P.O.V. Eragon

Seguimos afastando-nos cada vez mais da nossa casa. A princípio guiava Arya para o interior do castelo, mas não demorei a perceber que esta desviava ligeiramente a nossa rota para o jardim principal. Não prestei muita atenção ao assunto e comecei a procurar a mente de Saphira. Ela não me dissera nada desde a noite anterior e eu começava a estranhar. Ainda a procurei por alguns minutos mas só encontrei os meus próprios pensamentos. Será que se esqueceu? Bem, seria uma estreia, Saphira nunca falha uma ocasião de festa, principalmente no que toca a aniversários.

Finalmente alcançámos a entrada do jardim e aí nos detivemos perante o cenário que se apresentava à nossa frente:

Preenchendo o enorme espaço vazio entre árvores e flores de todas as cores estava posta uma mesa que se estendia por dez metros rodeada de família, dragões e amigos. Uma toalha branca de bordados dourados suportava mil e um pratos dos mais variados gostos, do marisco ao porco e às frutas mais variadas. Nos rostos de todos brilhavam sorrisos acolhedores e dos seus lábios saiam saudações, desejos de parabéns e cumprimentos alegres. Ao fundo da mesa ocupando o lugar de honra estavam Saphira, Fírnen, os ovos e dragões recém-nascidos com enormes bandejas cheias de carnes vermelhas vivas do sangue que jorravam. Saphira olhava-me com um olhar de divertimento que a inicio não entendi.

“Julgaste mesmo que me esquecia do teu aniversário?”

“Bem… Tu não me disseste nada desde ontem então…”

“Eu estava à procura do presente perfeito mas nunca deixei a tua mente. Só não notaste a minha presença por estares cego de desejo por Arya.”

E lá estava ela. A gargalhada profunda que só um dragão do porte de Saphira possui. Genuína, alegre e acesa como as chamas que solta em direção a um destino indeterminado. É para mim impossível viver sem esta gargalhada, sem esta companheira. Tenho vergonha de alguma vez ter duvidado da franqueza do seu afeto por mim.

“Obrigado Saphira. Por tudo.”

E com um aceno ambos deixamos a nossa conversa e partimos para junto dos outros que evocam pensamentos com a boca para que possa ouvi-los com os ouvidos e não com a mente. Uma parte de mim queria continuar refugiada nas conversas partilhadas nas sombras do pensamento que só Saphira conhece como eu, mas depois de tudo o que organizaram para mim o mínimo que posso fazer é dar-lhes a minha atenção e carinho.

Fui saudado por Elfos, Humanos, Anões e Urgals; representantes das mais importantes casas de Alagaesia e por fim cheguei aos meus velhos amigos cuja companhia partilhava de forma muito mais próxima.

A meu lado sentava-se Arya, a minha rainha; à minha direita Nasuada sorrindo alegremente numa tentativa de esconder a sua dor; a seu lado estava Elva seguida da Lunah a nossa mais recente convidada, Orik e Ângela. Junto de Arya sentava-se Roran, Katrina e Ismira lado a lado com Murtagh. Fiquei agradavelmente surpreendido quando descobri como se davam bem. O Murtagh transformava-se numa pessoa completamente diferente quando estava com ela. Ficava sorridente e não parava de rir e brincar com ela. Pareciam dois melhores amigos. A princípio Roran e Katrina estavam reticentes com a surpreendente mudança de comportamento do Murtagh mas com o avançar do almoço foram ficando mais à vontade, confiando-lhe a sua filha.

O ambiente é maravilhoso, os músicos que chegaram pouco depois de começarmos a comer preenchiam o ar conferindo mais alegria ao momento com melodias que abraçavam os risos e conversas de todos os presentes. Ficou acordado que as prendas só seriam abertas no jantar preparado apenas para os familiares e amigos próximos.

O almoço foi tão agradável que durou até perto do pôr do sol.

A custo consegui desenvencilhar -me dos convidados para passear pelos jardins do palácio, sozinho. Era meu hábito valorizar tudo o que tenho de bom mas reservava sempre um momento do meu aniversário para lembrar aqueles que perdi ao longo deste caminho. O meu pai, o meu tio, Oromis,…

“Eles tinham razão… Valeu a pena.”

O voo silencioso de Saphira seguiu-me desde que deixei a mesa mas não me incomodou. É bom saber que até na solidão a tenho perto de mim. Ela tinha razão. O sacrifício deles fez realmente a diferença. Salvámos Alagaesia, Galbatorix e os Razac’s estão mortos. O povo vive sem medo de ser castigado por pensar de forma diferente e a nova era de cavaleiros começa lentamente a erguer-se. Tudo estava perfeito não fosse a nova ameaça que anunciava destruir tudo o que nos custou tanto a construir.

“Esta nova ameaça preocupa-me. Matei Galbatorix mas não sei até que ponto ele é superior a esta nova e misteriosa ameaça…”

“Realmente qualquer ameaça é preocupante mas as nossas forças não estavam tão fortes à anos. Encontraremos uma saída.”

O meu consciente ficou imediatamente mais leve com as falas de Saphira. Ela é a minha segurança.

“Sobe, um jantar planeado à meses por Arya espera-te e ainda tens de te arranjar.”

Num salto subi para o dorso de Saphira e regressámos à cabana.

P.O.V. Arya

Já está tudo pronto no salão, por isso decido que o melhor é ir até
à cabana preparar-me para o jantar. Quando chego Eragon ainda não estava em casa. “Ótimo, assim posso vestir-me e sair sem que ele me veja.” Entrei no meu quarto e tirei do armário o vestido já escolhido. Era de um verde água lindo que resultava de uma mistura perfeita entre o azul das escamas de Saphira e o verde de Fírnen. Tinha bonitos desenhos de dragões quase invisíveis nas mangas compridas e largas e a sua cauda longa tinha também bordados que se assemelhavam a chamas. O decote do vestido realçava o meu peito e a sua forma as minhas curvas. Encaracolei o meu cabelo e prendi-o num rabo-de-cavalo solto com alguns fios de cabelo solto à frente. Não precisava de mais nada, eu estava linda.

Sai de casa e segundos depois ouvi um bater de asas e vi uma sombra azul a aproximar-se. “Mesmo a tempo, vamos lá para palácio.”