Saracarema escrita por Brenda Paolla


Capítulo 4
Capítulo 4 - LuauSalí e Ramon.




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(Sintonize no tempo!: 21:19hrs da noite.)

Depois de uma manhã de muita alegria e comemoração, tivemos uma tarde animada e de pura organização. O visual do luau ficou lindo! Tudo muito colorido e alto astral, com a cara da família Salí. Tem as almofadas bordadas da bisa Oriana para o pessoal sentar, muitos panos amarrados em mastros firmados na areia, para enfeitar, e bastantes frutas e refresco natural para dar energia até o sol nascer!

Substituímos a tradicional fogueira por luzinhas coloridas por toda a volta e os motivos para essa troca são vários!: A brasa sujaria a gente, o clima está agradável, a tia Briana ficou com medo do Fred se queimar como da última vez, e claro, porque está ventando muito!

Acho que ninguém vai sentir falta e caso a maresia faça alguns narizes congelarem, tem muitos cobertores aqui em casa. Buscamos na hora! Aliás, daqui da varanda já dá para ver uma galera lá no ‘LuauSalí’ e eu estou a caminho!

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Chego e a vó Aixa pede para que eu a ajude cumprimentando o pessoal. Foram dezenas de “Oi sumida” dali, “quanto tempo não te vejo”, daqui, “você está parecidíssima com sua tia Briana”, de cá. A galera vinha em peso, trazendo violões, tambores, flautas e cavaquinhos, outros chegavam vestidos na simplicidade total, alguns com trajes de banho ainda! Mas só “gente que mora no coração enorme e infinito da família Salí!” Palavras da dona da festa!

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Todos em roda, curtindo a noite linda da praia de Saquarema. Começam a tocar e nós batemos palmas no ritmo. É vó Aixa a primeira a entrar na dança. Mais gente vai lá no meio com ela. Esse “mais gente” é tudo Salí. Fred, Selmo, vó Aixa e tia Briana, requebrando o esqueleto. Uau! Que saudade estava disso!!! A dança é esquisita e muito alegre. Contagia mesmo!
– Vai lá também! Você adora dançar! – fala a bisa Oriana para mim.
Faz tempo que eu não danço. Sei lá! Brasília me deixou tímida e com medo do ridículo. Devo estar dura e desajeitada. Mas que tal se eu arriscar?
O Fred me puxa e me roda. A tia Briana chega mexendo o quadril. – Faz!! Você é boa nisso! – ela diz animadíssima. E é o que eu faço.
Num rodopio e outro, vejo o Ramon! Mais uma vez fico surpresa. Vou até ele.
– Oi! Que bom que você veio! – digo, dando um beijo na sua bochecha.

Ele está com uma camisa branca, calça jeans creme e chinelo de dedo. Sei que só pegou a primeira roupa que encontrou no armário, mas seu jeito largado impecavelmente arrumado, sua despreocupação burocrática e seu cheiro limpo e leve e puro de sempre, ainda me surpreendem. Os cabelos assanhados, o olhar castanho que já me disse mil coisas e eu nunca entendi nada, mas sabia que era mil coisas boas porque vinha dele, os dentes branquinhos que combinam com a sua boca larga de lábios grossos fazendo com que o seu sorriso seja lindo e complicado de esquecer, são exatamente os mesmos, e eu, que odeio a mesmice, agora, sinto a tranquilidade de tudo permanecer igual. Do jeito que sempre esteve e estará. Mesmo que eu resolva voltar daqui uns dez verões!
– Hum... faz tempo que chegou? – continuo.
– Se quer saber se te vi dançando, eu vi. – ele fala sorrindo calmo. – Não se preocupa! Estava linda. – completa.
– Bem, não era isso, mas mesmo assim, obrigada! – respondo sorrindo, tentando disfarçar que sua suposição era correta. – É... já tem onde se sentar? – eu falo tão natural e calma e espontânea que até eu espanto!
– Não. Estou perdido. Não tem nenhum amigo meu aqui... só você, de amiga.
Amiga... – repito na minha cabeça e acho a ideia realmente interessante e legal e inovadora e tudo o que eu precisava! –.
– Não deixa a vó Aixa ouvir você falando isso, porque “Amigo de um Salí, amigo de todos Salís!” – falo gesticulando, imitando o jeito exagerado da vó Aixa.
Ele ri. – Mas eu me viro! Se quiser voltar a dançar, acho que os Salís vão gostar. Eu também vou.
– Han... depois! Agora, vem cá! Vamos sentar. Convidado não fica em pé no LuauSalí! – falo, puxando sua mão.

Arrumo um lugar do meu lado para ele sentar. Na verdade esse era o lugar da bisa Oriana, mas com certeza, ela não vai se importar!
– Está com fome? Tem frutas e também refresco que eu mesma fiz! – digo descontraída para socializar.
– Não. Eu tô legal, mas depois quero experimentar o suco! – ele faz cara de interesse.
– Ah, isso será legal! – pisco, achando realmente demais.
– Vai sim... – ele ri. – Então... resolveu voltar às origens? – completa.
– Sim! Tinha tempo que eu não vinha aqui, estava com saudades... não sei como consegui ficar longe esse anos todos desses malucos! – falo balançando a cabeça e olhando para a vó Aixa e o Fred de mãos dadas girando sem parar. – Eles vão ficar tontos. Mais do que já são! – eu brinco e a gente ri, mais uma vez.
– Você fez falta... para eles com certeza! Para Saquarema também. – ele me fala todo desencanado e despreocupado.
– É... acho que sim! Mas já estou de volta. – digo sorrindo.
– Vai ficar até quando? – ele me olha, agora atento, como quem está interessado na resposta.
– Uma semana. Um dia antes, meus pais vêm para cá e ficam até o outro dia, para irmos embora juntos. – eu respondo precisa.

☀☀☀☀☀☀☀☀☀☀☀

Selmo finalmente chega à sua comemoração e todos o aplaudem. É uma gritaria! Agora sim, começou a festança! A vó Aixa me chama para uma foto ao lado do Campeão. Eu vou, lógico! E ela aproveita para tirar infinitas! Eu e Selmo; eu no colo do Selmo; Selmo, tia Briana, eu e a bisa; eu, a bisa e o rosto da vó Aixa tampando o Selmo e a gente..., etc.

Depois da sessão de fotos, muita dança! Eu corro antes que me puxem para a “ondinha da paz” – todos enfileirados, dançando e se mexendo muito, segurando no ombro ou cintura da pessoa da frente –.

O Fred está fazendo companhia para o Ramon, conversando não sei o quê! Para não atrapalhar, nem ser intrusa, sento na calçada com o Selmo. Tia Briana chega entregando o violão que estava no quiosque para ele e oferecendo abacaxi. Eu aceito, porque é minha fruta predileta e realmente estou com fome. A tarde toda foi só para preparar o Luau e de manhã, só comi o bolo de coco da bisa Oriana, que estava delicioso, por sinal.
– Por que não veio com as ondinhas nas bochechas, Sah? As fotos ficariam mais legais... – O Selmo brinca.
– Hum... continua que eu dou ideia para a vó Aixa berrar o adorável grito de guerra à noite toda!
– Tá louca? – ele ri. – Ainda sabe alguma música que a gente cantava juntos nos lanches da bisa Oriana? – Ele fala tocando algumas notas no violão...
– Claro que sim! Tá legal... no três começamos. É... aquela da tia Briana, tudo bem? 1... 2. 3!

“...Quando o segundo sol chegar, para realinhar as órbitas dos planetas...”

Mal começamos e toda a galera já estava cantando junto, harmonicamente, com batuques nos tambores, e todos os outros instrumentos que levaram. E eu, que sou complicada para emocionar, fiquei com os olhos cheios de água. Porque estava tudo muito bonito e isso me fez lembrar como minha vida costumava a ser bonita também quando eu ainda morava aqui.
Ouço som de gaita e rapidamente me viro para achar quem é que a está tocando. É o Ramon... – claro! – digo baixinho, sorrindo, observando e dessa vez, nada surpresa.
Ele está com os olhos fechados, encostando a boca de leve e a cabeça movimentando devagarinho. Lindo! O som sai com toda a clareza do mundo e eu sinto o tempo mudar, a maresia pirar, meu nariz gelar e a pergunta que ele me fez sobre “voltar às origens” domina a minha mente. Porque essa música é maravilhosa e me faz pensar na bisa Oriana dizendo que “o paraíso de cada um é onde se sente bem!”, e o meu, sem dúvidas, é aqui. Porque o Ramon está surpreendentemente com o mesmo jeito incrível de 17 de janeiro, três anos trás, quando o conheci. Porque essa coisa de “voltar às origens” faz lembrar que fui embora um dia e com isso o presente, as mudanças, o mar, o verão e as malditas montanhas, vêm de novo à minha cabeça. Porque desacostumei a ser assim, feliz e completa e radiante, e me sinto engasgada. E na final, porque sou exagerada e acabo sorrindo e respirando fundo e me sentindo mais leve do que nunca!

Vou até o quiosque, beber uma água, e mal entro e pego a garrafinha e a bisa já vem me empurrando para a roda do luau. Volto para onde estava sentada no começo: ao lado do Ramon!
– Pensei que não teria mais sua companhia hoje. – Ramon me fala, com um sorriso no canto da boca.
– O Fred estava aqui e o papo parecia legal. Não quis atrapalhar! – digo sorrindo, também.
– Você não atrapalha! E o papo estava legal porque a gente estava falando de você... – ele junta as sobrancelhas enormes encolhendo os olhos. (Bem, se a intenção dele foi parecer sério, não foi bem sucedida.)
– Hum! Fiquei curiosa... posso saber sobre o que falavam de mim? – faço cara de desconfiada.
– Papo de homem! – ele brinca. – Nada de mais. – completa.
– Ok! – eu rio e resolvo não insistir. Entro em um novo assunto, que na realidade é velho e me lembra coisas boas e verão...: – Gostei de ouvir você tocando gaita!
– Hum! Valeu! É bom saber disso... – ele sorri. – Se estiver afim, posso tocar alguma coisa para você... – diz tirando a gaita do bolso esquerdo.
– Lógico que estou! Vou adorar! – respondo animada.

E ele toca alguma música que nunca escutei a letra, mas pelo toque, mesmo que falasse sobre amendoim torrado, continuaria perfeita!
– Uau! – falo feliz e encantada e fascinada.
– Conhece a música?
– Não... mas acho que é linda, assim como toque. – digo olhando para ele, sem me cansar de sorrir e achar tudo isso incrível.
– É... - ele ri sem graça - eu ouvia sempre ela... faz lembrar uns momentos aí... – ele dá uma pausa e me olha também, e fica pensando não sei em quê. – é do Pap... – O silêncio me tampa os ouvidos e eu só ouço o "zumzumzum" do tempo falando com minha mente.
– Depois escuta... – ele completa e eu respiro aliviada...
– Hum... tudo bem! – eu falo sem jeito devido à pausa enorme e ao jeito como ele falou e me olhou e o que passou na minha mente... parecia que... nada! É bobeira minha. – Está com sede? Você ainda não experimentou o refresco que fiz! – digo, tentando dar uma mudada no clima...

Ele volta a sorrir desencanado. – Já estava me esquecendo. Bom que você lembrou! – diz descontraído.

Eu busco o de tangerina para a gente. Ele toma com cara de que estava achando estranho...
– Ah! Vai dizer que não gostou? – falo realmente preocupada.
– É que... – ele ri. – Brincadeira. Está ótimo! – sorri.

☀☀☀☀☀☀☀☀☀☀☀

E nós, eu e Ramon, conversamos quase o luau inteiro. Ele perguntou sobre a universidade e que curso eu estava fazendo e ficou surpreso quando soube que era de Farmácia. Disse que achava que Moda era mais a "minha cara". Soube que ele resolveu seguir o pai e faz Administração e que já acostumou e consegue achar bacana, o que me deixou espantada porque a sua vontade antes era voltada à ecologia, natureza e áreas verdes. Mas, segundo ele, isso não mudou e ainda pretende trabalhar com a “flora rica brasileira”.

Ele quis saber sobre como é a vida em Brasília, como foi me adaptar “na cidade elaborada e sem praia” e o que eu, agora, faço para me divertir. E me falou sobre seus amigos da universidade, da sua irmã Tiara que já está de namorado, da capoeira e da viagem à Petrópolis daqui três meses. Bem, acho que foi só isso. Espero não ter esquecido de nada. Na realidade, não há como esquecer de nada...

Depois a vó Aixa chegou me chamando para um hula hula e pela insistência acabei indo. Ramon ficou sentado, batendo palmas, mas depois ele arriscou até uns passinhos. Após isso, aplaudimos a lua – coisa da Tia Briana! – e teve ainda a Sessão Histórias!
Já estava quase clareando quando o Ramon foi embora, porque a mãe dele havia ligado, preocupada. Aproveitei e fui também. Ele veio comigo até aqui na porta de casa. A despedida foi prévia. Um abraço e um beijo no rosto sem intimidade e jeito.

No entanto, o que posso dizer é que foi incrível, tudo!


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