Piratas Do Caribe: Um Novo Horizonte escrita por Tenebris


Capítulo 6
Capítulo 6: Propósito




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A neblina densa impedia Elizabeth de ver qualquer coisa à sua frente.

        Ela já mal podia enxergar os outros dois botes com o resto da tripulação que se salvara do naufrágio do Navio Luís IX. Neste bote, estavam apenas ela e Jack, que remara a viagem inteira, deixando Elizabeth encolhida a um canto do bote, tentando dormir, ainda coberta com o manto que Will lhe dera.

        Ela não lutava contra as lembranças. Apenas deixava que elas lhe invadissem as entranhas e a levassem para uma realidade idealizada mais confortável do que o mundo real. Elizabeth se contraiu mais a um canto, tremendo de frio, os dentes batendo uns contra os outros. E a lembrança de seu casamento fervilhava em sua mente.

        Quando em meio a uma batalha épica, aceitou o pedido de Will. Quando Barbossa os casou e eles se beijaram demoradamente, como se a guerra ao seu redor não tivesse mínima importância.

        Embora tentasse dormir, em nenhum momento da viagem ela conseguiu. Ela apenas fechava os olhos, sem de fato se desligar por completo. Ela nem sequer calculava quanto tempo estava à deriva no mar, navegando em um bote fornecido por Will, a caminho de Tortuga novamente.

        Seus devaneios foram interrompidos por Jack, que ainda remava. Seus olhos não apontavam para Elizabeth, mas sua voz parecia cautelosa quando falou:

        - Ele não aceitou, não é mesmo?

        Elizabeth retraiu-se, mas respondeu. Sua garganta ardia com o esforço que estava fazendo.

        - Não. – Ela suspirou. – Will não aceitou. Disse que é loucura, que não quer me condenar à servidão eterna no Holandês.

        - É típico de Willian.

        Jack falou de um modo como se conhecesse Will extremamente bem. Ele enfim encarou Elizabeth, sustentando-a pelo olhar. A voz um pouco mais elevada:

        - Sabe, Elizabeth. Não devia estar surpresa. Will está certo em não desejar sua morte, já que ele a ama.

        - Ora, Jack. – Elizabeth também elevou o tom de voz duas oitavas. Um humor ácido se sobressaiu. – Eu iria poder ficar com ele para sempre. Porque não aceitaria?

        - Porque Will quer lhe proteger. – Ele apontou um dedo para o lado esquerdo de Elizabeth, onde estava seu coração. – Quer proteger sua alma. Quer proteger sua alma da fragmentação, do esquecimento, e do sofrimento eternos. É isso que acontece quando alguém entrelaça seu caminho com o Holandês: Algo pior que deixar se existir. Caso não se lembre, eu estive no Baú de Davy Jones.

        - Jack! – Elizabeth gritou revoltada. Não podia admitir Jack estando ao lado de Will. Ela esmurrou a madeira do bote, fazendo-o balançar furiosamente. – De que vale minha alma, se não posso ficar junto de Will?

        Sua voz enfraqueceu ao final da frase. Elizabeth se lamuriava, uma única lágrima escorrendo pelo rosto. Ela estava cansada de chorar, quando tinha a solução, e todo o mundo contra ela.

        - Para você, sua alma pode valer muito pouco ou nada, querida. – Disse Jack, seus olhos incisivos fizeram com que Elizabeth desviasse o olhar por um tempo. – Mas pense em Will. Elizabeth, sua alma é a única coisa que lhe resta.

        - O que quer dizer, Jack?

        A verdade era que Elizabeth sabia muito bem. E relutava em admitir que era correto o que Jack dizia. Ela voltou a fitá-lo pelo canto do olho. Seu inconsciente temendo as próximas palavras que ouviria.

        - Querida, a sua alma é a única coisa que ainda liga Will a este Lado do Mundo.

        O bote atracou.

        Elizabeth mal digerira as palavras que acabara de ouvir. Fazia completo sentido. Ela levantou-se, ainda tonta por tanto tempo em mar aberto. O sol estava quase se pondo. Era a hora do dia que ela mais gostava, pois, às vezes, podia enxergar o tão conhecido clarão verde, significando que Will regressara do Outro Lado, no qual precisava realizar seu trabalho de levar as almas que morreram no mar.  

        Ela saiu pesadamente do bote, Jack a acompanhou até a parte principal do Porto de Tortuga. A tripulação que havia sido reunida saiu às pressas do bote quando chegaram à terra firme. Alguns saíram correndo desesperados alegando que o Juízo final aconteceria, outros beberam rum, e ainda outros foram rapidamente contar aos outros que o Cracken havia retornado dos mortos dez vezes maior e que vivenciaram essa cena verdadeiramente.

        - Está tudo bem, Elizabeth... Jack? – Falou Senhor Gibbs, se colocando entre Jack e Elizabeth

        - Ótima. – Ela respondeu, a voz sem emoção.

        - Bom, vou ver se acho algum lugar para passarmos a noite. Acho que precisamos de uma nova tripulação e um novo Navio. Até logo, Jack.

        Senhor Gibbs saiu apressado, com Jack por um momento em seu encalço, andando desajeitadamente como sempre fazia.

        - Senhor Gibbs! O rum! Não se esqueça do rum! Quero muito rum!

        - Sim Capitão! – Senhor Gibbs fez um gesto de continência e se foi, deixando Jack e Elizabeth sozinhos.

        - Não vou perguntar se está tudo bem, porque sei que mentirá, dizendo que está bem, mesmo hipoteticamente não estando, Savvy?

        Elizabeth abriu um sorriso milimétrico. Era este Jack que ela conhecia, tentando sempre ver o lado positivo das coisas. Jack se aproximou e ajustou o manto cinza em Elizabeth.

        - Pois é.

        - O que pretende fazer, agora que está de volta à Tortuga? – Perguntou Jack, entregando a sua bússola de pronto a Elizabeth.

        - Obrigada Jack, não precisa. Sei o que quero. Vou voltar à Bahia Naufrágio. Lá eu vou pensar melhor sobre o que Will me disse.

        - E sobre o que eu disse também, não é mesmo? – Jack parecia animado. Ele passou o braço na cintura de Elizabeth e a conduziu pelo Porto, na direção da Rua Principal.

        - Claro. Acho que preciso desse tempo sozinha. Há muito que refletir.

        - Boa sorte, querida. Se precisar de ajuda, sabe onde me encontrar. Tem meu total apoio.

        Em geral, Jack não era tão prestativo como estava sendo. Elizabeth se perguntava o porquê disso. Talvez ela devesse estar transparecendo o sofrimento que sentia por dentro, de modo até mesmo a despertar a compaixão de Jack.

        - Obrigada, obrigada mesmo, Jack. Por tudo. Obrigada por sempre estar ao meu lado nos momentos difíceis.

        O sol se punha no Horizonte, o céu mesclava-se em tons de rosa e laranja homogeneamente.

        Elizabeth abraçou-o, e Jack retribuiu o abraço apertado igualmente. Gentilmente, colocou as mãos no rosto de Elizabeth. Ela encarava aquele rosto misterioso, com olhos tão profundos e escuros como o mar. Então Jack fez uma coisa que nunca antes fizera com Elizabeth.

        Ele se inclinou, beijando de leve a testa de Elizabeth.

        O sorriso com os dentes careados e dourados se abriu, revelando um Jack que talvez Elizabeth não conhecesse tão bem assim.

        Jack perdeu a conta. Não sabia se era a quarta, sexta ou décima garrafa de rum. Ele e Senhor Gibbs estavam sentados em uma mesa do barzinho onde sempre costumavam ficar, comemorando e bebendo pelo nada. Homens cantavam alegremente com suas sanfonas. Ao canto, um casal se beijava e outros dois homens se batiam. Tudo no ritmo já conhecido do porto pirata de Tortuga,

        - A nós! – Dizia Jack. – Porque um dia ainda vamos recuperar o Pérola Negra!

        - Sim, Jack! – Dizia Senhor Gibbs, que já estava vermelho de tanto beber.

        - Todos se lembrarão do dia em que quase capturaram...

        Jack não concluiu a frase.

        - O Capitão Jack Sparrow.

        Mas alguém concluíra por ele.

        Jack se virou. Atrás dele estava um rosto conhecido. Um homem alto, de cabelos negros lustrosos, com fardas azuis e vermelhas. Ele levantou-se de pronto, tirando a arma de dentro de capa a apontando-a para o homem.

        - Parece-me familiar... Eu já o ameacei?

        - Lembra-se de mim, Sparrow. Quanta honra! – Havia acidez no tom do homem, que fazia questão de deixar a ironia bem evidente. – Deve se lembrar de um capitão que você embebedou há alguns dias atrás, tomando-lhe, ou melhor, roubando-lhe o navio para praticar pirataria.

        O homem pronunciou a palavra pirataria com tal repugnância que fez Jack franzir o cenho. Ele mal tinha reparado que o homem estava cercado por soldados ingleses, que apontavam fuzis para ele.

        E ele, sem dúvida, reconhecia o homem. Não se lembrava do nome, mas recordava-se que o havia embebedado aqui mesmo em Tortuga, roubara-lhe cartas de curso e licenças de Corsário. Tudo isso para embarcar com um bom navio em direção ao Holandês a fim de recuperar seu bem maior, o Pérola Negra. E agora ali jazia o homem diante dele. Com certeza pediria explicações e até mesmo expediria um mandado de morte.    

        - Siga-me, Sparrow. Temos muito que conversar.

        - Sou Lewis Evans, Capitão Sparrow. – O homem pronunciava “Capitão Sparrow” como se a expressão lhe provocasse graves náuseas.

        Jack fora levado pelos soldados ingleses até um porão ao fundo daquele mesmo bar. Agora, entrava no que parecia um escritório. Lewis sentou-se na cadeira da mesa central. O local era cheio de mapas pregados nas paredes, globos terrestres e armas. Logo atrás da mesa principal, na parede, havia um símbolo que Jack reconheceu de imediato: O símbolo da Companhia das Índias Orientais.

        Jack estava cercado. A única porta estava guardada pelos seis soldados que o acompanharam, ainda com os fuzis apontados pra ele. Lewis sentou-se, aparentemente divertindo-se com a expressão de apreensão de Jack.

        - O que um homem como eu poderia fazer para ser útil, Comodoro Lewis? – Jack inclinou-se, observando um papel na escrivaninha no qual se lia “Comodoro Lewis Johansson Evans”.

        - Não seja idiota. Eu sei por que você roubou o meu Navio. Recorda-se? Luís IX?

        Jack demorou-se a responder. Ficou observando atentamente pares de espadas emolduradas na parede, cada qual parecendo mais afiada e convidativa para uma fuga.

        - Ora, não me diga? Porque então? – Jack tentou tirar uma das espadas da parede, mas esta permaneceu presa. Um silêncio constrangedor pairou no ar antes que Lewis respondesse, como sempre, ácido.

        - Eu sei que você roubou o meu Navio Luís IX a mando de Willian Turner, o novo Capitão do Holandês Voador.

        Jack riu durante algum tempo. Em suma, não havia roubado um Navio para entregar a Will. Apenas queria um meio de chegar até ele para perguntar sobre o Pérola.     

        - Porque ri? – Indagou Lewis. – Está surpreso? Ora, o Navio Luís IX era o Navio mais veloz e poderoso dessas águas. Tinha grande potencial para concorrer com o Holandês. Então, você o roubou a mando de Will para que ele destruísse o Navio, ficando assim, livre de qualquer concorrência marítima.

        - O que o faz pensar que Will Turner destruiu seu precioso Navio? – Perguntou Jack, divertindo-se internamente. Ele serviu-se de uma taça de licor, na mesa de Lewis.

        - O que me faria pensar que Will não destruiu o meu Navio por medo? Acha que minto, Sparrow? – Lewis cerrou os punhos em um dos mapas.

        - De forma alguma. Eu admito, você descobriu. – Disse Jack teatralmente, caminhando entre os soldados. – Eu roubei, sim, o Luís IX a mando de Willian Turner.

        Jack sabia que só fazendo isso, concordando com Lewis, conseguiria sair dali vivo. Mesmo porque ele jamais acreditaria em Jack, caso ele dissesse que tudo isso nada tinha a ver com Will. E depois, Lewis parecia tão convicto da sua hipótese que Jack não ousou contrariá-lo.

        - É uma pena que Willian Turner tenha dado um tiro às cegas. Isso que ele acabou de fazer para despistar-me apenas me deu uma brilhante ideia.

        - Diga-me, sou todo a ouvidos. – Disse Jack, servindo-se de mais uma taça de licor. Mentalmente, ele completava sua frase anterior: “Diga-me, sou todo a ouvidos... Enquanto houver licor.” 


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