Interlúdio escrita por Djin


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

N.A.: Once Upon A Time não me pertence. Obviamente. Se pertencesse, a Cinderella teria ido prantear o ratinho dela em Child of the moon (2x07). Shame on you, Cindy. Como sempre, todos os créditos aos senhores Edward Kitsis e Adam Horowitz e à ABC.
Meus sinceros agradecimentos à minha beta, Mellie (que comentou, sobre o capítulo 2, que existem algumas drogas usadas em procedimentos anestésicos e com finalidade de dopar o paciente que causam sonhos vívidos, pesadelos, alucinações. É isso aí. Rumbelle também é cultura.) xD



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“Atrasada, atrasada, atrasada...!”- Isabelle levantou os olhos de seu café da manhã para ver Emma atravessando a casa a passos rápidos, uma tolha nos ombros, escovando rapidamente os cabelos ainda úmidos. –“Onde está a Mary Margaret?”

“Hm, ela já saiu há uns quinze minutos.”

“Droga.”- Emma deu uma última olhada no relógio da parede, vestindo apressadamente sua jaqueta vermelha e se dirijindo à porta, afobada, as chaves do fusca amarelo na mão.-“Prometi ao Henry que iria levá-lo à parada de ônibus hoje.”

“Não vai tomar café da manhã?”

“Não dá tempo...”- Ela parou com a mão no trinco da porta e se virou para Isabelle, como se tivesse tido um pensamento de última hora. –“Eu combinei com o Henry também de ir tomar sorvete à tarde... Talvez você queira ir? Posso passar aqui para te pegar.”

“Ah. Não sei. Pode ser... A gente combina na hora do almoço.” – Respondeu Isabelle, com um pequeno sorriso. Emma pareceu hesitar por um instante, antes de dar um pequeno suspiro e abrir a porta.

“Certo. É melhor eu ir agora. Tenho um bom dia, Isabelle.”

“Você também.”- Ela respondeu, aumentando o tom de voz para a porta que já ia se fechando. Ela terminou tranquilamente sua panqueca e colocou os pratos na pia, antes de ir recolher a escova e a toalha molhada que Emma tinha jogado sobre o sofá.

Isabelle não se importava de arrumar a casa. Na verdade, aquilo tinha vindo naturalmente a ela assim que viera morar com Emma e Mary Margaret. Talvez fosse porque sua mãe tinha morrido quando ela ainda era muito criança, e ela tinha ajudado seu pai a cuidar da casa desde pequena.

De qualquer forma, ela ficava feliz em poder ajudar as mulheres que a tinham tão amigavelmente acolhido em sua casa. E elas bem que precisavam de ajuda. Emma era um pequeno furacão, frequentemente deixando um rastro de desorganização por onde passava. Mary Margaret, ainda que muito mais ordeira, estava sempre ou ocupada com algo relacionado à escola onde trabalhava, ou distraída, perdida em pensamentos. Isabelle tinha impressão que isso provavelmente era por causa do tal David Nolan, se ela tinha captado corretamente as dicas nas conversas entre as duas ao longo dos dias.

Isabelle não pôde encontrar em seu coração a menor vontade de julgar Mary Margaret. Ela era um doce, e tinha sido tão acolhedora com Isabelle... Ela se encontrou, ao contrário, torcendo fortemente para que a pobre mulher não saísse machucada da situação, que parecia muito complicada e já a estava consumindo tanto.

Levando tudo em conta, não era de se espantar que Isabelle tivesse encontrado a casa no limite entre leve desleixo e franca desorganização quando chegou. Ela odiava admitir para si mesma, mas aquela tinha sido uma ótima desculpa para passar o máximo de tempo dentro de casa. Quando colocou tudo em ordem na casa, ela passou a usar a cozinha para ocupar seu tempo, incentivada por um velho livro de receitas de Mary Margaret e, às vezes, com a ajuda de alguns programas de TV.

Ela se lembrava de gostar de cozinhar, quando adolescente. Qualquer coisa para fugir da culinária pobre do seu pai. Mas, curiosamente, quando voltou a cozinhar, ela não se sentiu a vontade com os instrumentos de cozinha e as receitas, por mais tivesse todos eles na memória. Verdade seja dita, era assim que ela se sentia sobre muitas coisas. A sensação de estranheza a acompanhava quando ela olhava para quase tudo ao seu redor, como se ela tivesse sido transportada para um universo estranho, e todas as suas memórias eram como um manual de instruções escrito por outra pessoa.

Após algumas tentativas frustradas, ela pegou o jeito na cozinha. E acabou tenho uma surpresa inesperada: como tudo o que fazia parecia ser pela primeira vez, assim eram também os pratos que provava. Por mais que ela tivesse lembranças de comer panquecas, tortas e cookies, o sabor dos alimentos parecia explodir em sua boca como se fosse a primeira vez que os comia. Ela se deliciava ao tentar novos gostos e texturas.

Emma e Mary Margaret adoraram a novidade. Poder chegar em casa e encontrar o cheiro gostoso de um bolo saindo do forno era fabuloso. Às vezes, elas mesmas voltavam com sacolas cheias de ingredientes para testarem uma nova receita que lhes passara pela mente. Mas com o passar dos dias elas também começaram a sugerir que Isabelle deveria sair mais de casa, deixar a cozinha de lado.

Elas estavam certas, é claro. Assim como o Dr. Hopper, que estava começando a insistir nesse ponto em suas consultas semanais. A própria Isabelle não estava satisfeita com a situação. Nunca tinha sido de sua natureza se esconder dos problemas. Mas ela tinha que admitir que havia sido mais difícil do que ela tinha esperado voltar às ruas depois de todo aquele tempo no hospital.

Claro, ela tinha saído algumas vezes... Havia ido comprar roupas novas e objetos pessoais com Emma; tinha acompanhado Henry à parada de ônibus com a mãe dele; tinha até conhecido a escola, a convite de Mary Margaret. E sempre havia encontrado, pelo caminho, sussurros e olhares curiosos, às vezes debochados. Parece que ela era a ‘louca’ oficial da cidade, e as pessoas estavam reagindo com a pequenez de espírito que muitas vezes encontrava espaço para florescer nas pequenas comunidades.

A hostilidade e deboche, juntas à constante sensação de não pertencer àquele lugar, a sufocavam sempre que saía. Mas aquela situação não podia durar para sempre. Naquela manhã, já mais de três semanas após ter ido morar naquela casa, Isabelle decidiu que as coisas iam ter que mudar. Ela não saíra de uma ‘prisão’ para colocar a si mesma em um cativeiro doméstico.


Resoluta, pegou o jornal que Mary Margaret havia deixado sobre a bancada da cozinha e abriu nos classificados. Arrumar um emprego seria um bom começo. Era isso que ela tinha planejado, antes mesmo de Emma ter oferecido um lugar para ela ficar. Ela só esperava que a fama de ‘louca da cidade’ não atrapalhasse sua busca. “Faça algo corajoso e a coragem virá junto.”- Ela lembrou a si mesma a frase que alguém dissera há muito tempo. Ou ela tinha lido em alguem lugar...? Ela não tinha certeza.

*-*-*-*

Quando Isabelle passou pela porta do Granny’s, todo o barulho cessou por um segundo, enquanto os clientes lhe davam olhares estranhos, que passavam por todo o espectro entre pena e zombaria. Logo a conversa reiniciou, sussurrada, e ela bem sabia qual era o assunto reinante no lugar agora.

Lutando contra um leve rubor, ela ergueu o queixo, sem se deixar intimidar, e olhou em volta, procurando o responsável pelo estabelecimento. Só conseguiu encontrar uma atarantada garçonete andando apressada entre os clientes com uma bandeja lotada de pratos e xícaras. Isabelle tentou captar seu olhar, mas ela estava tão atarefada, correndo entre as mesas, que nem parecia vê-la.

Finalmente a moça voltou para o balcão, bandeja vazia, e Isabelle pôde parar ao seu lado para falar.

“Hm, com licença...”- A jovem levantou a cabeça, espantada, como se só então tivesse percebido a sua presença. Isabelle notou a forte sombra vermelha sobre seus olhos surpresos, combinando com uma mecha de seu cabelo e sua saia – bem mais curta do que seria recomendável para o ambiente de trabalho – “Eu vim pelo anuncio.”- O olhar da moça permaneceu vazio de compreensão. - “Nos classificados. Vocês estão com uma vaga...”

“Oh, graças a Deus!” - Exclamou a jovem garçonete, parecendo terrivelmente aliviada. - “Esse lugar está uma loucura! Nós tínhamos um outro garçom para me ajudar, mas ele se demitiu. E agora minha avó ficou doente. Não tem como eu cuidar desse lugar sozinha!”

Isabelle observou surpresa enquanto a jovem começou a apontar as coisas por trás do balcão, falando rapidamente, sem parar para respirar. – “Aqui ficam os bolos e tortas; na estante, os pratos e talheres (tem mais deles lá dentro); o microondas também fica aqui, mas todos os outros utensílios na cozinha, passando por aquela porta; a cafeteira está com problemas, tem que apertar o botão bem forte; vista esse avental e use sempre uma touca quando for cozinhar.” - A garota empurrou os paramentos nos braços de Isabelle e hesitou por um segundo, quando um terrível pensamento passou pela sua mente: “Ah, por favor, por favor, diga que você sabe cozinhar! Tenho certeza que perdi pelo menos dois clientes hoje depois de servir minhas panquecas.”

Isabelle acenou com a cabeça, espantada demais para falar. Foi o suficiente para a garota, que abriu um largo sorriso e colocou a mão em suas costas, empurrando-a pela porta da cozinha. - “Os pedidos que estão faltando estão ali do lado. Eu já volto com mais!” - Foi tudo o que ela disse antes de se retirar.

Isabelle ficou paralisada, olhando para a porta por alguns segundos, antes de estourar em risos. Aquela moça era definitivamente estranha. Pelo menos agora ela tinha um emprego, e tinha sido mais fácil do que ela tinha imaginado. A moça não tinha perguntado nada, nem comentado sobre sua história no hospital. Ela provavelmente não havia reconhecido Isabelle.

Ela estava terminando de colocar sua touca, felicitando-se por ter encontrado alguém que não sabia do seu passado, quando a jovem garçonete colocou a cabeça para dentro pela porta. –“Ah, só tente não fazer nenhuma... loucura... aí na cozinha. Tá?”- E com isso ela lhe deu outro largo sorriso e saiu.


Sim, aquela era uma moça muito, muito estranha.

*-*-*-*

Isabelle notou a surpresa se formar no rosto de Ruby e virou-se para acompanhar seu olhar, vendo o homem que entrava no restaurante. Ele vestia um terno cinza riscado, muito bem talhado, sobre uma camisa de fino tecido negro e uma gravata de um azul muito escuro, combinando com o lenço que se entrevia do bolso do paletó. Isabelle achou que ele caminhava com muita graça e segurança, apesar de usar bengala, e não parecia notar os olhares curiosos que recebia ao se dirigir à mesa vaga mais próxima.

“O que o Sr. Gold está fazendo aqui? Nós pagamos o aluguel ainda na semana passada.”- Ruby parecia intrigada.

“Talvez tenha vindo tomar café-da-manhã. Não é isso que se faz por aqui?”- Respondeu Isabelle, uma sugestão de humor na voz.

“Bom, acho eu nunca o vi comer coisa alguma. Com certeza, nunca aqui no Granny’s. Não duvido mesmo que ele se alimente da alma dos coitados que vão lhe pedir ajuda.” - Ruby soltou uma leve risada, mas pegou um cardápio por trás do balcão e dirigiu-se a sua mesa.

Isabelle já ouvira aquele nome, “Sr. Gold.” Emma e Mary Margaret o haviam citado em algumas conversas, nem sempre em tons muito simpáticos. Elas lhe contaram que ele era um agiota, um homem muito rico que mandava em boa parte da cidade. Com certeza ele se vestia como alguém de boa condição social. Mas Isabelle achava que sua elegância ia além disso, algo na sua postura e expressão.

“Bem, quem diria, ele veio mesmo pelo café da manhã.” - Anunciou Ruby, chegando ao seu lado e tirando-a de suas divagações. – “E ele come comida de gente!”- Ela riu e destacou uma folha do seu bloco de notas, onde anotara o pedido, estendendo-a para Isabelle, antes de sair para atender outra mesa.


Isabelle lançou um último olhar em sua direção, e se deu conta que o Sr. Gold a observava, cabeça levemente inclinada, uma certa intensidade no olhar que a fez arrepiar-se por um instante. Ela desviou o olhar, sentindo-se enrubrescer de leve, e virou-se em direção à cozinha.

*-*-*-*

Ela estava parada em frente à torre do relógio, as cores do pôr-do-sol colorindo tudo à sua volta, os últimos raios de luz refletindo em seus cabelos, formando uma discreta auréola. Um anjo, com certeza, em um mundo crepúscular levemente alaranjado. Parecia uma pintura.

O Sr. Gold sentiu seu coração pular uma batida quando a avistou. Já fazia dois dias que ele havia ido ao Granny’s para vê-la (em princípio, queria verificar se ela estava bem, se parecia saudável e estava à vontade no novo emprego; mas não podia deixar de admitir que apenas poder vê-la já era atrativo mais que suficiente para ir até lá).

Ele tinha ficado muito aliviado ao saber que ela tinha conseguido emprego lá. Não que ela estivesse precisando dinheiro, é claro – ele tinha se assegurado de acrescentar uma quantia generosa ao magro envelope que seu pai tinha deixado no hospital, junto com seus pertences. Mas ele estava começando a ficar preocupado por ela passar tanto tempo dentro de casa após deixar o hospital.

O Granny’s tinha se mostrado uma ótima alternativa para sua Belle: relativamente tranquilo, livre de influências diretas de Regina e facilmente acessível para ele observá-la. Absolutamente inofensivo (se você ignorasse a influência duvidosa da neta da Viúva Lucas). Ele ainda estava ponderando se devia fazer daquilo um hábito, ir mais vezes ao restaurante, zelar por ela à distância; ou, quem sabe, tentar aproximar-se dela.

Estranhamente, nunca passara pela sua mente que ele poderia simplesmente encontrá-la por acaso na rua, agora que ela passava perto de sua loja todo dia a caminho do trabalho. Ele se perguntou se ela iria querer que ele se aproximasse dela, se ela se lembrasse de quem ele era. Mas agora, ao vê-la parada, sentia uma necessidade premente de decidir logo como agir em relação a ela.

Sua Belle, tão linda, tão corajosa... Sempre exigindo tomar o seu destino em suas próprias mãos. Talvez esse fosse o certo, afinal de contas: deixá-la decidir. Depois de trancá-la numa masmorra, depois de expulsá-la sem lhe dar ouvidos... Talvez o melhor que pudesse fazer por ela daquela vez fosse simplesmente deixá-la escolher.

Ele não podia ter certeza de como ela reagiria à sua aproximação nesse novo mundo, com suas novas identidades. Menos certeza ainda do que ela faria quando a maldição fosse quebrada e ela lembrasse de tudo. Depois de tantos anos, décadas, calculando cada movimento que fazia, talvez fosse isso que ele lhe devesse: deixar o destino deles, daquela vez, em suas mãos. Com essa resolução, ele aproximou-se de Isabelle.

“Perdida, senhorita French?”

Isabelle virou-se para ele, indagando-se por um instante como ele sabia seu nome. Mas, é claro, todos na cidade sabiam seu nome, coisa que ela odiava.

“Ah, não, não! Não perdida. Só distraída, senhor... Gold?”- Respondeu, sorrindo.

“Agora, onde está minha educação? Não fomos devidamente apresentados. Sr. Gold, sim. Acho que nos conhecemos do Granny’s... você me salvou de comer uma refeição feita pela jovem senhorita Lucas no outro dia.” - Belle riu, surpresa pelo seu humor inesperado. Ele pensou que faria qualquer coisa para ouvir aquele som para sempre.

“E eu posso perguntar o que estava achando de tão fascinante na torre do relógio, Srta. French?”

“Não a torre.”- Respondeu ela, ainda sorrindo. – “Embaixo dela. A biblioteca. Mary Margaret – minha amiga- havia me dito que estava fechada há anos. Eu tive que vir dar uma olhada.”

“Sim, a biblioteca está fechada desde sempre. Você gosta muito de ler?”- Ele perguntou, mas já sabia bem a resposta. Ele se lembrava muito bem de como, no antigo mundo, ela parecia absolutamente maravilhada sempre que ele voltava de uma de suas ‘viagens de negócios’ com um novo livro de presente. Claro, o próprio castelo já tinha uma biblioteca que poderia mantê-la ocupada por anos, mas isso não parecia vir ao caso na ocasião.

“Adoro! Desde criança! Acho que, vivendo em uma cidade tão pacata, os livros para mim são quase como uma aventura. Uma pena que a biblioteca esteja fechada.”

“Uma pena, realmente. Era de se esperar que a prefeita tivesse mais comprometimento em promover cultura entre os cidadãos, não?”

Seu sorriso irônico fez Isabelle ficar desconfortável por um instante e, com uma uma olhada para o relógio da torre, ela acrescentou: “Bem, olhe a hora. Acho melhor eu ir agora... Minhas amigas vão começar a se preocupar se eu me atrasar muito.”

“Claro, claro. Tenha uma noite adorável, senhorita French.” - Respondeu suavemente o Sr. Gold, com uma galante inclinação de cabeça, que lhe conseguiu outro sorriso de Isabelle.

“Boa noite, Sr. Gold.”

Enquanto acompanhava com o olhar sua Belle se afastar pela rua (e ponderava o que fazer sobre a biblioteca), o Sr. Gold viu a jovem dar uma tímida olhada por cima do ombro (e virar rapidamente ao notar que ele ainda a observava). Definitivamente, ele deveria fazer mais algumas visitas ao Granny’s.



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