Os Esquecidos escrita por Bruna36


Capítulo 4
A História de Mamãe


Notas iniciais do capítulo

desculpa gente.. sei que falei que nesse capitulo o Peeta apareceria.. mas esse capitulo é importante pra saberem mais sobre a história deles.. e eu prometo que no próximo o Peeta aparece



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Naquela primeira noite, mamãe entrou no nosso quarto com os lábios comprimidos como se o menor movimento lhe provocasse dores. O rosto bonito apresentava-se pálido e inchado; os olhos inflamados e vermelhos. Parecendo derrotada, desolada, humilhada, ficou em pé no centro do quarto, os gêmeos correram para recebê-la, abraçando-lhe entusiasticamente as pernas, rindo e gritando, cheios de felicidade:

– Mamãe! Mamãe! Onde você estava?

Gale e eu nos aproximamos, abraçando-a com certa hesitação. Parecia que estava sentindo dor.

– Agora, falem com franqueza: como passaram o dia?

Cheio de ressentimento, Liam franziu os lábios, demonstrando mudamente

que seu dia não fora bom. Prim traduziu em palavras a raiva que vinha reprimindo até então.

– KAT E GALE SÃO MALVADOS – berrou. - NOS OBRIGOU A FICAR AQUI O DIA INTEIRO.

Perturbada, com aparência dolorida, mamãe tentou acalmar Prim, dizendo

aos gêmeos que as circunstâncias haviam mudado e agora eles teriam que

obedecer os irmãos mais velhos.

– NÃO! NÃO! - protestou a menina ainda mais furiosa, com o rosto muito

vermelho. - DETESTAMOS AQUI! LEVE-NOS PARA CASA! TIRE-NOS DAQUI!

Prim bateu em mamãe, em mim, em Gale, gritando que queria voltar para

casa. Mamãe permaneceu imóvel, sem tentar defender-se sem saber como controlar uma situação dominada por uma menina de seis anos. Quanto mais mamãe ficava calada, mais Prim berrava. Tapei os ouvidos com as mãos.

– Lucia! - ordenou a avó. - Obrigue essa criança a calar a boca imediatamente!

Bastou-me olhar para o rosto da avó e compreendi, pela expressão fria como

pedra, que ela sabia muito bem como obrigar Prim a se calar.

Todavia, sentado no outro joelho de mamãe estava um menino cujos olhos se arregalaram ao fitar a alta avó - alguém que lhe ameaçava a irmã gêmea.

Prim pulara do colo de mamãe e ficou diante da avó, com os pequenos pés plantados no chão. Então, atirando a cabeça para trás, Prim abriu a boquinha e gritou pra valer! Como uma estrela de ópera abriu o peito e seus berros anteriores pareceram simples miados de uma gatinha.

Oh, rapaz! Fiquei impressionada e apavorada com o que aconteceria em seguida.

A avó agarrou Prim pelos cabelos, levantando-a o suficiente para fazer Liam

pular do colo de mamãe. Mais depressa que consegui piscar, Liam mordeu-lhe a perna! Encolhi-me instintivamente, sabendo que agora estávamos numa enrascada. A avó lançou um rápido olhar a Liam e sacudiu-o longe como se fosse um cãozinho recém-nascido. Contudo, a dentada obrigou-a a largar os cabelos de Prim. A menina caiu ao chão, levantou-se depressa e deu um pontapé, errando por pouco a perna da avó.

Não querendo perder para a irmã gêmea Liam levantou seu pequeno sapato

branco, apontou com cuidado e chutou a canela da avó com toda a sua força.

E Prim correra para o canto, onde se encolheu e começou a gritar como uma fanática

Oh, foi mesmo uma cena digna de ser gravada e relembrada.

Até o momento, Liam não dissera uma palavra nem produzira um som, agindo

ao seu modo silencioso e decidido. Mas ninguém ia machucar ou ameaçar sua irmã gêmea - mesmo que esse "ninguém" tivesse quase um metro e oitenta de altura

Já decidida quanto ao que fazer, a avó deu contra o rostinho de Liam uma violenta bofetada, que o fez rodopiar!

Cambaleando para trás, Liam caiu ao chão, Ele vacilou e Meio correndo, meio engatinhando, correu para o canto onde Prim se encolhera e abraçou-a. Ficaram abraçados, de joelhos, os rostos unidos. Então, Liam somou seus gritos aos da irmã gêmea!

– Lucia, são seus filhos, faça-os calar a boca! Já!

Todavia, era praticamente impossível conter os gêmeos depois que eles começavam. Escutavam apenas o próprio terror e, berravam até a corda terminar, por pura exaustão física.

Aparentemente, até o momento nossa avó ficara surpresa por tal demonstração. Então, o que a mantivera imóvel desfez o feitiço. Com ar decidido, encaminhou-se ao canto onde estavam encolhidos os gêmeos. Curvou-se para levantar impiedosamente pelas golas as duas crianças que berravam. Mantendo-as afastadas de si com os braços esticados, enquanto elas esperneavam, gritavam, golpeavam com os braços.

. Então, os gêmeos foram largados no chão como lixo indesejável. Numa voz firme e sonora, que dominava os berros das crianças, a avó declarou implacavelmente:

– Se não pararem de gritar imediatamente, vou bater em vocês até arrancar

sangue da carne!

O tom desumano, somado ao frio poder daquela terrível ameaça, convenceu

os gêmeos - e a mim, também - de que ela faria exatamente o que prometia.

Perplexos e horrorizados, os gêmeos fitaram-na e – boquiabertos - engoliram os berros.

– Lucia, não admitirei a repetição de uma cena tão revoltante! É óbvio que seus filhos foram mimados, estragados e necessitam desesperadamente de boas lições de disciplina e obediência. Eles só falarão quando lhes dirigirem a palavra. Pularão para obedecer minhas ordens. Agora, filha, tire a blusa e mostre aos que desobedecem como o castigo é aplicado nessa casa!

– Não! - balbuciou. - Isso não é necessário, agora... Veja, os gêmeos se

calaram... estão obedecendo.

O rosto da velha assumiu uma expressão muito dura.

– Lucia, irá desobedecer? Quando eu lhe disser para fazer alguma coisa, obedeça sem discutir! E imediatamente! Veja os filhos que criou: crianças fracas, mimadas, desobedientes, todas quatro! Pensam que basta gritarem para conseguir o que desejam. Aqui, os gritos de nada lhes servirão. É melhor saberem que não existe piedade para os que violam as regras estabelecidas por mim. Você devia saber, Lucia. Alguma vez já lhe dei perdão? Mesmo antes de você nos trair, alguma vez permiti que sua carinha bonita e maneiras insinuantes detivessem o peso da minha mão? Oh, lembro-me de quando seu pai lhe queria bem e se voltava contra mim para defendê-la. Mas esses dias terminaram. Você provou a seu pai que é exatamente o que eu sempre declarei que você era: um monte de lixo, falsa e mentirosa!

Voltou os olhos impiedosos para Gale e eu.

– Sim, você e seu meio-tio fizeram filhos muito bonitos. Sou forçada a admitir isso, embora eles jamais devessem ter nascido. Por outro lado, parecem-me não passar de molengões inúteis e insignificantes!

– Agora, Lucia, tire a blusa!

Com grande dificuldade, cada botão de sua blusa branca foi aberto. Cuidadosamente, ela baixou a blusa, expondo as costas. Suas costas estavam riscadas por compridas marcas vermelhas. Algumas das marcas mais inchadas estavam cobertas de sangue. Praticamente não havia um centímetro de pele intacta entre marcas de chibata.

A avó, insensível, ignorando nossas sensibilidades e não dando importância à

situação de nossa mãe, proclamou novas instruções:

– Olhem bem e demoradamente, crianças. Saibam que essas marcas de

chicote descem até os pés de sua mãe. Trinta e cinco chibatadas, uma por cada ano de sua vida. E dezoito chibatadas extras por cada ano que ela viveu com seu pai, o casamento dela foi pecaminoso; um sacrilégio! Um casamento que constituiu uma abominação aos olhos do Senhor. E, como se isso não bastasse, eles tiveram que gerar filhos: quatro! Filhos gerados do Demônio!Filhos malditos desde o momento que nasceram!

Meus olhos esbugalhavam-se à vista daquelas marcas terríveis. Desejava ter nas mãos um chicote para açoitar aquela velha. Olhei para os cortes nas costas de mamãe e jamais senti tanto ódio ou ira. Ódio não só pelo que ela fizera à nossa mãe, mas também pelas horríveis palavras que ela falara

.

Então, a detestável velha me encarou, como se adivinhasse o que eu sentia.

Devolvi-lhe desafiadoramente o olhar, esperando que ela pudesse ver como eu negava, daquele momento em diante, nossa relação de parentesco - não só com ela, mas também com aquele velho lá embaixo.

Talvez ela percebesse algo vingativo nos meus olhos, pois suas palavras seguintes foram dirigidas exclusivamente a mim, embora ela usasse o termo "crianças".

– Como estão vendo, crianças, essa casa é capaz de ser inflexível e impiedosa ao lidar com aqueles que desobedecem e violam nossas normas. Daremos alimento, bebida e abrigo, mas nunca bondade, compreensão ou amor. É impossível sentir algo além de repulsa pelo que não é puro.

.

Olhou sucessivamente para cada um de nós. Sim, ela quis destruir-nos naquela noite, quando éramos jovens, inocentes e confiantes, pois só havíamos conhecido o lado bom da vida.

Mas ela não me conhecia

Ninguém jamais conseguiria me fazer odiar meu pai ou minha mãe! Ninguém jamais teria poder de vida ou morte sobre mim - não enquanto eu estivesse viva e pudesse lutar!

Lancei um olhar a Gale. Ele também olhava a velha. Seus olhos estudando os danos que ele poderia causar se a atacasse.

De todos nós, Gale era o que mais gostava de nossa mãe. Colocara-a no topo de um pedestal de perfeição, considerando-a a mulher mais querida,mais carinhosa, mais compreensiva do mundo.

Depois que a avó saiu do quarto, ficamos sem saber o que fazer, dizer ou

sentir, exceto deixar-nos dominar pelo sofrimento e amargura. Meu coração batia descompassadamente enquanto eu observava mamãe vestir a blusa, abotoá-la.

– Agora, escutem - disse mamãe com uma animação forçada. - Foi só uma vara de salgueiro e não doeu muito. Meu orgulho sofreu mais que a carne. É humilhante ser surrada como uma escrava, ou animal, pelos próprios pais. Mas não se preocupem isso nunca mais vai acontecer, e eu sofreria mais cem vezes essas marcas de espancamento para reviver os quinze anos de felicidade que tive com seu pai e com vocês

Então, começou a falar. Obviamente, o que ela relatou foi difícil dizer e

igualmente difícil para nós escutar.

– Esta é uma casa estranha e as pessoas que nela moram são ainda mais estranhas, não os criados, mas meus pais. Eu deveria ter-lhes prevenido de que seus avós são fanáticos religiosos. Acreditar em Deus é uma boa coisa, é uma coisa certa. Mas, quando as pessoas reforçam essa crença com palavras rebuscadas no Velho Testamento e interpretadas do modo que lhes for mais conveniente, isso é hipocrisia. E é exatamente o que fazem meus pais.

Ele pagou a construção da igreja, comprou os vitrais de todasas janelas, controla o pastor e os sermões, pois está comprando seu caminho para o céu, naquela igreja, ele é tratado como um deus, ou como um santo vivo. Depois, volta para casa, sentindo-se completamente justificado em fazer tudo o que deseje, pois já cumpriu seu dever, pagou a pavimentação do caminho e, portanto, está livre do inferno. Quando eu estava crescendo, com meu irmão mais velho, éramos literalmente forçados a ir à igreja. Mesmo se estivéssemos doentes a ponto de ficar de cama, tínhamos que ir. A religião era enfiada por nossas goelas abaixo. Seja bom, seja bom, seja bom, era tudo o que ouvíamos, sem parar. Prazeres cotidianos, normais, que eram bons para outras pessoas transformavam-se em pecados para nós. Meus irmãos e eu não tínhamos permissão para nadar, pois isso significaria usar roupas de banho e expor grande parte de nossos corpos. Éramos proibidos de jogar cartas ou quaisquer outros tipos de jogos que se prestassem a apostas. Não podíamos ir a bailes porque, para dançar, teríamos de aproximar o corpo de alguém pertencente ao sexo oposto. Recebíamos ordens para controlarmos nossos pensamentos, afastando-os da luxúria e assuntos pecaminosos, pois nossos pais afirmavam que os pensamentos são tão maus quanto os atos. Oh, eu poderia continuar durante horas relatando as proibições quem faziam, pois parece que tudo o que poderia ser divertido e excitante era pecado para eles. E há algo nos jovens que os leva a revoltar-se quando a vida é tornada restrita e controlada demais, fazendo-nos desejar acima de tudo as coisas que nos são proibidas. Nossos pais, ao procurarem obrigar seus dois filhos a se portarem como anjos, ou santos, só conseguiram tornar-nos pior do que teríamos sido se criados de outra maneira.

Arregalei os olhos, chocada com a narrativa. Todos nós estávamos assim.

Até os gêmeos.

– Então - prosseguiu mamãe -, certo dia, em meio a essa situação, um belo jovem veio morar conosco. O pai dele era meu avô e morrera quando o rapaz tinha apenas dois anos de idade. A mãe do rapaz chamava-se Alícia e tinha apenas dezesseis anos ao casar-se com meu avô, que, na época do casamento, tinha cinqüenta e cinco. Assim, quando deu à luz o menino, ela deveria ter vivido o bastante para vê-lo tornar-se um homem. Infelizmente, Alícia morreu muito jovem. O nome de meu avô era Garland Harry Foxworth e, quando ele morreu, metade do espólio deveria caber a seu filho mais moço, então com três anos de idade. Mas Malcolm, meu pai, assumiu o controle do espólio do pai do menino, naturalmente, uma criança de três anos não poderia ter voz ativa no assunto, quando meu pai ficou com a faca e o queijo nas mãos deu um pontapé em Alícia e no menino. Estes fugiram para onde moravam os pais de Alícia. Esta residiu lá até casar-se pela segunda vez. Teve alguns anos de felicidade com um jovem que amava desde a infância e, então, este morreu também. Duas vezes casada, duas vezes viúva, com um filho pequeno e, agora, órfã de pai e mãe. Pouco depois, encontrou um caroço no seio e veio a falecer de câncer alguns anos mais tarde. Foi quando o filho dela, Garland Harry Foxworth, o quarto do mesmo nome, veio morar aqui. Nunca o chamamos de outro nome senão Harry.

Mamãe hesitou e apertou os braços em torno de Gale e eu.

– Sabem de quem estou falando? Adivinharam quem era o tal jovem?

Estremeci. O misterioso meio-tio. E sussurrei:

–Papai... você está falando de papai.

– Sim - confirmou ela, suspirando fundo.

Mamãe continuou:

– Seu pai era meu meio-tio, mas apenas três anos e meio mais velho que eu. Lembro-me da primeira vez em que o vi. Eu sabia que ele viria, o meio-tio que eu jamais vira e de quem não ouvira falar muito, Eu tinha quinze de certo modo, estava madura para me apaixonar. Seu pai tinha dezessete anos. Era final de primavera e ele estava de pé no centro do vestíbulo, com duas maletas perto dos sapatos surrados. Suas roupas pareciam muito usadas e apertadas para ele. Meus pais estavam com ele, mas o rapaz virava-se para todos os lados, olhando tudo, perplexo ante a demonstração de riqueza. Eu, por mim, jamais prestei muita atenção ao que me cercava. Estava ali e eu aceitava como parte de minha herança, até que casei e passei a levar uma vida de pobreza, mal me dei conta de que fora criada num lar excepcional. Compreendam: meu pai é um "colecionador". Compra tudo que seja considerado uma obra de arte, não porque aprecie arte, mas porque gosta de possuir coisas. Gostaria de possuir tudo, se possível; especialmente coisas bonitas. Eu cheguei a pensar que fizesse parte de sua coleção de objetos de arte... e ele pretendia guardar-me para si, não por prazer, mas a fim de evitar que os outros tirassem prazer do que lhe pertencia.

O rosto corado, os olhos fitando o espaço, aparentemente revivendo aquele

Dia, minha mãe prosseguiu:

– Seu pai veio até nós tão inocente, ingênuo, carinhoso e vulnerável, pois só

conhecera afeição honesta, amor genuíno e uma grande pobreza material. Mudou-se de uma casa com quatro cômodos para essa mansão imensa e grandiosa, que lhe esbugalhou os olhos e lhe ofuscou as esperanças. Julgou ter tropeçado na boa sorte. Olhava meus pais com toda a gratidão. Hah! A pena que sinto pela sua gratidão ao ser recebido aqui dói-me até hoje. Na verdade, metade do que ele estava vendo deveria pertencer-lhe, de pleno direito. Meus pais fizeram o possível para que ele se sentisse como um parente pobre. Avistei-o ali, parado à luz do sol, e parei no meio da escada. Era lindo. Não apenas bonito, mas lindo. Existe uma diferença, vocês sabem. A verdadeira beleza se irradia de dentro para fora e ele a possuía, então, fomos

apresentados e a luz de seus olhos se extinguiu. Eu era sua meia-sobrinha e,

portanto, proibida. Ele ficou tão desapontado quanto eu. A partir daquele dia, eu na escada acendeu-se entre nós uma centelha, uma minúscula brasa ardente que viria a crescer cada vez mais, até que nenhum de nós dois conseguiu continuar a negá-la. A essa altura, meu irmão mais velho estava na faculdade; eu tinha poucos amigos, pois ninguém "servia" para a filha de Malcolm Foxworth. Eu era a jóia de meu pai; se algum dia um homem metirasse dele, teria que ser por um preço muito elevado. Assim, seu pai e eu nos encontrávamos escondidos e passávamos horas conversando Em breve, tinha que acontecer: fomos obrigados a confessar que nos amávamos e, certo ou errado, precisávamos casar-nos. E tínhamos que fugir dessa casa e escapar ao domínio de meus pais antes que nos transformassem em duplicatas deles, pois era esse seu objetivo: tomar o pai de vocês e mudá-lo, fazendo-o pagar pelo mal que sua mãe cometera ao casar-se com um homem tão mais idoso que ela. Deram-lhe tudo; isso eu admito. Trataram-no como se fosse um filho, pois ele estava destinado a substituir o filho que morreu antes de nascer. Mandaram-no estudar na Universidade de Yale e ele foi um aluno brilhante. Formou-se em apenas três anos, mas nunca pôde utilizar o diploma conseguido, pois trazia o seu verdadeiro nome e tínhamos que ocultar do mundo nossa real identidade. A vida foi dura para nós durante os primeiros anos de casamento porque seu pai foi obrigado a negar sua formação universitária.

Mamãe fez uma pausa. Olhou pensativamente para Gale e, depois, para

mim. Abraçou os gêmeos e beijou-lhes as cabeças louras.

– Kat, Gale, são vocês dois que eu espero que compreendam. Os

gêmeos são pequenos demais para isso. Estão tentando entender o que houve

entre seu pai e eu?

Gale e eu confirmamos com a cabeça.

– Agora, ouçam com atenção - disse mamãe em voz baixa, que deu mais

ênfase às suas palavras. - Estou aqui para fazer o possível a fim de que meu pai torne a gostar de mim; e que me perdoe por haver-me casado com seu meio-irmão. Entendam: quando completei dezoito anos, fugi com seu pai e, duas semanas mais tarde, voltamos casados e contamos a meus pais. Meu pai quase teve um ataque. Gritou, esbravejou, expulsou-nos dessa casa e disse-nos que nunca mais voltássemos! Por esse motivo, fui deserdada e seu pai também, pois acredito que meu pai pretendia deixar alguma coisa para ele; não muito, porém algum dinheiro. A parcela maior caberia a mim, porque minha mãe também possuía dinheiro de família. Ora, ouvindo-a falar, tem-se a impressão de que o motivo pelo qual meu pai se casou com ela foi o dinheiro que minha mãe herdou dos pais, embora na juventude ela fosse o que se chama de mulher vistosa; não muito bonita, mas possuía um porte rígido, nobre e poderoso.

Aquela velha já nascera feia!

–Por essa razão, estou relatando tudo e sendo tão franca quanto possível. Confesso que não possuo grande força de vontade e não sou do tipo que vence sozinha na vida. Só era forte quando tinha o apoio de seu pai e agora não conto mais com ele. Agora serei obrigada a fazer tudo que ele quiser.

– O que poderia querer ele além de obediência e respeito? - indagou Gale em tom adulto.

Mamãe fitou-o demoradamente, cheia de carinhosa compaixão, erguendo a mão para acariciar-lhe o rosto juvenil. Gale parecia uma edição mais jovem e menor do marido que ela enterrara tão recentemente. Eu também me parecia muito com ele, os mesmos olhos cinzas e cabelos escuros, mas Gale era bem parecido, não só na aparência física, mas os dois tinham o mesmo gênio.

– Não sei o que ele desejará, querido, mas farei tudo que for necessário. Ele

tem que me incluir no testamento. Não quero que acreditem nas palavras de minha mãe. O que seu pai e eu fizemos não foi imoral. Casamo-nos devidamente numa igreja, como tantos outros casais jovens que se amam. Nada houve de "pecaminoso" entre nós. E não são malvados, ou "gerados pelo Demônio", seu pai diria que isso não passa de "baboseiras.

Então, mamãe riu, ao mesmo tempo em que chorava, abraçando-nos todos.

– Seu avô profetizou que nossos filhos nasceriam com chifres, corcundas, rabos e patas... Portou-se como um louco, tentando amaldiçoar-nos e deformar nossos filhos, porque desejava que fossemos malditos! Alguma dessas profecias se realizou? - perguntou, parecendo um tanto descontrolada.

– Não - prosseguiu, em resposta à própria pergunta. - Seu pai e eu nos preocupávamos um pouco quando eu estava grávida pela primeira vez. Então enfermeira anunciou-lhe que ele era pai de um menino perfeito sob todos os aspectos.

– E decidi que amanhã de manhã, bem cedo, irei à cidade grande mais próxima para matricular-me numa escola que me ensine a trabalhar como secretária.

–Eu tinha certeza de que você encontraria uma solução!- exclamou Gale

– Confiem em mim - disse mamãe, agora sorridente e segura de si.

Desejei poder, de algum modo, ser igual a meu irmão Gale e tomar tudo o que nossa mãe dizia como uma promessa sagrada. Contudo, meus pensamentos voltaram-se demoradamente para as palavras que ela disse a respeito de não ter força de vontade e ser incapaz de começar tudo sem a presença de papai para lhe dar apoio.

– Tenho que ir, agora - disse ela, levantando-se para sair, enquanto os gêmeos explodiam em lágrimas

.

– Mamãe, não vá embora! Não nos abandone! – gritavam os gêmeos, envolvendo as pernas dela com os bracinhos miúdos.

– Voltarei amanhã de manhã, antes de sairem para a tal escola. No duro, Kat - disse, olhando-me nos olhos. - Prometo fazer o melhor possível. Quero tirar vocês desse lugar tanto quanto vocês desejam sair dele.


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Notas finais do capítulo

eu sei que esse capitulo ficou uma droga.. achei que eu coloquei palavras muito difíceis e as falas muito grandes.. fiquei com preguiça de corrigir.. desculpem



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