Virei o rosto rápido quando percebi seus olhos nos meus. Vi pelo canto do olho que ele deu um sorrisinho rápido e voltou a escrever algo em seu caderno. Corei. Seus olhos passavam uma sensação de calor, não sei.. Nunca havia me sentido daquele jeito antes. Ele voltou a tocar, e eu voltei a desenhar, observando o sol quase apagado pelo mar e escutando sua voz doce e encantadora. Precisava ir logo, pois já estava ficando tarde e minha tia ficaria preocupada, mas eu não conseguia. Sua voz era como um vício, uma vez escutada e eu não conseguia mais parar. Sem perceber, quando ele deu mais uma pausa em sua música, continuei cantando “It’s harder to leave with my heart on my sleeve than to stay and just pretend”.

– Gostei da frase – Escutei uma voz do meu lado direito, carregada de sotaque britânico – ficou perfeita, na verdade – vi o ruivo se levantando e andando em minha direção – Prazer, Ed – disse estendendo sua mão em minha direção.

– Hum.. Obrigada – estendi minha mão de volta, apertando a dele. – Charlotte.

– Se importa se eu me sentar aqui Charlotte?

– Claro que não, pode se sentar! - cheguei um pouco para o lado enquanto ele se acomodava ao meu lado, observando meu desenho.

– Você desenha muito bem. É talentosa. – disse, enquanto analisava meu desenho melhor

– Obrigada. Você também, o escutei tocando.

– Obrigada – ele sorriu, corando. Pegou o violão e o ajeitou em seu colo – Se importa de eu tentar encaixar seu trecho em minha música?

– À vontade – virei meu desenho em sua direção, enquanto ele começava a dedilhar seu violão, formando uma melodia única. Sua voz começou a ecoar em minha mente.

“I paid all my dues and she wanted to know
That I'd never leave her now I'm ready to go
As strange as it seems, she's endless to me
She's just like paperwork but harder to read

Patience's my enemy, loving's my friend
It's harder to leave with my heart on my sleeve
Than to stay and just pretend”

– E aí, gostou? – Disse olhando profundamente em meus olhos, parecendo se importar loucamente com a minha opinião.

– É perfeita! – me deixei sussurrar, o fazendo sorrir aliviado.

– Ainda não está pronta, mas.. – o cortei

– Continua perfeita! Muito melhor que qualquer coisa que já escutei. Você é muito bom, deveria ser reconhecido por isso. – Ele riu envergonhado, abaixando a cabeça. – Que horas são?

– São 19:42 – ele disse olhando seu relógio – porque?

–Preciso ir! Minha tia deve estar preocupada..

– Posso te acompanhar? – Ele fez uma carinha de cachorro abandonado

– Claro! – disse rindo enquanto ele me ajudava a levantar – é aqui em frente, mas mesmo assim, posso aproveitar de um pouco de companhia

– Mas então.. Você não parece ser daqui. De onde é?

– Porque não pareço ser daqui?

– Moletom, all star.. Não é muito típico de californianos – ele riu

– Bem, assim como eu você não parece ser daqui também.

– Sou de Framlingham, uma cidadezinha em Suffolk, Inglaterra.. Não é muito conhecida.

– Bem que reparei seu sotaque britânico – ele riu.

– E você, de onde é?

– Nova York. – Ele pareceu surpreso

– Sempre quis saber como é lá. Todas aquelas luzes, a cidade aonde os sonhos são feitos.

– Um dia você irá tocar no Madison Square Garden, e eu vou estar na primeira fila, escutando um coro de fãs gritando seu nome. – Vi suas bochechas ficarem vermelhas enquanto colocava ambas suas mãos nos bolsos de seu moletom.

– Acha mesmo que isso pode um dia acontecer? – vi novamente seus olhos azuis me encarando, aquele olhar ingênuo e ao mesmo tempo tão sábio.

– Tenho certeza. Você tem talento ruivinho, é só não desperdiçar. – baguncei seu cabelo enquanto ele sorria. – É aqui. – disse enquanto subia os degraus da casa de minha tia.

– Wow – ele disse a admirando – É uma bela casa, hun?

– É da minha tia... Ela está me acolhendo aqui por um tempo.

– Mas então Charlotte, será que a gente podia se encontrar de novo? Gostei de conversar com você. Queria te conhecer melhor – ele deu um sorriso que faria qualquer garota derreter.

– Sim! Poderíamos nos encontrar amanhã, talvez.. Pode ser? – disfarcei meu nervosismo dando um sorriso. Bem.. não funcionou.

– Claro, eu te pego aqui umas 19:00 e a gente podia fazer alguma coisa... Já conheço a cidade há mais tempo, posso te mostrar alguns lugares legais

– Está marcado – sorri e acenei quando ele já estava mais longe. A última coisa que vi foram seus olhos encontrando os meus novamente num último suspiro antes de fechar a porta.