My Germany escrita por UmGreyjoy, Florita


Capítulo 10
Esperanza Gonzalez


Notas iniciais do capítulo

Hey, people! Me desculpem pela demora a postar, acontece que eu fui viajar, assim como os outros autores, e não deu pra postar. Mas aqui está mais um chap da nossa querida Esperanza. Espero que gostem e nos vemos lá embaixo ^^



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Pra ser sincera, não é sempre que eu gosto do meu nome, afinal a esperança pode ser algo muito traiçoeiro. É como você jogar um pedaço de pão a alguém que está morrendo de fome. Aquilo não vai satisfazê-lo, só vai deixá-lo com vontade de mais. E experimentar algo assim é um dos maiores pesadelos do homem.

 Eu estava na cozinha do café, terminando de fazer um bolo, quando Nadine irrompeu pela porta.

 - Esperanza! - gritou, afobada, me dando um belo susto.

 - Aconteceu algo, Nadine? - perguntei preocupada, já imaginando uma invasão de soldados nazistas.

 - Preciso falar com você, venha comigo - ela pediu, e saímos do café pela porta dos fundos.

 Nadine parecia estar um pouco nervosa, cansada, mas satisfeita. Pegou um cigarro e o acendeu, provavelmente para tentar se acalmar. Eu gosto de quando ela fuma. O cheiro me lembra os cachimbos de meu pai, e me dá a sensação de estar novamente em casa.

 - Sabe quem é Pietro, Esperanza? - ela perguntou, olhando pra mim. Assenti com a cabeça, era um cozinheiro cigano que trabalhava no café comigo. Um moço simpático. - Sabe que ele mora no Beco do Sangue Sujo, certo?

 - Como? - retruquei, confusa. Eu nunca havia ouvido falar desse lugar.

 - O Beco do Sangue Sujo é um beco bem escondido aqui em Berlim, onde vários ciganos moram. Ele me contou que, por lá, mora uma menina bem quieta, bonita, que sempre despertou certa curiosidade nele. Hoje ele veio me contar que descobriu o nome dela.

 Eu realmente não sabia onde Nadine queria chegar, e acho que ela percebeu isso, pois disse, séria.

 - O nome dela é Safira - ela disse - Safira Gonzalez.

 Senti meus olhos se arregalarem. Não, não era possível. Minha irmã? Minha irmãzinha? Senti minhas mãos começarem a tremer, eu precisava encontrá-la.

 - Onde fica esse lugar, Nadine? - perguntei, já me preparando para disparar para lá.

 - Eu vou te passar o endereço, mas se acalme - ela pediu - Venha, coloque alguma coisa para esconder seu rosto.

 Voltamos para o café e eu enrolei um lenço em minha cabeça, escondendo meu rosto e cabelo. Ela me passou o endereço e segurou minhas mãos, firme.

 - Quando a encontrar, traga-a pra cá - pediu - Eu vou empregá-la. Ela poderá dormir no quartinho, com você.

 Abracei Nadine forte.

 - Muito obrigada, você não sabe o que isso significa pra mim. Muito obrigada.

 Ela me abraçou de volta, e aquele momento foi como se eu tivesse minha mãe novamente.

 - Está tudo bem, Espê - ela disse, sorrindo - Agora vá lá.

 Assenti freneticamente, e fui andando pelo caminho que Nadine me instruiu. O lugar ela longe, e eu tive que decorar o endereço, já que não leio uma palavra de alemão e não podia simplesmente pedir informações na rua. O dia estava frio, eu sentia minhas mãos congelando, mas prossegui, firme. A imagem de minha irmãzinha em um beco sujo, nesse frio imenso, só esperando ser encontrada, me dava esperança.

 E aqui nós voltamos ao tópico principal: raramente a esperança se torna uma coisa boa. Ela pode ser destrutiva. Algo pode vir como uma onda enorme e arrastar toda a sua fé pra fora de si. E foi o que aconteceu comigo quando eu cheguei ao Beco do Sangue Sujo.

 Estava tudo devastado. As coisas quebradas e espalhadas pelo chão, sangue seco nas paredes. Era a personificação de um pesadelo.

 Naquele momento, eu não sabia ao certo o que me guiou, mas eu corri para dentro do beco, revirando as coisas, procurando qualquer coisa que me remetesse a Safira. Encontrei uma criança que não deveria ter mais de 5 anos, morta, desfigurada. Toquei seu rosto devagar, as minhas lágrimas banhando-o. Era mais uma raposinha que teve a pele tirada por Arabela.

 Continuei procurando, até que tive um vislumbre de uma mochila de pano roxa. Voltei e a peguei nas mãos, estudando-a. Eu conhecia essa mochila. Essa mochila era minha, e sumiu juntamente com Safira.

 Tinha sangue seco por toda ela, mas eu não me importei. Abri, procurando alguma prova de que fosse realmente a minha mochila. Tinha uma bolsinha com algumas moedas, um saco com pedaços de pão duro, duas trocas de roupas simples e sujas… e um vestido azul.

 Peguei aquele vestido azul na mão, o reconhecendo de imediato. Era o meu vestido, o vestido que a pequena Esperanza de 15 anos usava quando fugiu do fogo. Embaixo dele, estava a saia vermelha de Safira e, embaixo de tudo, uma foto velha e corroída pelo tempo de nossa família destruída. Meu pai, minha mãe, eu e Safira, em um dia que viemos para a cidade, antes da praga nazista.

 Aquilo me despedaçou por dentro. Era como se o meu coração fosse dilacerado dentro do peito. Então era isso, minha irmã estava morta. Eu não conseguia acreditar.

 Guardei tudo dentro da mochila, disposta a levá-la e, quando levantei, trombei com um homem.

 Fechei os olhos firme, o flashback da última vez em que isso acontecera vindo à mente. Os olhos azuis, frios e cruéis do soldado nazista, suas mãos enormes me segurando com brutalidade, minha fuga pelos telhados. Agora não tinha telhados para eu fugir. Estava perdida.

 Ao abrir os olhos, percebi que não eram olhos azuis que me encaravam de volta, e sim um par de olhos castanhos tão assustados quanto os meus deveriam estar. O moço era obviamente cigano, com seu cabelo castanho no ombro e sua barba por fazer. Me soltou, assustado, o que me fez cair no chão. O lenço que cobria minha cabeça caiu, revelando meus traços ciganos.

 O moço deu um suspiro de alívio.

 - Graças aos deuses, é só uma cigana - suspirou aliviado - Você me deu um susto, menina.

 - Você também me assustou - me defendi - Quem é você?

 - Bruno Herrera - ele se apresentou, estendendo uma mão para me ajudar a levantar. Aceitei.

 - Esperanza Gonzalez - retruquei, batendo o pó e a sujeira de minha roupa.

 - Gonzalez? - ele perguntou surpreso - Como… Safira Gonzalez?

 Mais uma vez, o nome de minha irmã fez meu coração disparar.

 - Você a conhecia? - retruquei. Ele assentiu.

 - Dá época que eu morava aqui - ele contou - Ela nunca falava nada, sempre muito discreta, silenciosa. Era parecida com você. É irmã dela?

 Assenti, cansada.

 - Eu vim aqui com a esperança de encontrá-la, mas… - olhei ao redor - O que eu encontrei foi isso.

 O moço assentiu.

 - Eu vim ver meu avô - ele contou - Eu morava com ele aqui antes de achar emprego numa sapataria de um homem bondoso. Então passei a morar por lá.

 Assenti. Sua história era um pouco parecida com a minha. O moço começou a revirar os destroços, e encontrou o menininho morto.

 - Meus deuses, é Marlon - ele murmurou - Era uma criança tão feliz… não posso acreditar nisso.

 Fiquei em silêncio, o observando voltar a remexer nos destroços, e encontrar uma mochila de pano parecida com a minha, só que marrom.

 - Era a mochila de meu avô - ele murmurou - Meu avô…

 Insegura, toquei seu braço. Eu não sabia o que falar, e acho que ele percebeu isso. Conseguiu dar um sorriso triste.

 - Está tudo bem - garantiu - Ele pode ter fugido. Ele pode estar vivo. Assim como sua irmã.

 Assenti para ele, suspirando.

 - Nós devíamos enterrar o menininho - sugeri - Seria injusto deixá-lo apodrecer aqui.

 Ele assentiu, e pegou o pequenino corpo no colo. Pendurou a mochila marrom no ombro, e olhou pra mim.

 - Eu sei um bom lugar para enterrá-lo. Quer vir comigo?

 Assenti, voltando a esconder meu rosto com o lenço. Fui seguindo-o até um lugarzinho perto dali, um terreno baldio, todo de terra. Colocou o corpo da criança no chão, e foi até um canto, onde tinha uma pá, juntamente com pedaços de madeira e outros materiais.

 Passou a cavar um buraco, grande o suficiente para caber o corpo do menino. Demorou cerca de duas horas para ele terminar de cavar um buraco fundo o suficiente, e depositou o corpo ali. Por um momento, ficou apenas observando o menino. E passou a recolocar a terra na cova. Ao terminar, estava todo sujo de terra, mas um sorriso calmo habitava o seu rosto.

 - Espero que Marlon descanse em paz - ele disse, mas para si mesmo do que para mim.

 - Ele vai - garanti - Agora que está enterrado, o espírito dele pode se libertar do corpo. Ele vai ser feliz longe daqui, em um lugar onde Arabela não pode atingi-lo.

 Bruno franziu as sobrancelhas.

 - Arabela?

 Sorri pra ele. Essa história não era muito conhecida, nem mesmo entre os ciganos.

 - Esqueça - pedi, no que ele deu de ombros. - Bem, Bruno, acho que já está na minha hora.

 - Já? - ele perguntou, meio triste. Acabei corando por isso - Bem, me deixe pelo menos acompanhá-la até seu trabalho. Não é seguro para uma moça cigana andar sozinha por aí.

 - Não é necessário - garanti.

 - Por favor - ele pediu, como uma criança. Deu pra ver que foi involuntário, mas foi fofo. Sorri pra ele.

 - Tudo bem, tudo bem.

 O sorriso de Bruno foi tão grande que me fez dar risada. Fomos andando juntos até o café, conversando o tempo inteiro. Contamos sobre nossas vidas, nossos sonhos. Bruno era um rapaz sonhador. Admirei isso nele.

 Ao chegarmos, ele coçou a nuca, aparentemente constrangido.

 - Bem… então é isso - ele disse, sorrindo - Até mais, Esperanza.

 - Até mais, Bruno - sorri para ele, e já estava entrando no café quando senti sua mão envolver meu antebraço. Me virei pra ele, a tempo de receber um beijo no rosto. Corei por isso, eu definitivamente não era acostumada a esse tipo de contato.

 - Nós… podemos nos ver outra vez? - ele perguntou. Corei antes de responder.

 - Acho que seria ótimo.

 Bruno sorriu, antes de se virar e ir embora, feliz. O mesmo sorriso habitava meu rosto, quando adentrei o café.

 Eu não havia encontrado a minha irmã. Estava arrasada por isso. Mas conhecer Bruno foi, de certa forma, um consolo. Um consolo que, mais uma vez, traria ao meu coração aquele sentimento tão traiçoeiro: a esperança.


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Notas finais do capítulo

E aí, o que acharam? Deixem reviews, hein?
Beijos!