Memories escrita por taay


Capítulo 8
Capítulo 7


Notas iniciais do capítulo

Contém trechos de A Maldição do Tigre, de Colleen Houck, páginas 196 a 199.
Boa leitura!



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  “No dia seguinte acordei, me espreguicei e saí da barraca. O sol havia evaporado a água da chuva e transformado a selva molhada em uma sauna a vapor. Galhos e folhas arrancados pela tempestade se espalhavam pelo chão do acampamento. Um fosso encharcado de água cinzenta, cercado por pedaços de madeira enegrecida e carbonizada, era tudo o que restava de nossa fogueira.

  A cachoeira despencava com mais velocidade que o normal, empurrando destroços para o lago agora lamacento.

  — Nada de banho hoje — falei, cumprimentando Ren, que havia assumido sua forma humana.

  — Não tem importância. Vamos ao encontro do Sr. Kadam. É hora de retomar nossa jornada — replicou ele.

  — Mas e quanto a Kishan? Você não conseguiu convencê-lo a vir conosco?

  — Kishan deixou clara sua posição. Quer ficar aqui, e eu não vou implorar a ele. Quando toma uma decisão, raramente muda de idéia.

  — Mas, Ren...

  — Está decidido.

  Ele se aproximou de mim e puxou minha trança. Então sorriu e me deu um beijo na testa. O que acontecera entre nós durante a tempestade havia consertado nossa ruptura emocional e eu estava feliz por ele ter voltado a ser meu amigo.

  — Venha Kells. Vamos arrumar tudo.

  Só levei alguns minutos para desmontar a barraca e guardar as coisas na mochila. Estava aliviada por voltar para junto de Sr. Kadam e da civilização, mas não me agradava deixar Kishan daquele jeito. Eu nem tivera a chance de me despedir.

  Na saída, passei pelos arbustos floridos e fiz borboletas levantarem voo novamente. Não havia tantas quanto no dia em que chegamos. Elas se agarravam às flores encharcadas e batiam as asas lentamente ao sol, secando-as. Algumas alçaram voo para o céu e Ren esperou pacientemente enquanto eu as observava. Suspirei quando tomamos a trilha de volta para a estrada onde o Sr. Kadam estava acampado. Embora eu detestasse longas caminhadas e acampamentos, aquele lugar era especial.

  Meu tigre ia à frente, como sempre, e eu o seguia, tentando evitar suas pegadas lamacentas e caminhar em terreno mais seco. Para passar o tempo, mencionei a Ren a conversa com Kishan sobre a vida no palácio e disse que ele carregara uma sacola cheia de comida na boca para que eu não morresse de fome.

  Algumas coisas, porém, não dividi com Ren, especialmente o que Kishan me contara sobre Yesubai. Eu não queria que Ren ficasse pensando nela, mas também sentia que era Kishan quem precisava conversar sobre o assunto com Ren. Em vez disso, tagarelei sobre ter ficado entediada na selva e haver assistido à caçada.

  De repente, Ren se transformou em homem, agarrou meus braços e explodiu:

  — Você viu o quê?

  Confusa, repeti:

  — Vi a... a caçada. Pensei que você soubesse. Kishan não lhe falou?

  Rangendo os dentes, ele disse:

  — Não, não falou!

  Desviei-me dele e subi em uma série de pedras.

  — Ah. Mas não importa. Estou bem. Consegui voltar.

  Ren agarrou meu cotovelo e me colocou no chão à sua frente.

  — Kelsey, você está me dizendo que não só assistiu à caçada como também voltou para o acampamento sozinha?

  Ren estava mais do que furioso.

  — Foi — falei, com voz esganiçada.

  — A próxima vez que vir Kishan, eu vou matá-lo. — Ele apontou o dedo para o meu rosto — Você poderia ter sido atacada! Não posso nem citar todas as criaturas perigosas que vivem na selva. Você nunca mais vai sair do meu lado!

  Ele segurou minha mão e me puxou pela trilha. Eu podia sentir a tensão irradiando de seu corpo.

  — Ren, eu não entendo. Você e Kishan não conversaram depois de sua... refeição?

  — Não — resmungou ele. — Cada um foi para o seu lado. Voltei direto para o acampamento. Kishan ficou perto da... comida um pouco mais. Não devo ter sentido seu cheiro por causa da chuva.

  — Kishan ainda deve estar me procurando. Talvez devêssemos voltar.

  — Não. Seria bem feito para ele — Ren riu acintosamente. — Sem um cheiro para rastrear, é provável que ele leve dias até descobrir que partimos.

  — Ren, você devia voltar lá e dizer a ele que estamos indo embora. Ele o ajudou na caçada. É o mínimo que podia fazer.

  — Kelsey, nós não vamos voltar. Ele é um tigre adulto e pode tomar conta de si mesmo. Além disso, eu estava me virando bem sem ele.

  — Não, não estava. Eu vi a caçada, lembra? Ele o ajudou a abater o antílope. Kishan disse que você não caçava havia mais de 300 anos. Por isso fomos atrás de você. Ele disse que sabia que precisaria da ajuda dele.

  Ren franziu a testa, mas não disse nada.

  Parei e coloquei a mão em seu braço.

  Não é sinal de fraqueza precisar de ajuda ás vezes.

  Ele resmungou, dispensando meu comentário, mas prendeu minha mão em seu braço e recomeçou a andar.

  — Ren, o que exatamente aconteceu com você há 300 anos?

  Ainda carrancudo, ele não respondeu. Eu o cutuquei com o cotovelo e sorri, encorajando-o, ele não respondeu. A carranca lentamente desapareceu de seu lindo rosto e a tensão foi deixando seus ombros. Ele suspirou, correu a mão pelos cabelos e explicou:

  — É muito mais fácil para um tigre negro caçar do que para um tigre branco. Eu não me misturo à vegetação na selva. Quando ficava com muita fome e frustrado com a dificuldade de caçar animais selvagens, às vezes me aventurava em um vilarejo e roubava uma cabra ou uma ovelha. Eu tomava cuidado, mas logo se espalharam os rumores de que havia um tigre branco na região. Não só os fazendeiros queriam me afugentar dali como também havia caçadores de grandes animais selvagens que buscavam a emoção de capturar um animal exótico.

  — Nossa, você correu muito perigo! — observei.

  — Eles espalharam armadilhas para mim por toda a selva e muitas criaturas inocentes foram mortas. Sempre que eu encontrava uma, eu a desarmava. Um dia, cometi um erro idiota. Havia duas armadilhas bem perto uma da outra, mas eu me concentrei na órbita, que era do tipo padrão: um pedaço de carne pendurado sobre um buraco. Eu estava estudando o buraco, tentando calcular uma forma de pegar a carne, e tropecei em um arame oculto, disparando uma chuva de espigões e flechas que desabou sobre mim vinda do topo da arvore. Saltei para o lado para me esquivar a uma lança, mas a terra sob meus pés cedeu e eu caí no buraco.

  — Alguma das setas atingiu você? — perguntei, ansiosa

  — Sim. Várias me arranharam, mas eu sarei rápido. Felizmente, o buraco não tinha estacas de bambu, mas era bem-feito e fundo o bastante para que não conseguisse sair.

  — O que fizeram com você?

  — Depois de alguns dias, os caçadores me encontraram. E me venderam para um colecionador de animais selvagens. Quando me mostrei difícil, ele me venceu para outro, que me vendeu para um terceiro, e assim por diante. Por fim, acabei em um circo na Rússia e desde então fui passando de circo em circo. Sempre que as pessoas suspeitavam da minha idade ou me machucavam, eu causava problemas suficientes para provocar uma venda rápida.

  Era uma história terrível, de partir o coração. Eu me afastei dele e, quando tornei a me aproximar, ele entrelaçou os dedos nos meus e continuou a caminhar”

  Fechei meu livro, caminhei do banco perto dos armários e o guardei no meu onde também ficavam minhas coisas da aula de natação com o resto do meu material escolar para aquele dia.

  No intervalo custei a explicar aos meus queridos dois amigos o que acontecerá. Claro que minha prima não acreditou logo em mim; então tive de tagarelar nos mínimos detalhes sobre a conversa com o diretor e seu interesse por minha mãe. Aquele assunto ainda martelava em minha cabeça, e parecia incomodar, de algum jeito, Luke.

  As aulas seguintes passaram-se rapidamente. Como de costume, copiei o texto que havia na lousa — em ambas as aulas —, talvez quando chegasse à minha casa, devesse dar uma olhada nos textos que nem se quer o nome, ou o assunto, prestei a atenção.

  Peguei meu maiô preto, e minha toalha, fechando o armário em seguida. Caminhei lentamente ao vestiário feminino; minha mente vagava para lugares estranhos e subjetivos, imaginando, sem o meu controle, imagens de um possível futuro incerto.

  Pensei em minha mãe e em como andava solitária nos últimos anos; mantendo uma promessa inexistente de que cuidaria de mim primeiro. Somos tão parecidas neste aspecto. Apesar dela não saber esconder seus sentimentos muito bem. Eu via, e ainda vejo o que ela faz. Mas às vezes parecer forte não leva a nada.

  Disso eu sei muito bem. O vazio é uma parte quase dominante em meu coração. Já minha mente, ah, essa não. Sempre traçando uma carreira, um caminho subjetivo, juntamente com mais um alternativo; quase como um escritório cheio de armários, e todas as gavetas dos mesmos, abertas, as pastas, jogadas. Imagens, reais ou frutos da minha imaginação, indo e vindo livremente.

  Entrei no vestiário. Não era tão grande, mas também não era pequeno. Se não notasse na pintura começando a descascar, aqui e ali, era quase acolhedor. Olhei a frente, no espelho gigantesco que pegava quase toda a parede, meu reflexo. Parecia abatida; mas não minha expreção. Meus olhos se derramavam em tristeza, confusão e solidão. Tirei meus olhos dali antes que começasse a me perturbar com meu próprio reflexo. 

  Entrei em uma das cabines e me despi o mais rápido possível. Meio desajeitada, pisando aqui e ali em minha própria calça; tive todo o cuidado de dobrá-la corretamente para que não ameaçasse. Não me importei muito com as outras peças de roupa e logo coloquei meu maiô. Juntei tudo e levei comigo de volta onde ficava o espelho, logo na altura dos meus quadris havia uma pia que pegava toda a parede. Coloquei minhas coisas, incluindo meus tênis, apenas para soltar os cabelos. Coloquei tudo em meu armário, antes de trancá-lo novamente, peguei minha escova roxa e voltei ao espelho, sentindo o chão frio se chocando com o calor de meus pés. Era bom.

  Peguei minha escova que mais parecia algum tipo de espelho dos livros da Branca de Neve e passei levemente em meus fios; desatando os nós, tomei um cuidado extra desnecessário. A escova era magnífica a meu ver. Com as cerdas separadas por poucos centímetros, tinha o formato quadrado no alto; que levemente ia até o cabo com o final do mesmo em forma de bico. Quando se olhava ela com as cerdas para baixo, parecia realmente com um espelho de mão do livro da Branca de Neve. O contraste, com ela toda em roxo, era o que eu mais gostava. Apesar de roxo não ser minha cor favorita.

  Logo que terminei, peguei meu prendedor de cabelo que estava em cima da pia e fiz um coque alto o bastante para não se soltar.

  Caminhei de volta aos armários e guardei minha amada escova, com minha toalha no braço e me dirigi á piscina, esperaria a professora — que normalmente está atrasada — nos bancos ao lado da piscina.

  — Oi Kim. — Depois de longos minutos sentada, me recostando na parede, ouvi uma voz. Abri os olhos e Luke me observava, sentado a minha frente, sorrindo abertamente. Bocejei e pude ouvi-lo rir de leve.

  — Oi Luke.

  Olhei em volta e todos os 22 alunos, incluindo meu amigo e eu, estávamos esperando a professora. Perguntei-me quantos minutos haviam se passado, quando havia me sentado ali tinham apenas no máximo três pessoas conversando baixinho.

  E então percebi que Luke já havia se trocado e estava apenas com um short de malha largo, vermelho e branco, sem camisa. Peguei-me olhando de seus ombros, seus braços e tórax. E confessei a mim mesma que Luke era muito mais musculoso do que aparentava. Não era muito, mas dava-se para percebê-los. Como um rapaz que começou recentemente a fazer academia. Desviei meus olhos antes que literalmente começasse a babar que nem algumas meninas que estavam a uma distância razoável de nós. Sabia que se falasse sobre isso, elas não escutariam.

  — E então, você trouxe o balde?

  Perguntei sorrateira.

  — Balde? — Ele parecia-me confuso, sorri maliciosa.

  — É, para não começar a vazar a baba das suas admiradoras ali. — Apontei levemente com a cabeça.

  Seu sorriso se alargou mais ele me parecia indiferente; talvez não se importasse mesmo com as meninas incrivelmente bonitas o olhando maliciosas.

   — Vai ser sempre assim? Aonde eu for, por que...

   — Não se preocupe, com Zachary é pior. Se vocês andarem muito pelos corredores daqui, podem começar a construir uma nova arca. Por que inundaram a escola de baba.

  Luke fez uma careta e depois riu.

  — Qual é a graça senhor Campbell? — A voz da professora soou-se e todos pararam de conversar no mesmo segundo. O silêncio era quase insuportável.

  — Ne-nenhuma, desculpe-me professora.

  Vi Luke se sentar ao meu lado e sussurrar um “que susto que ela me deu”. Apertei meus lábios, um contra o outro, tentando controlar minha vontade de rir.

  No fim, acabamos jogando vôlei aquático. Meu time perdeu por dois pontos e Luke ficava rindo de mim, por ter sido colocado no time adversário ao meu.

  Caminhávamos de volta pra casa. Giovanna estava em nosso encalço, ela iria dormir na minha casa hoje, fiz uma nota mental para perguntar o por que. Mas ainda tinha tempo. Primeiro teria que fazer Luke parar de dizer que sempre foi bom nisso, sempre foi atlético e que ninguém o vencia, e blá blá blá.

  — Kimberlly, eu vou pra casa do Ryan, lá pela hora do jantar eu vou até sua casa, para dormir lá. Tudo bem, para você?

  — Claro, claro; só tenha cuidado. Não confio muito nesse Ryan Williams, ele é meio estranho. Mas isso só deve ser paranóia minha.

  Sorri pra ela enquanto a via se afastar, atravessando a rua.

  — Quem é Ryan Williams? — Olhei Luke, e seus olhos demonstravam confusão e preocupação. Dessa vez, não havia como tranquiliza-lo.

  — Ryan Williams, é o meu maior problema.


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Notas finais do capítulo

Começarei a escrever o cap 8 hoje, então, até depois.



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