Exit escrita por Relinked


Capítulo 10
Capítulo 9


Notas iniciais do capítulo

Obrigado, bio, pelo stress altamente bem feito da melanie
E obrigado, défi, pelo ânimo =3



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Uma sapa verde que não parecia bem uma sapa, e que era conhecida por Dayse, caminhava de maneira decidida por entre corredores de algo que parecia ser um edifício não muito velho, mas aristocrático ainda assim. Passando por quadros, esculturas e mesas com vasos antigos, a sapa resmungava, sem olhar para nenhum desses artefatos, enquanto os pensamentos a mil sobrepunham-se a qualquer outro sentido que ela ainda possuísse. Estava decidida que não perderia para a baixinha vigarista que andava salgando lagos, e que, por mais que o exército dela fosse pelo menos seis vezes maior, ela os quebraria em pedacinhos, cada uma daquelas bolachas-do-mar que com sua arrogância se achavam bonitas o bastante para dominar o mundo aquático. Sair carregada por peixes em meio a um lugar totalmente seco era arrogância de mais, e Dayse estava disposta a jogar sujo. Sujo, no sentido literal.

Enquanto passavam montes e montes de artefatos por Dayse, sem que ela reparasse, Yuri observava-os calmamente enquanto era carregada por outro corredor aristocrático, sobre uma bóia que parecia uma grande banana amarela e não parecia realmente confortável, todavia a cara de satisfação de Yuri pudesse desmentir essa impressão. Mas a cara de satisfação de Yuri não era pelo fato de estar sentada sobre uma grande bóia em forma de banana amarela nada confortável, e sim devido ao acontecimento que viria a seguir. Precisava apenas liquidar um ser chorão, que ela nunca vira antes, mas que, pela descrição, ela supunha ser fácil de encontrar. Um grande cara usando smoking e cartola brancos, carregando uma tesoura e um travesseiro, além de uma franja sobre um olho. Era só reunir seu exército de seres brancos e outros peixes que estavam em treinamento com as bombas internas das guelras, que permitiam a eles respirar fora d’água, e assim venceria qualquer exércitosinho verde ridículo que a outra poderia preparar.

E enquanto ambas pensavam nos seus exércitos, observando ou não artefatos aristocráticos e belos pendurados em paredes ou sobre mesas em corredores distintos, Raphael partia por um corredor estreito, sem muita iluminação e nenhuma decoração, com paredes cinzentas e chão de lajotas. Andava apressadamente, com o guarda-chuvas preto balançando sob o braço, e a cartola ligeiramente torta para dar um tom de movimento. Tudo minimamente planejado, executado e como ele queria. Raphael não estava sorrindo, todavia sentia-se bem mais satisfeito do que Dayse e até mesmo mais que Yuri, enquanto pensava nos próximos passos à serem executados por si mesmo. Alcançou, então, uma porta no fim do corredor escuro, com travas práticas do tipo que se vê em portas de saída de emergência. Via-se essas travas práticas pois essa era justamente uma porta de saída de emergência, e o que denotava tal característica não eram as travas práticas, e sim a placa brilhante onde podia-se ler “EMERGENCY EXIT” escrito em letras garrafais verdes.

Abriu-as e viu-se imediatamente atrás do grande edifício amarelo onde havia ocorrido o leilão que culminara de maneira perfeita, podendo então sair pelo portão dos fundos da grade que cercava algo que parecia ser um jardim. Chegar à Vernicomidas seria rápido, contanto que não tivesse problemas terríveis, como, por exemplo, pisar em dejetos fecais de algum animal bem grande de pelúcia ou ser atacado pelo mesmo. Todavia, foi exatamente isso que aconteceu, mas não nessa ordem.

O banheiro parecia incrivelmente colorido agora, com diversos tons de vermelho enquanto o sangue escorria no piso imaculadamente branco, e Kellyn observava em silêncio um desmaiado Erick com uma cara aflita. Takeso estava agora sentado na privada, a dor do nariz quebrado entorpecendo parte da sua visão, enquanto o ódio por ter sido estapeado por Kellyn crescia. Não ia deixar barato, já cansara de apanhar daquela garota que mais parecia um moleque, sem nunca poder revidar por óbvios costumes estabelecidos desde quando era criança. Mas ali, não ia ser punido e muito possivelmente ninguém olharia torto pra ele, se caso desse um bom bofetão na garota desprevenida que olhava morbidamente para o corpo caído de Erick, com algumas lágrimas presas em seus olhos resistindo à tentação de rolar pelo rosto. Takeso levantou-se, foi até ela e, com um único ímpeto de vontade, ergueu a mão e se agarrou ao cano no teto, que aparentemente não estava ali antes. Com um único puxão, arrancou-o e com isso fez jorrar litros de água em Erick, Rod, mas principalmente em Kellyn, que passou do estado seco para o estado absurdamente molhado em cerca de segundos. Aparentemente, a água possuía algum efeito para acordar pessoa que estavam desmaiadas, por Erick e Rod, levantaram-se de súbito, e olharam para Kellyn que estava com uma cara que remetia a uma pessoa que havia acabado de ser jogada sob uma tsunami. Pingando, todos os três, ainda meio ofegantes olharam para Takeso que estava com um enorme sorriso na cara, a dor no nariz passando pouco à pouco, agora com o cano na mão de uma maneira que prometia ser agressiva com a primeira lufada de ar que resolvesse balançar sua roupa (e, exatamente por isso, nenhuma lufada de ar atreveu-se à realizar tal ato).

- Vamos atrás do que quer que seja. – disse ele, decidido, enquanto batia o cano na palma da mão direita, segurando o mesmo com a esquerda – Já cansei desse banheiro.

Logo depois ele caiu no chão quando foi atacado pelos três seres humanos ensopados que se encontravam no chão.

Enquanto Alec dormia, um pouco torto no chão estofado da caverna, Melanie articulava furiosamente uma maneira de contornar a situação. Começou, então, a falar coisas bem alto, talvez para que Alec ouvisse.

- Bem legal acabar tendo que acompanhar um perdedor que nem sequer consegue controlar poderes dados de graça corretamente. – sua voz parecia irritada – Pobre garotinho, com dores na perna, sem conseguir fazer o que deve fazer direito. – acrescentou, com uma voz infantil – É deplorável.

Alec ouviu tudo, já que o volume na caverna era incrivelmente alto graças à acústica do lugar. Continuou deitado, imóvel.

- E nem adianta mais me preocupar com o resto do mundo, que continua em preto e branco. Que continua precisando desse garotinho que não faz nada direito.

Alec abriu os olhos, mas Melanie estava de costas pra ele. Ela continuou seu monólogo, alto:

-Ai, ai... Realmente, não adianta continuar viagem com um aborto da natureza desses do meu lado. Pelo jeito eu vou ter que ir sozinha mesmo. – continuou - Tudo bem, andar com esse moleque do meu lado é a mesma coisa que carregar um saco de lixo... Não é útil em nada e ainda fede.

Alec continuou a ignorá-la, embora seu cérebro começasse a achar que nem tudo que ela estava dizendo era verdade. Fechou os punhos.

- Claro, eu podia ter feito tudo isso sozinha. – Melanie continuava no seu tom irritado - era só encontrar mais um trouxa mimado com poderes esquisitos que eu conseguiria colorir essa terra do mesmo jeito. Mas não, - suspirou - eu tinha JUSTAMENTE que achar esse guri com cara de "Mamãe, eu sou cuticuti frufru" e resolver pegar ele mesmo. Eu e minha má sorte na hora das escolhas.

Alec sentiu o ódio crescer gradativamente enquanto ouvia Melanie reclamar. Queria, de alguma forma, bater naquela garota ou algo do tipo. Espancá-la parecia uma boa opção.

- O que dizer mais? Ele é um lixo. Um lixo tóxico reciclável. – fez uma pausa curta, e acrescentou – Digo, lixo tóxico apenas, pois nem reciclável esse moleque consegue ser direito. É um perigo à sanidade mental e estado normal das pessoas. – sua voz estava à ponto de atingir um frenesi -  Não há quem agüente ser babá de um pirralho que acabou de largar as fraudas!

Alec decidiu-se que espancá-la era realmente uma ótima opção, que ele queria muito arrancar alguns membros dela. Sentiu seu ódio arrancar-lhe a racionalidade que ainda tinha.

- Pra que raios continuar, afinal de contas, à colorir um mundo, se a perna dele está machucada? Ele precisa somente de alguns curativos e um pouco de amor da mamã...

Foi interrompida, porém, pelo grunhido de um urso verde musgo, enorme, com dentes grandes e símbolos brancos cobrindo seu pêlo. Ele olhava para os dois, com uma cara feroz que parecia dizer “saiam já da minha caverna!”.

- Saiam já da minha caverna! – grunhiu o urso, e começou a se aproximar deles, sobre as patas traseiras, as garras afiadíssimas à mostra.

Porém se quer chegou a alcançar a parte acolchoada da caverna, quando uma grande estalactite pontuda apareceu no teto subitamente crescendo de forma espantosamente rápida e penetrou com um barulho nauseante o crânio do urso, que permaneceu em pé enquanto o sangue saia de sua cabeça. Aos poucos, seu corpo caiu.

Melanie, que estava aterrorizada com o repentino ataque do monstro, virou-se para ver se Alec estava bem. Ele, porém, olhava decidido o urso na porta da caverna, mas não parecia estar focando o mesmo. Melanie, sem dizer palavra, seguiu o seu olhar e viu, do lado de fora, algo amarelo começando a se encher, enquanto a chuva tornava-se rapidamente uma garoa suave e o sol reaparecia feliz por entre as nuvens.

Assim que saiu do prédio amarelo, Raphael foi surpreendido por um enorme rinoceronte de pelúcia que parecia voraz, mas incrivelmente fofo e carinhoso, ainda que tivesse uma expressão que denotava a fúria. Sem dar tempo para qualquer pose possível de Raphael, o animal grunhiu e avançou correndo em sua direção, que, com os pouco mais de 5 segundos que possuía, só conseguiu arrancar um coelho da cartola e jogá-lo no chão, antes de ouvir o impacto do chifre na parede do prédio. O som do impacto foi algo parecido com um “Squizi!”, e o rinoceronte quicou para trás, atordoado. Assim que recobrou os sentidos, olhou para o chão, no lugar onde Raphael deveria estar, e viu um enorme buraco, profundo o suficiente para uma pessoa com cartola cair e ficar de pé. Raphael não estava no buraco, porém. Já tinha usado o coelho para sair atrás do rinoceronte, passando por baixo dele num túnel escavado de última hora. Alegremente e cantarolando, saiu andando enquanto limpava as luvas uma na outra, batendo as mãos como se dissesse “serviço terminado”, de olhos fechados e com cara de satisfação.

O que aconteceu à seguir foi uma série de fatos que poderiam ser evitados caso Raphael não tivesse resolvido fechar os olhos para encenar uma cara de satisfação convincente. O seu pé direito, juntamente com o incrivelmente lustroso sapato, entrou em algo enorme e melado, que acabara de sair do rinoceronte e encontrava-se muito fresco, praticamente pronto para ser pisado. Estacando no momento em que sentiu parte das fezes penetrar seu sapato e associar-se a sua meia, Raphael assumiu imediatamente a cara de nojo mais impensável que alguém se quer pensara, e permaneceu estático ali, com montes de resíduos fecais em torno de seu pé direito. Quando resolveu retirar o pé do grande monte de fezes, saiu saltitando em um pé só pela grama por alguns segundos, enojado, até enfiar o pé esquerdo numa outra particular montanha de dejetos fecais. Parou, abaixando ambos os braços e também a perna direita, até esta atingir o chão, então calmamente retirou o pé esquerdo do monte de excremento, depositando-o então na grama verde. O grito que veio em seguida fez o rinoceronte se refugiar em sua toca, escondendo-se embaixo da cama e pedindo para a mamãe vir ver se haviam homens de cartola dentro do armário.

O grito também foi ouvido por Dayse, que estacou e, depois de pensar por alguns segundos, começou à correr desesperadamente pelo corredor, esbarrando em vasos e esculturas, pensando que talvez Yuri já tivesse começado preparativos ou talvez até mesmo já tivesse terminado a missão. Não era possível ser tão desumanamente rápida, mas Dayse suspeitara de trapaça por parte de Raphael e resolveu que iria até a Vernicomidas em disparada, reunindo todos os sapos que encontrasse no caminho.

Yuri, entretanto, ouviu o grito como se fosse apenas mais um fenômeno natural como o vento ou a tsunami de ontem à noite. Algo que aconteceria outra vez, e mais outra, e se duvidar mais algumas. Aquele tipo de coisa que ninguém controla e que sempre vai estragar a vida de alguém que tiver a infelicidade de cruzar seu caminho, como é o caso de uma grande montanha de dejetos fecais de um rinoceronte.

As gotas de água continuavam a cair com uma alegria constante por entre os furos no telhado, em direção as bacias e panelas pelo ar alegre e batendo alegremente nos recipientes, produzindo uma sinfonia alegre digna de Salvador. A escada sustentava dois seres humanos, um deles caído e inconsciente, e o outro, ensopado, olhando em desespero o primeiro.

O ser humano caído era a mãe de Kellyn, que no momento não ouvia a alegre trajetória dos pingos que se aventuravam por sua casa. Talvez até ouvisse, mas não se lembraria depois de ter ouvido. O outro ser humano, por sua vez, era o pai de Kellyn, que havia se separado da mãe de Kellyn por motivos conjugais e essas coisas que adultos usam de desculpa pra fugir do compromisso de um casamento sério e cheio de amor que a gente sabe que não existe. Não via os filhos há alguns meses, desde quando a mãe de Kellyn o havia proibido de sequer tocar a campainha. Ele havia tocado a campainha algumas vezes e saído correndo, não por diversão, mas para fugir das panelas e outros utensílios de cozinha que em geral passavam voando pelo vidro da porta rumo à sua cabeça. Ainda desconhecia o motivo de tal ódio por parte de sua ex-esposa, mas descobriria assim que ela acordasse. O mundo, que tinha resolvido até então desabar como se estivesse perto do fim, dez minutos depois trouxe um sol sorridente para o céu um pouco nublado, fazendo então a chuva parar pouco a pouco. Quando ela parou de vez, e a sinfonia de batuques também o fez com uma nota particularmente emocionante que faria até mesmo Frank Sinatra chorar, já eram seis da tarde e a luz resolveu que era uma boa hora para pegá-los de surpresa num amasso de reencontro. Não foi isso que a energia encontrou, porém, quando invadiu a escada e o corredor, que estavam molhados pela água que havia a muito caído pelas bordas das vasilhas.

O pai de Kellyn já estava preocupado e, quando resolveu que era uma boa chamar a ambulância que viria gritante pela rua silenciosa acordando meio mundo que resolvera aproveitar a chuva para dar uma boa cochilada, a mãe de Kellyn abriu os olhos e, com um sorriso, olhou para o pai de Kellyn.

Estupefato, ele ouviu palavras saltarem da boca dela:

- Eu quero ir para o Japão.

Correndo com os pés melados, Raphael viu a Vernicomidas aproximar-se rapidamente, enquanto a manhã tornava-se tarde. Ainda com cara de nojo, ele tentava ir limpando os pés na grama, enquanto gemia de nojo com o contato direto. Viu o lugar onde devia haver um portão e correu para dentro dos jardins, aproximando-se em seguida das grandes portas duplas de antes. Apertou o mesmo botão de antes e esperou, pacientemente, as portas abrirem e revelarem, ao invés de uma grande festa com convidados aristocratas e uma grande faixa com dizeres de mau gosto sobre ele, uma grande batalha entre convidados aristocratas e sapos, que pareciam destruir metade da sala a cada segundo. A única coisa que permanecera, ainda assim diferente, tinha sido a faixa, que agora apresentava os dizeres “Bem vindo, tio retardado de cartola com os pés melados de merda!”.

A batalha, todavia, chamou-lhe mais a atenção do que a faixa. Socos, chutes e tapas eram distribuídos pelos sapos, enquanto os convidados aristocratas apenas os recebiam e tentavam revidar batendo nos sapos levemente, gentilmente e delicadamente com suas luvas brancas. Dayse observava tudo do alto da escada, as mãos nos quadris, com uma cara de satisfação gigante. Essa cara, porém, se desfez quando ela viu Raphael e, imediatamente, correu para o corredor do lado esquerdo, partindo coisas enquanto corria. Raphael não entendeu muito bem o porque de tal atitude, mas nem teve tempo de pensar quando viu Takeso, Erick, Kellyn e até mesmo Rod carregando um cano de metal cada um, enquanto corriam pelo topo da escada. Correu, por entre convidados e sapos, sem receber uma mísera agressão, mas deixou um coelho para fazer a sala parecer ainda mais destruída quando voltasse, para um gran finale num cenário espetacularmente desolado.

Dayse corria em disparada, imaginando que Raphael havia trazido toda a frota de Yuri consigo, e estava decidida a terminar o trabalho com as próprias mãos. Correndo por entre escadas e corredores, olhando rapidamente dentro de salas, ela procurava o maldito cara de smoking branco, tentando ouvir qualquer som de choro ou de tesoura cortando que seus pudessem captar. Não estava sendo bem sucedida, porém, e já estava começando a desistir, quando ouviu barulho de metal caindo no chão logo atrás de si. Olhou e viu um garoto parado, meio desbotado, e um cano no chão, sendo este o que fez o estalido que ela ouvira. Quando virou-se para ignorá-lo e continuar a correr, foi atacada por dois outros canos que acertaram sua cabeça em cheio, e ela caiu de borco no chão com um barulho engraçado de algo molhado deslizando em borracha.

- NÃO ELA! - Takeso gritou, ensandecido – Temos que ajudá-la e procurar o cara que o Erick falou!

Ele passou correndo por eles e sentou-se no chão, tentando ver algum sinal de vida em Dayse. Segundos depois ouviram passos apressados e viram, subindo a escada com cara atordoada e sapatos melados, Raphael, que não parecia nada feliz.

- Ótimo. – disse ele – Eu mato o maldito do Isaac e fico com a Vernicomidas pra mim.


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