Quando me levantei, já deviam ser pelo menos nove da manhã. O sorriso retardado não saiu do meu rosto em nenhum momento. Duvido até que tenha passado a noite sorrindo como um idiota.

-Quem se importa?-Sussurrei pra mim mesmo, enquanto terminava de prender o suspensório.

Baguncei meu cabelo, depois o arrumei de novo. Não ficava bom de jeito nenhum. Então apenas peguei um chapéu e o coloquei.

Eu ainda achava muito estranho o fato de o velho ter roupas que serviam em mim, e roupas que serviam perfeitamente bem em Sophie. Ele dizia que era por ter netos e sobrinhos, mas isso não pareceu verdade. Tem algo naquele senhor que me incomoda, muito.

 Saí do quarto, e segui até a cozinha. Simplesmente fui atacado com xícaras e pratos.

-Até que enfim você chegou. Não imaginei que fosse tão preguiçoso. Isso não se faz, sabia?

-Ah...Bom dia pra você também.

-Não tem bom dia aqui, garoto. Tenha foco. Andando. Quero esses pratos na mesa. As xícaras ao lado. Vamos, você me ouviu. Faça isso direito. Você deve ter seus dezoito anos, não é mais hora de ficar brincando de casinha. Ação. Rápido.

-Você fala como se estivéssemos...

-A garota já acordou?-Ele me interrompeu, mudando bruscamente de assunto.

-Não sei. Mas, whoa. Como você sabe que ela está aqui?

-Eu sei de tudo que acontece nessa casa. E aliás, escutei risadinhas ontem. Elas denunciaram vocês.

  Ele me lançou um olhar malicioso como quem diz: ‘Eu sei o que vocês fizeram’.

-Não é nada disso.-Eu ri.-Estávamos só...conversando.

-Sim. E assunto não faltou, hein?-Ele riu.  E colocou café nas xícaras. Não pude me conter e ri com ele.

-Sophie está demorando.-Comentei, o ajudando a colocar bolo nos pratos.

-Ah, rapaz. Você não sabe o quanto ela é indecisa quando se trata de vestidos. Se perde entre eles tentando escolher um. E quando acha, passa horas se olhando no espelho pra saber se realmente ficou bonita.

-Como você sabe disso, Sr. Will?-O olhei sério.

Ok, ele tinha mesmo algo de errado. Eu sabia. Desde o primeiro momento, em que ele olhou Sophie como se já a conhecesse. E como se conhecesse muito bem. Eu tinha que descobrir que conexão ele tinha com ela.

-Eu apenas sei.

-Isso não existe. Vamos. Vai ter que revelar isso a qualquer hora, por quê não agora?

-Revelar o quê?-Escutei uma voz feminina atrás de mim, e me virei. Sophie estava com um sorriso no rosto, e um vestido azul claro, que ia até seus joelhos, e tinha renda nas mangas.

-O...segredo do café dele. É...viciante.-Menti. Ela murmurou algo, depois se sentou.

-Me desculpem, rapazes. Mas eu não aguento mais. Estou com uma fome de alguém que passou a vida inteira sem comer.

-Ainda é a Sophie exagerada.-Escutei o velho sussurrar.  Me segurei para não força-lo a contar o que era isso. Então, só sentei na mesa, ao lado de Sophie.

-Edward, eu sinto muito por isso, mas você realmente é um péssimo mentiroso. Acha mesmo que eu, Sophie Hadley, vou acreditar que você queria o segredo do café dele? –Ela sussurrou, colocando açúcar no café.

-Acho. Por quê não acreditaria?

-Porque você é um péssimo mentiroso.-Ela me olhou com um sorriso do tipo ‘ganhei’.

-E não era você quem estava com a ‘fome de alguém que passou a vida inteira sem comer’?

 Ela riu alto, e deu um gole no café em sua xícara.

-Não pense que eu vou esquecer disso, ladrãozinho.

                                                                    ...

-Quer me contar o que aconteceu lá?

-Depois que você me contar o que queria de Sr. Will, sim. Talvez eu queira contar isso pra você.

-Ei, isso é trapaça.

-Não. É chantagem.-Ela riu.

Há lugar melhor pra conversar do quê ao ar livre, em um lugar no alto das arvores?

-É estranho, Sophie.

-Mas eu quero saber. Para de ser chato, vai.

-Ok. Acho que...Sr. Will conhece você.

-Mas é claro que conhece.-Ela jogou as mãos pro alto.-Estou hospedada na casa dele.  Por quê diabos ele não me conheceria?

-Preciso que você seja séria, Sophie.

-Ok.-Ela fez uma careta.-Desculpe.

-Quando chegamos, Sr. Will te olhou por horas, como se tentasse lembrar de você. Ele sabia seu nome, e falava de você como se te conhecesse. E como se conhecesse muito bem. E ele mantém isso até hoje. Eu não sei o que é isso. Não sei mesmo. E eu só quero descobrir.

-Edward, por favor. Raciocine comigo .-Ela suspirou.- Sou uma Hadley. Quem nessa região não me conhece? Acho que todos aqui já ouviram meu nome pelo menos uma vez. O velho deve ter ficado...surpreso de ver a “Princesa Sophie” em sua casa.

  Fiquei a olhando por um minuto. Não, não era isso. Ela nunca entenderia. Tinha algo além disso. Muito além. Aquele velho escondia algo relacionado a ela, e eu iria descobrir isso.

-Claro. Você está certa. Como eu não pensei nisso antes?

 Ela sorriu, satisfeita.

-Vai me contar agora?-Perguntei.

-Não aconteceu nada de interessante. Eu só...estava desenhando no quarto, quando olhei a janela e vi uma garotinha.

-Uma garotinha?-Ri.-Hã.

-Posso falar sem você me interromper? Sim? Grata. Decidi correr atrás dela e...- Á escutei contar toda a história. Mas uma coisa me deixou intrigado.

Gracie.

-E então, eu cheguei aqui.

-Essa garotinha, Gracie. Quantos anos ela tem?

-Oito, porque?

-Ah meu Deus.-Um sorriso se formou em meus lábios. Desconfiava que estava queimando agora.-Ah meu Deus, Sophie!

-O que foi? Ficou maluco? Edward, você bebeu?

-É minha Gracie, Sophie. Minha Grace está viva! Meu Deus.

-Não pode ser...como eu não pensei nisso? Ela tem tudo pra ser sua irmã perdida, Ed. Céus.

-Escute, Sophie. Preciso que me conte como ela está, o que ela disse, se ela falou de mim e pra onde ela foi.

-Olha, ela estava bem quando eu a encontrei e...-Me encostei numa árvore e prestei atenção no que ela dizia.

Gracie. Minha Grace. Será que era mesmo ela? Ou eu estava ficando maluco?