A Beautiful Mess escrita por Danendy


Capítulo 7
Capítulo VII – Um convite


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítulo, pessoinhas. Desfrutem (ou não).



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Durante o almoço, meu grupo que, geralmente, vivia as gargalhadas e conversando, estava quieto demais. Não havia percebido esse clima mais cedo, mas, pelo que pude notar, alguns nem se olhavam nos olhos. Imaginei que estivesse perdendo alguma coisa. Por que toda aquela frieza ali? Clove hoje nem mesmo se sentara próximo a Lavinia. Elas sempre ficavam juntas. Apenas Madge e Gale pareciam alheios ao que estivesse acontecendo ali. Para eles, todo dia era uma lua de mel. Isso chegava a dar nojo depois de um tempo, sério.

  — Hm… — Comecei. — Vejo que o mosquito da discórdia picou alguém aqui.

— Por favor, Katniss, não é nossa mãe e nós não temos dez anos. Não use essas metáforas ridículas. — Lavinia falou ríspida.

— Ah dá um tempo, Lavinia… — Darius me defendeu.

— Certo… — Eu disse também já irritada. — O que houve aqui?

Até Madge e Gale saíram daquele mundinho de amor deles para se voltarem para o grupo. Talvez eu estivesse enganada, talvez eles soubessem e só estivessem ignorando o que quer que tenha acontecido.

— Nada, ok? — Clove também parecia alterada. — Não houve nada! — Ela pegou a bandeja e levantou.

Enquanto ela caminhava a passos rápidos para fora do refeitório, Darius, Madge, Gale e eu ficamos boquiabertos. Os únicos que pareciam entender o que acontecera eram Lavinia e Cato. Lancei meu olhar mais aterrador sobre eles. Que eles não pensassem em fugir como a Clove.

— Ok, o que foi aquilo? — Perguntou Madge. — O que diabos está acontecendo aqui? — Ela olhou para Lavinia.

— Ela deve estar na TPM, sei lá. — A ruiva deu de ombros.

— Aham. — Cato falou irônico.

Bem, parecia que eu estava mesmo perdendo alguma coisa. Levantei também, deixando minha bandeja sobre a mesa.

— Eu vou atrás dela. — Falei.

— Você nem sabe para onde ela foi… — Gale protestou.

— Para onde mais a Clove iria? — Murmurei enquanto ignorava o pedido de Gale e saía da mesa.

Não demorou muito para eu chegar à biblioteca. Havia apenas a bibliotecária e uns três alunos lá, nunca tinha muita gente, pelo menos não desde que a internet e as copiadoras se tornaram comuns à vida cotidiana. Segui até um canto afastado do cômodo, onde duas estantes abarrotadas de clássicos faziam frente uma para outra, e mais adiante eu a encontrei. Sentada no chão, encolhida no canto, Clove me lembrou de como anos antes eu a conhecera. Só mais uma perdedora que se escondia dos outros por ser alta e desengonçada demais. Não que tivesse algum problema nisso, tudo o que lhe faltava, na verdade, eram confiança e roupas dois números menores. Agora ela tinha as roupas, mas a confiança parecia ter ido embora novamente.

Sentei-me no chão ao seu lado e apanhei seu sanduíche natural sem nem mesmo pedir. Ela não pareceu se importar com isso. Eu poderia tê-la pressionado para dizer alguma coisa, mas apenas me concentrei em comer o sanduíche, afinal deixara meu almoço intocado sobre a mesa.

— Ela dormiu com ele na noite do baile, Katniss. — Clove finalmente falou, quando eu peguei a caixinha de suco da bandeja sobre suas pernas. — Ela sabia que eu gostava dele, sabia e mesmo assim dormiu com ele.

Espere, do que diabos ela estava falando? Quase engasguei com o suco quando percebi que ela estava se referindo a Lavinia e a Cato. Desde quando algo estava acontecendo entre eles, além das cantadas regulares e horríveis dele para ela? E desde quando Clove gostava dele? Aliás, quando foi que nosso grupo foi se complicar com essa coisa de romance? Madge e Gale não contavam, porque Madge não pertencia ao grupo até namorar Gale.

— Você gosta do Cato? Por que não me contou? — Foi tudo que eu consegui perguntar.

— Você anda distante desde o semestre passado. Não vai mais a minha casa, não foi mais aos jogos. Eu não podia te abordar no corredor ou durante o almoço. Como eu ia te contar?

Eu me senti culpada. Estava tão preocupada em me afastar de Marvel, que me esquecera de que como consequência estaria me afastando de Clove. Costumávamos ser boas amigas, tanto quanto eu e Gale éramos. Ela era o tipo de garota que eu gostava de ter por perto. Diferente de Madge ou de Lavinia, Clove era tímida — apesar de ser animadora de torcida — e parecia ter vergonha da própria beleza. Acho que a agenda social dela só ficava preenchida pelo fato de andar com as pessoas populares, mas na maior parte do tempo ela preferia manter as coisas quietas e ficar em casa. Eu costumava assistir filmes antigos, alguns até mesmo em preto e branco, com ela. Nós fazíamos milk-shakes e ficávamos na sala de estar durante os sábados à noite quando seus pais iam jantar fora. Clove também era uma das poucas pessoas que eu conhecia que não tinha pais separados.

— Eu sinto muito. — Consegui dizer. — Tinha falado com Lavinia sobre esses seus… sentimentos?

Ela apenas assentiu. Eu recostei minha cabeça na parede e suspirei.

— Bem, vocês deveriam conversar. — Sugeri.

Ela parecia prestes a chorar quando respondeu:

— Conversamos. Ela disse que também gosta dele. — Confessou. — Sabe, eu poderia superar se ela tivesse mentido e dissesse que estava bêbada demais, o que obviamente ela estava. Mas não, ela admitiu que gosta dele. — Ela deu um longo suspiro, como se tentasse reprimir o choro. — Eles chegaram juntos esta manhã. No carro dele e de mãos dadas. Acho que ela deve ter dito a ele algo sobre mim, porque eles evitaram agir como o Gale e a Madge durante o almoço…

Clove brincou com os dedos. Se estivéssemos num outro ponto da biblioteca, a moça responsável pelo local estaria nos mandando ficar quietas, mas ali era tão recôndito que nem mesmo ela poderia nos ouvir.

— Por que parou de ir lá em casa? — Ela subitamente perguntou. — Quero dizer, você sempre foi minha melhor amiga, não a Lavinia, por que se afastou?

Eu hesitei. Eu não me sentia a vontade para falar sobre aquele “episódio” da minha vida.

— Foi por que estava dormindo com Marvel?

Isso me pegou de surpresa. Se ela sabia, por que nunca tocou no assunto? Olhei incrédula para Clove

— Ah, por favor. Eu via você saindo da casa dele pela manhã, nos dias em que o pai dele estava viajando. Eu também vi vocês se beijando algumas vezes. Nunca entendi vocês dois… Geralmente o Marvel exibia as namoradas por aí, mas você… ele a queria só para si mesmo ou o quê?

— Eu não era namorada dele. — Clove me lançou um olhar cético. — Não do tipo que se sai apresentando por aí. Eu quero dizer, ele queria algo assim, mas eu nunca quis. Eu só gostava de…

— Transar com ele? — Clove completou.

Eu ri embaraçada. Essa era a velha Clove, delicada como uma paulada.

— Não! Quero dizer, sim… — Ela também riu. — Mais ou menos. A verdade é que eu gostava de vivenciar esse tipo de coisa, sabe? Somos adolescentes, certo? E ele era gentil comigo também. Mesmo com aquele apelido insuportável.

— Kitty… — Ela lembrou. — Sempre ria quando ele te chamava assim quando ia aos jogos. Você também parou de ir a eles…

Mais uma vez a culpa me afligiu. Ela era minha amiga. Eu deveria ter dito a ela. Deveria ter confiado nela e ter contado sobre Marvel. Talvez, nos últimos meses eu estivesse sendo egoísta. Quando ela recebeu a carta da Universidade de Miami, eu só ficara sabendo uma semana depois e por acaso. Ela também só soubera por acaso da minha admissão em Berkeley. Íamos ficar a quarenta e cinco horas — de carro — de distância uma da outra e nem nos lembramos de dizer isso. Quanta amizade…

— Como foi que passou a gostar do Cato? Ele nem é o seu tipo, ou sei lá…

— E eu tenho um tipo?

— Bem, você sempre saiu com os garotos inteligentes…

Nós duas rimos dessa vez. Cato era meu amigo, mas também era o clichê de atleta burro. Conseguira uma vaga na Universidade de Toronto no Canadá, apenas por conta do trabalho de seu pai como diplomata. Ainda assim, ele era divertido e sempre tinha cantadas horríveis para dizer a mim ou a Lavinia.  Achava estranho ele nunca brincar com a Clove.

— Ah, que se dane… eu vou para Flórida no próximo semestre, e ele vai para o Canadá. Aliás, nem sei por que estou me incomodando. Não vai durar com a Lavinia também.

Ela parecia aliviada ao proferir essas palavras, como se fizesse todo sentido. Eu não quis falar nada sobre relacionamentos à distância ou férias de verão para não irritá-la. Nem lembrei a ela que Lavinia se inscrevera para a Universidade Estadual de Ohio em Columbus — e fora aceita —, o que tecnicamente a deixava bem mais perto de Cato — pouco mais de seis horas de carro. Não queria desanimá-la. E afinal de contas, seis horas ainda era alguma coisa.

— Então, esquecendo esse drama que eu criei, e quanto a você e aquele garoto na noite do baile? — Clove perguntou.

Eu estiquei a mão para pegar a barra de cereal em sua bandeja, mas ela deu um tapa e afastou minha mão, enquanto pegava a barra para si. Ela sorriu enquanto tirava a embalagem e abocanhava.

— Peeta? — Eu falei, finalmente. — Ele é um cara legal. Meu parceiro em biologia.

— Ah… — Ela pareceu ponderar. — Você o beijou?

Clove tinha um sexto sentido e não havia me contado? Quando eu fiquei calada por tempo suficiente para que ela soubesse que a resposta daquela pergunta era afirmativa, Clove voltou a falar:

— Sinceramente, Kat, você hein? — Ela sorriu.

— Apenas aconteceu… — Expliquei. — E ele meio que surtou depois.

— Pelo menos têm caras beijando você… — Clove riu um pouco amarga. — Eu não vejo a hora disso aqui acabar.

Eu sabia do que ela estava falando. Colegial. Clove era animadora de torcida, e detestava o ensino médio. Panem Hill parecia ser um mundo paralelo.

— Vou sentir sua falta… na Califórnia. — Disse sincera e segurei sua mão sobre a bandeja em seu colo.

Ela terminou a barra de cereal e suspirou apoiando sua cabeça no meu ombro.

— Não se preocupe, eu vou ligar toda semana. Não vai se livrar de mim tão fácil.

Rimos e ficamos ali pondo a conversa em dia. Clove me contou que a mãe dera a ela passagens para uma viagem à Austrália naquele verão, e que ela estava ansiosa para ir. Voltaria para a matrícula na Universidade de Miami em agosto. Eu contei que estava pensando em arranjar um emprego de verão antes de ir para Berkeley. Também contei as coisas que andavam acontecendo em casa. Ela ficou indignada com a situação de Johanna. Mas ficou feliz quando contei que Haymitch resolveu tentar parar com a bebida. Ficamos ali durante tanto tempo que perdemos as aulas seguintes. Não importava, era bom ter minha amiga de volta.

-x-

Eu tentei encontrar Peeta nos corredores quando Clove e eu saímos da biblioteca, mas não havia ninguém mais por ali. Imaginei que ele fosse me esperar na sorveteria. Acreditava que sim. Clove se despediu de mim no estacionamento, quando foi pegar carona com Marvel. Ele olhou para mim e eu o olhei de volta, mas foi só isso. Saí pelos portões e caminhei despreocupada pela calçada.

Quando cheguei à sorveteria em que estivéramos na semana passada, adentrei o lugar e pude vê-lo sentado num reservado no fim do corredor. Ignorei todas as pessoas ali, quando ele ergueu a cabeça para poder me ver, e sorri involuntariamente quando meus olhos encontraram os seus. Mas o que diabos estava acontecendo? E o que eu diria a ele? Eu o beijara e depois ele fizera o mesmo. Isso não ia funcionar.

Enquanto eu caminhava em sua direção, um milhão de desculpas esfarrapadas surgiram na minha cabeça, porém nenhuma parecia verossímil. Quando me sentei de frente para Peeta, seus olhos me estudaram e então ele sorriu. Relaxei um pouco.

— Então, vai querer de quê? — Ele perguntou, mas parecia um pouco retraído. Eu não era a única nervosa ali.

— Hm?

— É… meu bilhete… seu sundae, vai querer de quê?

Ah, isso! Eu falei a ele que queria um grande, de creme e passas com cobertura de chocolate, castanhas e duas cerejas sobre. Peeta chamou educadamente a mesma moça que nos atendera na semana anterior, e fez nossos pedidos.

— É estranho parar aqui. Geralmente, eu só compro e vou embora. — Comentei assim que a moça nos deixou.

— É um lugar agradável. — Peeta disse. — Não é cheio de pessoas, toca canções em um rádio… parece que voltamos aos anos 1950.

— Foram bons anos. — Disse.

— Se você ignorar todo o drama pós-guerra, talvez.

— Bem, nada é perfeito. — Sorri.

E então ficamos em silêncio. Ele não conseguiu manter seu olhar fixo em mim, então o desviou antes mesmo que eu o fizesse. Tentei não me desesperar e fazer o que eu sempre fazia quando a situação entre mim e um garoto chegava a esse ponto: fugir.

Quando a moça retornou com os nossos pedidos, pudemos ficar em silêncio enquanto comíamos, o que melhorou um pouco o clima tenso entre nós. Tentei não pensar na noite do baile, porque isso me levaria a dizer alguma coisa imbecil. Talvez, eu não devesse estar ali, talvez eu não devesse tentar ser amiga dele. Isso parecia bem claro para mim. Tentei reunir toda a coragem que tinha para olhar o relógio em meu pulso e dizer que tinha que ir, mas Peeta foi mais rápido.

— Katniss… — Ele começou.

Larguei a colher na taça quase vazia e ergui minha cabeça para estudar seus olhos azuis apreensivos. Toda a coragem que eu tinha reunido se esvaiu e eu fiquei ansiosa para saber o que ele queria.

— Sim? — Perguntei, tentando esconder a ansiedade em minha voz.

— Bem… meus irmãos estão voltando esse fim de semana para as férias de verão e… — Ele estancou no meio da frase.

— E? — Eu tentei ajudar.

— E minha mãe vai fazer um jantar no sábado a noite para recebê-los. Eu… — Ele respirou fundo e demorou alguns instantes para falar novamente. — Eu queria saber se você gostaria de ir. Minha mãe adora cozinhar para as pessoas…

Ele estava me convidando para um jantar em sua casa? Estava me convidando para conhecer a sua família? Eu procurei em minha mente várias alternativas para declinar o convite, mas acabei fazendo justamente o oposto.

— Eu adoraria. — Eu finalmente disse.

Seu alívio era quase palpável e seu rosto se iluminou em um sorriso. Eu acabei sorrindo também. Foi quando eu pude esquecer a noite de sábado e o silêncio não mais era incômodo, porque a canção que tocava no pequeno rádio ali perto finalmente invadiu nossos ouvidos.

Oh, mirror in the sky, what is love?

Can the child in my heart rise above?

Can I sail through the changin' ocean tides?

Can I handle the seasons of my life?


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Notas finais do capítulo

Então, pessoal, andei fazendo minha maratona Academy Award essa semana, então fiquei ocupada e não deu para postar antes. Aliás, ansiosos pro Oscar desse ano?
Enfim, vou tentar adiantar o próximo, mas não posso prometer nada. Até semana que vem. ;**