My Germany escrita por UmGreyjoy, Florita


Capítulo 15
Adena Devet


Notas iniciais do capítulo

Olá gente, tudo bem? Mais um capítulo da Dena ^.^ espero que curtam. E esse capítulo vai especialmente pra minha prima e leitora querida, Letícia, que acompanha fielmente my germany - e é apaixonada pelo Dimitri. kkkk
Boa leitura!



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Milla espalhava o batom com o dedo indicador em meus lábios, finalizando minha preparação. Ela deu espaço para meu reflexo no espelho em seguida, e eu o contemplei admirada.

— Parece uma estrela de cinema — diz ela, com igual admiração.

O batom vermelho era mais forte do que eu escolheria, minhas pálpebras estavam pintadas de uma cor violeta suave, com cílios negros e compridos, como os olhos de uma boneca. Minhas bochechas, num tom rosado natural, finalizavam o trabalho de minha irmã.

— Como está linda, Ivy...

— Não mais do que você — disse, olhando para ela por cima de meu próprio reflexo.

Seu traje era composto de um vestido azul marcado na cintura por um laço de um tom mais escuro, com detalhes luminosos do próprio tecido.

Meu vestido era mais neutro. Uma cor creme, mangas curtas, uma saia de pregas, na altura dos joelhos.

No pescoço, um colar adornado por pedrinhas brilhantes, emprestado de Milla. Nas mãos, delicadas luvas de renda. Sapatos de salto alto nos pés, e cabelo solto.

— Toc, toc — faz Dimitri, adentrando o quarto. Ponho-me de pé.

Ele olha para nós duas, balança a cabeça, e colocando-se entre eu e Milla, nos abraçando, uma de cada lado.

— Como são lindas!

— Ora — diz Milla, agoniada. — Eles já chegaram? — e livra-se das garras de Dimitri, voltando a encarar o espelho.

— É por isso que você é minha preferida — ele sussurra para mim.

Eu rio, mas logo saio debaixo de sua asa, e olho pela janela, de onde já vem a resposta. Um carro escuro, caro, lustroso e bonito, se encontra estacionado diante da residência dos Savinna.

— Acabaram de chegar. A garotinha, Sabine, é uma graça! Estávamos conversando há pouco. Eu a segurei nos braços. Isto é tão engraçado... Parece até mais inteligente do que Milla, por exemplo.

— Poupe-me, Dimitri — Milla revira os olhos. — E Richard, está bem? Conversou com ele também?

— Sim, claro. Bem, eles estão na sala. Estamos aguardando as senhoritas — e ele sai do quarto.

Não muito depois, Milla abre a porta novamente, espiando por uma pequena fenda, e me convidando á apreciar sua visão.

Deparei-me com um rapaz alto e forte, de cabelos castanhos lisos e olhos azuis fortes.

— Suponho que seja Richard Thompson.

— Sim, é ele. Não é lindo?

— É bonito.

Milla bate a porta.

— Bonito? Ele é lindo. O mais lindo homem que existe!

Eu rio. Milla e Richard estudavam juntos. O rapaz de sorte havia conquistado o coração de minha irmã, depois de um tempo de convivência e estudos.

— Ele é bonito, Milla.

— Bonito! Bonito é muito pouco.

— Sim, é bonito de aparência. Só posso dizer isso. Nem o conheço.

— Bonito de aparência! — exclama Milla, indignada. — Isso porque ainda não o viu em roupa de banho.

— Milla! — eu digo, seguido de uma gargalhada.

— Mas é verdade! Ele é da equipe de natação. E cá entre nós, é o melhor de todos — ela suspira. — Ah, não! O melhor de tudo: Ele é comunista! — revela.

Eu a olho, alarmada.

— Milla, você não disse sobre...

— Não! — ela me corta, ofendida. — É claro que não, Ivy! Eu nunca faria isso!

Sorrio, e jogo os braços por cima de seu ombro.

— Eu sei.

— Você é minha irmã, ok? Eu jamais faria algo que colocasse o nosso segredo em perigo...

— Eu sei, Milla. Você é a melhor.

Ela ri.

— E então, está pronta para receber os convidados?

Dou de ombros.

— É claro.

— Então, vamos. Richard Thompson me aguarda. E sua família também.

Ela da um rodopio, quase perde o equilíbrio, e abre a porta novamente. Desta vez, nós duas passamos por ela.

Richard se mostra mesmo um verdadeiro cavalheiro, e se levanta de seu acento para cumprimentar-nos. Beija a mão de Milla, e depois a minha.

— É um prazer, Ivy. Milla contou muito sobre você.

— Devo dizer igualmente para os dois, Richard.

Milla sorri sem jeito.

— Vocês estão lindas.

— Obrigada — dizemos em uníssono.

O resto da família também nos cumprimenta. O Sr. Thompson – um homem de meia idade, com uma barriga volumosa, um cabelo castanho ralo e um bigode um tanto quanto parecido com o do Führer – não parece assim tão gentil quanto seu filho. Mal trocou três frases comigo e com minha irmã. Tinha nas mãos um copo de conhaque, e estava acompanhado de Alek.

A Sra. Thompson gargalhava com Gisella na sala de estar. Uma mulher loira de cabelos curtos e levemente encaracolados, com um batom vinho e olhos negros marcados, destacando seus olhos azuis.

A garotinha, Sabine Thompson, continuava na companhia de Dimitri. Trajava um vestido salmão, e tinha uma tiara de pedrinhas vermelhas em seus cabelos loiros compridos. Sorriu ao me ver, e também se levantou para cumprimentar a mim e Milla.

— Ei, Ivy — Dimitri disse, assim que me assentei ao lado dos dois. — Sabine estava me contando o quanto gosta de livros. Principalmente os de poesia.

— É mesmo? — pergunto, sorrindo para ela. — Eu e Dimitri lemos juntos quase sempre. Tenho uma coleção inteira de livros de poesia na minha cabeceira.

— Ele me disse — sorriu para Dimitri, e de Dimitri para mim. — Pode me mostrar depois?

— É claro que sim, princesinha.

Ela sorri, e coloca os dedos sobre os lábios claros. Logo os retira, a mando de sua mãe. Seus traços são lindos e puros, e me lembram de mim mesma, quando tinha aquela idade. Sua postura no sofá, sua risada profundamente alegre aos meus elogios e aos elogios de Dimitri. Espero, sinceramente, que a guerra nunca a faça sofrer. Que ela continue com seu lindo sorriso preso ao rosto, e que nunca seja arrancado, como o meu foi.

Eu e Dimitri levamos Sabine até o quarto. Ela escolhe um livro, e assim, uma página aleatória, e nós três lemos juntos a poesia selecionada. Como uma espécie de jogo.


Algum tempo depois, Gisella aparece na porta do quarto, convidando para o jantar.



A mesa ficou dividida. Alek e Gisella e os Thompson falando sobre negócios, Milla e Richard rindo sem parar sobre algo inaudível á minha distancia, e eu e Dimitri, ouvindo sobre como Sabine adoraria visitar a França, depois de me ouvir revelar que foi lá que passei boa parte da infância. Ela parecia querer visitar o mundo todo, no fim das contas, pois expressou o mesmo sentimento ao saber que Dimitri havia vivido em Londres.


No meio do jantar, uma gritaria vinda da rua chamou a atenção de todos nós. Sabine foi a primeira a sair de seu lugar, seguida por Dimitri que girou a maçaneta, e desceu para a varanda. Todos acompanharam.
A cena encontrada era de oficiais. Cinco oficiais fardados, em um circulo fechado. Meu coração parou. Apertei a mão de Dimitri, e senti minhas pernas vacilando.
Uma brecha no circulo de oficiais revelou um homem velho, magro e de barba grisalha caído no chão. Cuspia sangue, e rugia de dor á cada pontapé que lhe era direcionado pelos nazistas. O choro do homem piorava meus sentimentos. Náuseas, tontura. Talvez Dimitri percebesse antes se não estivesse tão atento ao cruel espancamento, como todos os presentes, e os vizinhos que saiam em suas varandas.

— O que aquele homem fez, mamãe? — Sabine questionou.

Laura Thompson revirou os olhos, e corrigiu:

— Não é um homem, querida. É um judeu.

Um dos oficiais – o líder – sacou sua arma, e virou-a ao contrário, golpeando a cabeça do velho senhor, e fazendo-o chorar ainda mais. Os golpes não cessaram, até o sangue espirrar forte no asfalto. Os outros oficiais aproveitaram para chutá-lo e socá-lo, e tudo o que eu podia ver era sangue.
Mas em seguida, porém, tudo ficou preto...

Acordei com uma imagem borrada de Dimitri, seus olhos azuis bem abertos, tomando forma aos poucos.

— Ivy — diz ele. — Graças á Deus!

— O que aconteceu? — indago, olhando para a família Thompson e os Savinna, todos a me encarar preocupados.

— Parece que não tem um estomago muito forte, querida — disse a Sra. Thompson.

— O que houve com o homem? — implorei a Dimitri, segurando seu braço. — Eles o mataram?

Ele balançou a cabeça.

— Não sei. Nós entramos para te socorrer, e não vimos o que houve depois...

— Deus queira que não — Richard diz, seguido de um olhar de reprovação de seus pais.

— Seja lá o que houve, eles não estão mais na rua — diz Alek.

Sentei-me no sofá. Gisella me entrega um copo d’água. Milla passou o braço por meu ombro.

— Você está bem?

Assenti, de um modo não tão convincente.

— É terrível, não é? O que eles fazem com essas pessoas...

— Pelo amor de Deus, Richard! — o Sr. Thompson grita, equivocado. — Não repita isso jamais!

— O que aquele senhor fez? — Sabine queria saber.

— Nasceu judeu — Gisella foi quem respondeu. Não como se estivesse realmente explicando. Havia pesar em sua voz.

— E o que há de errado nisso? — a menininha insistiu.

— Ora, Sabine! Não lhe ensinam nada na escola?! — questionou a mãe da menina, com falta de paciência. — Eles não deveriam estar em nosso país!

— Não ouça o que eles dizem, Sabine — diz Richard. — Aquele homem não tinha culpa de nada. Sinto muito que tenha visto aquilo, mas vai lhe servir de lição. Você é uma garota esperta. Não deixe que ninguém controle sua mente. Nunca, jamais.

Não posso deixar de sorrir levemente com as palavras de Richard. Sabine assente, com os olhos arregalados para o irmão, entendendo sua mensagem. Ou fingindo entender. Ela entenderia, mais cedo ou mais tarde.

— Cale-se Richard! Nenhum filho meu defenderá judeus! — grita seu pai.

— Nem odiará, papai.

— Ora! — o homem diz, andando de um lado para o outro. — E você, menina? — ele olha para mim. Seu tom irritado não é propositalmente direcionado á mim. Ainda assim, sinto medo. — Está se sentindo melhor?

— Sim. Eu só fiquei assustada com a situação...

A pequena alemãzinha dos Thompson se aproxima, e coloca uma de suas mãos pequenas sobre meu braço, afagando-me, como se dissesse que tudo ficaria bem. Sorrio terna para ela.

Tive certeza, naquele instante, que Sabine tomaria a mais corajosa e nobre decisão.


Fora de contexto – uma última nota sobre os Thompson:
No auge da guerra, Richard Thompson pousa sua irmã ferida em seus braços, e repete que tudo ficará bem.



O sangue é filtrado pelo tecido de suas vestes, e escorre pelo asfalto.
A menina fora chicoteada, quase que até a morte, por um dos oficiais do grupo que passava pela rua de sua casa transportando judeus para algum campo. Sabine tentou salvar um garotinho judeu, pequeno, magro e indefeso, que recebia a mesma punição que lhe fora destinada.
Sabine se tornaria uma forte mulher, junto ao irmão, com sua luta persistente contra o nazismo.


Dimitri me guia até o quarto depois da despedida da família Thompson. Eu o abraço com força, e ele me protege de qualquer mal. Lágrimas estão borrando toda a maquiagem, lavando meu rosto, e revelando a verdade por trás da minha máscara. Sou uma judia. E em breve, meu destino seria o mesmo daquele senhor.

Milla invade o local de súbito, e tento controlar meus soluços. Não sai muito bem.

— Ah, Ivy... Eu sinto muito por aquela cena. Como a humanidade consegue ser tão cruel? O pobre senhor, mal se aguentava em pé... — ela segura meu queixo com carinho, e depois se deixa cair na cama.
Logo Milla perceberia que minhas lágrimas tinham motivo maior do que o senhor espancado. Ela se apóia nos cotovelos, e me assiste curiosa enquanto repito o nome de Dimitri sem parar. Há tanto desespero escondido nos sussurros, que mal consigo aceitá-los como meus. Estava aterrorizada.

— Adena, precisamos tirar você daqui — diz meu irmão, convicto, sem se importar com a presença de Milla.

— Não há mais saída, Dimitri...

— Esperem — Milla diz, erguendo-se ainda mais. — Esperem um momento. Há algo que eu precise saber?

E Dimitri conta. Cada mínimo detalhe. O oficial, Thomas Roys. A briga. Ashira.
Milla está boquiaberta ao fim de tudo. Meu choro fora contido durante a detalhista explicação de Dimitri á irmã. Eu tinha que me acalmar, e meu irmão me deu tempo para isso. Não me soltou por um segundo enquanto falava. O desespero jamais ajudou alguém, afinal.

E todos os três dividiam o espaço pequeno de minha cama naquela altura.
— Porque não me contaram?!

— Porque você abriria a boca, Milla.

— Não abriria não!

— E entraria em desespero...

— Milla — eu os corto. — Não contamos porque não queríamos te preocupar. Assim como não contamos á seus pais.

— Ivy corre perigo. Tem de sair daqui. Pra ontem! E você, Dimitri, deveria ter achado um lugar para ela muito antes! Deveria ter falado com o papai!

— O que o papai poderia fazer, Milla? Não temos parente nenhum aqui, exceto os por parte de nossa mãe. E estes são puramente nazistas. Não podemos tirar Adena do país, e fugir para a Rússia. Eu estava contando com tempo, tempo para arrumar um lugar onde ela pudesse viver...

Tempo. E se meu pai tivesse tido tempo? Tempo de pegar seus bens mais preciosos, e fugir com suas quatro filhas e sua esposa. E se todos os outros judeus tivessem tempo? Se todos soubéssemos o que iria de fato ocorrer depois da noite dos cristais?

A vida é imprevisível. E, de modo imprevisível, uma voz familiar berrou por mim, do lado de fora da casa.

— Ivy!



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Notas finais do capítulo

E aí, curtiram? Obrigada por chegarem até aqui. Reviews aceitas. Até a próxima!



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