My Germany escrita por UmGreyjoy, Florita


Capítulo 2
Esperanza Gonzalez


Notas iniciais do capítulo

Hey people, segundo capítulo daqui. Este é sobre a outra protagonista, a cigana Esperanza. Espero que gostem e nos vemos lá embaixo!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/285846/chapter/2

Se eu tivesse que definir a minha vida em uma palavra, acho que essa palavra seria dança. É. Acho adequado dizer que a minha vida é como uma dança, cheia de giros e passos complicados, com partes mais intensas, outras mais leves, ora no ar, ora no chão. E uma dança, como qualquer outra, sempre tem um final.

Sou Esperanza Gonzalez e tenho 19 anos. Nos tempos de hoje, sou o que se pode chamar de impura. Renegada. Enfim, sou uma cigana.

Não sei de que forma em plenos 1941, em plena Berlim, consigo me manter viva. Realmente não sei. Talvez eu seja realmente uma boa fugitiva. Talvez eu seja sortuda. Ou talvez os deuses estejam reservando o pior para o final. Como saber? O que interessa é que estou aqui por enquanto. Mas nada da minha antiga vida restou. Tudo se transformou em cinzas.

Eu era feliz no meu acampamento no sul da Alemanha, onde eu morava com meus pais e minha irmã mais nova. Eu realmente era feliz lá. Tudo era pacífico. Não tínhamos preconceitos. Se tivéssemos que cuidar de alguém ferido, cuidaríamos. Nós só queríamos tocar a nossa vida em paz.

Mas então o fogo nazista se alastrou por tudo, queimando a todos dentro de suas barracas. Eu e minha irmã Safira estávamos caçando vaga-lumes, e fomos as únicas que sobrevivemos. Eu tinha 15 anos nessa época, e ela, 13.

Nós vivemos juntas por um bom tempo. Nos virávamos bem, conseguíamos roubar o suficiente para sobreviver, mas fazendo o máximo para não prejudicar ninguém. Nunca fomos pegas, éramos profissionais de fuga. Conseguíamos passar completamente invisíveis para toda aquela multidão alemã enfurecida, a despeito dos nossos fortes traços latinos.

Passamos 2 anos assim, nos arrumando como podíamos, dando nosso jeito para resolver os problemas. Até que nos demos bem, ouço dizer. Na medida do possível, conseguíamos nos virar.

Até que um dia, embaixo de uma ponte, eu acordei e ela não estava mais lá. Safira tinha sumido, com toda a comida e roupas que nos restavam. Tento pensar que ela foi comprar algo, ou fugir de alguém, e os deuses tiveram piedade dela, levando-a para o céu. Sou egoísta demais para pensar que ela tenha fugido sem mim, e agora viva uma vida plena e feliz... sem mim. Sem falar que, na época em que vivemos, a morte é a solução menos dolorosa para pessoas como nós.

Porém algo dentro de mim grita que ela ainda está viva. Em algum lugar dessa Alemanha imensa (ou, quem sabe, desse mundo imenso), está minha pequena irmã Safira, nos seus 17 anos, lutando para sobreviver. Fugindo. Escalando montanhas e matando dragões, como sempre fizemos.

Quanto a mim, passei esses últimos 2 anos na miséria total, ainda pior do que estava quando vivia com Safira. Por ser uma pessoa só atualmente, tive que optar por roubos mais escassos, e por passar fome na maioria dos dias. Acabei perdendo a maioria do peso, e mal conseguia me manter de pé.

Até que um dia, ouvi falar de um Café que abrigava renegados. Pelo que parecia, era de uma francesa comunista chamada Nadine de Garmeaux, em Berlim. Resolvi tentar a sorte.

Nunca uma viagem foi tão exaustiva pra mim. Sem comida, sem água, cheguei a Berlim praticamente pele e osso, sem me aguentar em pé. Consegui achar o café de Nadine que, generosa, cuidou de mim e me deu um emprego.

Trabalho lá como cozinheira, e sempre que aparece algum soldado nazista, me escondo o melhor que posso. Recuperei o meu peso, e ainda canto as cantigas de meu acampamento antes de dormir. Ainda tento me convencer que um dia voltarei a vê-los, que voltaremos a dançar nas rodas e cantar nossas músicas. Que voltaremos a olhar para o fogo e tentar ver o futuro. Tento acreditar que um dia voltarei à barraca de minha mãe e pedirei para que ela leia minha mão, para ouvi-la exclamar como a minha linha da vida é longa. Tento acreditar que ainda reencontrarei meu pai, e que ele tocará acordeon pra mim, como fazia quando eu estava sem sono. E, acima de tudo, tento acreditar que reencontrarei Safira. Quando imagino esse momento, sempre a vejo com um vestido laranja e vermelho que ela tanto gostava, com seus longos cabelos negros presos em uma trança, com uma tornozeleira de sinos, que tilinta quando ela dança. Tento acreditar que dançaremos juntas novamente, neste ou ou noutro plano.

Aprendi a fugir e a me esconder como ninguém, aprendi a nunca confiar em alguém com uma suástica bordada na manga na blusa. Aprendi a jamais permanecer ao lado de um homem que diz amar a Alemanha acima de tudo. Esses, geralmente, são os que mais querem me ver morta. Eu só queria que eles entendessem que eu jamais seria capaz de fazê-los mal. Eu só quero viver em paz.

Infelizmente, não é possível no momento, e suspeito que não será possível por um bom tempo ainda. A única coisa que me resta é fugir, sobreviver e ter esperança.

Afinal, esse é o meu nome. É pra isso que eu nasci. Para esperar, cantar e, acima de tudo, ter esperança. Esperança de que, um dia, poderei sorrir de verdade e viver em paz.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E aí, o que acharam da Espê? Deixem reviews, hein?
Beijos!