Abro os olhos. O feixe de luz amarelada cai sobre mim, me assustando. Estou ajoelhada no chão, sentindo ser observada. Levanto o olhar a minha volta e percebo estar no centro de um palco, parada em frente a jaula de Ren. Solto um suspiro longo e abro a jaula. O motivo disso eu não sei, mas sinto que é o que devo fazer.

Retiro com cuidado o cadeado, deixando-o cair no chão com um estrépito. Mesmo livre, o tigre não se moveu. Estava com os olhos fechados e seu rosto apresentava uma expressão triste. Aproximo minha mão e quando estou perto de alcançá-lo, ele abre os olhos. Estão de um azul tão fraco que parecem cinzentos. Através deles, consigo ver tudo: tristeza, doença, aversão... Tudo de ruim que se pode imaginar. Tento acariciá-lo novamente, mas ele rosna e percebo que é melhor parar de incomodá-lo.

Olho para a platéia a minha volta, procurando por algum rosto conhecido. Não há nenhum. Não vejo Sr. Davis, Matt, Maurizio, Cathleen ou até mesmo Dhiren. São todos desconhecidos.

Quando desvio o olhar novamente para o tigre branco, percebo que ele caiu de lado, se apoiando em seu lado esquerdo. Seus olhos estão de um tom irreconhecível agora, entre um tom azul-claro e cinza-prateado, quase branco. O animal pisca ligeiramente e quando abre os olhos novamente, quase pulo de surpresa: estão dourados, exatamente como os de Kishan em meu sonho. O pelo ainda é branco, mas os olhos dourados, como uma fusão dos dois tigres.

Levanto-me em um salto, porém sinto algo me empurrando pelas costas. Caio no chão, consciente de todas as dores que preenchiam as partes de meu corpo que haviam batido contra o piso. Sento-me e olho para trás, procurando meu agressor.

De repente minha respiração se acelera, impedindo-me de pensar com coerência. Abaixo a cabeça na altura dos joelhos, inspirando profundamente enquanto aguardo meus pulmões se acalmarem. Não demorou muito, felizmente, porém quando retorno, sinto uma sensação de medo tomar conta de mim. Tento olhar para trás novamente, e me arrependo. Vejo corpos flutuando, agora sim, de pessoas conhecidas. Vejo meus pais, meus avôs e avós, todos os membros de minha família mortos, os corpos pairando há cerca de um metro do chão. Lágrimas surgiram em meus olhos mas eu continuo olhando. Sinto uma descer ao ver o Sr. Kadam, o homem mais inteligente que eu conhecia. Ao seu lado, encontro dois casais: o primeiro, um indiano com uma mulher com traços mais asiáticos. Rajaram e Deschen; o segundo, uma mulher mais jovem segurava a mão de um homem que eu conheço muito bem. Yesubai e Kishan.

Comecei a chorar como uma criança, não me importando com os olhares caídos sobre mim pesadamente. Contra minha vontade, continuo olhando. Outro arrependimento veio à tona quando percebi um tigre branco flutuando ao lado de Kishan, inerte. Desvio rapidamente o olhar para a jaula e percebo que Ren estava tão imóvel quanto uma estátua. Solto um longo arquejo de tristeza e sinto meus olhos incharem.

Me ajoelho em frente ao corpo do tigre, deixando as lágrimas descerem e caírem no chão e em minha blusa. Não me importo. Era um pesadelo no qual eu não podia acordar, recordo minhas próprias palavras. Olho para trás novamente e vejo que não há mais nada ali, apenas parte do público curioso. A expectativa cresce dentro de mim e eu sinto-me iludida ao perceber que nada mudou. Eles estão mortos, pensei comigo mesma. É isso.

Uma mão foi colocada sobre meu ombro e eu reagi com um choque. Viro o rosto a fim de ver quem era, mas o rosto estava embaçado, exceto pelos olhos.

Eu os reconheceria em qualquer lugar, afinal, aquelas órbitas negras estiveram muito presentes em meu sonho.