Eles acenaram para mim e entraram no carro, acelerando e indo embora. E lá estava eu novamente, pequena e sozinha, tendo que ficar com aquela maldita velha que se não fosse pelos meus pais ela me deixaria morrer de fome. Ela é minha vó, todos dizem que devo amá-la, mas, como amar uma pessoa que não me ama? Aquela velha sempre dizia que me odiava por eu ser diferente, por eu não gostar de ninguém. Eu só tinha seis anos, nem sabia se gostava da minha mãe e do meu pai também. Eu nem sabia se eu gostava de mim mesma.

De qualquer forma eu tinha que aguentar algumas semanas com aquela velha na minha casa “cuidando” de mim. Meus pais sempre viajavam e minha vó sempre cuidava de mim, mas ela apenas ficava sentada na frente da TV, dormindo. Até que eu gostava quando eles viajavam, eu podia ficar sozinha sem ninguém me irritar. Sem ninguém me mandar sair do meu quarto.

Eu ficava sozinha desde... Vamos ver... Provavelmente desde meus três anos de idade. Era todo o mês. Era todo o mês sozinha. Sozinha em termos. Todos esses dias sozinha eu fiz uma amiga, uma amiga imaginaria. Tudo começou quando eu ficava sozinha no meu quarto quando os meus pais viajavam. Eu comecei a falar sozinha e a brincar sozinha, parecendo que tinha alguém lá. E por que não ter? Alguém que eu gostasse e que fosse igual a mim. Eu criei, eu a criei. Talvez eu não devesse ter feito isso, mas era só uma pessoa imaginaria, ela nunca iria existir, certo? A nomeei de Laine. Minha melhor e única amiga, Laine. Nós brincávamos juntas apenas quando meus pais viajavam por que eles iriam reclamar, eles não gostavam que eu falasse sozinha. Eles queriam que eu ficasse com todos.

Laine brincava de tudo que eu gostava, ela falava de tudo que eu gostava, afinal, ela fazia tudo que eu quisesse. Eu quis que ela fosse mais velha, apenas um ano mais velha que eu. Eu falava com ela como se alguém estivesse ali, eu a abraçava como se alguém estivesse ali.

– Ei, Laine! Olha o desenho que eu fiz de nós duas! - levantei o papel com meu desenho feito a giz.

– Que lindo desenho! Eu sou tão importante assim?

– Claro! Você é minha melhor amiga!

– Como uma irmã?

– Sim, sim!

– Então, sempre juntas, promete?

– Prometo!

Nós duas se abraçamos. Eu sorria, sorria todo tempo que eu estava ao seu lado.

Eu gostava tanto dela que tentei ficar com ela o tempo todo, mesmo com meus pais em casa. Eles odiaram. Mandavam-me calar a boca e falar com gente real, que eu não ia virar nada quando crescer se continuasse assim. Que todos iriam me odiar. Quando eles diziam isso, eu saia correndo para o meu quarto, chorando.

– Laine, você me odeia? –eu a abraçava toda vez que chorava-.

– Eu não te odeio, nunca vou odiar. Lembra da nossa promessa? Sempre juntas.

– Mas... Eles não gostam da sua presença... Você ainda pode me visitar quando eles estiverem viajando, certo?

– Claro. Mas quem garante que até lá você ficará bem?

– Eu vou ficar. Vou ficar bem sabendo que você vai voltar.

Não era uma despedida, infelizmente.