Souls escrita por Beffs


Capítulo 4
Capítulo 4




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            O garoto acordou assustado após uma noite sem sonhos. Não se lembrava da sensação de dormir e acordar sem passar por nada entre os dois. Ainda desnorteado, partiu para seu ritual matinal. Fora ao banheiro e, ao chegar na cozinha, lembrou-se que não estava em sua casa, surpreendendo-se com a presença feminina no recinto.

            - Mal dormiu uma noite aqui e já se deu a liberdade de andar só de cueca pela minha casa? Tenha mais respeito, por favor.

            Joe correu ao quarto onde dormira, envergonhado, e colocou novamente suas roupas. Voltou a cozinha e deparou-se com um café da manhã incrível. Lea encorajou-o a comer bem, dizendo que ele precisaria de todas as suas energias se ele quisesse sobreviver àquele dia. Ele, após ver o que ela era capaz de fazer, não duvidou de suas palavras e se alimentou como se não comesse há anos.

            Ao terminarem sua refeição, ela pediu para o garoto se preparar pois eles estavam de saída. Lea foi ao seu quarto, suspirando e pensando na fria que seu chefe a colocara. Tudo por culpa daquele erro. Aquele erro custara muito para ela, mas ela decidiu parar de pensar nisso e aceitar seu trabalho, grata por ainda fazer parte da Ordem. Abriu seu guarda-roupa e colocou roupas confortáveis, pegou seu arco e chamou o garoto para saírem.

            Saíram do prédio e começaram a caminhar. Joe já estava perdido, não conhecia aquela parte da cidade. A garota, no entanto, conhecia aquele lugar como a palma de sua mão.

            Shu apareceu repentinamente e pousou sobre os ombros da garota.

            - Você não acha que as pessoas acharão estranho ver uma águia empoleirada no seu ombro? – Perguntou o garoto, sem entender o descuido da garota.

            - Relaxa, novato, ninguém pode ver Shu. Se alguém vê-lo, esse alguém ou é um médium como nós, ou um outro espirito.

            - Como assim?

            - Um humano comum não consegue enxergar um espirito invocado, nem um espirito recém-chegado. Eles só veem o espirito se ele já se alimentou de força vital o suficiente e, acredite em mim, ninguém deseja essa visão.

            Joe se calou, temendo o que acabou de ouvir. O quão horrendas seriam essas criaturas que, primeiro invadem nossa dimensão à procura de nossas vidas e, quando se alimentam o suficiente, tomam proporções de fazer qualquer pessoa tremer. Ele queria poder esquecer tudo o que estava ouvindo, mas sentia que era tarde demais para isso. Sentia que nunca, em toda a sua vida, tivera alguma chance de escapar desse destino.

            A garota entrou em um beco e começou a correr. Joe acompanhou-a com muita dificuldade, mas não a perdeu de vista em meio àquele labirinto de vielas. Ela então parou.

            - Chegamos, novato.

            - E isso aqui é exatamente o que?

            - Aqui é um armazém da Ordem. Um dos vários que eles têm espalhados pelo mundo. Dentro dele temos espaço livre o suficiente para realizarmos o seu treinamento em segurança, além disso, se nós precisarmos de algum equipamento, ele estará guardado nesse lugar. Eles guardam de tudo por aqui. Agora, se afaste.

            A garota começou a se concentrar, o pássaro em seu ombro fez o mesmo. Ela apontou a palma da mão para a parede e fechou os olhos. Nesse momento, o circulo branco voltou a aparecer sobre os seus pés. Momentos depois, a parede começou a rachar.

            Joe se assustou com o que via. Foi quando percebeu que a parede não estava rachando de fato. Era como se houvesse um véu transparente cobrindo-a, e era esse véu que estava se rasgando.

            As falhas tornaram se maiores e maiores, criando uma fissura. Quando ele olhou pela fissura, viu uma porta, onde momentos antes existia apenas parede. Joe entendeu, então, o que se tratava aquilo. O armazém se localizava em outra dimensão, e a garota estava abrindo uma passagem para eles. Ela abriu a porta e chamou o garoto.

            - Anda logo, novato, a fissura se fechará em pouco tempo.

            Ele, apressado, entrou no armazém, vendo a fissura fechar-se as suas costas.

            - Bem vindo ao pesadelo, novato. – Gritou Lea do outro lado do salão vazio em que se encontravam. – Você vai passar muito tempo aqui!

            Ela ligou um rádio que se encontrava atrás dela, estava tocando Red Right Hand do Nick Cave & The Bad Seeds. Ele jurou ter escutado a garota falando o quanto amava aquela musica, contudo, quando foi pergunta-la para ter certeza do que ouviu, viu-a se preparando para atirar em sua direção. Percebeu que ela estava com aquele sorriso maníaco que o aterrorizava e percebeu que não se tratava de uma brincadeira.

            Lea soltou a corda e uma flecha de luz cruzou o salão, passando a milímetros do rosto de Joe, deixando atrás dela uma fina linha de sangue, resposta do corte superficial que causara.

            - É novato, vai ter que ser mais rápido do que isso se quiser sobreviver por aqui. – Falou enquanto puxava a corda, fazendo surgir mais uma flecha entre a corda e a haste.

            Joe, que já entendera que aquilo não era mentira, percebeu que sua única alternativa naquele momento era correr, correr e ganhar tempo para pensar em um plano. E foi o que fez.

            Ela atirou mais uma vez, dessa vez para matar. Percebeu que o garoto tomou a decisão correta, ele correu. A flecha cruzou o ar no local em que o garoto estava há segundos atrás. O único dano causado pela flecha foi um furo na camisa do garoto, que estava desabotoada. Lea sorriu e teve a certeza que esperara, aqueles próximos dias seriam muito divertidos. Começou a rir e preparou mais um tiro, ela estava, de fato, se divertindo.

            O garoto percebeu a proximidade que o último tiro passou de seu corpo. Precisava pensar em algo para se defender, compulsivamente olhando ao seu redor, procurando algo que pudesse servir de escudo. Viu alguns barris parados a poucos metros de onde estava. Escutou uma risada angelical vindo do outro lado do salão, nunca imaginou que um som tão doce pudesse fazê-lo tão mal, trazê-lo tanto medo. O tom maléfico que a voz trazia o levava a loucura. Joe se escondeu atrás dos barris, e logo quando se sentou ele lembrou-se da força que aquelas flechas possuíam, foram capazes de ultrapassar o crânio de um ser sem dificuldade alguma. Levantou-se apressado e voltou a correr, ao fazer isso, ouviu o barulho de madeira sendo estraçalhada.

            - Achei que você iria continuar com a burrada, novato. Já estava ficando triste pensando que minha diversão iria acabar, pensei que iria morrer! – Gritou a garota entre risos, sem se deslocar nem um centímetro de onde estava.

            - Hoje não, vadia. Hoje não. – Retrucou Joe, já estressado com as atitudes daquela garota que achava que tinha o mundo sobre seus pés.

            Ele continuou a correr e percebeu que ia de encontro a uma parede. Pensou que se a garota ainda estivesse na mesma posição talvez ele ainda tivesse uma chance, não queria morrer ainda. Olhou para a direção dela somente para ver o vazio, ela não estava lá. Ou ele se distraiu e não percebeu o movimento dela ou ela era ridiculamente silenciosa, pensou. Algo em sua cabeça o dizia que a segunda opção parecia mais real.

            Parou e olhou pra trás, somente para confirmar seu maior temor. Lá estava Lea, parada, com o arco armado e pronto para atirar.

            - Ninguém te ensinou a respeitar os superiores, novato? Chamar-me de vadia não foi sua melhor escolha, isso eu te garanto. – Falou sem o sorriso no rosto, demonstrando que realmente desprezara a fala do garoto.

            Pronto, pensou o garoto, agora acabou pra mim. Já tinha perdido as esperanças de viver. Olhava para a garota, visivelmente com ódio do que ele dissera e, infelizmente, pronta para atirar. Nesse momento, sem esperança alguma, ouviu uma voz desconhecida em sua cabeça.

            - Você sabe o que fazer, não perca a esperança. Deixe-me ajuda-lo. – Disse a voz em sua cabeça.

            Joe assustado fez, sem saber como, o que a voz disse. Deixou seu corpo livre para ela. Sentiu sua mão direita se levantar, como se estivesse mandando a Lea parar. Sentiu algo estranho percorrendo seu corpo, algo estranhamente confortável. Era como se ele tivesse essa sensação durante a vida toda, mas a sentia de uma maneira diferente de como fazia agora.

            Lea disparou e, quando a flecha atingiu a mão direita de Joe, a flecha parou, fazendo apenas um pequeno furo no garoto. Lea olhou desacreditada, mas nem um pouco surpresa.

            Ele olhou atônito para o que estava acontecendo. O tiro que pensou que significaria sua morte parou em sua frente, e ele sabia que fora ele quem fizera aquilo. Via a flecha parada logo ali, sentia a ponta dela em sua mão.

            - Agora! – Disse novamente a voz em sua cabeça.

            Não sabia como, mas sabia exatamente o que devia fazer. Concentrou-se na ultima sensação que sentira, forçando-a a acontecer novamente. Sentiu que algo escapava de suas mãos, porém não via nada. Viu, entretanto, a flecha começar a se rachar. Ela quebrou-se em milhares de brilhos de luz, que foram caindo e esvanecendo-se até não existirem mais. Olhou para Lea e não acreditou no que viu. A garota, dessa vez, estava demasiadamente surpresa e, para a maior surpresa dele, ela estava, de certa forma, assustada.


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