As Desastrosas Aventuras da Guilda escrita por Hikaru


Capítulo 9
Interlúdio: O Conselho dos Doze


Notas iniciais do capítulo

Essa é uma pequena pausa na história principal (que eu descontroladamente fiz andar rápido demais). Aqui vou apresentar um pouco de como funciona o sistema de governo de Novo Mundo



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Quando o Conselho dos Doze se reunia na sala mais alta do arranha-céu mais alto de Novo Mundo, a situação era grave.

Os doze magos mais habilidosos em suas escolas governavam formalmente Novo Mundo. No entanto, a maioria deles, como bons magos, era um tanto excêntrica e bastante afetada, logo as reuniões tendiam ao caos completo e não resolveriam praticamente nada, não fosse a mão de ferro exibida pelos poucos dos seus membros que tinham um pouco grau de sensatez.

Roan, um anão grisalho e tipicamente barbudo, levantou-se de sua cadeira e falou para seus companheiros sentados na mesa redonda:

– Eu, Roan, Taumaturgista-Mor e Líder deste Conselho dos Treze, declaro aberta sua décima sexta reunião.

– Posso saber por que exatamente fomos convocados, sábio líder? – o tom de sarcasmo era nítido na voz de Thomas, o Eletromante-Mor. Ele esboçava um sorriso torto por debaixo dos piercings do seu rosto.

– Irei direto ao ponto, companheiros, pois sei bem como o tempo de vocês é precioso – disse Chloe, a Ilusionista-Mor, com um quê de deboche para seu colega. Todos sabiam bem que Thomas gastava seus dias se recuperando da ressaca e suas noites tocando com sua banda, Thommy Thunder e os Mutiladores – Meus espiões no Vaticano acabam de me informar que o Papa quer reconstituir o Segundo Estigma.

Silêncio total na sala.

– Desculpe, Chloe, mas nas condições atuais isso é completamente impossível – comentou Elizabeth, a Biomante-Mor. Ela sempre priorizava os fatos acima de tudo, e colocava os pés de todos no chão durante as reuniões do Conselho – A magia está nos noticiários, nas fantasias de todos, ao redor do mundo inteiro. Como ele conseguiria selá-la de novo?

– Devo lembrar-lhe, Elizabeth, que a situação era exatamente a mesma na época da Inquisição, mas ainda assim a Igreja conseguiu – comentou ela.

– A situação não era exatamente a mesma, Lizzie – retrucou Völundr, o Tecnomante-Mor. Ele era o mais velho do Conselho, e tinha desenhado e construído boa parte da fundação de Novo Mundo – Hoje em dia as informações chegam a absolutamente qualquer lugar com a internet e a TV e outros meios de comunicação. Na era medieval, tudo que se sabia da magia vinham de livros, que eram raros, e do boca-a-boca.

– Ainda assim é uma situação que exige providências – insistiu Chloe, preocupada.

– Srta. LeBlanc, nós temos algo menos abstrato a tratar do que os planos loucos daquele velho senil – disse Roan – Com isso eu quero dizer, é claro, a vinda do Terceiro Estigma.

– Menos abstrato, Roan? – reclamou ela, perdendo seu tom impassível e adquirindo um certo grau de raiva – O Segundo Estigma demorou mais de dez mil anos para acontecer depois do Primeiro. Se existe algo abstrato a ser tratado nessa reunião, é a vinda do Terceiro. Além do mais, nós não sabemos nem o que será que irá acontecer nele.

Roan franziu o cenho, seríssimo.

– Muito bem, srta. LeBlanc. Apresente-nos a situação.

– Meus espiões detectaram que o Vaticano realiza frequentemente operações de destruição de livros de magia e história recente. Além disso, vários magos estão desaparecendo misteriosamente em Roma e em toda a Itália.

– Isso sempre aconteceu por lá, Chloe – comentou Sekhmet, a Piromante-Mor. Seu olhar duro e impetuoso fazia tremer as pessoas de almas mais fracas que a encontravam.

– É verdade, mas agora está muito mais frequente – a ilusionista respondeu – e além do mais, meus agentes conseguiram a informação de que outro livro está sendo escrito.

Novamente a sala mergulhou em silêncio.

– Parece toda a prova de que precisamos, Roan – disse Mestre Zhan. Ele se recusava a ter um título, pois não via o kijutsu como uma magia, e sim como uma extensão dos sentidos humanos. Normalmente permanecia calado durante as reuniões, por isso todos os seus comentários eram levados mais a sério que os dos outros membros do Conselho.

O semblante de Roan era a definição de preocupação.

– Suponhamos que eu leve as loucuras de João Paulo III a sério. Como nós iremos impedi-los sem declarar guerra ao Sacro-Império?

– Hehe, eu gosto dessa ideia – comentou Roberto, o Geomante-Mor. Tudo o que Robbie queria saber nessas reuniões era de quem ele seria encarregado de encher de porrada.

– Nós não vamos declarar nenhuma guerra hoje, Robbie – respondeu Roan, ríspido.

– Eu soube que a Guilda aceitou um contrato para matar o Papa... – comentou Layla, a Psíquica-Mor. Sua voz era lenta, quase arrastada, e ela aparentemente não conseguia focar o olhar em nenhum de seus colegas.

– Layla, por favor me diga que você não veio pra reunião drogada. De novo – ralhou Elizabeth.

– Não, mãe, eu juro que não...

– Por favor, concentrem-se – disse o cada vez mais ríspido Roan – Layla, não podemos deixar um assunto tão importante assim nas mãos daqueles delinquentes juvenis.

Layla levantou-se e, num surto de concentração, disse:

– Pois foram estes delinquentes juvenis que acharam e mataram uns bons 20% dos criminosos dessa cidade. Eles nunca deixaram de completar uma missão. E... Eles tem um necromante.

Todos na mesa se reviraram em suas cadeiras. Aquele assunto já tinha causado muito discussão naquele Conselho.

– Tudo que estou dizendo é que, talvez, nós devêssemos realmente nos concentrar no Terceiro Estigma ao invés de se preocupar com uma remota vinda de um Segundo que já aconteceu.

– O que, novamente, invoca a pergunta: o que é o Terceiro Estigma? – perguntou Lazarus, o Alquimista-Mor. Apesar de parecer insano, ele só era levemente perturbado.

– Nós já confirmamos o que eram os dois primeiros: o nascimento do primeiro ser humano, e o selamento da magia durante a Santa Inquisição – disse Sophitia, a Hidromante-Mor. Ela era uma arquiteta especializada nos Estigmas – no entanto, não existe absolutamente nada que diga a ordem na qual os próximos irão aparecer. Sabemos o que serão pelo menos dois: o aparecimento de criaturas mitológicas, e o surgimento de magos das chamadas Magias Proibidas.

– Madame Asha – disse Thomas, sempre irônico – poderia nos fornecer uma luz?

– Infelizmente, meu querido, esse é o tipo de vidência que não se pode simplesmente se concentrar e conjurar uma visão – respondeu Asha, a Aeromante-Mor. Ela era eloquente e tratava todos no conselho como se fossem seus filhos – Francamente, acho que somos abençoados pelo número de informações que temos.

– Abençoados ou não, Asha, as informações não são suficientes – disse Roan, derrotado – Admitamos: estamos perdidos.

– Eu discordo, Roan – disse Sekhmet, tomando as rédeas da situação – nós temos informações concretas sobre a possível vinda de um novo Segundo Estigma, e pelas chamas do inferno, nós temos que impedi-la.

Roan considerou as possibilidades, e após um longo minuto, rendeu-se.

– Muito bem. Por falta de informações concretas acerca da natureza da vinda do Terceiro Estigma, e em face da nova ameaça ao modo de vida da nossa cidade e da nossa sociedade, levantem a mão direita quem é a favor de tomarmos providências imediatas contra os planos do Papa João Paulo III?

Todos levantaram a mão, menos Thomas e Layla.

–Layla, você ouviu a pergunta, não? – perguntou Elizabeth.

Ela estava perdida num devaneio, olhando para as lâmpadas no teto.

– Eu? – disse ela, despertando de súbito – Sim, é claro. Só acho que vocês deveriam confiar mais nos mercenários. Mas to vendo que fomos massacrados, Tommy.

– Os velhos não tiveram a oportunidade de conhecer eles que nem a gente.

Roan bateu o punho na mesa, selando o voto.

–Está decidido. Chloe, quero que você concentre todas as suas forças na Europa em descobrir informações sobre os planos do Papa.

– Já trabalhando nisso.

– Thomas, Roberto, quero que todo e qualquer sinal deste movimento na minha cidade seja silenciado imediatamente.

Os dois abriram sorrisos largos e estalaram seus ossos. Fazia tempo que não recebiam permissão para matar a vontade.

– Völundr, Elizabeth. Preparem-se para uma eventual guerra.

Ambos os queixos caíram.

– Certamente você não acha que chegaremos a esse ponto, Roan – comentou ela, quase gaguejando.

Ele encarou-a nos olhos, e sua expressão emanava preocupação.

– Assim eu espero, Elizabeth – disse ele, temeroso – Mas é minha função estar preparado para o pior. Vão! O resto de vocês, mantenham seus antigos serviços, mas estejam em alerta.

Todos levantaram, e bateram forte os punhos na mesa de pedra, em uníssono. Aquele gesto selava a decisão tomada na reunião, e tornava-a lei na cidade.

Enquanto todos saiam da sala, Roan puxou Layla pelo braço e separou-a dos outros.

– Layla, você parece saber alguma coisa que nós não sabemos. De novo.

Ela deu um sorriso jovial e despreocupado.

– Roan, depois de toda reunião você faz exatamente a mesma acusação e eu te digo exatamente a mesma coisa: mas é claro que não. Se eu soubesse, teria partilhado com todos a informação.

Ele ainda não parecia convencido.

– Você sabe que não engana ninguém com essa fachada de criança avoada aqui. Você sempre sabe o que vai acontecer.

– Se eu soubesse o que ia acontecer sempre, teria dado um jeito de não termos essa conversa sem sentido. Por favor, Roan, eu tenho mais o que fazer.

Ela virou-se em direção à saída, mas impediu-se no meio do caminho.

– Sabe, Roan, a vida não teria a menor graça se todos soubessem o que ia acontecer. Vocês que não tem o dom da vidência, acreditem, são privilegiados. Estou te falando isso por que quero que você saiba que, se eu algum dia esconder alguma informação de você, é por que tenho motivos para isso. Por que sei que, de um jeito ou de outro, certas coisas já foram traçadas pelo Destino. Não cabe a nós tentar mudar.

Roan absorveu as palavras, atônito com o súbito acesso de maturidade que a garota havia demonstrado.


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