Legalmente Ruiva escrita por Snapelicious


Capítulo 4
Três


Notas iniciais do capítulo

Eu sou um ser humano horrível.
Estava viajando na maionese quando percebi que não atualizava essa fic desde dezembro. Sério, eu sou uma pessoa horrível.
Por mais que eu abrisse esse documento todo dia, nunca conseguia escrever mais do que oito palavras, e olhe lá. Fiquei empacada por quase três meses.
Um recorde.
Mas eu adorei escrever esse capítulo, e tenho quase certeza que o próximo não vai demorar (pelo o menos não tanto quanto esse). Agradeço a todos que ainda suportam meus atrasos. Na verdade, agradeço á todos que ainda não me mandaram uma MP me mandando para aquele lugar.
Vocês são demais.



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O sapato prendeu na parede. E ficou lá, balançando ameaçadoramente, com o salto fincado no cimento. O cara de olhos verdes me olhou confuso.

–Isso poderia ser considerado como tentativa de assassinato – disse ele, e me olhou de cima à baixo – Mas eu sei que você está tendo um péssimo dia.

–Uh – murmurei, sem saber o que dizer – Eu acho que vou pra casa.

Fui cambaleando até a parede e dei um puxão forte no meu sapato. Não saiu. Puxei de novo. Não saiu.

–Eu ia dizer que você tem uma força extrema para conseguir colocar ele aí, mas acho que me enganei – ele deu uma risadinha, e com um puxão, tirou meu sapato da parede – Nossa, formou uma cratera...

–Foi acidente, ok? - reclamei, colocando o sapato – Não ria de mim.

–Eu não tô rindo – disse ele, em uma tentativa fracassada de se manter sério – A propósito, sou Harry. Harry Potter.

–Ginny Weasley – falei – E essa é minha deixa para ir embora. Espero nunca mais te ver, tchau!

–Você não veio aqui para uma entrevista de emprego? - perguntou ele, quando eu alcancei a maçaneta. Me virei.

–Você aceita idiotas na sua empresa? - perguntei. Harry deu de ombros.

–Depende.

E sorriu.

Hoje mais cedo eu disse que casaria com ele. Esse pensamento me fez corar. Tá, ok. O cara era muito lindo, me pagara um café, tinha possibilidade de ser meu futuro chefe e eu estava praticamente pelada em sua frente. Sem falar no descalça.

–Sente-se – disse Harry Potter, apontando para a cadeira em frente à sua mesa. Tomando todo cuidado do mundo para não causar maiores estragos, sentei – Então, Ginevra Weasley? - perguntou ele, olhando para meu currículo. Não ria do meu nome, por favor, não ria do meu nome – Formada em jornalismo, trabalhou em uma revista de jardinagem – ele ergueu as sobrancelhas – Em uma locadora de vídeo. No... Bob's? Participou de um clipe do Ricky Martin - ele coçou a cabeça, mas seus olhos em seguida se arregalaram – E na Wilf Projects.

Oh, mierda.

–É um currículo bem diferente – disse ele, colocando o papel na mesa. Dei um sorriso sem graça.

–Eu sou multi-funcional.

É. Agora Ginny Weasley é uma impressora HP LaserJet.

–O que te fez deixar uma das maiores empresas dos Estados Unidos para vir trabalhar em uma revista de finanças? - perguntou ele.

Sério, eu tinha esperanças que ele não fizesse pergunta nenhuma.

–Eu estou procurando por um ambiente mais calmo – inventei, tentando parecer relaxada. Na verdade, eu estou procurando qualquer coisa que dê dinheiro – E que tenha relação à minha carreira como jornalista, já que eu amo escrever.

–E porquê a Successful Savings? - perguntou ele, parecendo interessado.

–A o quê? - franzi o cenho.

–Successful Savings – repetiu ele – A nossa revista.

–Ah, claro – pisquei. Ai, caramba – Eu estava vendo as possibilidades e pensei: Porque não? - e dei uma risadinha, indicando minhas roupas com a cabeça – Pior que isso não pode ficar.

Bem nessa hora, ouvimos um trovão e começou uma chuva torrencial.

–Sério, eu sou amaldiçoada – resmunguei. Ele sorriu.

–Pelo o menos você pode sair daqui com um emprego – disse.

–Por favor – falei, e nós dois rimos. Esse cara é demais.

–Para todos que vieram aqui antes de você, eu pedi a mesma coisa – disse – Um artigo. Quinhentas palavras, com um jeito diferente de falar sobre finanças pessoais. Acha que pode fazer isso?

Engoli em seco.

Não. Eu não conseguia fazer isso.

E mesmo abrigada embaixo de um toldo de uma lanchonete, enrolada em um sobretudo amarelo que eu acabara de comprar (foi absolutamente necessário) e observando o cardápio fingindo que eu iria pedir alguma coisa, isso parecia uma missão impossível. Finanças pessoais. Ele foi pedir isso para a pessoa que menos sabe controlar seu dinheiro de toda Manhattan.

Moda. Essa é minha área. E agora me meti em uma revista de finanças, prometendo que entregaria o artigo até a manhã. Um artigo que eu não sabia como fazer.

Pedi uma folha de papel e uma caneta à garçonete, que me olhou de cara feia. Tive que pedir um sanduíche de bacon e um suco de laranja, os quais eu pagaria com um cheque de dezesseis dólares.

Como começar um artigo de finanças? Primeiro, como diabos se fala sobre finanças?

Eu não sei nada sobre o assunto, e duvido que muita gente também saiba sobre isso. É uma coisa meio... Inalcançável. Toda vez que eu leio algo sobre a bolsa de valores, fico meio “Tá, e aí? O que isso vai afetar em minha vida? Por acaso as botas de couro vão ficar mais caras!?”. Se bem que se fosse um artigo sobre as botas de couro, minha vida estaria dez mil vezes mais fácil.

Se finanças fosse resumida em comprar, eu estaria feita. Mas... Não é isso?

Joguei o cabelo para trás e me concentrei na folha.

Você compra uma ankle boot de quase trezentos dólares e descobre que sua melhor amiga derramou vinho tinto nela. O que vem a seguir pode ser um mundo de possibilidades. Se você se irritar, vai acabar brigando com sua amiga, e perdendo a bota para a maldita mancha roxa. Se você manter toda calma do mundo e aceitar que ela não fez por mal, é mais fácil atirar a bota pela janela, porque, sinto muito, aquela mancha não vai sair. A única saída que você tem é se perguntar o que ela fazia tomando vinho com sua ankle boot, ou porque ela está com um misterioso namorado novo.

A mesma coisa vale para sua conta de cartão de crédito. Você não pode se perguntar porque a conta está com namorado novo, e muito menos pode derramar vinho dela e atirá-la pela janela, já passou, fim de papo. Uma hora o cobrador vai aparecer na sua porta. Você vai ter que pagar. Mas ao invés de ficar se remoendo pela bota perdida e pela conta que você não pode pagar, você poderia não ter comprado o sapato (que, mais precisamente, você não precisava). Ou não tendo ido tanto ao cinema, sendo que há uma locadora de filmes a duas quadras de sua casa. Ou não ter gasto dez dólares chamando um táxi para ir à tal locadora quando você poderia ter gasto cinco minutos das calorias daquele bolo do dia anterior, que você também não precisava. Nem pense em comprar um tênis novo apenas para ir alugar alguns filmes. Você não precisa disso. Você nem precisava ter se preocupado tanto com essa conta. Quantas preocupações você teria evitado se não tivesse passado naquela loja no horário do almoço. Se a vitrine não tivesse te seduzido você provavelmente não estaria contando as moedinhas para pagar os inúmeros cartões de créditos, sobre coisas que você nem ao menos se lembra de ter comprado. Mas você sabe que seu cartão não foi roubado, porque ladrão nenhum gastaria cento e cinquenta dólares em lingerie, ou oitenta e três em sais de banho, que você apenas comprou porque a vendedora tinha um cabelo legal. Foi você quem gastou aquele dinheiro, e apenas você tem que assumir a responsabilidade depois.

Você não sabe como gastou, e também não sabe como pagar. Um irônico vai-e-vem que afeta todo mundo. Se você tem uma banheira, os sais de banho terão valido a pena. Se você têm um namorado, a lingerie terá valido a pena. Mas se você não tem nem banheira, e nem namorado, sinto muito. A culpa é toda sua.

Depois de pagar a tal conta, você pode estar vivendo debaixo da ponte. Mas se você tiver uma caneta esferográfica com algum resquício de tinta e alguns guardanapos velhos, sinta-se como se tivesse ganhado na loteria. Escreva sua vida com ironia e finja que não aconteceu com você. Depois mande para uma editora, e fim de papo. Acabou-se. Ninguém fala mais nisso.

Pelo o menos você ganha alguns trocados com os direitos autorais.”

Reli tudo umas quatro vezes e sorri.

–Está muito bom – disse Harry Potter, girando em sua cadeira. Eu estava de pé, na frente de sua mesa, o observando ler meu artigo e torcendo as mãos apreensiva. Pela janela eu via a escuridão do céu e a claridade ofuscante das luzes nos outros prédios. Minha capa amarela pingava em seu tapete.

–Você achou? - suspirei, aliviada.

–Adorei o modo que você comparou contas de cartão de crédito com a bota que você não precisava – disse ele, colocando a folha na mesa e erguendo os olhos para mim – É definitivamente um modo diferente de encarar as próprias finanças.

–Queria escrever algo que as pessoas ignorantes sobre o assunto pudessem entender alguma coisa – falei. Pessoas ignorantes tipo eu.

–E conseguiu. Era exatamente disso que a Successful Savings precisava – ele deu um meio sorriso – Você está dentro.

Meu queixo caiu.

–Quê? - murmurei – Sério? Sério mesmo?

–Absolutamente – ele pareceu rir da minha perplexidade – Como você gostaria que esse texto fosse assinado? Por Ginevra Weasley?

–Ah, não – falei, balançando a cabeça – Eu não quero ser muito relacionada a essa revista.

Ele ergueu as sobrancelhas.

–Porque, quero dizer... - continuei, meu sangue gelando de pavor – Eu pensei em algo mais, sei lá... Misterioso. Que tal só Ginny?

–É uma boa ideia – disse Harry – Além de entender o artigo as pessoas gastarão tempo ponderando sobre quem seria a escritora misteriosa. Uma boa jogada. - ele olhou no relógio, e foi se levantando – Tenho que ir. Eu te ofereceria uma carona, mas tenho que encontrar uns amigos, então...

–Ah, não, não se preocupe – falei rapidamente, arrumando minha capa no pescoço – Eu vou a pé, moro à algumas quadras daqui. - ficamos nos encarando por alguns segundos constrangedores – Bem, eu vou indo.

–É, acho melhor – disse ele – Até amanhã.

–Tenha uma boa noite, chefe – respondi, sorrindo. Mas não pude ver sua reação, porque já estava bem longe dali.

Conseguira um emprego com o cara gato que me pagara um café e vira meu sutiã de oncinha. E ele gostou do meu artigo escrito com uma caneta engordurada e com folha barata. De repente o sanduíche de bacon parece ter valido a pena.

–Mione, você não vai acreditar – falei, entrando no apartamento e fechando a porta atrás de mim – Acho que encontrei o amor da minha vida. Ele...

Cheguei na sala, e logo percebi que Hermione não estava sozinha. Se ela estivesse se agarrando com Rony no meio do sofá seria menos estranho. Mas Rony estava servindo o convidado de refrigerante.

Vou voltar a pensar que hoje não é meu dia.

Senhoras e senhores, Harry Potter está comendo pizza na minha sala.


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