Milhares de bicicletas rodeavam Amsterdã. Eu nunca havia visto nada igual. Nunca pensei na possibilidade de existir mais bicicletas do que carros em uma cidade. A europa é realmente inimaginável, pensei.

O hotel era apenas duas quadras depois da estação e sem erro eu o acharia facilmente. Enquanto eu caminhava perante as calçadas de Amsterdã, eu ia analisando cada detalhe. Absolutamente todos os prédios residenciais e empresariais eram feitos juntos uns aos outros. Pelo menos, toda a cidade parecia ter sido planejada desse jeito.

Ao chegar no hotel, onde todas as minhas colegas de dança estariam hospedadas esperando pela grande competição, tive o grande alívio do recepcionista falar inglês, pois holandês eu tinha certeza de que não sabia nada. O simpático recepcionista me informou o número do quarto e explicou-me como chegar lá exatamente. E assim eu o obedeci.

Quando pus meus dois pés no tal aposento, a primeira coisa que pensei que faria seria mandar um e-mail a Nicolas informando a minha chegada ao hotel em segurança.

De: Drew Kimberley (drewkim_262@gmail.com)
    Para: Nicolas Morin (nicolas.mor7@hotmail.com)

Assunto: Cheguei, papai.

O hotel era apenas algumas quadras da estação, por isso não fui assaltada, torturada e nem estuprada. Está tudo sob controle, apenas estou sentindo um pouco de nervosismo, mas sempre sinto isso antes de grandes competições. Estou com medo que coisas ruins aconteçam hoje há noite, afinal é a minha primeira competição representando uma equipe que não seja a Inglaterra.
Responda-me quando puder e, por favor, não se esqueça de torcer por mim.
Drew

Pensei várias vezes antes de enviar, mas finalmente apertei no botão. Queria que ele estivesse aqui. Eu sabia que ele me apoiaria. Mas não era hora de pensar nisso, era hora de seguir em frente. De focar. De alcançar mais um sonho.

Até que a porta de meu quarto começou a bater insuportavelmente.

Nicolas?

Porém, quando a abri notei que Desi vinha em direção aos meus braços. Pulando de alegria.

– Você chegou! Você chegou! Por que não avisou logo? - ela perguntava enquanto me balançava de um lado para o outro.

– Eu acabei de chegar, Desi. - e ri de sua expressão. - Como foi na Itália? - perguntei, fazendo sinal para ela entrar no quarto.

– Foi ótimo. Ed ficou lá com seus parentes e eu voltei para Amsterdã. - dizia sorrindo. - Você não tomou banho ainda? Vamos ir para o palco daqui há alguns minutos. - alertou-me.

– Quê! Mas eu acabei de chegar. - eu disse indignada.

– O tempo passa rápido, amiga. Vamos logo. - ela disse saindo do quarto e indo em direção ao seu. E eu, sem perder mais tempo, fui em direção ao banheiro para me preparar para a competição.

Enquanto dava os últimos retoques para ir ao ônibus, um barulho vinha em direção ao meu notebook. Um barulho que indicava nova mensagem recebida.

Uma nova mensagem de Nicolas.

De: Nicolas Morin (nicolas.mor7@hotmail.com)
    Para: Drew Kimberley (drewkim_262@gmail.com)

Assunto: Aqui estou

Obrigado por ter avisado. Fico feliz pelo fato de ter filhos que me obedecem. Aliás, eu acabei de chegar. Minha mãe ficou muito feliz por ter me visto, até chorou com a minha chegada. E como você disse, ela continua normal. Ela até me contou que a doença ainda está fraca e que é completamente reversível. Só foi falta de sorte, como ela disse. Mas em relação à você... Bem... Você realmente acha que precisa de sorte? Você não dança com as pernas. E sim com o coração, Drew. O talento está dentro de você.

Mas de qualquer forma, boa sorte. Queria muito estar com você. Saiba disso.

Nicolas Morin

Poderia jurar que lágrimas sairiam de meus olhos a qualquer momento. Eu o queria mais do que qualquer coisa. Eu sabia disso. Eu desejava isso. Eu almejava isso.

– Drew! Vamos logo. O ônibus já chegou. - gritou Desi, do outro lado da porta. E eu fui em direção a ela para abri-la.

– Ah, oi. Só vou no banheiro retocar a maquiagem, pode entrar. - eu disse, fazendo sinal para que ela entrasse. Fiquei no banheiro pouco tempo e quando saí notei que Desi parecia assustada, com a mão tapando a sua boca enquanto olhava a porta.

– Desi? Está tudo bem? - perguntei, estranhando a sua atitude.

– Ah... Oi... É... Estou ótimo e você está linda. - ela disse mudando de assunto. Eu agradeci com um sorriso. É, fazia tempo que eu não me sentia tão bonita. Eu estava com uma saia curta e uma camiseta com um decote bem adequado, em que seu centro estava escrito "França".

E somente a partir daí minha ficha havia caído.

Eu iria competir para a França e não para a Inglaterra. Um nervosismo invadiu meu corpo de repente. Fazendo-me enjoar. Fazendo-me sentir alegre, mas ao mesmo tempo triste. Essa troca de sentimentos estava acabando comigo, pensei.

– Drew, você está bem? - perguntou Desi, parecendo preocupada.

– Estou... Vamos. - disse e puxei seu braço, para irmos logo a competição.

O local estava lotado, do jeito que eu havia imaginado. Os juízes já estavam sentados em seus lugares preparados para fazerem o julgamento dos pontos de cada equipe. E, como previsto, a equipe da Inglaterra seria a primeira a se apresentar e eu havia localizado a tão esperada equipe.

Vagance estava linda e ao seu lado estavam as outras meninas, as quais pareciam ansiosas. E Michael. Michael estava ao lado de Vagance. E foi o momento que decidi ir até lá.

Porém, minhas pernas pararam imediatamente quando meus olhos viram aquela cena. A cena que eu jamais imaginaria ver em minha vida.

Michael beijava Vagance. E ela retribuía com vontade.

Eu fiquei paralisada. E, por sorte minha, nenhum deles havia me visto, pois eu chorava. Chorava como nunca. E ninguém se importava. Ninguém via. Ninguém nunca fora traído tanto quanto eu havia sido. Até que elas foram chamadas para dançar e foram para a pista. Mas eu continuava ali. Chorando enquanto olhava para a parede em que Michael e Vagance haviam se beijado.

– Drew! Drew! O que aconteceu? - Desirée me puxava com força, mas a intenção de me fazer voltar para a realidade. - Por que você está chorando? A Inglaterra já vai se apresentar. Foco! - ela dizia pensando que eu estava aos prantos pelo nervosismo. Mas de qualquer forma eu limpei minhas lágrimas e fui ver a tal apresentação. Queria ver o que elas haviam planejado o ano inteiro.

Até que eu havia me decepcionado novamente.

E não fora somente eu. Eram todas as meninas de minha equipe, as quais pareciam estar tranquilas, agora estavam às lágrimas. A treinadora tentava acalmá-las, mesmo sabendo que não seria possível. A música que as meninas da Inglaterra estavam dançando não era nem mais nem menos do que Where Have You Been, da Rihanna. A qual eu havia dito para Vagance no dia em que ela havia me ligado.

Eu não acreditava no que estava acontecendo. Estávamos sendo desclassificadas. E não por falta de talento, mas sim porque fomos traídas por Vagance. Ou traídas por mim mesma.

Quando a música havia acabado, todos batiam palmas e comemoravam. Nós seriamos as próximas a nos apresentarmos. Mas, na verdade, não sabíamos o que fazer. Os locutores chamavam nossos nomes, mas ninguém movia um músculo. Porque sabíamos que ninguém iria se apresentar. Não essa noite. Não amanhã. E nem nunca. Estávamos sendo desclassificadas. A treinadora falava com os juízes que avaliavam a situação com cuidado. E logo, as respostas foram vindo aos poucos.

– Meninas, parem de chorar. Foi realmente um azar, mas não podemos fazer nada além de aguardar. Eles pensarão em nosso caso e daqui há uma semana nos informarão se continuaremos na competição. Agora, vamos voltar para a estação. Temos uma longa viagem pela frente. - ela afirmou, mostrando chateação. Todas assentiram com a cabeça, mas eu não. Eu não sairia ainda. Não antes de fazer uma coisa.

– Treinadora. A senhora me daria cinco minutos? - pedi.

– Não mais do que isso, Drew. - ela disse, sem olhar para mim. Porém, eu não me importei. Fui atrás da justiça.

Atrás de Vagance.

Entrei na sala em que a Inglaterra estava localizada furiosamente. E todas me olharam devido ao barulho. Porém, elas não me barraram, apenas vieram me saudar.

– Drew! Como é bom vê-la. - dizia Laura.

– Como está Paris? - perguntava Ashley.

– Como você está linda. - ressaltava Victória.

Entretanto, eu ignorava todas. Eu ia em direção à Vagance, pois ela era a única que eu queria "parabenizar".

– Espero que esteja feliz agora. Afinal, você conseguiu tudo sozinha, não é mesmo? - eu gritava, enquanto empurrava-a. As meninas ficaram quietas de repente, olhando para a cena que estava por vir.

– Drew! Eu... Eu não tinha a visto. - ela dizia assustada.

– Eu sei que não. Você estava muito ocupada com Michael. - eu disse, fazendo-a assustar-se ainda mais. - Você é inacreditável... Roubou a minha música, o meu ex-namorado... O que mais você quer? A minha janta? Deixei o resto em meu prato, só falta você pegar também. - eu disse, fazendo-a avançar em mim. Porém, ela havia sido impedida pelas meninas da equipe, que já haviam entendido o que estava acontecendo.

– Como assim roubou a música de vocês? - perguntava Ashley, mostrando-se confusa.

– Não se meta. - gritava Vagance.

– Ah... Você não disse a elas? Você não disse a elas que você perguntou a música que eu dançaria na semifinal, afirmando que você era de confiança. Que nada aconteceria se você soubesse. - eu gritava. - Mas para a sua felicidade, fomos desclassificadas e a culpa é sua.

– Para com isso. - ela pedia, pondo as mãos nos ouvidos.

– Você não consegue escutar a verdade? Você não consegue aceitar o fato de que você é uma cretina? - eu gritava.

– Para! Chega! Você só sabe reclamar! Você só reclama da sua vida maravilhosa em Paris enquanto eu fico sozinha naquela merda de Londres! Enquanto você não dá a mínima para mim. - dessa vez ela quem chorava.

– Se você odeia Londres, por que não vai embora? Nunca pensou que existem pessoas que gostariam estar em seu lugar? - eu perguntava, dessa vez mais calma. Mas ela nada respondia.

– Não, não é mesmo? Porque você só consegue pensar em si mesma. Mas não se preocupe, a partir de hoje eu nunca mais irei reclamar para você. Até porque você não existe mais para mim. - eu disse, largando as mãos das meninas que haviam me cercado e indo em direção à saída.

E infelizmente eu havia dado de cara com Michael.

– Drew! Minha nossa... Você está maravilhosa. Como é bom vê-la. - ele dizia, apertando-me contra seu peito. Mas minhas mãos o empurraram, para bem longe de mim.

– Não toque em mim. - eu disse largando seu corpo. Ele me olhou com um rosto assustado e seguiu meu corpo com o seu olhar até eu finalmente sumir.

Eu estava desesperada. Era como se a única ponte em que eu pudesse atravessar tivesse desmoronado em pedaços. Mas eu segui em frente. Eu não podia desistir. Eu não era a mesma Drew. Dessa vez, eu batalhava por aquilo que eu queria. E tudo por causa de Nicolas.

Nicolas.

Era isso.

Quando cheguei em meu aposento, abri meu notebook imediatamente para lhe contar o ocorrido.

De: Drew Kimberley (drewkim_262@gmail.com)
    Para: Nicolas Morin (nicolas.mor7@hotmail.com)

Assunto: Dança= Um grande desastre.

Nicolas, por favor, eu preciso de sua ajuda. Eu... Eu não sei se você me responderá rapidamente, mas eu preciso de você. Mais do que qualquer coisa. Por favor, responda-me assim que puder.

E enviei, sem ao menos revisar minhas palavras dramáticas. Era isso o que eu estava sentindo. Eu não iria mentir.

E felizmente o barulho de mensagem recebida aliviava os meus ouvidos.

Era Nicolas.

De: Nicolas Morin (nicolas.mor7@hotmail.com)
    Para: Drew Kimberley (drewkim_262@gmail.com)

Assunto: Socorrendo a donzela.

Acalme-se. Eu vou ligar para você, fique atenta.

E meu celular tocava. E eu o atendia imediatamente.

– Drew? - era Nicolas. Era ele.

– Você não sabe como estou feliz por ouvir a sua voz. - eu disse suspirando fundo.

– O que aconteceu? - ele perguntou parecendo preocupado.

– Tudo foi um desastre. Absolutamente tudo. Vagance me traiu. E Michael...

– O que aquele idiota fez? - ele perguntava com raiva.

– Vagance está namorando com ele. Eles se beijaram na minha frente. E o pior é que Vagance me deixou como palhaça, pois eu não sabia de nada. - e eu chorava. Chorava como uma criança.

– Está brincando? Eles fizeram isso com você? Ah Drew... Não chore. Caramba, eu queria muito poder te abraçar. - ele disse, sendo sincero. Fazendo-me amolecer.

– Fizeram. E Vagance roubou a nossa música da competição. Eu disse a ela achando que ela era de confiança, mas devido a minha burrice fomos declassificadas... Pelo menos, estamos esperando por isso. - eu revelava.

– Que garota ridícula... Mas Drew, se eu fosse você ficaria contente. - ele admitiu.

– Contente? Por que?

– Porque você é uma menina fantástica. Vocês eram melhores amigas inseparáveis, mas isso só mostrou o quanto vocês eram separáveis... Quero dizer, você não tem nada a vê com ela. Por favor. Não chore. - ele pedia.

– Não vou mais chorar. - eu dizia, limpando as lágrimas. - Obrigada Nicolas.

– Ainda bem, pois se não eu teria que ir até aí limpar as suas lágrimas. - ele ria.

– Não seria uma má ideia.

– Acalme-se... Ainda existe um lugar feito somente para nós. Onde nós iremos descobrir juntos. E nada desses pesadelos acontecerão. Minha mãe não vai estar com câncer. Michael não vai existir. E Vagance não irá ser maldosa. Somente eu e você, Drew. Descobrindo coisas novas. Descobrindo aquilo que nos atraí.

– Espero que esse lugar exista realmente.

– Ele existe, pode acreditar. Aliás, amanhã é o seu aniversário, não é?

– Bem... É... Eu até tinha me esquecido.

– Amanhã então comemoraremos. E sabe onde?

– Ah, Nicolas... Não será necessário.

– Não existe essa resposta, Drew. É mais do que necessário. E comemoraremos no Le Duplex. Não duvide de mim. - ele dizia.

– Só comemorarei por você. - eu cedia. - Amanhã nos falamos, a treinadora irá passar em todos os quartos agora para.... Para encher o saco. - eu disse, fazendo-o rir.

– Tudo bem. Eu ligo para você amanhã. Cuide-se. - ele disse.

- Você também... Cuide-se.

Pois eu estava longe e não poderia cuidar de você, pensei.