Guardiã do Rei escrita por Miss America


Capítulo 28
O Príncipe Morto?


Notas iniciais do capítulo

O título do cap, como sempre, não me agradou, mas saibam que ele tem uma duplicidade de sentido. Entre morrer morrido (avá) e morrer simbolicamente. Ah, sei lá, só fiquei sem ideia.
Sim, eu postando na terça! Surpresaaaa! ¬¬
É que terminei minha redação semanal e esse cap estava pela metade desde sábado, aí terminei ele.
Não vou dizer mais uma vez que não gostei dele, porque isso vocês já sabem.
Não sei o que se passa comigo, mas a fase-floresta tá sendo a mais difícil por enquanto.
Whatever, aproveitem :)
p.s.: desculpem tanta menção à comida, é que eu escrevi antes do jantar e tava com fome hauhauauaha



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I could dream more then, I could believe more then

That the world could only get better

I could be free more then, I could pretend more then

That this life could only show me good times

~ Once When I Was Little

.

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Annabeth puxou Percy com força e ambos desataram a correr.

Enquanto corriam, pulando galhos quebrados e tropeçando em pedras devido à escuridão da noite, Percy gritou para Annabeth:

– O que... estamos fazendo?

Ela respondeu-lhe sem tirar os olhos do caminho tortuoso.

– Estamos... correndo!

– De quem? – Percy insistiu, irritado.

Annabeth olhou por cima do ombro, procurando alguma coisa, e então desacelerou. Percy fez o mesmo. Ao longe, ouviam-se passos desajeitados e lentos.

Ela apoiou as mãos sobre os joelhos, respirando com dificuldade o ar gelado da noite.

– Me desculpe Percy – disse, para a surpresa do menino.

– Pode me dizer com calma, agora, por que estamos fugindo?

Annabeth mudou o peso do corpo de um pé para o outro, e então sussurrou sigilosamente.

– Inimigos, Percy. Inimigos dos meio-sangues.

Os olhos verdes do menino arregalaram-se.

– Soldados reais? – perguntou, pois não havia visto direito que os perseguia.

Ei, voltem aqui – a mesma voz confusa e tímida soou novamente.

– Não – respondeu Annabeth. – Sátiros.

Percy franziu o cenho, incrédulo.

– Está me falando daquelas criaturas bizarras que tem pernas de burro no lugar de pernas humanas?

– Bode – corrigiu Annabeth. – São pernas de bode, mas não se resume a isso. São uma raça mais perigosa do que aparentam.

O perseguidor pareceu tropeçar mais uma vez, pois uma árvore balançou bruscamente a alguns metros deles.

– Vamos – chamou ela, mas não correram. Esconderam-se atrás de um pequeno morro, de onde viam com perfeição o sátiro chamar-lhes em vão.

– Não me parecem muito assustadores – observou Percy.

Annabeth suspirou frustrada de onde estavam.

– São um povo rebelde, Percy – contou. – Rebelaram-se contra o Acampamento e contra Quíron há, pelo menos, uns quinze anos. Nunca foi muito bem explicado o motivo, mas cada um de nós tem uma teoria.

– E qual é a sua?

Ela deu de ombros.

– Creio que foi por causa de uma missão mandada por alguns deuses para seus filhos, e certos sátiros os acompanharam. Porém a missão terminou em morte, e o Conselho do Casco Fendido tomou a missão como uma armadilha. Irritados, os deuses disseram que sim, mesmo que não fosse verdade, apenas para extravasar a raiva. Alegaram que sátiros apenas atrapalhavam e chamavam atenção para os semideuses e provocam a morte deles.

– Então, brigaram – concluiu Percy. – Uma teoria muito boa.

Annabeth deu um risinho de satisfação.

– Sou filha da sabedoria – disse. – Não é fácil me enganar.

Ambos aguardaram por longos minutos, escondidos e em silêncio, o sátiro se aproximar.

– O que acha que ele vai fazer? – pediu Percy.

Ela sacudiu a cabeça, pensativa.

– Não sei – admitiu. – Mas temo um sequestro. Sátiros fazem isso com frequência. Usam-nos como arma de chantagem.

– E para onde nos levariam?

– Shhh, espere – ela acenou com a mão em urgência. Percy apurou os ouvidos, e ouviu o mato sendo pisoteado perto deles. A silhueta de uma criatura alta, desajeitada e com pequenos chifres salientes na cabeça apareceu pela primeira vez, e Percy temeu a aparência da criatura.

O sátiro, porém, parecia perdido e cansado, e quando falou, tinha uma voz chorosa como uma criança.

– Por favor, juro-lhes que não vou matar ninguém – disse. – Fui exilado, não vou sequestrar ninguém. Acreditem em mim, eu juro pelo deus Pã.

Percy e Annabeth entreolharam-se. Percy permanecia desconfiado, mas a expressão de Annabeth mudara. Agora ela parecia mais interessada do que assustada.

– Ele jurou por Pã – ela sussurrou.

– Quem é...

– Shhh – repetiu irritantemente.

Devagar, Annabeth levantou-se de onde se escondiam. Mandou Percy continuar agachado, o que lhe incomodava, afinal, estava sendo protegido por uma garota. Era ridículo para o rei que era, mas, se não a obedecesse, corria o risco de ser morto ali mesmo.

– Alto lá – falou Annabeth de forma alta e clara. Os passos do sátiro cessaram, e ele olhou para trás, na direção dela. – Quem está aí?

A criatura aproximou-se devagar, como se não acreditasse que alguém havia escutado seus pedidos.

– Boa noite, viajante – o sátiro disse educadamente. – De onde vens, e para onde vais? E que boas novas trazes consigo?

Annabeth escolheu bem as palavras antes de responder. Percy admirava a coragem dela.

– Venho de Floresta Fria e parto para a Cidade Real – bradou. – Devo chegar ao castelo em nome de meu senhor.

O sátiro pareceu ponderar o que ela havia dito.

– Perdoe-me, mas seu senhor mandou a pessoa errada em um momento errado.

Enquanto dizia isso, o sátiro chegou mais perto. Onde parou, a luz da lua o iluminava, e sua aparência não era aterrorizadora. Mais parecia um jovem como outro qualquer, um tanto magro, abatido e tímido.

Percy sentiu um arrepio quando o reino foi citado.

– E por que diz isso, meu caro? – perguntou Annabeth.

– Não sabes? – o sátiro pareceu surpreso. – O príncipe, que agora seria rei, está morto.

Foi como se Percy houvesse levado um soco no rosto, e a impressão foi tão forte que ele se sentiu tonto e enjoado. Morto? Era essa a ideia que todos tinham dele, agora? Era por isso então que Dern mandou que atirassem em Annabeth sem se preocupar com a vida dele?

E sua mãe? Como ela estaria reagindo? Só o fato de imaginá-la chorando e abraçando as roupas do filho guardadas em seu quarto partiu tão profundamente o coração de Percy que ele teve vontade de gritar e chorar. Mas era um homem feito, um Herói de uma dita antiga profecia, e sabia que, se voltasse atrás, estaria perdido¹.

Por isso, inspirou lentamente, sentindo as pernas bambas, mas tentando ouvir com firmeza o resto da conversa.

Annabeth também parecia estar em estado de choque, pois a demora dela em responder fez o sátiro preocupar-se.

– A senhorita não sabia? – perguntou outra vez. – Tudo bem, creio que compreendo. Faz pouco tempo que tudo aconteceu. Ele foi jogado do Pico Inglês durante sua coroação, foi algo realmente trágico. Era muito jovem.

– Você o c-conhecia? – a voz de Annabeth falhava.

– Não, não, apenas ouvíamos falar dele na aldeia... e só – ele pareceu vago demais. Annabeth deu um passo receoso para trás, fazendo o sátiro falar apressadamente: - Não, por favor, não tema. Não há mais ninguém comigo. Eu... eu fui exilado.

– Exilado?

– Exilado. Tive problemas com os Anciões e minha punição foi vagar pela floresta até que eles decidam que mereço perdão.

Havia tristeza e arrependimento carregados na voz do sátiro. Já não parecia mais uma ameaça, e até mesmo Percy sentiu pena dele. Sabia como era estar longe de casa.

– Sinto muito – respondeu-lhe Annabeth. As coisas já pareciam mais tranquilas, mas antes que Percy arriscasse se aproximar dos dois, o sátiro falou em um tom urgente.

– Senhorita, por favor, peço-lhe: não importa quais sejam suas ordens, não vá para o castelo. Desde a morte do príncipe Perseus, a guarda toda têm estado em alerta contra qualquer tipo de visitante. E eles não vão gostar de te encontrar – ele estreitou os olhos – não é, senhorita?

Percy arqueou as sobrancelhas. Ele poderia saber que eram semideuses?

Annabeth não pareceu surpreender-se como ele.

– Por favor – pediu ela. – Não diga a ninguém.

– Uma troca de confiança, tudo bem? – o sátiro propôs. – A vocês dois.

Ele apontou com a cabeça na direção do morro, onde Percy escondia-se logo atrás.

– Hã... Percy, venha – chamou Annabeth. Percy hesitou, até se erguer e caminhar desconfiado na direção da dupla.

Quando conseguiu focalizar melhor o sátiro, viu que ele tinha um rosto amigável e pequenos chifres nascendo no alto da cabeça, que era coberta por um cabelo cacheado e castanho. Percy cumprimentou-o com um aceno de cabeça, que foi retribuído da mesma forma.

O sátiro sorriu.

– Se me permitem, creio que estão fugindo do reino, e não tentando chegar até ele – disse.

Annabeth olhou preocupada para Percy, mas o menino estava impressionado pelo fato do sátiro não o reconhecer como o príncipe que era.

– Bem, não me apresentei – disse o dono dos pequenos chifres, para evitar o silêncio. – Meu nome é Grover Underwood. O seu, creio que seja Percy.

– O meu é Annabeth... Chase – respondeu Annabeth, um tanto incerta. - E ele é... hã, Percy... Grad – inventou ela, afinal, o príncipe era pra estar morto.

– Há quanto tempo vagam por essas bandas? – pediu Grover.

– Há quase três dias – respondeu novamente Annabeth, pois Percy ainda encarava calado o sátiro.

Grover assentiu.

– Comeram alguma coisa, desde então?

Percy e Annabeth se entreolharam. Em meio a tantas discussões e atalhos errados nas últimas horas, não comeram praticamente nada. Andavam distantes do curso do rio, para que pescassem; suas armas de bronze celestial não serviriam para a caça, e as árvores não estavam em tempo para frutas.

Pela primeira vez Percy percebeu que estava com fome. Muita fome.

Devido ao silêncio dos dois, Grover ofereceu-se:

– Posso ajudá-los a encontrar alguma coisa para comer- disse. – Apenas, não vamos caçar. Seria contra meus princípios. Mas acho que vocês devem lavar-se no rio e comer alguma coisa. Estão com umas caras péssimas... sem ofensa – sorriu.

Annabeth olhou para o próprio vestido, e Percy ficou observando-a murmurar alguma coisa para as roupas rasgadas e sujas. Seu cabelo loiro e cacheado estava meio molhado e meio seco, com todo tipo de folhas presas à ele e lama nas pontas. O rosto estava coberto de pó, e tinha os lábios rachados do frio. Estava cheia de hematomas e cortes profundos.

Percy imaginou que não deveria estar muito melhor. Não estava machucado como Annabeth, mas em compensação estava todo sujo de lama, mato e pior: agora estava molhado. Teria usado sua capacidade de secar-se assim que saiu do rio, mas Annabeth o puxou e então correram como loucos.

O frio da noite soprava um vento gelado, e o cansaço dominou a ambos. Mas Annabeth olhou para Percy com uma expressão que ele conhecia: de quando ela se esquece de si e pensa apenas nele e na missão:

– Agradecemos Grover – ela virou-se para o sátiro. – Mas temos que...

– Não – interrompeu Percy. – Grover tem razão. Estamos cansados, sujos e com fome – ele a encarou, enquanto dizia: - É claro que aceitamos a ajuda. Vamos nos alimentar, tudo bem?

Annabeth detestava que Percy a interrompesse, mas pareceu não querer insistir. Assentiu de leve, claramente exausta.

Grover mexeu em uma pequena bolsa que levava consigo e tirou de lá algo semelhante a um instrumento. Quando percebeu que Percy não conhecia o objeto, ele explicou:

– Uma flauta de bambu. Creio que poderei fazer as árvores darem algum fruto. Enquanto isso, vão se limpar. Estão da cor da terra.

Quando ele se afastou, Annabeth franziu o cenho para Percy:

– Minha vez de entrar no rio. E não sou filha do deus das águas, então mantenha distância – mandou, e caminhou um tanto corada na direção do rio gelado.

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– Reconhecer semideuses é uma habilidade dos sátiros – contou Grover para Percy. – Temos um olfato apurado, digamos assim.

Ele assentiu, e Annabeth torcia para que ficasse mais a vontade.

Estavam os três reunidos em volta de uma fogueira pequena, comendo algumas frutas – entre elas, romãs e pêssegos – que Grover conseguira fazer brotar das árvores com sua música². Tentavam esquentar as mãos em volta do fogo precário, e toda vez que uma rajada mais forte de vento batia, os três desesperavam-se para que o fogo não se apagasse.

Percy comia de uma forma desajeitada a fruta, e Annabeth observava-o brigar com as sementes da romã. Poderia ser uma cena cômica – um príncipe que não sabia comer sem talheres – se não fosse trágica. Ela entristeceu-se profundamente por ele e pensou em Sally, tão boa mulher, agora sofria pela possível morte do filho.

Subitamente, uma pontada dolorosa de culpa a invadiu, e ela mordeu sua fruta em uma tentativa de distrair os pensamentos.

– Cuidado ao comer demais – avisou Grover. – Já não comiam há dois dias, poderá fazer mal a um estômago vazio. Ah, e guardem um pouco para sua jornada. Precisarão no caminho.

– Não virá conosco? – perguntou Percy.

O sátiro balançou a cabeça tristemente.

– Sei para onde vão – respondeu. – Vão para o Acampamento Secreto, sem dúvidas. Não posso sequer me aproximar deste lugar. Seria morto no mesmo instante. Desculpem-me.

Annabeth arqueou a sobrancelha direita.

– Mas o que fez para um exílio tão severo?

Grover torceu os dedos, nervoso.

– O que estou fazendo agora – confessou. – Amizade com meio-sangues.

Percy olhou para Annabeth confuso, e ela encolheu os ombros, também em dúvida.

– Fui mandado com um grupo para sequestrar meio-sangues – contou Grover. – Mas não tive coragem. Encontrei uma menininha pequena, filha de Afrodite, e ela era encantadora. Senti-me culpado e deixei-a partir. Mas a menina contou de mim para Dioniso, e nosso grupo sofreu um ataque. Todos disseram que a culpa foi minha, e agora estou aqui. Tarãn – encerrou, com um sorriso amarelo.

– Deveria haver um modo de acabarmos com essa disputa – disse Annabeth. – É ridícula.

– Pode até ser ridícula, mas ainda corremos risco de vida – considerou Grover.

Como ninguém sabia responder aquilo, calaram-se por alguns segundos.

Percy mexia com um galho nas chamas, pensativo, quando disse:

– Sabe mais alguma coisa sobre o reino?

Grover pensou um pouco.

– Há rumores de que o rei, pai do príncipe morto, voltará a reinar – contou. – Uma série de ordens foram dadas para busca de semideuses, já que existem boatos que dizem que um meio-sangue o empurrou de lá. Existem outras histórias também, que dizem que o príncipe se suicidou, enquanto outros falam que o meio-sangue que o empurrou matou vários soldados usando poderes da mente.

Annabeth rolou os olhos diante de tamanha tolice.

– Mas, além disso – insistiu Percy. – A família dele, o Conselho Real.

Os olhos de Grover brilharam de repente, e ele estalou os dedos.

– Sim! A família dele... ouvi pessoas falando que a prima do príncipe tem tido visões, e o sacerdote do castelo aprisionou-a em uma das masmorras, dizendo que ela estava praticando bruxarias.

Annabeth engoliu em seco, lembrando-se de Rachel. Percy esmagou a romã com os dedos, cada vez mais furioso. Annabeth começou a preocupar-se com aquelas informações e o que poderiam provocar em Percy.

– Pessoas falam que a menina sonhou com o príncipe vivo e chorando sobre um túmulo. Parece que ela retratou a cena em um quadro, e em outra noite acordou o castelo por causa de um pesadelo envolvendo deuses gregos, e o príncipe estava no centro da briga. Então, ela foi obrigada a calar-se – ele mordeu o lábio inferior. – É tudo o que sei. Resumindo, o castelo está em caos, e não se sabe quem sucederá o trono, pois o rei está cada dia mais doente. Talvez casem a prima louca com alguém e...

– Basta – cortou Annabeth, então tentou corrigir-se. – Acho que... bem, já sabemos o importante. Não é, Percy?

Percy tinha os olhos vagos, presos às chamas pequenas da fogueira.

– Sim – ele sussurrou, então sacudiu a cabeça, como se despertasse de seus pensamentos. – Obrigado Grover, obrigado.

O sátiro assentiu levantando-se do chão.

– Se me dão licença, irei dormir – disse. – Talvez eu ainda esteja aqui pela manhã. Tenham uma boa noite – sorriu, e caminhou por vários metros, até sair do campo de visão de Annabeth.

A fogueira continuava a estralar algumas pequenas brasas. Percy arrumou-se na terra, um tanto desconfortável, e então soltou o galho que estava segurando para cutucar o fogo.

– Sinto muito por seu reino – falou Annabeth, bastante contrariada, afinal, ela salvara a vida dele.

Percy ergueu-lhe olhos verdes e vivos.

– Sou um Herói, você disse. Eu vou voltar. Vou salvar meu reino – prometeu.

Annabeth não pôde deixar de se surpreender com a atitude do menino. Sabia que ele era teimoso e orgulhoso até demais, mas a força com que dissera aquelas palavras reconfortou o coração pesado de Annabeth.

Ficaram em silêncio por longos minutos, enquanto Percy aparentava um profundo estado de reflexão. Foram informações demais de uma só vez, e deveria estar doendo nele.

Então, ele voltou a falar:

– Agora muita coisa faz sentido – disse.

Annabeth não soube se era para ele mesmo ou para ela.

– Porque Fritz não gostava de mim – continuou ele, no mesmo tom introspectivo. – Porque papai queria que eu governasse. Porque... o porquê de tantas coisas.

– Nós vamos chegar ao Acampamento – afirmou Annabeth, batendo com o punho cerrado sobre sua perna. – Falta pouco, eu prometo.

Percy franziu as sobrancelhas.

– Annabeth... – começou, com um ar duvidoso. – Rachel sonhou... comigo, sobre um túmulo – as palavras custaram a sair. – O que... o que poderia significar?

Annabeth não sabia responder.

– Rachel tem um dom, Percy – ela gaguejou. – O que ela vê pode significar várias coisas...

– Será que era o túmulo de meu pai? – ele pediu em tom de desespero, com olhos marejados, referindo-se a Paul.

– É claro que não – Annabeth tentou impedir que ele ficasse vulnerável, mas acabou sendo ríspida demais. Sentiu-se culpada no mesmo momento.

Percy abaixou a cabeça.

– Você está certa – disse. – Pode significar... outras coisas.

Annabeth sabia que o sonho de Rachel incomodaria Percy. Sem dúvida, assombraria a ela também, pois, de qualquer forma, o túmulo remete à morte. Morte de quem? Ou de quê? Seria algo tão grave que levou Rachel a não esconder o quadro, como fazia com os outros?

Então, ela pensou em um modo de acalmar Percy.

– Todas as crianças no Acampamento – começou com a voz levemente embargada, e Percy prestou atenção nela – sofrem com a família. Somos abandonados pelos pais divinos e pelos mortais. Vivemos sozinhos, e isso de certa forma é necessário. Aprendemos a valorizar o que temos e a lutar por isso, nem que seja apenas por nós mesmos... – ela interrompeu-se. – Percy, saiba que todos nós morremos. O importante é quem continua vivo, não quem parte. Ame seu pai mortal e chore por ele quando ele morrer, mas não deixe que isso o atrapalhe. Siga... em frente.

Percy lhe encarava como se Annabeth houvesse dado um sermão ou algo do tipo. Então ele suspirou.

– Já amou alguém, Annabeth? De verdade?

Ela não esperava pela pergunta.

– Bem, amo meus amigos, minha mãe.

– Digo, de verdade – ele insistiu. – Alguém que fizesse diferença na sua vida. Seu pai mortal?

Annabeth virou o rosto.

– Não fale nele – respondeu secamente, fazendo Percy calar-se.

– Bem... acho que você entendeu – ele disse, receoso de dizer algo errado.

Annabeth tentou parecer um pouco mais calma.

– Sim, entendi – confirmou. – Alguém de carne e osso, que pode morrer a qualquer momento. Só para você perceber que eu também sinto a mesma coisa, certo?

Percy assentiu. Annabeth encolheu os ombros. Então, com uma súbita conclusão, percebeu que sempre estivera sozinha. Podia amar o Acampamento, amar os amigos e a amar a Quíron, mas era incapaz de amar alguém do modo como Percy se referia.

Frustrada, ela balançou a cabeça.

– Não. – murmurou. – Nunca senti o mesmo que você. Me... me desculpe.

Percy pareceu desapontado.

– Talvez algum dia, ame – disse ele, tentando diminuir a tensão que o silêncio de Annabeth deixou.

– Tomara que não. – ela se viu dizendo repentinamente.

O menino ergueu as sobrancelhas.

– Por quê?

Annabeth tinha começado uma linha de lógica interna e trágica. Uniu pontos e ligou fatos perdidos, encontrando um fim terrível, mas não quis compartilhar com Percy e deixá-lo ainda mais triste.

Ela piscou os olhos algumas vezes, antes de perguntar:

– Você teria coragem de machucar alguém que ama?

Percy surpreendeu-se.

– Não, é lógico que não. – respondeu prontamente, da maneira que Annabeth esperava. – Minha mãe sempre disse que quando amamos, não machucamos as pessoas. O amor não deve ferir.

Annabeth continuou fitando-o sem que Percy entendesse, até que seu olhar se clareou. Ele abriu a boca para dizer alguma coisa, mas continuou calado.

– Eu sei – disse Annabeth. – E é por isso que acho que jamais vou amar alguém.

– Annabeth, não é assim – a voz de Percy aumentara de volume. – Você não pode simplesmente...

– Boa noite Percy – ela disse, se levantando do chão. – Não chegue perto de onde eu estiver dormindo.

– Espere, Annabeth! – chamou ele, mas ela continuou se afastando, sabendo que não queria continuar a conversa.

– Vá dormir, Percy – ela gritou de volta.

Podia ouvi-lo chamar às suas costas.

– Annabeth! – gritou mais uma vez. – Nós vamos ficar bem, nós vamos vencer a guerra, vamos salvar o Acampamento, nós vamos...

– Boa noite, Percy.

– Mas...

– Boa noite.


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Notas finais do capítulo

¹Referência à Daenerys Targaryen, de As Crônicas de Gelo e Fogo, porque eu simplesmente amo essa personagem e toda a força que ela tem de seguir em frente. A frase, na íntegra, é assim: "Se eu olhar para trás, estou perdida."
²Sátiros podem fazer frutas nascerem?
.
Eu, pessoalmente, achei o cap um pouco enrolado. É que, inicialmente, ele era diferente, mas eu (como sempre) alterei pequenas coisas e ele mudou por completo. Vocês verão no próxim cap como este daqui era pra ser, pelo menos em partes.
Sim, a Annie foi bastante vaga no fim. Tem gente apostando nos reviews que ela morre! Ai credo, depois eu que sou malvada x.x É claro, eu não vou explicar o que acontece, mas vou deixar pistas. Esse diálogo no fim? Saiba que ele tem mais importância do que aparenta. Ele representa, talvez, o esqueleto de toda a história. Com o tempo vocês vão perceber isso.
Bisous!