Os dias iam passando sem pressa. A cada cinco dias, aproximadamente, o reino recebia uma pomba com notícias de Arya, cada vez mais próxima de Winterfell.

Arya e sua tropa – composta por dez cavaleiros e um meistre - haviam partido há pouco mais de um mês, rumo a Porto Real, rumo à salvação do norte. Os ânimos sobre a partida eram os melhores, todos esperavam que tudo começasse a mudar assim que ela voltasse, voltando aos eixos. Agora que ela está perto de voltar para casa tudo parece mais ameno, mais feliz.

Não havia muito que fazer a não ser esperar. E essa espera estava acabando com os nervos de Sansa.

Apesar de não querer admitir para si mesma, não era apenas a viagem que está acabando com as noites de sono da rainha, o beijo que Tyrion lhe dera era a causa principal de toda essa agitação, toda essa confusão. Não havia sequer um dia em que não pensasse no que ocorrera. No que sentira quando ele pusera seus lábios de encontro aos dela. O formigamento que percorreu todo o seu corpo quando sentiu as mãos dele segurarem o rosto dela. Ela se lembrava de todos os detalhes. E sentia o coração acelerar e a respiração descompassar toda vez que se lembrava deles.

Sansa começava a acreditar que era mais fácil cuidar de todo um reino do que cuidar de seu próprio coração. Não conseguia decidir o que fazer, deixar como está ou tentar de uma vez por todas resolver toda essa bagunça.

Não conseguira ficar a sós com Tyrion depois o ocorrido. Ele parecia sempre com pressa, não se dirigindo a ela mais do que o necessário. “Bom dia” era algo raro de se ouvir, ao passo que, quando ela acordava, ele já havia se levantado. E quando se colocava para dormir esperava o máximo que conseguia, deitada na cama, olhando para o fogo que crepitava, mas nunca conseguia esperar tempo o suficiente para vê-lo. Chegou a pensar que talvez ele não estivesse mais dormindo na mesma cama que ela.

Em um dos dias, o lado da cama dele ficara intacto. O travesseiro sem sinais de que alguém havia dormido sobre ele, o cobertor preenchendo todo o lado dele da cama. Sinal de que ele dormira em algum outro lugar que não a cama. Era difícil dizer onde ele poderia ter ido. Eram inúmeros os lugares possíveis. Eram inúmeros os bordéis possíveis.

Sansa tratou de tirar imediatamente aquele pensamento da cabeça. Ele não faria uma coisa dessas, afinal, certo? Humilhá-la perante o reino que a pertencia?

Parecia estar revivendo a sua primeira noite ali, a noite do baile. Noite em que ele não dormira no mesmo quarto que ela. A noite sobre a qual nunca falaram. A noite passada seria mais uma noite sobre a qual eles nunca conversariam. Durante todo esse tempo, uma ideia ainda não havia passada pelos pensamentos de Sansa: talvez ele estivesse arrependido do que fizera e estava evitando-a. Não parecia provável, mas não era impossível.

Ele havia se comportado bem todos esses anos, sem nenhum escândalo, não começaria agora a tornar tudo uma bagunça. Pelo menos, era o que ela pensava, era o que ela rezava para que fosse verdade.

Sansa foi tirada de seus pensamentos quando ouviu alguém adentrar ao quarto. Tyrion.

Tyrion não chegou a dar dois passos dentro do quarto até parar e vê-la sentada com um livro nas mãos, encarando-o. A perfeita imitação de uma estátua, ele parecia congelado ali. E ela, como num espelho, refletia a mesma expressão do rosto de Tyrion. Nenhum dos dois fez questão de se mexer durante algum tempo, até que ele finalmente falou:

- Sansa! Eu não... Não sabia que estaria aqui, não esperava vê-la aqui agora. Achei que estaria com Rickon. Eu... – a surpresa estampada do rosto de Tyrion e nas frases praticamente repetidas fizeram Sansa repensar que talvez ele estivesse mesmo evitando-a.

- Rickon teve alguns problemas. Pedi que fosse consertá-los antes que virassem algo maior e pior. Ele virá me chamar assim que puder. Não tenho muito o que fazer mesmo. E por que todo esse espanto em me ver aqui? Não queri-

- Rickon teve problemas? Você sabe que tipo de problemas? – a cara de surpresa tornava-se algo como medo. Medo de quê?

Mesmo Tyrion tendo interrompido-a e ignorado completamente a sua pergunta ela o respondeu educadamente:

- Ele não me deu muito detalhes. Parecia nervoso e ansioso, porém. Deve ser algo pessoal. Percebi que Rickon é daqueles que fica com um problema na cabeça até que consiga resolver, então achei melhor deixá-lo resolver este e depois cuidamos de outro. Algum problema Tyrion? Algo que queira me contar...?

- Problema? Não, nenhum. Sem problemas. Eu só vim pegar umas... Coisas, mas deixa para lá, não vou precisar delas agora. Lembrei que tenho que... Ir. Com licença Sansa.

Ele já se dirigia a porta sem dar chances de Sansa perguntar mais alguma coisa. Assim que abriu encontrou Rickon parado do lado de fora com o braço erguido prestes a bater na enorme porta do quarto do casal.

- Interrompo? – perguntou ele constrangido.

- Não. É claro que não. Já estou de saída.

Tyrion rumou para o corredor sem mais delongas. Não sem antes dar um olhar sério ao mais novo parado à porta, e este retribuir calorosamente. Pela rapidez da troca de olhares não era para a rainha – nem para Sansa – haver visto. E se fosse assim, por enquanto, ela fingiria que não havia visto. Às vezes, o melhor que podemos fazer é nada.

- Vossa Graça, desculpe pelo imprevisto.

- Não se preocupe Rickon. Imprevistos acontecem. Está pronto agora?

- Se aprouver a Vossa Graça.

- Então vamos.

O compromisso que tinha com Rickon não era nada de mais. Como, surpreendentemente, o reino estava em condições melhores a cada dia, alguns dos senhores voltaram a pagar os impostos totalmente. Ele havia prometido que a ensinaria um pouco sobre os números e todo esse mundo que para Sansa fazia pouco sentido. Nada de mais.

Sansa queria perguntar a Rickon sobre Tyrion, perguntar se ele sabia de algo, por onde ele andava o dia todo, o que ele fazia. Talvez, numa das andanças pelo castelo os dois tenham se cruzado. Mas, o lado rainha dela dizia que não devia perguntar. Esse era um assunto apenas entre ela e o anão. Ninguém mais.

Mais confusões internas.

Antes de tomar uma decisão, analisou a situação de todos os ângulos possíveis, decidindo perguntar, afinal, antes de ser a rainha, era irmã de Rickon. Sabia que ele não sairia por aí contando qualquer coisa que ela lhe dissesse.

- Rickon, antes de começarmos... Eu queria saber, tem visto Tyrion andando por aí? – era ligeiramente uma pergunta vaga, mas que poderia render algumas pistas.

- Eu... Ahn... Vi... algumas vezes... – Porque tanta hesitação? O que esses dois estão escondendo? Deuses! - Sua Graça andando pelos corredores. Algum problema, Vossa Graça?

- Por cinco minutos, vamos esquecer que eu sou uma rainha? Por favor? Quero ser apenas Sansa. Sua irmão mais velha. Não sei se você reparou, mas não tenho muitos amigos por aqui. Sinto falta de Jeyne Poole.

- Certo. Então, como seu irmão eu te digo que você não deve se preocupar com Tyrion – disse ele, com certo tom de admiração na voz, tom que ela não o via usar há um bom tempo. Estranho. Mas igualmente agradável.

- E porque você diz isso? Porque não devo me preocupar com Tyrion? Bran e Arya não falariam dele dessa forma – Rickon corou.

- Tyrion não é o monstro que todos pintam. E você foi a primeira a descobrir. Eu digo... Tantas coisas ruins aconteceram... Porque ficar relembrando o tempo todo? Todos nós cometemos erros, talvez ele tenha cometidos alguns a mais, é verdade, mas se você deu uma segunda chance a ele, porque eu não daria?

Sansa não resistiu ao impulso e o abraçou. Abraçou forte, como no dia primeiro dia dela em Winterfell. Ele retribuiu da mesma forma.

As coisas estavam prestes a melhorar, ela pressentia.