Recordações escrita por Nekoclair


Capítulo 2
2. Primeiras impressões


Notas iniciais do capítulo

Olá! A quanto tempo -ne ^^ Bem, vocês já sabem - e aos que não sabem fica o aviso - que eu não corro nos capítulos, mas este realmente demorou mais do que eu julgava que demoraria. =
Bem, boa leitura aos que ainda não em abandonaram! ^^



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Suspirei pesadamente, ainda com os olhos pesados por conta do sono.

Eu estava cansado - Como não estaria?! - e a principal causa disso era meu conturbado primeiro encontro com o jovem albino. Eu sentia minha cabeça latejar, consequência claramente direta de meu recente e incomum estado de fúria.

Eu simplesmente odiava pessoas excêntricas como Gilbert.

O lilás dos meus olhos passeava pela brancura imperfeita do teto - pois este se encontrava marcado por umas poucas manchas amareladas, resultantes de infiltrações recorridas no telhado -, buscando uma fonte de serenidade e conforto. A inquietação que me tomava me perturbava cada vez mais, inquietando-me crescente e gradualmente.

Eu estava ciente de que seria melhor simplesmente ignorá-lo e manter a maior distância possível daquela criatura problemática, mas como eu faria isso sendo que somos companheiros de quarto? Eu estava fadado a conviver com aquela figura por um tempo indeterminado, sendo ou não essa a minha vontade.

Levei o braço livre das faixas e das queimaduras, estas ainda não totalmente curadas, para baixo do travesseiro, desejando aumentar a maciez do local onde minha cabeça se encontrava apoiada. Continuei a fitar as manchas no alto, traçando, distraidamente, caminhos imagináveis, ligando-as umas às outras.

Eu precisava acalmar-me, esquecê-lo e, em seguida, quando eu estivesse enfim mais relaxado, pensar em uma solução para este meu pequeno probleminha, chamado Gilbert.

Será que me permitiriam mudar de quarto se eu simplesmente assim solicitasse?... Acredito que não.

– Er... Roderich...

O súbito chamado me assustou, mas, ao menos, serviu para me libertar do transe em que eu me encontrava até então. Ergui o tronco em uma velocidade considerável, procurando, com o olhar violáceo, o dono da voz tímida e aguda que, sem dúvidas, pertencia a alguma criança; e uma cuja voz não me soava de toda desconhecida...

Cocei os olhos com as costas das mãos, enquanto eu enfim encarava o recém-chegado com as pálpebras semicerradas. A presença repentina do mais jovem dos irmãos Beilschmidt me era uma surpresa, mas não me era desprezada; na verdade, minha opinião sobre o jovem não era clara. O loiro parecia ser uma figura pacata e serena perante Gilbert, no qual, aparentemente, ele depositava uma enorme admiração.

Ele se mantinha, sob meu ponto de vista, em uma posição de neutralidade.

Os olhos do outro brilhavam, receosos, observando-me atentamente da batente da porta. Ele não ameaçou uma aproximação ou coisa do tipo, manteve-se simplesmente estático e em silêncio, com o olhar subitamente fugindo do meu. O jovem alemão tinha as maças do rosto avermelhadas, em um contraste significativo perante sua pele tão clara.

Depois do que pareceram longos minutos de silêncio ele enfim se pronunciou.

– É melhor você descer. Já estão servindo a comida e não é bom você demorar.

– Ah, sim... – eu disse, após mirar rapidamente o relógio na cabeceira para constatar as horas e, em seguida, pondo-me enfim de pé. Ajeitei os fios bagunçados de meu cabelo e, também, minhas roupas, sendo observado, a todo segundo, pelo menor, que me encarava ainda com os olhos bastante receosos. – Obrigada por me avisar.

Sorri ao jovem e me aproximei, cautelosamente, pois ele parecia-me um tanto quanto amedrontado com minha repentina decisão de diminuir nosso distanciamento. Ele realmente não me parecia uma má pessoa e eu sentia que poderia ter uma convivência tranquila e agradável ao menos com ele, apesar de que seu comportamento excessivamente cauteloso e fechado parecia que dificultaria uma fácil e primeira interação. Nada que um pouco de insistência não resolvesse, claro.

– Não sei o seu nome ainda. – eu disse, pondo-me ao lado dele, porém, não tão próximo quanto eu desejaria. Eu sentia que mais um passo meu e ele correria para longe, ou ao menos era essa a minha impressão do jovem, que por acaso continuava escondido, em grande parte, atrás da porta. – Você poderia me dizer? – eu exibia um sorriso educado.

– Ludwig... Ludwig Beilschmidt. – ele respondeu, timidamente.

– Muito prazer. Vamos ser amigos, okay? – eu disse, dando mais um passo, o qual foi recebido sem qualquer reação.

– Tá... – ele disse, com a voz baixa e a face tingida por um leve escarlate, enquanto enfim saía de seu esconderijo. – Agora é melhor nos apressarmos antes que arranjemos problemas...

Apenas concordei em um leve balançar da cabeça.

– Poderia me mostrar onde é? Eu não conheço a casa ainda... – cocei a cabeça, levemente, um tanto embaraçado.

– Claro. – ele disse, com um leve e tímido sorriso. – É só me seguir.

E foi o que fiz.

Acompanhei-o por todo o corredor até alcançar a escada, descendo por esta, novamente, ao andar inferior. Depois de todos os degraus terem sido devidamente percorridos, seguimos na direção contrária à entrada, até nos depararmos com um salão relativamente grande, onde três mesas compridas estavam dispostas, ocupadas, estas, por umas vinte crianças e por algumas senhoras e moças de idades variadas, que deveriam ser as responsáveis pelo bem-estar dos órfãos.

Segui Ludwig e nos encaminhamos à senhora que servia a comida num balcão que separava a cozinha do refeitório. Já com o prato nas mãos, o estendi a mulher assim que Ludwig já se virava em direção às mesas, com a bandeja cheia já nas mãos. Tratei logo de segui-lo, com passos apressados e o prato de espaguete balançando nas mãos.

Sentamo-nos na ponta da mesa mais afastada, um do lado do outro, e, sem demoras, Ludwig se pôs a engolir a comida apressadamente. Depois de observá-lo por alguns instantes, estando eu um pouco surpreso com a pressa do alemão, que já tinha a face lambuzada de molho, enfim levei a primeira garfada à boca. Eu comia calmamente aquela comida de gosto amargo, enquanto rodava os olhos pelo salão, analisando o local cautelosamente.

Direcionei-me então ao alemão, que já quase terminava a refeição.

– Onde está o Gilbert?

– Ele já comeu. – respondeu, simplesmente.

– Ah... Não o vi aqui, no refeitório, quando chegamos. Ele deve ter engolido a comida tão rapidamente que duvido até que saiba qual era o prato do dia. – dei uma breve e baixa gargalhada, repleta essa de ironia.

Por longos e desconfortáveis instantes, o loiro nada pronunciou, o que me preocupou de certa forma. Eu não dissera nada que não devia, certo?

– Não é bem isso... – o alemão disse, enfim, sério e entristecido, enquanto pousava os garfos nas beiradas do prato, agora vazio, e limpava a boca suja de molho com um guardanapo de papel – O Gil sempre come antes, sozinho.

Ergui uma sobrancelha, tomado tanto por surpresa quanto por confusão. O loiro encarava o próprio prato, agora apenas sujo do restante de molho, com os olhos chateados e um tanto solitários.

– Por quê? – perguntei.

– Ah... Não sei direito. As senhoras dizem que é para ele não causar nenhum problema. Dizem que é por precaução.

– O que ele aprontou para ter esse castigo? – eu mantinha as feições sérias.

– Não sei. Nada que eu saiba, ou ao menos nada de tão sério. O Gil é proibido de muitas coisas na verdade, mas eu não sei o motivo. Mas não acho que ele tenha feito alguma coisa tão grave para merecer toda essa solidão. Ele não pode sequer chegar muito perto das outras crianças que as senhoras já o dão broncas! Isso é injusto... Muito injusto. – o menor falava, em visível tristeza.

Eu encarava o loiro, incrédulo. Realmente, não importava o quanto Gilbert se mostrasse detestável, esse tipo de tratamento certamente não estava certo. Ele era, afinal, uma criança, como todos nós! Por que ele haveria de receber esse tratamento especial? Com certeza haviam meios mais apropriados para corrigir algum problema que o albino possa ter ou estar causando. Esse tipo de isolamento não poderia ser mais desnecessário!

E para mim, que tive, até bem recentemente, uma convivência alegre e cheia de carinho com meus pais, tudo isso parecia ainda mais errado. Eu certamente não suportaria esse tipo de tratamento; eu já me via completamente perdido na situação em que estava, sabendo sequer como eu iria conviver com tantos problemas já tão evidentes naquele lugar! Não havia carinho, amor ou simpatia para com as crianças que ali residiam. Era muito óbvio, na verdade, que essas mulheres apenas estavam aqui pelos salários que ganhavam ao final do mês; eu não via nem mesmo uma que sinceramente parecesse gostar do que fazia.

O alemão subitamente ergueu-se do banco, o que causou um rangido relativamente alto, fazendo-me voltar à realidade e deixar meus pensamentos a parte. Direcionei meus olhos ao loiro, que tinha claras intenções de se afastar, e, de repente, eu não sabia mais o que fazer.

Eu deveria segui-lo ou terminar minha refeição?

Acabei por comer mais algumas garfadas, apressadamente, e logo eu já me adiantava por onde o loiro havia sumido, por entre uma porta que levava a um amplo quintal. Pude notar, ao fundo, as duas figuras sentadas, conversando, Gilbert e Ludwig, acompanhados de uma garota de longos cabelos castanhos, e que me parecia, a primeira vista, velha demais para ser uma órfã daquele lugar e nova demais para ser uma funcionária. 

Fiquei a encará-los por alguns momentos, surpreso e curioso, mantendo uma distância considerável. Por estarem relativamente distante e eu não enxergar bem desde alguns anos atrás, por causa do que acredito ser miopia, eu não podia ver as feições em nenhum dos rostos, apesar de que eles não me parecessem estar discutindo ou algo do tipo, somente conversando.

Decidi então encaminhar-me a eles, até porque eu ainda me encontrava consideravelmente curioso por saber também tudo o que ocorria com o de cabelos brancos. Porém, antes que eu pudesse dar mais que três passos, uma mão pousou pesadamente sobre meu ombro, forçando-me a estagnar. Virei-me de imediato, me deparando com a senhora de mais cedo, a qual me encarava com um olhar reprovador.

– Eu pensei ter dito para manter distância dele.

– Ah... – eu mantinha os lábios abertos, subitamente intimidado e sem saber o que fazer. Optei pelo caminho que me parecia, no momento, mais fácil. – Então é ele o tal Gilbert? Eu não sabia. Ele certamente não se parece nada com o pequeno Ludwig. – eu disse, numa falsa, mas convincente, tranquilidade.

A senhora ergueu uma das sobrancelhas, desconfiada. Eu sentia o suor acumular em minha testa, por entre minha franja. Eu odiava mentir e agir dessa forma tão hipócrita, mas, com certeza, não era uma boa ideia desafiar essas madames. Além disso, eu tinha que me por como prioridade; os problemas de Gilbert eram-me apenas curiosidades, nada mais.

A senhora retirou a mão de meu ombro, mas manteve os olhos presos aos meus por mais alguns torturantes instantes. Eu sentia que não aguentaria toda aquela pressão por muito mais tempo.

– Eu tenho de ir agora. Têm muitas coisas que ainda não vi nesta casa. – eu disse, sendo o menos transparente possível, enquanto reverenciava a mulher e caminhava de volta ao refeitório. – Até mais tarde, madame.

Assim que adentrei novamente a casa e sumi do olhar da mulher, apressei meus passos e subi as escadas, direcionando-me ao meu quarto, que teve a porta fechada por mim assim que me foi permitido. Recostei as costas na superfície de madeira, ofegante, o corpo ainda tomado pela adrenalina e o coração acelerado. Levei a mão primeiramente ao peito, sentindo suas batidas, e depois à testa, limpando o suor que ali se acumulara.

Eu sentia-me mal pelo que tinha feito - ou, no caso, falado -, mas eu não poderia ter problemas, ainda mais no meu primeiro dia. Mais tarde eu certamente veria o Gilbert, afinal dividíamos o mesmo quarto, e então eu o perguntaria sobre o que acontecia consigo; afinal não havia qualquer mal em adiar perguntas de assuntos tão irrelevantes à minha pessoa.

Eu estava curioso, somente isso. Não havia sequer porque eu sentir pena de uma pessoa que eu mal conhecia e cuja primeira impressão me fora tão negativa.

Mas, ainda assim, esse desconforto em meu peito não desaparecia.

O meu próprio remorso me consumia, gradativamente, condenando-me. Eu odiava mentiras e normalmente as evitada, mas nunca pensei que eu fosse capaz de ser um mentiroso tão bom; apesar de eu não saber se isso era realmente uma qualidade ou um defeito.

Recostei a cabeça na porta, deixando meus pensamentos se encaminharem ao quintal, onde a jovem e os irmãos ainda provavelmente permaneciam. Quem seria ela? Seria uma das responsáveis por cuidar de nós, órfãos?

E qual a relação da moça com os irmãos?

Qual seria o seu nome?

Apenas de não tê-la visto muito bem, ela aparentava ser a mais nova das funcionárias, ainda assim eu não fazia ideia de sua idade. Tudo que sei é que tinha cabelos castanhos e levemente ondulados, que deviam lhe bater aproximadamente no meio das costas. Mesmo sem vê-la muito bem eu já estava certo de que ela era uma jovem muito bela e gentil.

Espero ter a chance de conhecê-la em breve... Sentia que minha curiosidade havia sido novamente despertada.

Cerrei os olhos levemente, respirando compassadamente a fim de me tranquilizar. Meu coração batia ainda acelerado e minha mente estava tomada por milhares de pensamentos diversos.

Subitamente senti-me sozinho, naquele quarto vazio, e nunca achei tão necessário o conforto que os braços de meus pais me ofereciam como naquele momento; o que me fez sentir, de alguma forma, diferente do habitual, pois eu era muito mais forte que isso. Por que logo agora eu fui ser assolado por tamanha solidão, a qual eu tivera sucesso em, até então, ignorar?

Eu estava bem sozinho. 

Eu não poderia me dar ao luxo de chorar, afinal meus pais não queriam isso.

Mas então por que meus olhos ardem?

Por que há lágrimas involuntariamente se acumulando e escorrendo pelo meu rosto?

Isso não está certo.

Encolhi-me mais, puxando as pernas e as envolvendo por meus próprios braços. Abaixei a cabeça, a fim de ocultar as lágrimas que escorriam, mesmo que eu me encontrasse sozinho naquele cômodo abafado.

Senti subitamente certa pressão sobre minhas costas e, no momento seguinte, eu já estava caído sobre o chão, com a cara a centímetros do piso de madeira velha, as lágrimas agora ainda mais incontroláveis.

A porta havia sido aberta, com força, fazendo-me ser lançado contra o chão por culpa do impulso aplicado sobre meu corpo. Em um movimento inconsciente, virei o rosto em direção à entrada, deparando-me com o jovem albino, que me encarava, estagnado e calado. Claro, só podia ser ele para abrir uma simples porta com tamanha brutalidade!

Nenhum de nós nada pronunciou, apenas continuamos na nossa silenciosa troca de olhares. O albino encarava-me, surpreso, e por várias vezes vi seus lábios se mexerem, como se desejasse se pronunciar, mas se visse incapaz disso.

– Rod... – ele enfim se pronunciou, apesar de um tanto receoso ­– Você está bem? Por que está chorando?

Só então me lembrei de tal fato. Eu estava tão concentrado no súbito surgimento do alemão no quarto que sequer recordara de meus próprios pensamentos a cerca dos meus problemas, ou das lágrimas que manchavam meu rosto pálido até então.

Ajeitei-me, apressada e desajeitadamente, pondo-me sentado, e levei as mãos aos olhos, esfregando-os a fim de conter e eliminar qualquer resquício das lágrimas. O alemão se aproximou e se sentou ao meu lado, novamente calado. Ele parecia-me um tanto receoso, incerto.

Aparentemente, não sabia como lidar com a pessoa diante de si, no caso: eu.

– Eu estou bem. Pode voltar ao que estava fazendo.

– Idiota... – ele sibilou – Como eu poderia simplesmente o deixar sozinho quando você está desse jeito?!

– Como eu já disse: não há nada de errado comigo. E, de qualquer forma, não é problema seu.

Ele bufou, irritado, e cruzou os braços sobre o peito da maneira mais infantil possível.

– Não importa o que você diga, eu não irei embora até que me digo o que houve. Deve ter sido algo incrivelmente horrível para fazer um aristocrata de alta ordem como você cair às lágrimas! – sua voz tornou-se irônica, mas, ao fundo, eu sabia que ele tentava me fazer rir; o que, claro, só servira para irritar-me mais.

Fechei os olhos com força, determinado a ignorara o albino que continuava a discursar como um psicólogo formado, o que me irritava profundamente. Meus problemas não o interessam e não o desejo se intrometendo nos meus problemas pessoais!

– Então, por que não conta para o incrível eu? Tenho certeza de que poderei te ajudar de alguma forma!

Um nervo pulsou-me fortemente na testa, tamanha a minha raiva acumulada. Virei ao albino, dando sua desejada atenção. Eu sentia as lágrimas voltarem a tomar meus olhos, mas eu, novamente, não as conseguia controlar.

– O que houve? – eu disse, mais para mim do que para ele ­– Meus pais morreram e agora eu estou sozinho! É isso o que aconteceu! Por que você não para de se meter na minha vida? Esses assuntos não te importam e eu sequer gosto de você, e sei que pensa o mesmo de mim! Pare de tentar se fazer de meu amigo, porque você não é! – minha raiva tornou-se incontrolável e, quando dei por mim, já a havia atirado sobre o albino, por meio de palavras rudes, mas das quais eu nada me arrependia.

Ele encarou-me, surpreso talvez pela súbita elevação no tom de minha voz ou pelas palavras dirigidas a si, porém, simplesmente permaneceu calado, com as feições inicialmente reprovadoras.

Eu não sabia se ele havia ficado chateado ou não, mas o seu silêncio me incomodava. Eu queria que ele me respondesse, me xingasse, me batesse... Qualquer coisa, mas não que simplesmente me ignorasse. Era frustrante...

Senti meus olhos arderem fortemente e as lágrimas aumentaram ainda mais. Meu peito doía e a dor que percorria meu corpo era insuportável. O albino suspirou, profundamente, e de repente sua voz tornou-se mais mansa. Quando voltou a se pronunciar, parecia, inclusive, uma outra pessoa.

– Está se sentindo melhor? – ele perguntou, as feições um tanto impassíveis.

– Por que deveria estar? – eu disse, a voz falha pelo choro ainda controlado.

– Pensei que se sentiria melhor se brigasse comigo... Apenas isso. – ele apoiou a mão no meu ombro, fazendo-me direcionar minha atenção novamente a ele, surpreso.

Gilbert Beilschmidt estava tentando ser gentil, e, incrivelmente, estava conseguindo. Sua companhia, seu toque, de alguma forma acalmou-me o peito, que deixou de se contrair tão forte e dolorosamente. Eu o encarava nos olhos, rubros e violetas se chocavam de frente e, subitamente, senti que havia sido enganado até então.

Aquela pessoa... Não era má. Não tinha como ser. Os olhos não mentiam, nunca, e maldade era a última coisa que via nos brilhantes orbes que também me encaravam, com notável preocupação. Não haviam realmente motivos para eu ter de manter distância de si.

Por que desejavam tanto o isolar?

Isso me soa cada vez menos certo...

– Sabe, Rod... Eu sei que se sente sozinho. Eu sei bem como é na verdade, mesmo que eu nunca tenha conhecido minha mãe, já ela abandonou a mim e ao Lud quando éramos bem pequenos, eu te compreendo muito bem, pois também penso nela de vez em quando e a desejo de volta. – ele deu uma curta pausa em suas palavras, que eram ouvidas, por mim, com excessiva atenção – Todos aqui se sentem assim, acredite. Você quer o conforto de uma família, que perdeu e não consegue esquecer, o que é muito normal. Eu sei que dói, essa solidão toda, mas chorar não adiantará em nada.

Ele soltou meu ombro e levou a mão aos próprios cabelos, bagunçando-os, enquanto uma coloração avermelhada tingia sua face. Ele suspirou, desviou os olhos dos meus e se pôs de pé, batendo a seguir nas roupas, a fim de tirar-lhe o pó. Eu observava cada mínima ação sua, com o rosto ainda manchado pelas lágrimas que haviam enfim secado.

– Rod, você sobreviveu, então continue andando. Chorar no canto não vai adiantar em nada. Seus pais morreram e não vão voltar, e por mais rude que isso soe, é a verdade e você deve aceitá-la verdadeiramente, pois só então você será capaz de prosseguir a diante.

Ele se calou subitamente e eu também nada pronunciei. Eu estava em choque por suas palavras e ações, de forma que não sabia sequer quando ia ser capaz de assimilar tudo que acontecia.

O albino era uma pessoa interessante e talvez eu tenha o julgado mal em nosso primeiro encontro.

Ou ele estaria apenas agindo dessa forma por pena do meu estado, quando me encontrou sozinho e às lágrimas no quarto?

O que se passa por sua mente?

– Você entende então, Rod? Não fique chorando. Vá procurar algo para se distrair e faça alguns amigos. – ele sorriu, levemente, ainda um tanto constrangido ­– Eu não sou bom com lidar com as pessoas, mas espero ter te ajudado um pouquinho que seja.

Nós continuamos nossa fervorosa e muda troca de olhares por mais alguns instantes, antes do albino voltar a se pronunciar, enquanto já pegava à maçaneta.

– Então... Agora eu vou indo. Até depois, a gente se esbarra por aí...

– Gilbert, espera. – minha voz saiu ruidosa de minha garganta – Desculpa por ter te julgado mal...

Ele riu baixo, enquanto encarava-me de cima.

– Então você andou pensando coisas ruins ao meu incrível respeito? Que coisa feia, Rod, não se julga um livro pela capa. – ele disse, sorrindo – Mas espero que você tenha mudado um pouco de opinião.

– É... Mudou, um pouco... – eu sentia minha face esquentar, de vergonha.

Ele soltou um alto e desnecessário suspiro de alívio, enquanto seus lábios se curvavam em um sorriso perturbado.

– Muito bom saber, Rod! Afinal, eu não o desejo ter como inimigo, mas como aliado. – ele interrompeu seu pronunciamento momentaneamente, enquanto era observado por um confuso eu – Talvez um simples plebeu como eu consiga até algum privilégio se eu me mantiver aliado à nobreza!

– Não comece novamente com essas bobagens... – eu disse, numa voz mais cansada do que irritada.

Talvez simplesmente não tivesse sobrado mais ódio para ser descontado sobre o albino...

– Há, vamos, jovem mestre! Eu só sou reconhecido quando o interessa? Trate de se lembrar de mim quando estiver escrevendo seu testamento!

Levei as mãos aos lábios, enquanto uma risada contida e inexperiente escapava-me. O albino alargou mais o sorriso na face branquíssima, notavelmente satisfeito.

– Certo, certo. Chega de bobagens, Gil.

O albino sorriu uma última vez e então saiu, deixando-me sozinho no quarto.

Eu não sabia o que realmente havia acabado de ocorrer, mas eu percebia que não haveria mais volta, independentemente das consequências que se seguiriam, pois eu já me sentia totalmente envolvido pela presença da figura de cabelos brancos.

Talvez não sejamos apenas colegas de quarto afinal...

Mas... A sua companhia me será uma benção ou uma maldição?


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Notas finais do capítulo

Obrigada aos que estão acompanhando e comentando!! Vocês foram meu incentivo, e tenho certeza que continuarão sendo. o/
Então, desculpa pelo Gil filósofo, gente. Não sei se deu pra captar a ideia que eu queria. O Gil tem, na verdade, bastante experiência de vida, por isso consegue falar sobre um assunto aparentemente complicado. Ele simplesmente falou o que sempre sentiu.
E não pensem que eles já estão se apaixonando, pois está longe disso! xD
Bem, qualquer erro, por favor, me avisem. Eu mesma estou betando a fic e gramática realmente não é meu ponto forte...
Espero receber alguns reviews neste capítulo também, pls~ Não se esqueçam de mim. :3
Então nos vemos por ai! BJJS!!
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E agora eu tenho um pedido mega ultra super importante para fazer. xD E que eu quase esqueci, mas tudo bem. u.u
Eu gostaria de pedir para que vocês lessem essa PruAus -> http://fanfiction.com.br/historia/329653/Mystery_And_Crime/
A fic não é de minha autoria, é da minha beta e amiga, French Lily. É uma resposta a um desafio que fiz a ela e eu realmente ficaria agradecida a quem pudesse acompanhar e comentar. Foi a chibis quem me incentivou a escrever e eu realmente admiro muito a escrita dela, mas a falta confiança recentemente. =< Então, pls, deem uma chance a fanfic dela!! Ela realmente tá precisando de um incentivo!!
Prometo que não vão se arrepender. :3
Bem, espero que esta minha súplica alcance os corações de vocês~ ne ^^



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