Capitulo 5

Corações

Syaoran tinha razão, não deveriam ter saído da propriedade Li para principio de conversa. Não sabia o que fazer, só sabia que deveria ficar agarrada a blusa do chinês e não soltar mais.

_ Sakura, fique perto de mim.

Ela nem pensara em se afastar.

Syaoran relaxou um pouco a postura de luta e estendeu os braços para frente, fechando os olhos. Era como se estivesse para receber algo. Então, uma grande espada apareceu em suas mãos.

Sakura o viu puxando a espada longa e fina da bainha e posicionando-se em posição de luta. Os homens ao redor se afastaram um pouco, se perguntando de onde o garoto a tinha retirado. Eles quebraram garradas e pegaram cadeiras, muitos também tinham canivetes das mãos, correndo todos de uma vez contra Syaoran.

O garoto cortou os três primeiros atacantes com um golpe e pegou Sakura pela cintura, jogando-a do outro lado do balcão. Cautelosos, nenhum deles se aproximou. Se estivesse sozinho não seria problema, mas não podia se afastar muito, pois precisava proteger Sakura. Porem, ele se assustou guando ouviu a menina gritar seu nome, olhou para traz e viu um homem alto e rechonchudo segurando uma faca contra o pescoço de Sakura.

_Não se mexa garoto, ela pode se ferir! Agora, bem de vagar, largue a espada.

Relutante, Syaoran soltou a espada. Assim que sua mão soltou o cabo, um dos homens ao seu lado o chutou com força. Ele foi jogado ao chão recebendo uma chuva de golpes. Tudo o que o chinês podia fazer era colocar as mãos na cabeça para se proteger.

Sakura chorava vendo o garoto sem reação, ela tentava se livrar da faca em seu pescoço, mas apenas acabava se machucando. Sobre o balcão, estava o copo com o chá que estavam tomando. Ela pisou com força no pé do homem, que acabou afrouxando a faca, e pegou o copo em sua frente, jogando-o no mesmo. Pulou o balcão e pegou a espada, jogando-a por baixo para Syaoran.

Ele não pensou duas vezes, pegou a espada e cortou os homens ao redor. A lamina da espada começou a soltar uma pequena fumaça e, aos poucos, pegou fogo. O garoto afastou todos os homens em seu encalço e se juntou a Sakura novamente.

_Muito bom! Mas vocês, da família Li, não são os únicos a usarem magia.

De tudo o que poderia acontecer acabou acontecendo, pensava Syaoran. Talvez, por isso não se surpreendeu tanto assim quando o homem rechonchudo que tinha agarrado Sakura murmurou algumas palavras e estendeu a mão em sua direção. Porem, Syaoran conhecia aquela magia. Pulou sobre Sakura, desviando-se do ataque. A menina se assustou quando as cadeiras atrás deles explodiram.

Syaoran se levantou com Sakura e a puxou para mais longe do balcão. Não tinha outra escolha. Teria que conjura-lo e rezar para que a magia não saísse do controle novamente. Olhou para traz, a porta da taverna não estava muito longe, mas alguns homens estavam impedindo a passagem. Aquele seria o único jeito.

_ Sakura, quando eu mandar, corra em direção à porta.

_Mas... – ele a interrompeu – Não se preocupe com eles, apenas corra.

Não era bem isso que ela queria dizer, não poderia deixa-lo para trás.

_Estarei logo atrás de você.

Ela assentiu com a cabeça. Syaoran fechou os olhos e respirou fundo, colocou dois dedos na lamina que ardia em chamas, mas não pareciam queima-lo. Começou a murmurar palavras estranhas enquanto um grande símbolo se abria em baixo de seus pés. Sakura não o reconheceu, não era como a do mago Clow ou a dela. No centro havia o símbolo de yin yang como posição de sol, onde vários raios saiam dele. Ao redor, havia mais símbolos que Sakura não sabia decifrar por estarem em chinês, e que estavam dentro de dois quadrados desalinhados.

_AGORA!

Ela não soube o que aconteceu depois, apenas virou as costas e correu em direção à porta. Um homem ficou em sua frente, mas antes que percebesse um grande animal pulou em cima do mesmo. Era um lobo gigante de três chifres na testa que, assim como a espada, ardia em chamas. Mas era diferente, parecia que ele era inteiramente feito de fogo. Olhando para o animal, ouviu uma voz em sua mente.

_Corra!

Syaoran cortou o ar e lançou uma onda de fogo na taverna, dando uma distração para que fugissem. Invocou o animal que protegia Sakura e correu atrás dela. Seu olho direito ardia intensamente. Mesmo que tivesse usado a magia somente do esquerdo, sentiu o poder do outro olho vibrando. Por um instante, por causa da dor, fraquejou e quase caiu de joelhos.

Sakura corria na chuva com o gigante lobo ao seu lado. Ela olhou para trás esperando ver a silhueta de Syaoran, que apareceu logo depois, porem ele não era o único. Syaoran pegou Sakura pela mão e correu.

O lobo de chifres deu meia volta e pulou em cima dos homens que os perseguiam rugindo igual a uma besta, mas ele se desfez assim que derrubou alguns deles no chão.

_Temos que despista-los.

Syaoran corria com dificuldade, não bastava o olho que incomodava, mas também estava perdendo suas energias. A chuva atrapalhava sua visão, mas sabia que os homens que o seguiram estavam a uma boa distancia graças a seu amigo de fogo. Ele tropeçou e caiu.

_Syaoran, levanta! – Sakura podia ver o quanto o chinês estava desgastado. Esgotara todas as suas forças protegendo-a.

Ela ouviu os homens que os perseguiam se aproximando. Com esforço, ajudou Syaoran a se levantar e entraram num beco próximo.

Para o alivio de ambos, os homens passaram direto. O passeio daquele dia havia se tornado uma confusão, para a tristeza de Sakura. A noite já havia chegado e ambos estavam sentados atrás das latas de lixo, esgotados.

_Quem era o lobo gigante?

_Isso fica como parte do ensinamento. Te direi outro dia. – ele olhou para Sakura ao seu lado- Eu disse que ia terminar em confusão. E parece que sempre acabo molhado.

Ele olhou para o céu, que parecia que ainda tinha bastante água para oferecer. Ela riu ironicamente.

_Me desculpe! Você tinha razão...sobre as pessoas. – Seus olhos se encheram de lagrimas. – Desculpa.

_Você é culpada de estarmos molhados, mas não do que aconteceu lá trás. A culpa é das pessoas por serem tão gananciosas e egoístas a esse ponto. Porem, nem todas as pessoas são assim. – ele a encarou nos olhos – você não é assim.

Sakura nunca vira tanta sinceridade no garoto, estava tentando descobrir se ele estava falando a verdade, mas Syaoran se encolheu de dor e colocou a mão no olho direito.

_Você esta bem?

_Sim, foi só alguma coisa que entrou no meu olho.

Ele tentou se levantar sozinho, mas acabou precisando da ajuda de Sakura. Voltaram a caminhar lentamente, um apoiando-se no outro.

_Eu vou descontar isso no seu treinamento! – disse Syaoran.

_O que!?

Não sabiam que horas eram, mas sabiam que já era tarde da noite quando finalmente voltaram para as multidões que andavam pelas ruas, agora livres de guarda-chuvas. Mas para a miséria de Syaoran, as surpresas naquele dia ainda não haviam acabado. Não estando muito longe da residência Li, ele avistou um carro preto luxuoso que avançava pelo asfalto.

_Droga!

Syaoran empurrou Sakura contra um canto na parede, abraçando-a fortemente. Aquela era uma péssima hora para Yeilan voltar de viagem, ela não poderia vê-los ali, pois se tinham achado ruim enfrentar aqueles homens na taverna, enfrentar a fúria de Yeilan seria duas vezes pior.

_Syaoran, o que voc... – ele tampou a boca dela – Fica parada!

Sakura não sabia o motivo de seu coração estar batendo tão forte. Quando o carro passou frente a eles, Syaoran apertou Sakura e enfiou a cabeça no pescoço da menina, que se arrepiou com o gesto. Ela pode sentir o perfume de Syaoran, fechou os olhos e respirou fundo.

Como era maior que Sakura, sua imagem a tampava por inteiro. Assim que o carro passou, ele se desgrudou da menina e pegou sua mão.

_Temos que correr!

Eles correram para os muros da residência Li. Syaoran teve que fazer pezinho para Sakura pular. Entraram pela janela do quarto, pois nenhum empregado poderia vê-los pelos fundos. Syaoran tomou impulso e pulou usando o apoio da parede para segurar na beirada da janela, que por sorte não era tão alta. Depois ajudou Sakura a subir, puxando-a pelas mãos.

Ele abriu o guarda roupa e jogou um par de roupas para Sakura.

_Se troque antes que alguém suba aqui.

Sakura se trocou e não muito depois ouviu uma das empregadas batendo na porta.

_Srta. Sakura, A mestra Yeilan pediu por sua presença e a do jovem mestre imediatamente.

_Certo, já estou descendo.

Syaoran estava no banheiro, ela o viu de costas retirando a camisa, então pode ver o quanto seu corpo estava machucado, com cortes feios e hematomas.

O olho direito de Syaoran ainda estava dolorido. Ele lavou o rosto, e percebeu que Sakura ainda o observava, percorrendo os olhos por seu corpo. Sentiu sou rosto aquecer com aqueles olhos verdes sobre si e desviou o olhar.

_O que foi?

_Nada! Sua mãe esta nos chamando.

_Diga que estou no banho.

Sakura, vermelha, correu para o andar de baixo a encontro de Yeilan.

Yeilan estava sentada no sofá, tomando um chá verde quente para tentar aliviar o estresse. Sakura entrou na sala, nervosa.

_Sakura, onde esta Syaoran?

_Ele esta tomando banho.

_Seu cabelo esta todo molhado – Sakura pôs a mão na cabeça.

_Ah, há, há. Eu também acabei de tomar um banho, pois fiquei toda suja do treinamento.

Yeilan observou Sakura de cima a baixo.

_Sua relação com Syaoran tem melhorado ultimamente?

Ela já não sabia mais se sua relação estava melhor ou pior, os dois viviam brigando até então. Relembrou de como ele havia lhe protegido naquele dia e do abraço que tinham dado para se esconder. Sentiu seu rosto queimar.

Yeilan riu e falou.

_Parece que sim.

_Não, não é o que parece. Para que você tinha nos chamado mesmo? – disse a menina tentando mudar de assunto.

_ Oh sim! Realizaremos uma festa aqui daqui a dois dias, como um baile.

_Uma festa?

_Um evento para intensificar as amizades entre famílias que antes eram nossas rivais. E será nesse dia que apresentaremos o herdeiro da família Li e sua esposa. Vocês dois precisam passar uma imagem a todos da festa de que estão se dando bem, para mostrar os laços fortes da família Li.

_Laços fortes? – Sakura não tinha um bom pressentimento sobre isso.

_Você já pode ir dormir, deve estar cansada. Fale a Syaoran que quero velo assim que ele terminar, esta bem?

Ela consentiu e desejou uma boa noite, subindo as escadas. No meio do trajeto de volta para o quarto, Lieng voltava pelo mesmo corredor. Ele olhou para Sakura e sorriu. Não foi um sorriso simpático, seus olhos tinham um brilho perigoso mais intenso do que de costume, sentiu um calafrio ao passar por ele. Ela continuou seu caminho sem encarar o olhar que a seguia.

Quando entrou no quarto, Syaoran já estava deitado, mas ainda estava acordado.

_Sua mãe disse que quer falar com você.

_É melhor você tomar um banho para não se resfriar. Deite na cama hoje! Deve estar cansada.

Sakura pensou no que Yeilan tinha dito, sobre laços fortes. E perguntou-se sobre sua família. Quando Syaoran passou ao seu lado, ela segurou sua blusa, impedindo sua saída.

_Syaoran, você acha que minha família esta bem?

O garoto já imaginava aquilo, ela não admitia, mas sentia muita falta da família e acabava sofrendo silenciosamente.

_Tenho certeza de que sim – ela o largou – Va dormir!

Ela lhe desejou uma boa noite e fechou a porta.

Quando Syaoran procurou por Yeilan, encontrou-a no escritório dela.

( Chinês ON)

_Você me chamou mamãe?

Yeilan chegou perto de Syaoran, e tocou-lhe o rosto.

_Deve estar doendo, não é? – ele se surpreendeu – Você é muito imprudente Syaoran!

_Então você descobriu!

_ Vocês não são muito discretos. Agarrando uma moça inocente em publico, que coisa feia!

_NÃO, NÃO FOI ISSO!– ele tentou se explicar, ficando vermelho, mas Yeilan apenas riu – Espera, a senhora não vai ficar zangada?

_Isso pode ter melhorado o relacionamento de vocês! – Ela chegou perto de Syaoran e deu-lhe um tapa na cabeça – E isso é por ter desobedecido minhas ordens.

Ele esfregou a nuca da cabeça, ela realmente batia forte.

_Mas Syaoran, os conselheiros também ficaram sabendo do ocorrido. Vocês criaram muita confusão usando magia!

_Eu não imaginava encontrar uma pessoa que soubesse usar magia.

_Eles estão zangados com você!

_Mais do que já estavam? Nunca gostaram de mim mesmo!

_Querem que você realize treinamentos para aprender a controlar sua magia do olho direito!

_O que? Eu não posso. Já estou responsável pelos treinamentos de Sakura. Além do mais... – ele tocou no canto do olho dolorido.

_Eu entendo, mas não posso fazer nada. Desculpe-me! – Ela abraçou Syaoran, que ficou surpreso. Yeilan Li não era de abraçar ninguém. - Você vai ter que se esforçar, e também terá que proteger Sakura, eles a odeiam tanto quanto odeiam você.

_Porque ela não pode ver sua família?

_Mesmo ela sendo japonesa, eles querem cortar totalmente a relação que ela tem com eles. Acham que assim, a família não terá tanta mistura de etnia. Como se pudessem fazer a moça virar uma chinesa! – Disse ela.

Eles se afastaram e ficaram em silencio por um segundo.

_Ela é poderosa! –disse Syaoran – mais do que eu.

_Por isso foi escolhida para ser sua esposa!

_Acho que ela também tem o mesmo poder que Clow tinha, apesar de não ser uma descendente dele.

_Sim, ela tem! Sakura pode prever o futuro e o passado, mas esse não é o verdadeiro poder dela! Quem sabe, se conseguirmos despertar todo seu potencial, ela possa mudar as coisas por aqui.

Syaoran concordou com a cabeça. Yeilan contou sobre os detalhes da negociação entre as famílias e a festa que seria realizada há dois dias. Quando ele ia sair, ela disse.

_Syaoran! Sobre o passeio de hoje, um passarinho me contou.

Ela não precisava dizer mais nada, ele tinha entendido. Já deveria ter imaginado.

Correu para um dos quartos da casa que tinha uma plaquinha na porta, escrita “Meiling”. Ele entrou sem bater.

_Então foi você!? – gritou.

A garota de longos cabelos e olhos amendoados acordou, sem muita surpresa.

_Syaoran, querido! Veio dormir comigo?

_Não enche! Acho bom você não se intrometer nos meus assuntos, Meiling.

_Não eram seus assuntos! Você nem queria ir. – Ela resmungou, sem sair da cama.

_Por sua causa agora eu estou encrencado!

_Por sua causa, eu ainda estou sofrendo – disse ela com raiva – Era para eu ser sua noiva, Syaoran! E não aquela japonesa metida a besta.

_Cuidado com as palavras Meiling, eu realmente não estou de bom humor!

Ele lhe lançou um olhar feroz, que a fez tremer um pouco.

_Não é justo!

_A vida não é justa para ninguém!

Ele saiu batendo a porta do quarto.

(Chinês Off)

Entrando em seu quarto, viu Sakura sentada na cama.

_Por que ainda esta acordada?

_Não conseguia dormir.

Ele se aproximou e segurou o queixo da menina, ficando bem próximos. Ela sentiu a face queimar mais uma vez e desviou o olhar.

_Seu pescoço tem uns arranhões. Deve ter sido naquela hora. – Ele se referia à faca que fora posta em sua garganta.

Abriu uma gaveta do criado mudo e pegou algumas bandagens. Sentou-se ao lado de Sakura para colocar os curativos.

_Posso te fazer uma pergunta?

_Claro!

_Porque parece que você não odeia essa família? Depois de tudo o que fizemos?

Assim que ele terminou de colocar os curativos, ela abaixou o olhar para não encara-lo. Por sorte, o quarto estava com as luzes apagadas, então ele não poderia ver a vermelhidão em seu rosto.

_Não é isso! Eu realmente odeio essa família, e tenho certeza que ele também me odeiam. – Syaoran já esperava por aquelas palavras, mas não sabia o porquê de se sentir um pouco triste. – Porem, eu não odeio você e nem a Yeilan.

Ele se surpreendeu.

_Mas, por quê?

_Eu sei que a culpa de não poder ver mais minha família não é realmente sua e de Yeilan, apesar de ela ser a líder. Eu vejo em seus olhos, nos dela e também nos de Tomoyo algo que não vejo nos olhos das outras pessoas, talvez seja gentileza. Além do mais, você me protegeu hoje. Obrigada!

Ela sorriu para ele, que ficou vermelho mais uma vez.

_Ah! – ele sentiu uma forte pontada no olho direito, talvez ainda ficasse assim por alguns dias.

_O que foi? Ainda é o seu olho? – perguntou Sakura – Me deixe sopra-lo.

_Não, esta tudo bem!

Ela insistia em soprar o olho do garoto, mas ele não deixava. Então, ela segurou o rosto do chinês com ambas às mãos e o beijou no olho dolorido. Ele ficou sem reação.

_Meu pai disse que quando a gente beija um lugar dolorido a dor passa. Que é um tipo de magia.

Ele não respondeu, e ela o olhou nos olhos, percebendo o que havia feito.

_Ah, me desculpe. Foi uma reação involuntária!

_Tud... tudo bem! – Ele se levantou – É melhor irmos dormir.

_Mas, você não vai dormir na cama? – ela se corrigiu rapidamente – Eu posso dormir no sofá!

_Não, durma ai! – ele de deitou no sofá – Porem é só por hoje!

_Ah! Syaoran seu malvado!

Syaoran não sentiu o dor do olho passar, mas deitou-se com um pequeno sorrido no rosto.

Sakura acabou dormindo com a lembrança da conversa com Tomoyo naquela manha, sobre como eles não dormiam na mesma cama e que poderiam fazer uma troca. Naquela noite, ela realmente dormiu na cama no lugar dele, sentindo o cheiro de Syaoran no travesseiro. Por algum motivo, aquilo a agradava e a fazia dormir bem.