Era perceptível a irritação de Kayo em relação ao namorado. Este não dava à garota atenção alguma, e fazia questão de comportar-se da típica maneira masculina quando acompanhados de amigos. Fazia todas as brincadeiras de mau gosto, gritava, falava palavrões, era mal-educado.
     A garota fez cara de nojo e soltou a mão do namorado e foi sentar-se ao lado do irmão, no banco de trás. Daisuke dormia calmamente, com uma expressão serena no rosto. A japonesa sorriu, encostou seu rosto no ombro do irmão e rapidamente adormeceu.
     Daiki só notou que a menina tinha saído do banco ao seu lado após vê-la dormindo no ombro do irmão. "Tem algo errado nessa cena... Mas não sei o que é...", pensou, mas logo tirando sua atenção do casal para dar uma alta gargalhada da brincadeira de uns amigos.
     Daisuke se assustou com o barulho, e acordou. Sorriu ao ver a irmã ali e passou seu braço em volta dos ombros dela. Deu um beijo leve na cabeça da moça e voltou a dormir. Logo ouviu uma nova gargalhada estrondosa e deu um chute na poltrona da frente.
     - Daiki! - chamou, áspero. - Seja menos escandaloso! São sete e meia da manhã e tem gente aqui com sono!
     - Você está vendo alguém aqui dormindo? Acho que não, hein...! - respondeu o garoto, em tom debochado e fazendo algumas caretas.
     - Realmente, não tem ninguém dormindo, mas pelo menos, as pessoas que se divertem se mostram educadas o bastante para respeitar aqueles que não estão a fim de escutar gritinhos escandalosos. Ria baixo.
     Daiki ficou quieto e sentou-se direito na poltrona. Daisuke fechou novamente os olhos e dormiu, despreocupado. Só acordou quase três horas depois, quando estavam próximos à rodoviária da cidade onde ficariam. Daisuke acariciou suavemente a cabeça da irmã afim de acordá-la.
     A moça se remexeu um pouco e abriu os olhos lentamente, com um sorriso no rosto. Olhou para o irmão com olhos transmitindo um sentimento que Daisuke não pôde identificar. Ajeitou a coluna e se espreguiçou, depois olhou em volta. Viu o namorado dormindo e soltou um suspiro.
     - Que foi, Kayo? - perguntou o irmão, puxando ela pra mais perto.
     - Nada, é só que... - ela disse baixo, lançando um olhar meio triste na direção de Daiki. - Não sei... Se continuar assim, acho que o feriado não será tão divertido como eu imaginei...
     - Vem cá...  - Daisuke puxou a menina e a abraçou. - Faço questão de tornar esse feriado o melhor possível para você... Prometo que será o melhor dos fins-de-semana... - disse, num sussurro, no ouvido de Kayo. Deu um beijo demorado em seu rosto logo depois do término da frase.
     Chegando à cidade, todos os adolescentes desceram do ônibus, pegaram suas malas e foram para uma praia distante e deserta, de táxi. Chegando lá, armaram as barracas onde dormiriam, e colocaram todas as suas coisas em ordem.
     - Kayo, já terminei de montar nossa barraca. - Daiki abraçou a garota por trás, e deu-lhe um beijo no pescoço.
     - Que bom! - disse a menina, contente, virando-se para encarar o namorado. - Qual delas é?
     - Desculpe, Daiki, Kayo... - Daisuke interrompeu, desvencilhando a irmã dos braços do outro garoto e puxando-a firmemente em sua direção. - Vocês sabem que não posso deixar que os dois durmam juntos. Entendam, por favor.
     - Tudo bem, aniki. - respondeu Kayo, com um sorriso no rosto. - Não tem problema.
     - Como assim "não tem problema", Kayo?! Claro que tem! - Daiki estava exaltado, e quase gritava. - Se você ainda não percebeu, Daisuke, somos namorados! Temos o direito de dormir juntos quando resolvemos passar dias longe de casa! Afinal, é para esse tipo de coisa que saímos de casa!
     - Não, Daiki! - o mais velho também levantou sua voz de maneira a sobrepor a do outro. - A gente sai de casa pra se divertir com os amigos, e não pra transar com as namoradas!
     - Bem, transar também é se divertir, não é?!
     - Sai de perto da minha irmã, Daiki. Se for pra "se divertir" que você a quer, eu não quero mais você perto dela. - Daisuke envolveu a cintura de Kayo, que agora, quase chorava, e andou com ela para longe do outro. - Não se preocupe... Se ele agiu daquela maneira, é porque só quer te usar... Pra ele, você é só um objeto, para transar e depois largar.
     - Obrigada Dai-chan... - sorriu a menina, acompanhando o irmão. Este a levou para sua própria tenda e entrou lá com ela.
     Deitaram, se ambos de lado, a menina de modo a fazer suas costas encostarem-se ao peito do irmão. Kayo vestia um short azul marinho, e uma blusa larga branca. Daisuke vestia apenas uma bermuda preta e uma camisa de mesma cor, ambos de tênis.
     Depois de algumas frases, Daisuke ousadamente começou a distribuir beijos no pescoço e face da irmã, levantando ligeiramente a blusa da mesma até abaixo dos seios, e acariciar levemente, com a ponta dos dedos, a barriga e a pele sobre as costelas, provocando vários calafrios na menina.
     Kayo fechou seus olhos, deixando-se levar pelos toques do irmão. Ela virou-se e logo sentiu seus lábios sendo tomados pelos lábios quentes de Daisuke. A garota correspondeu prontamente, e na mesma intensidade, levando suas mãos a adentrar a blusa do homem, acariciando todo o seu peito e abdômen.
     - Ta chegando longe demais, Kayo...  - Daisuke interrompeu, ofegante. Separou-se da menina, saiu da barraca e foi sentar-se na areia, perto da água.
     - Daisuke, a gente vai ao mercado porque temos que comprar algumas coisas. Você vem junto? - perguntou um grupo de meninos e meninas.
     - Vou não, tenho que dar uma organizada numas coisas ainda...
     - Sabe se sua irmã vai?
     - Não. Ela ta dormindo. Por favor, levam o Daiki junto. Se for preciso, arrastem-no. - pediu o garoto, sem fitar o grupo; tinha seus olhos fixos do horizonte.
     Os adolescentes saíram e Daisuke encontrou-se novamente sozinho. Lembrou de todas as cenas de Kayo sendo maltratada pela mãe, todas as vezes que a menina fora consolada pelo irmão, o beijo na sala... A interrupção da mãe quando estavam quase transando no quarto... A revelação sobre o que Daiki realmente queria de Kayo.
     O homem deitou seu corpo na areia e fechou seus olhos, cheios de lágrimas. "O que eu faço, Kami-sama? Estou apaixonado pela minha irmã... O que eu faço...?" O jovem estava confuso: vários sentimentos diferentes se trombavam na mente dele, e ele não sabia como colocar tudo em ordem. Não sabia o que pensar, o que fazer, com quem falar.
     Sentiu uma mão confortável debaixo de sua blusa acariciar seu abdômen e outra secar gentilmente uma teimosa lágrima que insistira em escorrer dos seus olhos. Abriu os mesmos lentamente, e fitou a irmã com um belo sorriso no rosto, uma expressão gentil em sua face. Ela havia trocado de roupa, e agora vestia seu biquíni preto e branco, com uma bermuda de mesma cor.
     Seu cabelo voava com o vento que corria do mar para a costa, deixando-a cada vez mais bela. Ela levantou-se e estendeu sua mão ao irmão, para ajudá-lo a se levantar. O homem o fez e logo se dirigiu à cabana para trocar de roupa. Voltou vestindo uma sunga preta, e segurou a mão da irmã.
     - Vamos dar um mergulho, Kayo. - o homem sorriu, e correu segurando a mão da irmã, em direção à água.
     Kayo riu e acompanhou o irmão, também correndo. Quando a água já estava praticamente em seus joelhos, Daisuke virou de frente para a irmã, e caiu dentro d\'água, puxando a garota por cima dele. Os dois se olharam nos olhos e logo veio uma onda e os cobriu. Os dois riram e avançaram um pouco mais para o fundo. Quando a água alcançou um pouco abaixo do peito da menina, pararam.
     - Daisuke, eu não quero mais fingir... Nem esconder...
     - Eu sei... Mas o que podemos fazer? Somos irmãos, Kayo!
     - Isso nada é mais do que um detalhe! Daisuke, eu te amo, e se o amor não é impedido por igualdade de sexo, como nos homossexuais, vai ser impedido por barreiras genéticas e sociais?
     - Eu sei, meu amor... Eu sei... - Daisuke envolveu a irmã em seus braços e apertou-a contra seu corpo. - Sofreremos mais se reprimirmos esse amor, certo?
     - Demais, Dai... Eu não quero ficar longe de você... Nunca mais...
     - Tudo bem... Mas... Você quer mesmo chegar e dizer a todos que, mesmo sendo irmãos, vamos ficar juntos? - o homem a olhou nos olhos, com uma expressão muito séria. "Nem parece o Daisuke..." Kayo não disse nenhuma palavra... Apenas abaixou a cabeça e negou. - Bem... Vamos esperar um pouco então... - ele sorriu gentilmente, acariciando o rosto da irmã. - Pelo menos alguns meses, até todo mundo esquecer sobre você e Daiki.
     Kayo sorriu e olhou para o irmão com os olhos cheios de lágrimas. Com sua mão, Daisuke puxou o rosto da menina para mais perto e pousou seus lábios sobre os dela. Os dois entrelaçaram suas línguas e se beijavam da maneira mais intensa que podiam. Um beijo feliz, apaixonado, ousado e atrevido. Aquele beijo não era o primeiro, porém marcava o início de uma relação não aceita pela sociedade, e ambos teriam que lutar juntos e fortes contra todos aqueles que se opusessem a eles.
     - Estou disposto a lutar por você, Kayo... Contra quem for.