Transtorno De Boderline escrita por Liz03


Capítulo 16
Síndrome de Asperger


Notas iniciais do capítulo

Eu ando escrevendo bastante para aproveitar enquanto estou de férias, mas enfim vamos ver como esse capítulo ficou.

Depois dos asteriscos quem quiser pode colocar The Only Exception do Paramore para tocar :)

Bem, vamos aos fatos.



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Síndrome de Aspergeré um transtorno do espectroautista, diferenciando-se do autismo clássico por apresentar fala compreensível. A validade do diagnóstico de SA como condição distinta do autismo é incerta, tendo sido aprovada a sua eliminação do "Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais" (DSM), sendo fundida com o autismo.

OK, agora eu quem estava querendo desistir de ir a essa visita. Mas ele usou os meus argumentos para resistir. O feitiço virou contra o feiticeiro, de modo que, chegamos a casa por volta de 16:30 p.m do sábado. Era um condomínio fechado de super casas de revista e a da família Campani não deixava arquiteto nenhum decepcionado. Fomos recebidos por uma senhora com seus cinquenta e tantos anos, mas que parecia mais velha pelas rugas que se juntavam no canto de seus olhos. Ela falou com Vitor com certa intimidade, colocou a mão em seu peito e sussurrou quase que para ela mesma.

- Menino...- disse e então Vitor me apresentou. Ela mostrou um sorriso que transmitia alívio e um pouco de seriedade. Foi avisar ao senhor Alberto Campani que as visitas haviam chegado.

Ele nos recebeu no jardim numa sala onde estava servido um chá. O cumprimento dos dois foi restrito a um aceno discreto de cabeça. Vitor estava calado de uma maneira atípico, resou a mim a tarefa de falar primeiro.

- Boa tarde senhor Alberto – estendi a mão .

- Boa tarde doutora Pan – ele respondeu num tom que refletia polidez e distância.

Comi logo alguns biscoitos porque estava ficando nervosa e nervosismo me dá fome. Vitor bebeu o chá e cruzou os dedos da mão, quando como estava esperando uma resposta.

- Muito bem, fico feliz que você tenha vindo aqui Vitor – disse no mesmo tom educado de antes – Tenho uma proposta a lhe fazer – limpou a boca com o guardanapo de pano- Eu me preocupo com você e pensei em lhe oferecer um emprego na empresa. Antes que você reclame dizendo que não se interessa – ele falou antecipando-se aos comentários do filho- o trabalho seria na fundação beneficente que a empresa financia. Pensei em vários cargos para você, desde coordenador geral até professor de artes,fica a seu critério.

- Não quero – foi o que ele respondeu seco, eu até me engasguei um pouco com o chá.

- Ora Vitor! Eu estou aqui em missão de paz, está bem? Se algo acontecer com você eu não vou me perdoar...

- Agora sim! Claro, claro – Vitor inclinou o corpo mais para frente e depois recuou batendo palmas – Você está preocupado com sua culpa não é papai? Vai se sentir chateado se eu morrer igualzinho a ela não é? Isso vai atrapalhar seu chá...com toda certeza.

O homem ficou em vários tons de vermelho, estreitou os lábios e eu juro que achei que ele iria explodir. Fiquei um tanto histérica porque não sabia se devia falar, se devia sair dali ou algo do tipo. Apenas comi mais três biscoitos.

- Isso não tem nada a ver com ela – ele disse agora de um modo menos educado.

- Tem tudo a ver com ela, e você sabe disso, papaizinho – olhei para Vitor e vi que ele fazia um sorriso cínico. Como se alguém sorrisse antes de vomitar. Fiquei mais aflita, mais biscoitos.

A conversa continuou mais ou menos nesse nível saudável de amor de pai para filho. Até que uma mulher se aproximou de nós, nitidamente ela não era uma empregada casa. Usava um vestido preto com partes de renda, sapatos chiques, eu devia parecer uma mendiga maltrapilha perto dela. Naquele instante em que eu a vi a detestei. Sim, confesso que tenho preconceito com mulheres que parecem retiradas de uma passarela, ainda mais se for loira. E ela era absolutamente loira, de olhos completamente azuis e rosto perfeitamente maquiado. Imaginei que deveria ser um tipo de assistente especial ou secretária de confiança.

- Tudo bem, meu amor? – ela passou a mão pelo ombro de Alberto Campani e eu quase cai da cadeira. Meu amor? Ela é mais nova que eu! Cruzes!

Ele demorou a responder. Respirou profundamente – Priscila – e pôs a mão sobre a dela que ainda estava em seu ombro – Vitor e sua nova namoradinha Pan vieram nos fazer uma visita – Namoradinha? Namoradinha? Namoradinha é o que ela é sua meu senhor.

- Vitor! – disse num sorriso jovial e superficialmente contente, caminhou para poder cumprimentá-lo, mas como ele não se levantou apenas um aceno foi dado – e você...Pan, não é? Prazer em conhecê-la.

Eu não tive coragem de não me levantar, então nos cumprimentamos com beijinhos no ar que nem encostavam nas bochechas. Ela usava um perfume floral, que para variar eu não gostei.

- Então, Vitor, estou lhe oferecendo uma chance de trabalhar, de se sustentar e não ficar dependente das pessoas – disso o homem por fim e completou a fala olhando para onde eu estava como se ao dizer ‘pessoas’ fizesse referência a mim.

- O Vitor não depende de mim – foi o que consegui responder de forma rápida.

E ele ficou alguns segundos com uma cara de indignação no rosto até que se inclinou na cadeira de novo – Eu não dependo dela – como se eu não tivesse acabado de dizer – Eu tenho o dinheiro que a minha mãe deixou para mim...

- Esse dinheiro não vai durar para sempre, e você precisa de tratamento.

- ....e eu preferiria depender dela ou de qualquer um a precisar de um centavo do seu dinheiro – ele colocou uma das mãos na mesa, por um momento fiquei com medo que se levantasse e desse um murro no homem do outro lado da mesa. Eu nunca vira Vitor tão alterado – Eu preferiria morrer sem porcaria de tratamento nenhum!

- Ah deixe de falar tolices! Não estou lhe dando nada, você tem direitos como meu filho.

- Não se preocupe em me dar esmolas, e mesmo que você jogue a porcaria de uma moeda, eu não vou estender a porcaria da minha mão para pegar – ele apenas se levantou, e eu fiquei ali com um biscoito mordido – Vamos Pan – fiz acenos de cabeça para o senhor Alberto e para Priscila e sai derrubando minha bolsa e farelos de biscoito.

Ele fechou a porta do carro e foi o caminho inteiro em silêncio. Quando estacionei na garagem do meu prédio ficamos os dois dentro do carro olhando para frente.

- Página virada – disse e olhou para mim aparentando estar exausto.

- Não, não. Página arrancada isso sim, era para virar com gentileza, sabia?

- Achei melhor assim, não quero que alguém leia isso no livro da minha vida – ele olhou para o outro lado, o maxilar estava tensionado, percebi então que além de cansado ele parecia triste, mas voltou a olhar para mim e pôs a mão delicadamente em minha coxa – só quero agora escrever capítulos com você. De preferência contos eróticos

Sorri antes de me aproximar e beijá-lo. Ele retribuiu o beijo e já estava ficando mais animado, quando parei de prestar atenção na boca dele por um instante. Espera ai...

- Vitor...- tentei afastá-lo- Vitor...espera...- afastei-o com os braços.

- Vamos escrever Pan- disse rindo e tentando se aproximar, mas coloquei o braço de novo entre nós – O que foi?

A boca dele estava mais quente do que de costume- Espera...- encostei a mão no pescoço e na testa dele. Febre. – Vitor, você está com febre. Nós vamos para o hospital – voltei a ligar o carro.

- Não precisa, você cuida de mim aqui mesmo.

- Não. Isso não é brincadeira, Vitor. A febre é só um alerta do corpo precisamos investigar a causa. – dirigi até o hospital com uma preocupação médica e uma angustia de quem gostava muito do paciente.

***

MONA

Quando eu vi que ele estava lá no bar de novo soube que não era para afogar as mágoas. Conversava sorridente com o Dodô, o cara do balcão, e me perguntei se deveria apenas ignorá-lo e fingir que não o vi ali ou se seria melhor ir até lá logo e ver o que ele queria. Mas não precisei ficar debatendo comigo mesma por muito tempo.

- Oi – disse cutucando meu ombro enquanto eu servia a mesa 6.

- Oi – falei depois de colocar uma porção de batatas fritas para os clientes.

- Tudo bem? – ele sorriu com as mãos nos bolsos.

- Unhum. E contigo?

- Também – olhou para Dodô no balcão que fez um sinal de ok para ele, silenciosamente mostrei meu dedo médio para meu amigo balconista- Eu estive pensando se você não gostaria de tomar um café ou um chá depois que terminar seu turno hoje – bem, certamente ele já sabia que meu turno terminava mais cedo, e na verdade, um café não seria nada mau, mas o problema era ele .

- Hum... – foi a minha resposta.

- Ah...ah, você já tem compromisso...tudo bem, eu...pode ser outro dia...- já percebi que ele gagueja um pouco quando começa a ficar nervoso.

Eu já estava com a resposta na ponta da língua. “Olha cara, é o seguinte. Você é maneiro, mó gente fina mesmo. O sanduíche de bacon estava ótimo, mas não foi um encontro e não estou interessada em um, ok?” . Mas quando olhei para o modo como ele mordia o lábio, uma maneira nervosa, lembrei de como foi divertido a conversa naquele dia e, embora eu realmente não quisesse encontro nenhum, também não queria ser rude com ele.

- Não quero um encontro – comecei a dizer e vi algo nele murchar – Mas se você quiser apenas, somente, restritamente tomar um café e jogar conversa fora...

- Sim – disse antes que eu completasse- OK, vou esperar aqui mesmo – apontou para a mesa 8 e sentou-se antes que eu pudesse acrescentar ênfase às minhas condições.

- OK, ainda tenho mais meia hora aqui – fui buscar mais um porção de batata frita para outra mesa, olhei para trás na caminhada e ele estava tamborilando com os dedos na mesa e sorrindo.

No momento em que vi aquele sorriso de animação, soube que tinha feito mal em ter aceito o convite. Contudo, devo admitir que Bernardo seguiu todas as condições sem protestar ou tentar trapacear. Acho que ele só queria alguém com quem conversar, uma pessoa que não soubesse ao certo a história da vida dele e por isso não se importasse tanto. Devo reconhecer que, acima de tudo, ele era uma companhia agradável.

- Acho que todo mundo tem seu dia de pequeno príncipe em conflito com as pessoas grandes- falei lembrando do livro que li há apenas algumas semanas atrás.

- Eu acho que todos têm seu dia de raposa em relação ao pequeno príncipe – disse depois de um sorriso de compreensão.

- Hum...interessante perspectiva, você acha a humanidade carente? – digo lembrando da raposa que queria ser cativada.

- Um pouco...mas seria injusto chamar a raposa de carente e pronto. Ela era muito mais que isso, porque ela só queria formar laços, mesmo sabendo que seriam rompidos um dia, ela queria ter lembranças. Algo para se apoiar nos dias difíceis. – ele pegou o creme que nadava no café com uma colher- Mas você chamou a raposa de carente, isso deve dizer muito sobre você.

Levanto os olhos e vejo que o comentário foi despretensioso – Claro, fui eu quem disse que a raposa quer atenção do príncipe mesmo sabendo que ele vai dar um fora nela – dizendo isso percebo que ele vacila um pouco com os olhos. Então foi isso, penso comigo mesma. Diagnóstico encontrado. Ele era a raposa e algum pequeno príncipe veio, o cativou e depois se foi, provavelmente, porque precisava cuida da sua flor.

- Acho que você está sendo maldosa com a raposa, uma predisposição a ser injusta com ela – diz enquanto eu ainda estou descrevendo minha conclusão mentalmente.

Continuamos a conversar por mais algum tempo, ele me ofereceu carona e, como já era um pouco tarde para pegar um ônibus, aceitei. A pensão guardava apenas uma luz acesa, que deveria ser do Sr.Casto – o escritor falido- lendo e relendo os mesmos livros de sempre (ele sofria de insônia então era comum passar noites em claro).

- Obrigado por ter aceitado tomar o café – ele diz quando estaciona o carro próxima ao meio fio.

- Não por isso – tiro o sinto de segurança. Passamos uns bons 25 segundos nos encarando – Bernardo, eu já tenho o resultado da consulta de hoje, você gostaria de ouvir? – como ele concorda prossigo – Você é a raposa do Exupéry.

OK, eu sou uma pessoa com problemas de relacionamento com o mundo.Parte graças ao que alguns vão chamar de Asperger, mas também parte pelo que você pode entender como: dificuldade de entender e/ou partilhar de costumes e/ou exigências da sociedade. Já entendi o manual de instruções e sei que pessoas como eu estão fadadas a uma vida  sem muitas emoções ou intereções, então tento sobreviver e conviver da melhor forma possível. Não sou boa em , como diria a raposa,“criar laços”, mas acho que acabei de criar um laço com a própria raposa amiga do pequeno príncipe. Que não vai dar certo, como sempre, eu sei. Contudo, resolvi que vale a pena assistir o filme. Tomada 1/ Cena do carro/ Garota de classificação problemática encontra raposa que precisa de laços/ Luz (só a do quarto do Sr. Castro no momento)/Silêncio no estúdio (dois gatos brigam e/ou acasalam –difícil saber- em algum lugar da rua) / Câmera (acho que fechei os olhos um pouco, então perdemos a câmera 1, senhores) / Ação.

E assim foi a cena do beijo com a raposa. 

Precisei procurar o livro debaixo das roupas sujas que eu, de maneira organizada, empilho na cadeira do quarto. E quando encontro sei exatamente que parte quero.

"(...) Tu procuras galinhas?
- Não – disse o príncipe. – Eu procuro amigos. Que quer dizer “cativar”?
- É algo quase sempre esquecido – disse a raposa. – Significa “criar laços”...
- Criar laços?
- Exatamente – disse a raposa. – Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu também não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo... (...)".


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Notas finais do capítulo

OK, não sei se gostei muito desse. Mas me digam vocês, como foi? :)



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