Father escrita por Constantin Rousseau


Capítulo 3
Capítulo 3




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Foi naquela mesma segunda-feira inquietante, enquanto voltava para casa, que ela de fato o conheceu. Estava atrasada, apressada, nervosa; com medo de levar mais uma bronca do pai. A mãe certamente começara a se preocupar com a demora, e por isso corria com o máximo de cuidado para não escorregar nas poças enlameadas das vielas de Naughty Hill. Os All Stars estavam completamente imundos, assim como a barra da calça jeans velha, mas ela continuava correndo, pisoteando na água e fazendo gotas se projetarem para todos os lados. Como se sua vida dependesse daquilo; e, de fato, realmente dependia, mas isso não convém.

E, mesmo assim, irrequieta, pôde ouvir com uma clareza assustadora o gemido baixo que ecoou por toda Nothing Street; o único som produzido além desse era o que ela mesma fazia, batendo os pés no asfalto molhado. Mas a curiosidade inflamou-se em seu peito como uma faísca pronta para saltar sobre a pólvora.

Corria o grande risco de ser castigada por aquilo, e, mesmo assim, precisou parar e voltar para ver o que acontecia por ali.

Nothing Street era a viela mais estreita e escura de toda Naughty Hill, com apenas dois lampiões antigos e falhos entre as casas que se assemelhavam a pequenas caixas retangulares e totalmente descoloridas pelo tempo. Uma lamparina era colocada no começo da rua, e a outra, apenas no fim. As únicas pessoas que ousavam caminhar por ali eram aquelas que não se importavam com os altos índices de criminalidade do local, ou com o risco iminente de serem espancadas por vândalos.

Os únicos que moravam ali eram homens brutos; todos vindos da Guerra Centenária, que pouco se importavam com a vida e morte de adolescentes no local.

Apenas uma garota muitíssimo idiota seria capaz de adentrar em Nothing Street sem nem mesmo temer a violência à qual seria submetida se fosse descoberta por qualquer pessoa; seu pai, ou os moradores do local. E, ainda assim, pouco se importando com isso, ela cruzou a escuridão com passos acelerados, escutando a própria respiração pesada em meio à umidade do ar. As pontas dos dedos estavam dormentes e doloridas pelo frio, e esfregou as mãos uma na outra na frágil e inútil tentativa de aquecê-las ao menos o suficiente para que a fisgada aguda passasse.

Foi então que ela o viu, mesmo com a pouca e precária iluminação. Ali, estirado no chão como um tapete que para mais nada servia, um filete de sangue ainda presente no canto inferior dos lábios, tossindo e tremendo feito uma britadeira. Contrariando de forma total e incompreendida o Darwinismo do ambiente no qual foi tão cruelmente criada, ela caminhou até ele e o amparou delicadamente, como se ninasse a um bebê.

Recebeu um olhar assustado e surpreso, vindo de dois grandes orbes castanhos; os mais bonitos que ela jamais teve o prazer de contemplar plenamente.

Sorriu de forma leve, expondo as duas fileiras de dentes brancos e perfeitinhos. Com toda a inocência que a frase poderia conter, sem ter total consciência do que aquilo realmente significava para o rapaz, ela afirmou com convicção:

— Eu vou cuidar de você...


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