Pânico. Pânico era a única coisa que eu sentia. Ok, talvez eu tenha tirado conclusões precipitadas, mas depois de tudo que vivi, acho que você também tiraria.

Tremendo, abri a porta lentamente. Já estava escuro, o som das corujas alto, tomando conta de praticamente tudo. A chaleira da Dona Maria gritava, avisando que o café estava pronto.

Pisei na grama lentamente, como se tudo pudesse explodir a qualquer momento. Talvez pudesse. Nutella começou a latir.

-SHHH – fiz um sinal com o dedo.

Ela ganiu.

Continuei andando, muito lentamente, como se estivesse com medo de acordar alguém ou...

Eu estava com medo.

Algo mexeu na árvore, que estava a alguns metros de mim, e por um momento, as corujas se calaram.

A chaleira de Dona Maria me assustou, as corujas, o fato de eu nunca mais ver minha irmã, tudo me assustou e eu comecei a correr, descontroladamente, até tropeçar em uma pedra. ARGH. Ia me levantar, lentamente, até que reparei que meu corpo estava pesado. Eu não conseguia... Como o garoto do meu sonho. A água do lago estava gelada, rígida.

Aquilo era água?

Ali, eu conclui que eu iria morrer. Que aquilo nunca tinha sido um pesadelo, mas simplesmente um aviso da realidade. E a única coisa que eu podia fazer era esperar.

Esperar para definhar até a morte.

Sem a Cassy.

Sem meu pai.

Sem ninguém, só a chaleira da Dona Maria, e aquela maldita pedra.

Por um momento, eu tentei nadar para a superfície. Mas isso não surgiu efeito, apenas saíram bolhas da minha boca.

Até que eu olhei para o lado e conclui que aquilo era pior do que tudo. Pior que o garoto do meu sonho, pior que o latido de Nutella às 4 da manhã, pior que a própria morte, pior que aquilo que eu julgava ser o insuportável.

Cassy estava ali. Inconsciente, com os olhos fechados, e uma gota estava caindo sobre seus pequenos pés. Um vestido branco, de seda, e uma tiara na cabeça. Esbugalhei meus olhos e comecei a tentar ir para a superfície, para berrar por ajuda, procurar por primeiros socorros, qualquer coisa. Cassy não podia morrer. De novo não. Segurei sua mão. Cassy estava pálida e gélida. A pequena gota percorreu seus dedos. Segurei sua mão com mais força. Com o outro braço livre, tentei nadar até a superfície. Ar.

Como eu estava conseguindo ficar tanto tempo sem respirar?

Mas parecia que havia um bloqueio. Algo que me impedisse. E agora voltamos para a situação inicial: só que agora eu tenho que cuidar da minha irmã, de 8 anos, morta.

Relaxei o corpo. Eu ia ficar ali por um bom tempo, até morrer. Pelo menos Cassy estaria ao meu lado. 5 minutos se passaram. Eu estava de olhos fechados, esperando. Até que ouvi um grito. Me virei rapidamente para Cassy. Seus olhos estavam abertos, esbugalhados. Pulei, até que bati a cabeça na ponta do lago. Como assim Cassy havia revivido? Abri um sorriso. Só que de repente, eu lembrei novamente que estávamos em um lago, à beira da morte. AH é.

Cassy começou a se mexer, freneticamente. Em pânico. Como se ela estivesse tentando me afogar. Que ótimo.

Agora seria minha própria irmã a me matar. Que final feliz para uma garota como eu.

Mas ali que eu realmente percebi que final feliz não existe. Nem nunca existiu. É tudo uma ilusão de conto de fadas. Nem príncipes, nem castelos, nem abóboras que andam, nem bailes perfeitos com vestidos perfeitos, nem uma princesa que revivesse com um beijo. Nem uma pessoa que revivesse com um beijo.

Não, eu nunca cheguei a acreditar nisso.

Mas nos meus sonhos isso era real.

E agora, eu estava presa em um pesadelo.

Que ironia.

Agora o ar começou a fazer falta. Desespero. Da minha boca e do meu nariz, só saiam bolhas. Tentei chamar Cassy. Mas ela não me ouvia. Seu instinto assassino, sua curiosidade, ou o que quer que fosse, falavam mais alto. E assim eu fechei os olhos, as bolhas sumindo lentamente pela água gelada.

E alguma coisa pesada e escura fez sombra sobre nós, mas eu me recusei a abrir o olho.

Até que eu desmaiei.