O sol tentava me acordar com seu brilho intenso, ainda não entendo porque Regina deixa as camas viradas pra janela e não coloca cortinas nela.

- Ariane levanta que tá na hora de ir pra escola – disse Regina com aquela voz de quem acabou de acordar

 - Já vou levantar, só mais 5 minutos.

- Já estamos atrasadas, levanta logo e para de ser preguiçosa.

Eu levantei resmungando, odeio acordar cedo mais que tudo nessa vida, fui ao banheiro e me olhei no espelho e vi que meus olhos ainda estavam um pouco inchados, mas nada que uma boa maquiagem não resolva.

- João Pedro vai nos levar de carro

- Ótimo assim não preciso cansar meus pés

Regina riu e de depois foi ao banheiro, eu fui à cozinha ver o que tinha de bom pra comer e me deparei com João Pedro ainda de cueca fazendo café, ele era extremamente lindo com aqueles cabelos castanhos claros e olhos verdes, barriga definida e uma bunda meio grande, algumas garotas da escola não acreditavam que eu havia terminado com ele, mas fazer o que, passado é passado.

- Olá – eu disse timidamente

- Oi – ele disse meio tímido – Você quer café? Eu acabei de fazer.

- Quero- fui ao armário pegar um copo e percebi que ele estava me observando – O que foi?

- Nada – ele disse gaguejando – É melhor eu ir trocar de roupa

Eu tomei meu café junto com Regina e depois João nos levou para a escola, enquanto ele parava o carro já havia umas quatro garotas assanhadas esperando ele sair do carro. Bitches. Desde que eu me entendo por gente João é o garoto mais desejado da cidade, todas as garotas amam ele e só ele não percebe isso. Eu e Regina fomos para a diretoria ver em que sala nós estávamos e infelizmente não estávamos na mesma, então eu fui pra minha sala me preparar para o inferno que só estava começando. A primeira aula foi muito tranquila, a professora de Geografia era bem legal e fazia todos darem risada, mas já na 2° e 3° aula foi um tédio. Tivemos que fazer uma redação sobre como foram nossas férias e eu fiquei pasma porque eu não imaginava que o 3° ano ainda fazia redações como aquela. Fui para o intervalo encontrar Regina e ela estava conversando com Bianca, uma menina que era da nossa sala ano passado.

- Oi Bianca – eu disse fazendo um risinho simpático

- Oi Ariane! Eu estava precisando falar com você

- Sobre o quê?

- É que eu fiquei sabendo que você está trabalhando na livraria e eu queria saber se tem esses livros lá.

Ela me entregou um pequeno papel dobrado onde tinha uma lista de livros.

- Eu vou ver, você pode passar mais tarde lá pra pegar.

- Ok, eu vou sim.

Bianca saiu andando e me deixou sozinha com Regina.

- Como foi à aula?

- Péssima e a sua?

- Horrível

Ficamos falando o intervalo inteiro sobre nossos colegas de classe e sobre nossos professores novos, o intervalo passou rápido e as últimas três aulas também então eu fui pra casa de Regina almoçar e depois fui pro trabalho, chegando lá tive uma surpresa.

- Mãe? O que você tá fazendo aqui?

- Volta pra casa

- Não

- Estou mandando

- Você não manda em mim desde os meus 10 anos de idade. Agora saia, por favor, eu preciso trabalhar.

- Quero você em casa de noite

- Vai ficar querendo

- Uma hora você vai ter que voltar

- Ou não

Minha mãe bufou e saiu batendo a porta da livraria, mal sabia ela que não importasse o quanto ela insistisse eu não ia voltar pra casa. Não considerava mais aquele lugar como casa, me sentia melhor até na escola do que lá. Eu estava tão distraída com meus pensamentos que nem percebi que Bianca havia entrado na loja

- Oi Ariane, você achou os livros que eu te pedi?

- Me desculpa Bianca, eu nem tive tempo de procurar ainda! Você pode esperar um minuto?

- Claro que sim – disse ela sorridente

Eu até pediria para Fernanda procurar os livros para Bianca, mas ela estava enrolada atendendo outros clientes então resolvi procurar os livros eu mesma, sempre achei que deveriam ser contratados mais 2 funcionários para a livraria, mas Ângelo disse que apenas eu e Fernanda éramos suficientes e eu achava que isso era preguiça de pagar salário para mais pessoas, mas é claro que eu não disse isso a ele. Procurei os livros de Bianca, mas infelizmente só achei 3 dos 5 livros que ela havia pedido

- Bianca, só achei 3 livros – eu disse fazendo uma espécie de biquinho forçado

Ela fez uma expressão meio triste

- Quais você achou?

- O mistério da rua 15, 50 tons de cinza, e A bolsa amarela

- hum, tudo bem, mas você pode encomendar os outros? – agora era ela que estava fazendo biquinho forçado

- Sim, hoje mesmo eu encomendo.

- Muito obrigada – ela disse forçando um sorriso – Agora e tenho que ir, tchau.

- Tchau

 O resto do dia foi bastante agitado, parecia que todo mundo queria comprar livros naquela tarde, isso me deixou feliz porque ia me ocupar a cabeça e não ia me permitir pensar em minha mãe, e eu acho que isso é uma boa coisa.

- Ariane? Você pode fechar a loja pra mim hoje? Eu tenho umas coisas pra fazer. – disse Fernanda

- Claro que sim, é só me dar às chaves.

- Estão na porta do almoxarifado ok? Agora eu estou indo, tchau

- Tchau

Bom, estava quase na hora de fechar a loja, então fui até o almoxarifado buscar a tal chave , tranquei a porta do almoxarifado fui trancar as outras portas, ficar sozinha na livraria me dava calafrios, queria fechar logo tudo e sair dali. Quando finalmente apaguei as luzes peguei minha bolsa e me certifiquei que eu não estava esquecendo nada, fechei a porta da frente e fui embora, quando coloquei as chaves no bolso da  minha calça jeans percebi que havia um pequeno bilhete onde estava escrito em uma caligrafia muito bem caprichada:

‘’Eu voltei Ariane, espero que esteja preparada’’

Aquelas pequenas palavras me deram calafrios, eu nunca tinha visto aquela letra na minha vida, de quem era aquele bilhete? Como ele foi colocado no bolso da minha calça? Quem estava voltando?

Fiquei fitando o bilhete por um bom tempo até perceber que eu estava no meio da calçada fitando um pedaço de papel e a maioria das pessoas que passavam ali ficavam olhando pra minha cara como seu eu fosse louca. Peguei o ônibus e fui para a casa de Regina ainda com o bilhete na mão, por algum motivo eu estava tremendo, estava suando frio e estava com um certo medo, era sobrenatural um bilhete aparecer no bolso da minha casa sem explicações, e ainda com aquelas palavras. Quando finalmente cheguei na casa de Regina fui correndo para o quarto dela.

- Regina! Regina! –saí gritando pela casa

- O que foi menina você quer me matar de susto? – disse ela

- Olha isso – disse eu entregando o bilhete para ela, que leu com o olho mais arregalado do mundo

- Quem te mandou isso? – disse ela lentamente

- Eu não faço ideia.

- Onde você  encontrou?

- No bolso da minha calça, esse bilhete apareceu lá do nada

- O que foi gente? – João entrou no quarto só de toalha amarrada na cintura, as vezes eu acho que ele só faz isso pra me provocar, mas não é hora de pensar nessas coisas Ariane!

- Olha isso – Regina disse entregando o bilhete para ele, que quando terminou de ler arregalou os olhos em minha direção

- Mas quem...

- Eu não sei, achei no bolso da minha calça

- Devem estar brincando com você, só pode – disse ele com um sorris sarcástico

- Ou não – disse Regina

- Acham melhor eu contar a polícia? – eu disse um pouco assustada

- Claro que não! Eles vão rir da sua cara – disse João Pedro rindo – Você nem sabe quem te mandou isso, pode ter sido qualquer pessoa, inclusive aquelas garotas da escola que odeiam você .

- João tem razão Ariane, se você mostrar isso a polícia eles vão rir de você, é melhor esperar algum tempo ou um próximo bilhete, sei lá.

- Fica calma Ariane, ninguém vai machucar você, é só um bilhete. – disse João me abraçando

- Um bilhete muito assustador – eu disse apavorada

- Já disse pra ficar calma, agora vá tomar um banho pra relaxar e pare de pensar nesse bilhete - disse ele me soltando.

- É Ariane, é melhor você tomar um banho e ficar calma.

- Ok, é o que eu vou fazer

Peguei meu pijama e fui para o banheiro, eu realmente precisava de um bom banho e descansar, deixei a água quente tomar conta do meu corpo e relaxei os ombros que estavam tensos. Logo após o banho fui para a cozinha comer algo, João Pedro ainda estava só com a toalha na cintura, ele realmente fazia aquilo pra me provocar.

- Você está melhor? – disse ele se aproximando de mim

- Sim, só preciso comer alguma coisa, o que tem de bom aí?

- Pizza de ontem – disse ele rindo

- Acho que serve – eu ri para descontrair

Abri a geladeira para pegar a pizza e quando me virei de novo João Pedro estava muito perto de mim, ele colocou as mãos na geladeira, me deixando presa.

- Me deixa sair – eu disse baixinho para Regina não ouvir do banheiro

- Me dê um bom motivo – ele olhou bem dentro dos meus olhos

- Por favor

- Resposta errada

Ele foi se aproximando mais e mais até seus lábios encostarem nos meus, eu não queria recuar, mas precisava porque não queria iludir ele, não queria fazer ele sofrer mais do que já tinha feito, mas eu não recuei porque precisava daquele beijo, precisava daquele toque, precisava dele. Eu estava tão abalada por causa da minha mãe e por causa do bilhete e João Pedro me fazia esquecer de tudo e era exatamente  isso que eu estava precisando. Ouvimos a porta do banheiro abrir e nos separamos bruscamente, parece que Regina percebeu porque assim que entrou na cozinha ela disse:

- Atrapalhei algo?

- Não – eu respondi – Eu perdia a fome, vou dormir, boa noite

Deitei na cama, desejando que eu nunca mais cometesse aquele erro novamente

Assim que acordei, percebi que estava muito atrasada, peguei meu uniforme e vesti rapidamente, sorte que João Pedro ia nos levar de carro, não eu não podia ficar feliz com isso porque teria que encarar ele frente a frente agora mesmo, mas uma hora eu teria que fazer isso porque afinal, eu estou morando na casa dele.

- Bom dia Ariane – disse ele quando cheguei na cozinha

- Ah, bom dia

- Vocês estão estranhos – disse Regina desconfiada

- Não estamos não – dissemos juntos

- Estão sim, mas deixa pra lá né, vamos logo porque estamos atrasadas – ela pegou a bolsa dela e foi para o carro

- Contou pra ela? – João Pedro perguntou

- Claro que não, agora vamos e depois a gente conversa.

Ficamos todos em silêncio dentro do carro, eu pensando na vida e eles não sei o que estavam fazendo, ficou um clima meio estranho até ver o que nos aguardava na escola

- O que está acontecendo? – disse Regina se referindo ao grande tumulto na porta da escola

- Não sei, vamos lá ver – eu disse

Quando soube o motivo do tumulto eu quase desmaiei, era um cartaz de desparecimento onde estava escrito em letras bem grandes  ‘’DESAPARECIDA: BIANCA MAZARO. ÚLTIMA VEZ VISTA: LIVRARIA BAÚ DE HISTÓRIAS’’ em baixo dessas letras estava uma foto de Bianca sorridente e com seus óculos redondos, parecia uma foto atual, mas não foi só isso que me assustou, foram as pequenas palavras que estavam escritas de caneta vermelha no rodapé da folha ‘’tome cuidado, eu estou voltando´´