As Desastrosas Aventuras da Guilda escrita por Hikaru


Capítulo 8
A vida, o universo e tudo o mais


Notas iniciais do capítulo

Depois de tanto tempo a inspiração me veio de novo. Aproveitem!



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–É bem possível que isso seja uma miragem. – disse Lilly, confusa e exausta.

–Sempre achei que só existiam miragens de oásis e bananeiras. – confessou Freddie, no seu infinito conhecimento de lugares alheios e fenômenos naturais.

Depois de andar por horas que pareceram dias pelo deserto, a Guilda avistou por detrás das dunas uma enorme construção de pedra maciça da mesma cor da areia que pisavam. O estilo não lembrava nada que qualquer um deles já tivessem visto nos livros da escola, mas convenhamos que essa não é uma fonte muito confiável de informação. No entanto, até mesmo um especialista em arquitetura antiga teria dificuldades para definir quem ou quando tal prédio fora construído. Várias colunas enormes erguiam-se em círculo, como que criando uma barreira ao seu redor. A construção era formada de vários curvos que inclinavam-se para o centro, entrelaçando-se e sustentando um teto redondo. Por dentro, uma única parede redonda fechava a construção. Não havia entrada aparente.

–Acho que a gente deveria ir lá. – comentou Ryuuko.

–Bom não é como se a gente tivesse muita coisa pra fazer por aqui não é? – respondeu Annya.

E assim foram eles descendo a duna em que estavam na direção do que, observando mais de perto, parecia ser um templo. As paredes, os arcos e as colunas estava gravadas com ideogramas e figuras alienígenas. Algumas se repetiam bastante frequentemente: Uma mulher sem rosto, planetas, estrelas e cérebros.

– Pelo menos uma sombra pra gente se sentar um pouco – comentou Jackie – mas que porra é essa? Parece um templo mas não tem porta.

– Talvez alguém tenha construído um lugar extremamente sofisticado e grande pras pessoas se sentarem e descansarem no meio do deserto. – chutou Freddie, com um certo grau de erro.

– É, com certeza essa é uma possibilidade bastante plau...- Ryuuko foi interrompida pelo som de pedras arrastando-se umas nas outras. A frente deles, os blocos da parede deslizavam-se e ajeitavam-se, formando uma grande passagem para dentro do templo.

– Acho que nós estamos pra ter problemas.

Sendo as opções entrar no misterioso templo ou cozinhar no deserto escaldante à espera da morte certa, o grupo decide entrar. O lugar era misteriosamente bem iluminado, apesar de não haver nenhuma janela. Nas paredes, as mesmas gravuras do lado de foram se repetiam extensivamente ao longo de um corredor cujo fim não se via. Após alguns minutos de caminhada sem nenhum incidente, o corredor terminou numa porta.

Freddie bateu na porta algumas vezes.

–Você é retardado? Obviamente não tem ninguém ai – ralhou Lilly.

– Entrem... Eu estava esperando por vocês – disse uma voz dentro da sala, enquanto a porta abria com um rangido grave. Freddie fez uma careta de deboche para Lilly, que lhe retribuiu com um gesto obsceno.

Havia um trono. Sentado no trono, havia uma mulher.

No entanto não era apenas uma mulher. Todos na sala sentiram uma aura de poder emanando dela. Era impossível manter contato direto com seus olhos. Sentada displicentemente em seu trono, ela estava completamente nua. Sua pele era azul celeste e brilhava como se algum dia as estrelas acendessem no céu antes do crepúsculo. Ela levantou-se e avaliou o grupo. Não só sua pele era uma projeção de um dia impossível, mas assim eram seus olhos e seus longos cabelos.

– Permitam-me que eu me apresente. – sua voz ressonava nas profundezas da mente de quem a ouvia, capturando toda a sua atenção, e parecia mais com um coral do que uma única voz – Eu sou a atual arconte da Magia. Ela os recebe no seu templo. Pulemos as introduções, já que eu já sei seus nomes, e conheço seus feitos.

– Um... Arconte? Nós fizemos algo de errado? – perguntou Annya. Ela estava nitidamente preocupada.

– Não, muito pelo contrário. Vocês aceitaram uma missão que, ainda que não saibam, trará um grande benefício à minha mestra se cumprida. E ao que parece, vocês estão bastante aptos a cumpri-la. No entanto, parece que a maga branca se perdeu, não?

– Você pode nos ajudar a resgatar a Helena?

– Estas são as ordens da minha mestra. Ela poderia ela mesma resgata-la, mas acha mais divertido observar os humanos e seus pequenos conflitos...

– Você está falando da magia como se ela fosse uma pessoa. – comentou Ryuuko.

– Uma pessoa? – a arconte deu uma risada – Não, ela definitivamente não é uma pessoa. Minha mestra é a encarnação do conceito da magia. Acho que a palavra mais próxima que pode descrever o que ela é “deus”.

Todos ficaram em silêncio atônito. Nenhum deles era muito religioso, mas ninguém fica impassível quando um profeta se apresenta. Nenhum deles ousou questionar o que aquela estranha moça dizia. Algo nas suas palavras era extremamente crível, e nenhum deles duvidou dela em nenhum momento da conversa. Mas todos acharam este fato bastante estranho.

– Então... Você é serva da deusa da magia?

– Exatamente.

– Tudo bem. Então agora explique para nós como matar o Papa e resgatar Helena irá ajudar uma deusa.

– Sentem-se, por favor, pois para isso terei que contar uma longa história – e cinco cadeiras apareceram do nada – A história que lhes contarei agora é verídica, pois eu a presenciei, apesar de não ter estado lá. Eu lhes contarei agora a história da origem do nosso universo.

Pausa dramática.

– Pera, o que? – disse finalmente Jackie, que neste ponto estava bastante confusa – Você quer dizer, a de verdade? A origem verdadeira do universo?

– É claro. Vocês humanos tem vagas teorias de como algo tão grandioso e vasto como o universo foi criado, mas nenhuma delas chega perto do que realmente aconteceu. E o que aconteceu, começou no fim.

– Pois no início do nosso universo, havia outro. Outro universo, no fim dos seus bilhares de éons de idade, completamente diferente do que habitamos hoje. No entanto, ele tinha uma semelhança com o nosso: ele tinha um Destino. E sabendo que seu tempo já estava no fim, este antigo universo usou de suas últimas energias para gerar uma prole divina. Essa criança nasceu e cresceu no caos e vazio do mais absoluto nada, por milhões de anos, pois seu único alimento era a carcaça do agora falecido antigo universo. Após tornar-se adulta, ela fez o que lhe ocorreu mais naturalmente: ela teceu. Ela era o Destino, e ela teceu usando os fios da realidade o caminho de tudo o que existe hoje, seja deus ou seja humano.

– Espera um pouco – interrompeu Jackie – Isso quer dizer que tudo o que a gente faz já está premeditado e traçado? Nós não temos livre arbítrio?

– Isso é.... Um pouco complicado. Até mesmo eu não compreendo as atos dos deuses. Talvez um dia você encontre um arauto do Destino e ele saiba mais sobre o assunto. Mas acredito que nós temos livre arbítrio sim. Os fios do Destino são traçados à medida em que a vida do Universo passa. Ou talvez as ações e os pensamentos das pessoas tenham controle nas decisões da deusa. Enfim, não desviemos da história com questões filosóficas.

– Com o começo do tear, surgiram os dois deuses primordiais deste universo: O Espaço, um infante que nasceu em uma explosão e cresce sem parar; e o Tempo, que já nasceu engatinhando rumo ao fim de sua própria vida. Juntos, eles trabalharam e modelaram os quatro Elementos: Fogo, Terra, Água e Ar. Estes quatro passaram bilhões de anos trabalhando na arquitetura celestial, criando estrelas, galáxias e planetas.

– E foi em um desses trabalhos que, após bilhões de anos fazendo as mesmas estrelas e os mesmos planetas, os quatro Elementos decidiram que era hora de algo novo. No seu mais novo planeta, eles criaram algo jamais visto em nenhum outro canto do Universo: A belíssima deusa Vida, e seu irmão, o soturno Morte. Vida e Morte nasceram pequenos, microscópicos até. Mas esta parte da história já foi desvendada pelos seus cientistas. Acredito que devo pular para a parte que interessa.

– Milhões de anos após seu nascimento, Vida tinha criado a mais incrível variedade de seres nos mais diversos planetas que visitou. Mas ela sentia-se solitária. Seu irmão era bastante ocupado na tarefa de regular seu trabalho, que crescia a cada dia que passava. Pouco tempo era gasto com conversas levianas e atividades de lazer. Vida decidiu arriscar-se a criar algo que seu irmão sempre fora contra: um semelhante. Um ser pensante, igual aos deuses. Nascia então o primeiro humano. Ele era um ser engenhoso: aprendera a linguagem, a escrita, o uso de ferramentas em alguns meros anos. Também ele foi o primeiro amante de uma deusa, pois ele amou Vida por diversas vezes, e foi pai de seu primeiro filho. O primeiro semideus deste Universo era a Magia, minha mestra. A estranha fusão entre mundano e divino, a junção da imaginação e do poder criaram um semideus que por seu próprio poder logo seu elevou ao panteão junto aos mais antigos e poderosos deuses. Diz-se entre os divinos que Magia é a única deusa que iguala ou até mesmo supera o poder de Destino.

– Espera, isso não faz sentido – mais uma interrupção, dessa vez de Annya - se o primeiro humano era pai da Magia, então ela é tão antiga quanto nossa raça, correto?

– Exato.

– Então por que os humanos só descobriram a magia em 2012?

– Essa é exatamente a parte que nos interessa. Na época da Inquisição católica, a magia era livremente praticada por alguns indivíduos. A história da criação do universo e da magia foi repassada do primeiro humano para sua prole, de modo que ao passar dos anos ela sofreu algumas mudanças, o que geraram as diversas mitologias e religiões do mundo antigo. No entanto, era numeroso o número de sábios e magos que conheciam a verdade, e a Igreja sabia disso e os temia. No seu plano de dominar a Europa antiga através da sua religião monoteísta, os próprios magos da Igreja realizaram um ritual poderosíssimo. Usando como catalisador o sacrifício dos milhões de livros de magia que foram queimados através do Index Librorium Proibitorium, a Igreja trancou toda e qualquer lembrança da magia e da história do Universo dentro de um único livro. Livro este que eu achei e libertei.

– Você descobriu a magia? – perguntou Lilly, perplexa.

– Eu libertei a magia. Esse seria o termo mais correto. Mas sim, fui eu. Como recompensa, Magia me tornou sua única arconte.

– Isso... É muita informação para um dia só.

– Me perdoem simplesmente despejar todas essas histórias em cima de vocês, mas o tempo urge. O novo papa pretende repetir o plano da antiga Inquisição e selar a magia novamente, para assim retomar o controle do planeta. Por isso que vim à vocês. A sua missão de matar o pontífice e resgatar Helena irá atrasar ou talvez até mesmo acabar com as intenções da Igreja.

– Isso parece ser uma missão bastante importante para colocar na mão de um punhado de malucos que nem a gente – comentou Freddie.

– Bom nós já íamos fazer ela, mudando o destino no mundo ou não. Por mim aquele cara já tá morto – disse Jackie.

– Então já que estão de acordo, não tem mais tempo à perder. Vão. Eu lhes desejaria Sorte, mas ela não anda em bons termos com a minha mestra.

– Certo, mas acho que vamos demorar um pouquinho pra chegar lá. Estamos no meio de um maldito deserto.

– Ah, não se preocupem com isso. Apenas vão.

Desconfiados, e um pouco atordoados pelas informações que obtiveram, eles não tiveram muito poder para desobedecer a arconte. Saíram pelo extenso corredor que os levaria de volta para o deserto escaldante discutindo sobre tudo que acabaram de ouvir. Assim, distraídos como estavam, seu choque foi grande quando a porta do templo abriu novamente deslizando as pedras da parede, revelando uma vista privilegiada do Coliseu de Roma.


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Notas finais do capítulo

Criar uma mitologia é uma experiência interessante. Recomendo a todos que já escreveram alguma coisa



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