto, ao lado de instrumentos de metal brilhantes que evitei encarar por muito tempo. Agarrei o computador, quase prevendo o mal e o iniciei. Imaginei que ele estaria seguro por uma senha, mas provavelmente, Victor nunca imaginou que fosse ser descoberto por ninguém. Nesse ponto, percebi sua mascarada arrogância.

Não sei o que me chamou a atenção naquela pasta em especial, mas me vi direcionando a seta naquela direção. Cliquei, e dessa vez, o computador exigia uma senha. Xinguei. Ao lado do campo havia uma informação. Digite sua senha (6 dígitos). Sabendo que não ia acertar, coloquei uma sequência de letras e números qualquer. Claro, não funcionou. Então pensei um pouco, o que, com 6 dígitos Victor poderia usar como senha? Com um arrepio, digitei CLAIRE e presenciei o computador reagindo e permitindo meu acesso. Victor era daquele tipo de pessoa de sempre trocar a senha de tudo a cada pouco tempo.

O melhor seria se eu nunca tivesse acertado a senha.

Aquela pasta, descobri, continha uma porção de vídeos, cada um com um nome diferente, cliquei em um aleatoriamente, nomeado de Danilo e percebi do que se tratava. O tal Danilo era um homem de meia-idade, no vídeo, seu rosto sangrava e ele fitava a câmera com desespero, enquanto uma voz perguntava quais eram suas últimas palavras. A voz de Victor.

O mesmo padrão se seguia nos outros vídeos que olhei, com outras vítimas, e percebi o que estava tão claro quanto água, pelo menos agora: Victor era um psicopata. Um estranho psicopata que insistia em gravar as últimas palavras de suas vítimas.

De repente, era como se eu tivesse claustrofobia, todo aquele cômodo, com os instrumentos brilhantes de tortura, as fotos ao lado de nomes de pessoas que iam ou foram assassinadas... Aquilo me sufocava.

Deixei o local com lágrimas de incredulidade rolando pelo rosto. E o pior de tudo, há menos de uma hora, eu entregara Ana a um assassino. 


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Notas finais do capítulo

Uma breve explicação: Os dois POVs não se passam simultaneamente, sendo que o POV da Ana acontece por volta do meio-dia e o da Claire aproximadamente meia hora depois de Victor e Ana deixarem o apartamento e.e

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