A Beautiful Mess escrita por Danendy


Capítulo 8
Capítulo VIII – Piquenique


Notas iniciais do capítulo

Capítulo adiantado, espero que gostem.
Ah, leiam as notas finais. ;)



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A semana passou rápido, porém, infelizmente, não sem problemas. Os pesadelos voltaram a estar dentro do padrão, com gritos, fumaça, meu pai, mais gritos. Isso não fazia deles menos assustadores, claro, mas a esses eu podia sobreviver. Quando sábado chegou, eu fiquei aliviada. Especialmente por causa de Johanna, que além de acompanhar Haymitch ao grupo de apoio e de estar tentando reintegrá-lo ao trabalho na loja de ferramentas, também recebera uma visita inesperada durante a semana. E não fora de Finnick, a quem eu tinha quase certeza que ela iria procurar em breve quando a raiva e o desapontamento passassem. Não, quem a visitou foi Annie Odair.

Annie batera na nossa porta no começo da noite de quarta, antes que Haymitch e Johanna tivessem saído para o grupo de apoio. Eu atendi e cogitei mandá-la embora, mas Johanna surgiu atrás de mim antes que eu pudesse sequer dizer uma palavra.

— Katniss, por que não vai ver se Haymitch já está pronto? Diga a ele que vamos sair em dez minutos… — Seu rosto estava lívido e o tom na sua voz não deu espaço para qualquer retórica minha.

Eu subi as escadas um tanto relutante em deixá-las ali, mas não quis desafiar Johanna, aquilo era um problema dela, e ela saberia lidar com ele. Bati na porta do quarto de Haymitch e sem delongas, girei a maçaneta. Estava aberta. Entrei e o encontrei olhando da janela do seu quarto para a varanda. Não dava para ver muita coisa daquele ângulo, mas era possível escutar. Juntei-me a ele, em silêncio.

— O que acha que ela está fazendo aqui? — Sussurrei.

— Shh! Escute. — Ele apontou para a varanda.

Eu me concentrei em tentar entender o que diziam lá embaixo, mas a distância tornava isso uma tarefa difícil. Só consegui entender bem quando uma delas levantou a voz. Era Annie.

Me diz, por acaso ele disse que queria ficar com você? Por acaso ele alguma vez falou que ia me deixar?! — Ela pausou, para tentar recuperar o fôlego, pensei. — Por favor… você já sabia que essa era uma batalha perdida quando entrou nisso. Eu não sei o que ele diz a você, mas que fique claro: Finnick me ama. Nós vamos ter uma criança.

— Ah, felicidades! — Disse Johanna, e eu reconheci o tom sarcástico em sua voz. — Mas como disse, não faço ideia de onde seu marido está. Agora, se o recado já foi dado, tenho um compromisso. Passar bem. — E pude ouvir a porta se fechando.

Quando dei por mim, Haymitch já estava na porta do quarto. Eu o segui e descemos a escada juntos para encontrar uma Johanna com um estranho sorriso no rosto, sentada no sofá da sala. Não era isso que eu esperava. Não era um sorriso natural, era algo reprimido. Um sorriso com esperanças que ela não queria ter. Ele logo se desfez quando ela se deu conta de que estávamos ali.

— Vamos? — Falou para Haymitch e se levantou do sofá.

— Claro, vamos. — Haymitch respondeu.

Eu os assisti da porta da casa enquanto eles pegavam a velha caminhonete de Haymitch na garagem e saíam. Fazia tempo que ninguém ligava aquela lata velha, tanto que tinha minhas dúvidas quanto ao seu funcionamento até aquele momento.

A manhã da quinta também foi estranha, pelo menos para Clove, que quando me encontrou num dos corredores da escola, antes das aulas começarem, me contou que não vira Lavinia com Cato naquele dia. Eu ficava me perguntando se agora ela os seguia por aí, desejei que não.

A tarde daquele mesmo dia foi normal, ou quase isso. Era dia de reunião para preparação do discurso. Glimmer novamente mostrou sua hiperatividade enquanto dizia mil coisas, lia o discurso e comia o que eu achei ser uma pequena cenoura. Finch, Marvel e Peeta pareciam acostumados àquilo, mas ainda era esquisito para mim.

Ao fim da reunião, Glimmer nos explicou que o trabalho estava pronto e que agora tudo que tínhamos a fazer era ajudar com a preparação do palanque para a cerimônia de formatura no fim da próxima semana. Ela saiu com Peeta (que se despediu de mim com um aceno) e Finch. Eu ficaria para ver o último treino de Clove e Lavinia na equipe de animadoras.

Marvel também ficaria. Ele e eu nos olhamos em silêncio enquanto sozinhos no auditório. Talvez, nunca pudéssemos agir normalmente um com o outro, mas, depois de pensar sobre a noite do baile, decidi que tratá-lo mal não fazia mais sentido algum.

— Vai esperar Clove? — Eu perguntei o que já sabia, apenas para quebrar o clima tenso.

Ele assentiu. Falar não funcionara, ainda estávamos tensos e hesitantes. Pensei em sair dali e ir procurar Clove no vestiário, porém não tinha a menor vontade de ficar cercada da equipe de torcida. Eram barulhentas demais e suas conversas não me interessavam nem um pouco. Voltei a me sentar, colocando a mochila sobre o colo. Marvel pareceu hesitar, mas fez o mesmo a umas três cadeiras de distância.

— Soube que está me seguindo. Stanford, hã? — Eu brinquei.

Ele sorriu. Era aquele conhecido sorriso malicioso que no passado me atraíra tanto.

— Então Clove contou? — Ele deu de ombros. — Fui aceito na Universidade do Texas também, mas era o que minha mãe queria…

A mãe de Marvel deixara o pai dele há dois anos e fugira com um pintor. Ela agora vivia no Texas com esse mesmo homem, e queria que Marvel ficasse mais próximo dela. Ela deixara bem claro que nunca o abandonara, mas sim a seu pai, que vivia para o trabalho e se esquecera completamente que tinha uma família. O pai de Marvel era médico e passava tempo demais no hospital. Às vezes, eu podia sentir a solidão na sua casa quando acordava no meio da noite com um pesadelo e ficava vagando por lá.

— Sei… — Falei. — Está pensando em se formar em quê?

— Por que a pergunta? Pesquisando possíveis maridos ricos? — Seu tom era divertido.

— Talvez… — Eu mordi o lábio inferior de leve de maneira inconsciente, sabendo que isso o provocaria.

— Kitty, você é fogo, hein? — Ele sorriu. — Ciências políticas, já que quer tanto saber.

— Eu deveria ter adivinhado. — Me permiti sorrir também. — Bem, meus parabéns.

— Obrigado.

E então o silêncio veio novamente. E foi estranho, porque desta vez não era incômodo. Era aquele mesmo silêncio íntimo que costumávamos compartilhar, e isso me fez sentir esquisita. Será que eu sempre me sentiria assim a respeito de Marvel?

A sexta-feira chegou e foi embora como um flash. No caminho de casa, com Peeta — com quem eu voltara para casa durante toda a semana, exceto no dia anterior — eu dei meu número de telefone a ele, e pedi que me mandasse uma mensagem com o endereço.

— Eu posso te buscar… — Ele ofereceu.

— Não, não precisa. Eu encontro sua casa, preciso apenas do endereço. — Falei.

— Tudo bem. — Ele não insistiu. — Fico feliz que não tenha mudado de ideia.

Paramos no mesmo ponto em que sempre nos despedíamos. Eu devo ter dirigido a ele aquele sorriso afetado que eu descobrira ser capaz de exibir desde que começáramos a andar juntos, pois Peeta sorriu também, e eu adorei ver as suas covinhas surgirem em seu rosto.

— Bem, eu tenho que ir agora… — Comecei, ajeitando a mochila nas costas. — Vejo você amanhã.

— Até amanhã. — Seus olhos azuis fitaram os meus.

Eu me virei e atravessei a rua. Ao chegar do outro lado eu me virei novamente para vê-lo ali parado na calçada, como sempre, olhando para mim. Aquela sensação estranha no peito me acometeu de súbito novamente.

Mas, enfim, era sábado, e Johanna andara tão ocupada que nem sequer tivera tempo para alguma crise de “depressão pós-cretino”, então, com o fim de semana, aproveitou para fazer o que sempre fazia e afundou no sofá e na frente da TV, enquanto Haymitch saía para abrir a loja e eu arrumava as coisas.

Mais tarde, Johanna e eu preparamos o almoço, na verdade ela cozinhou, eu apenas cortei alguns temperos e ajudei lavando as vasilhas que sujávamos. Haymitch chegou pouco antes do meio-dia. Johanna o inspecionou tentando ver se ele não tivera alguma recaída — ela passara a semana toda fazendo isso —, e foi quando almoçamos os três a mesa da cozinha.

Durante a tarde, havia combinado de me encontrar com minha turma no parque próximo de casa, o mesmo em que eu, às vezes, costumava vagar quando estava muito sobrecarregada. O dia não estava quente demais, o que possibilitava fazermos um piquenique por lá. Chamei Johanna, e antes que ela inventasse alguma desculpa para não ir, Haymitch falou:

— Se eu tenho que ir ao grupo de apoio, querida, você vai a um piquenique com a Katniss. — E se virou para mim. — Docinho, só a traga de volta quando ela estiver feliz.

— Ok. — Falei. — Voltamos às seis.

E puxando Johanna por um braço e carregando uma cesta com o outro, saí pela porta da frente. Johanna, arrastada por mim, fechou a porta e se soltou. Olhou para mim de um jeito cético.

— O que eu vou fazer lá? — Perguntou cruzando os braços.

Permanecíamos na varanda. Seus olhos castanhos e grandes me encaravam, enquanto os meus a estudavam. Ela usava um short curto, que cobria menos que metade da coxa. Sua pele estava pálida de tanto evitar o sol, mas ainda estava em forma. Vestia também uma camiseta bem humorada que comprara há alguns anos, antes de decidir adiar a ida para a faculdade de ciências da computação. A camiseta era rosa e dizia “Push my buttons”¹, com um teclado logo abaixo, sobre a curva dos seios.

Sorri.

— Ah, vamos lá. — Falei arrumando minha saia de pregas azul que ia até um pouco acima do joelho. — Vai ser divertido. O pessoal gosta de você.

Ela me olhou desconfiada, mas logo deu de ombros e fez menção de ir em frente. Fiz o mesmo.

-x-

O clima no parque era mais fresco, por conta das árvores, isso explicava o número de pessoas que também tiveram a ideia de fazer um piquenique naquele dia. Mas nenhum grupo era tão animado quanto o nosso. Éramos oito jovens, sentados na relva, comendo e conversando, todos ao mesmo tempo. Depois de uma semana com um clima tenso durante as refeições, fiquei feliz de ver todos contentes.

Bem, quase todos, pois Madge não estava ali conosco. Ela saíra com a mãe para escolher vestidos para uma cerimônia oficial que seu pai teria em algumas semanas. Ser filha do prefeito, às vezes, era um empecilho. Apesar disso, Gale parecia contente conversando com Johanna. Eu tentava levar a conversa com Clove, (consequentemente) Marvel — que ela convidara — e Darius para evitar que ela se distraísse com Lavinia e Cato, que podiam até não ter estado juntos na quinta pela manhã, mas ali eles pareciam bem unidos. No entanto, eu acabava sempre ficando sem jeito com os sorrisos maliciosos do vizinho da minha amiga.

 Quase comemorei quando Lavinia, que estava deitada sobre a relva, com a cabeça apoiada no colo de Cato, fez uma pergunta a Johanna:

— Johanna, estou curiosa… como é ir pra cama com um homem casado?

Quase…

Todos ficaram calados e — tenho certeza — prenderam a respiração. Havia essa coisa sobre Lavinia e Johanna. A mãe de Lavinia era uma das religiosas e puritanas da cidade que se pudesse apedrejaria Johanna em praça pública. Lavinia tampouco aprovava sua conduta, o que certamente fora a razão pela qual Johanna me lançou aquele olhar cético quando eu disso que todos gostavam dela antes de sairmos de casa.

Achei que Jo ia perder totalmente a cor e ficar desconcertada ou perder a cabeça e ir embora, porém, diferente da garota abatida que chegara chorando em casa na semana passada, ela sorriu bem-humorada e respondeu:

— Bem, não tem nenhum segredo, é o mesmo que ir pra cama com qualquer um. — Disse. — E disso você entende bem mais do que eu, certo? — Ela sorriu irônica e piscou para a ruiva.

Clove foi a primeira a rir. Não porque ela estava magoada com Lavinia — pelo menos não só por isso —, mas porque não consegui segurar o riso. Quase ninguém conseguiu, até mesmo Cato que deve ter sido o que mais se esforçou para isso, esboçou um leve sorriso. Lavinia o acotovelou.

— Podia ter vivido sem essa Lavinia. — Darius falou, e então se voltou para Johanna. — Já disse que virei fã da sua camiseta?

Johanna lançou aquele olhar de flerte, que há tanto tempo eu não via, para Darius. Aquela era minha garota, confiante, sensual e petulante. Sorri para ela.

— Se sentiu tentado? — Ela perguntou e puxou um pouco a camiseta, o que acabou exibindo parte de sua barriga lisa.

— Posso? — Darius perguntou.

— Não… — Ela soltou a blusa. — Só o bonitão aqui pode, vesti essa roupa especialmente para ele. — E se virou para Gale novamente.

Gale teve que olhar para baixo, porque sempre ficava encabulado com as investidas de Johanna, mesmo que não fosse novidade. Ambos tinham em comum não só o meu afeto, mas o amor por exatas. Alguns anos antes, quando Johanna ainda estava no colégio, ela fora sua tutora nas aulas avançadas, e, desde essa época, Johanna parecia gostar de deixá-lo desconcertado. Era óbvio que ele se sentia atraído por ela, talvez todos os garotos ali se sentissem. Isso, claro, não queria dizer que Gale não amasse Madge e deixasse de lhe ser fiel.

— Ah relaxe, garotão. — Ela deu um tapinha no braço dele.

Johanna voltou os olhos em minha direção, não olhou exatamente para mim, mas para alguém próximo. Segui seu olhar, ela olhava para Marvel, como se fosse a primeira vez que o notava ali. Virei novamente para olhar para ela, e seus olhos estavam em mim, inquisidores.

— Não! — Eu sibilei.

Ela ponderou e resolveu ficar quieta. Era claro que se lembrava de Marvel, por conta das incessantes vezes que ele me procurara depois que eu decidi que não íamos a lugar nenhum. Ela cansara de dar desculpas a ele. Fazia quase oito meses, claro, por isso ela não se lembrou logo de cara.

A tarde passou rápido com todos reunidos. Quando eu e Johanna voltamos para casa ela fez questão de comentar sobre Marvel.

— Então me faz mentir por semanas, me faz atender ligações e agora é amiguinha dele de novo? — Johanna enfatizou o “amiguinha”.

— Dá um tempo, Jo. Clove o levou, e aquela história toda… bem, foi tudo culpa minha.

Ela me lançou um olhar cético enquanto subíamos as escadas da varanda de casa.

— Sério… — Insisti. — E bem, cansei. — Falei girando a fechadura. — Vou tomar um banho, tenho um compromisso às sete.

— Hum… Compromisso? — Ela parecia interessada. — Algo a ver com o bonitão do parque?

— Está atrevida hoje, hã? Não, não tem nada a ver com ele. — Expliquei. — É umm jantar, na casa de um amigo.

— Bem, use aquele vestido azul marinho, se vai conhecer a família de alguém… E avise se for dormir fora. — O tom maternal retornara. A velha e prática Johanna.

 Ela tomou a minha frente e entrou em casa. Haymitch estava na sala. Jogado no sofá vendo TV e comendo marshmallows de um saco que segurava. As pessoas do grupo de apoio disseram que era bom substituir um vício por outro, então quando sentisse vontade de beber, que ele substituísse por algo mais saudável. Eu sinceramente, não via nada de saudável em comer doces, porque ir de alcoólatra a diabético não era um grande progresso, mas se estava funcionando para ele…

Eu subi as escadas para o meu quarto depois de acenar para Haymitch. Johanna se juntou a ele na frente da TV, porém não antes de gritar que ele estava acabando com o estoque de guloseimas dela.

Ri e continuei pelo corredor.


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Notas finais do capítulo

¹ Aperte meus botões.
Então, pessoas, adiantei esse capítulo, porque só Deus sabe da minha vida a partir de amanhã. Começo de mês em contabilidade é puxado, e semana que vem iniciam novas disciplinas na faculdade, o que implica em mais trabalhos e menos tempo. E estou ainda com o lance da tradução, mas paro esta semana, porque infelizmente não tenho um vira-tempo (ainda). Outra coisa, é que estou lendo dois livros, e isso também toma tempo, mas não posso largá-los.
Enfim, o próximo capítulo é só sobre o jantar. Muitas ideias me vêm a cabeça, então pessoas, para o bem ou para o mal, preparem-se.
Amo vocês, e quero estar de volta na próxima semana com o capítulo. Me desejem sorte. ;*