A Luz no Coração de Gelo escrita por Hika-chan_16, Phinderblast


Capítulo 2
A canção do destino: Kazui, o menestrel


Notas iniciais do capítulo

Pequena parte já conhecida e uma parte grande inteiramente nova! :D
A partir daqui, tudinho novo o/
Então, aproveitem! ^^



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~ Capítulo 2 ~ A canção do destino: Kazui, o menestrel

 

A viagem seguiu sossegada por algumas horas. Deviam pegar o caminho mais longo para desviar do feudo de Britoniah, então rumaram para o norte, em direção à cordilheira de Mjolnir. Galoparam pelo vale montanhoso, evitando os monstros selvagens que perambulavam pela cadeia de montanhas. As árvores, mesmo não tendo o porte das suas parentes da Grande Floresta, eram altas e imponentes. Por vezes passavam perto de uma ou outra flor gigante, muito comuns nas regiões mais altas, mas raras ali no sopé. Zangões e rockers vagabundeavam pelos arredores, oferecendo perigo apenas para aprendizes descuidados que se distanciavam demais da cidade. O clima estava ameno e Akira julgava ser atmosfera ideal para uma viagem, não podendo conter a emoção de andar por aquele lugar tão estranho para ela.

Vai chover.” concluiu Akihiko. A sumo logo perguntou o porquê dele pensar assim, um clima tão ameno e confortável, poucas nuvens no céu. “Está úmido demais para um lugar de árvores tão espaçadas, e o vento sopra do oeste, do rio de Geffen.” explicou para ela enquanto gesticulava. Ele parecia bem inteligente e sábio, pensou a garota. Akihiko ajudou a pequena a descer e desmontou de seu peco peco também, amarrando seu arreio em uma árvore próxima. “Peguem a tenda, vamos armar aqui, entre essas árvores”.

Akira apenas observava o trabalho apressado e coordenado de todos, não houve mais ordens ou conversas, eles apenas faziam o que tinham que fazer, como se tivessem treinado aquilo por anos a fio, pois tudo fora montado em poucos minutos. Os peco pecos foram amarrados dentro da tenda, que era grande o suficiente para acolher a todos ali, inclusive suas montarias.

Será que um pobre aventureiro pode desfrutar do aconchego de uma tenda seca antes que os céus desabem sobre minha cabeça?” Não havia muito tempo que tinham acampado ali, mas era tempo o suficiente para a garota notar as nuvens mais espessas no céu, assim como um vento mais frio lamber-lhe a face. Akihiko não disse nada para o estranho que aparecera pedindo abrigo, mas um de seus colegas o convidou a entrar com um sorriso no rosto. Só agora a garota havia notado a alegria daqueles homens, que estavam sempre carrancudos, ainda mais quando se referiam a ela ou a missão. Estavam mais contentes, contavam piadas e riam.

Se esqueceram um pouco de mim” pensou ela.

Acho que você nunca viu um bardo ou menestrel na vida, não é mesmo?” Ela ficou um tanto surpresa ao escutar aquilo vindo do lorde ao seu lado, ainda mais acompanhado de um sorriso. Suas bochechas ficaram coradas e ela o olhava com atenção, ele sempre dizia coisas sábias, poderia aprender muito com ele.

Como eu lhe disse, minha vida era a abadia e Glast Heim... Na abadia apenas noviços e sacerdotes eram meus amigos e na cidade amaldiçoada eram poucos os aventureiros que passavam e, se o faziam, eram por trajetos distantes do meu.” O rapaz escutava atentamente o que a garota lhe dizia, sua voz era doce e feminina, coisa que estava desacostumado a escutar e que lhe soava como música. Akihiko pôs-se a contar o que sabia sobre os bardos, figuras tão queridas pelas pessoas, mas por muitas vezes subestimada pelos guerreiros. Suas canções tinham uma ponta de magia, pois poderiam mudar o rumo de uma batalha perdida. Eles sabiam de coisas, coisas que ninguém mais sabia, histórias que ninguém mais contava. Diziam que uma vez por ano se encontravam em um lugar secreto e juntos contavam tudo o que sabiam e então transformavam em histórias e canções. A pequena escutava tudo com muita atenção, era uma história maravilhosa. Voltou o olhar para aquela figura tão singela que conversava com um homem, parecia tão normal, seria ele alguém que sabia coisas que nem mesmo Akihiko sabia?

Mas são apenas boatos, eles não negam, mas também não confirmam, quem pode saber o que é verdade e o que é mentira sobre eles? Eu não posso, eu não vi” concluiu Akihiko.

Começou a chover. Não era uma tempestade, apenas uma chuva forte e sem vento. As gotas batiam no tecido grosso da tenda e faziam um barulho surdo e que relaxava, som relaxante até demais. O clima fresco, a chuva, o som da água, tudo era propício para um belo sono, mas não era o que o coração de gelo queria.

Senhor menestrel, toque algo para nos acordar”. A chuva não demoraria muito segundo suas previsões e dormir agora só os deixaria sonolentos mais tarde, ele sabia disso. A sumo bocejava constantemente, ficara ao lado do lorde o tempo todo, escutando histórias incríveis e que sua madre superiora nunca contara. Escutar as palavras do rapaz a acordou imediatamente, queria escutar a “música mágica” que aquele homem poderia fazer. O menestrel estava um pouco afastado de todos, afinando seu instrumento, um tipo de violão estranho. Parecia que ele não tinha ouvido o pedido do lorde, mas era apenas aparência. Tirou seu chapéu da cabeça, revelando os curtos cabelos de um azul celeste ímpar e fitou o casal praticamente do outro lado da tenda. Dedilhou o violão e lhe tirou notas suaves, mas tristes e até um pouco perturbadoras.

 

Existe uma moça que fala com os mortos

Em sua vida os deuses intercedem

Para encontrá-la não tomem caminhos tortos

Pois sua morada permanece em Geffen

 

Mas, pobre garota, ela tem uma maldição

Quem a procura apenas uma fera encontra

Tal fera de temor enche seu coração

Dia e noite, todo o tempo a pobre jovem amedronta

 

Besta fera selvagem e inumana

Rápida e de ataque mortal

Golpeando a todos em sua fúria insana

Com suas garras e magia letal

 

Todos o olharam, muitos estupefatos. Poderia aquele homem saber de sua missão?

Qual seu nome, meu senhor?” Perguntou Akihiko, o único que não demonstrava a surpresa de todos.

Kazui... Kazui Leaderholsen, o seu criado” disse o jovem, levantando-se e curvando-se exageradamente. Os outros lordes estavam apreensivos, pois julgavam que sua missão era secreta e apenas o alto escalão do castelo estava ciente dela. “Ora ora meus senhores, não precisam se exaltar, é apenas uma canção” um sorriso brincalhão dançava nos lábios do rapaz, ignorando completamente o perigo que era jogar com aqueles guerreiros. Akira agora estava temerosa e dava graças por estar sentada, pois seus joelhos tremeriam com certeza. Aquela figura, antes misteriosa e fascinante, agora lhe parecia unicamente misteriosa, talvez até perigosa, pois brincava com os lordes sem medo do que poderia desencadear. Pode ser que fosse forte o suficiente para derrotar todos os ali presentes, pode ser que fosse um servo de Yami, ou a própria arquimaga disfarçada.

Todos os temores lhe sumiram da mente quando sentiu o toque firme em seu ombro, o mesmo que sentira no castelo, mas agora firme e quente, e não frio; era Akihiko sem a manopla de aço nas mãos. Ele colocou sua mão ali por um motivo e Akira julgava ser para acalmá-la, porque provavelmente ele deveria ter notado sua cara de espanto e medo. O lorde olhou para os seus companheiros e eles imediatamente entenderam o recado. Todos os ali presentes - exceto a sumo, por não ter arma, Akihiko, que mantinha-se sentado ao lado dela e o menestrel - sacaram suas armas. Quase duas dezenas de lordes reais cercaram o rapaz que nas mãos possuía apenas um violão afinado.

Mas que indelicadeza de sua parte, Aki-kun... Tsc tsc tsc” o jovem de cabelos azuis enfiou a mão no bolso de sua roupa. Uma dúzia de espadas se levantou contra ele, mas não tinham o interesse de feri-lo, apenas de intimidá-lo. Do bolso ele sacou um baralho e com as mãos hábeis ele o embaralhou, deixando o violão preso meticulosamente nas costas enquanto isso. “Espero que no futuro não trate pessoas suspeitas na base da intimidação e da espada, para o seu próprio bem, Aki-kun. Nosso encontro acaba aqui, obrigado pelo abrigo” e isso foi tudo o que o menestrel disse, pouco antes de tirar uma carta do baralho e mostrar para eles. Os Amantes era o que estava escrito nela e seu desenho era de um jovem casal de mãos dadas. Houve um fraco brilho azul envolta do menestrel e antes que algum dos lordes ali presentes pudesse golpeá-lo ele havia sumido, teleportado para sabe-se lá onde. As espadas voltaram a dormir em suas bainhas e houve um grande alívio no local, mas não para Akira.

A chuva ainda caia torrencialmente e os lordes voltavam a conversar como se nada tivesse acontecido, mas a garota ainda estava visivelmente balançada. Akihiko permanecia ao lado dela e assim ficaria até o fim da missão, o rei a julgava ser a única capaz de derrotar a inimiga, então teria que ser protegida, ela parecia tão frágil. O estado da garota reforçou a dúvida que tinham sobre o poder dela.

~*~

Ela escutava os murmúrios e cochichos entre eles. Não podia ouvir claramente o que falavam, mas apontavam para ela e faziam gestos de desdém, e volta ou outro escutava um “fraca” e “ela não vai conseguir”. Sentia-se mal, terrivelmente mal. Eles pareciam não se importar com o que acontecera minutos atrás com aquele menestrel estranho, mas a lembrança permanecia vívida em sua mente, amedrontando-a. Agora o Coração de Gelo estava de costas para ela e ela sentiu como se todos estivessem a observando com olhares de desconfiança. Não agüentou aquela terrível pressão, era pior que andar pelos cemitérios de Glast Heim. Não pensou em mais nada naquele momento, tinha que sair dali, então se levantou e correu. Correu para fora, para longe, não sabia para onde estava indo, mas contanto que fosse para longe daquele lugar não se importava onde acabaria chegando.

A chuva era pesada e torrencial, seus pés afundavam, ora na lama, ora nas folhas encharcadas. Seus cabelos estavam completamente ensopados, assim como sua roupa, ficando cada vez mais difícil correr. A água era gelada e seus lábios rapidamente estavam roxos, contrastando imensamente com sua pele extremamente branca e agora arrepiada pelo frio. Não se via nenhum monstro, forte ou fraco, apenas as árvores que pareciam chorar, derramando suas lágrimas grossas e pesadas sobre o chão. Tropeçou, não em uma pedra, nem em uma raiz alta, tropeçou nos próprios pés, coisa até comum de se acontecer com ela, mas que agora a fez cair de cara no chão. Levantou-se rápido, a lama cobria seu rosto e ela quase se desesperou, pois não conseguia respirar. Sentou-se, com as pernas dobradas para fora e olhou para cima.

Lágrimas começaram a descer pelo rosto dela e misturavam-se com os pingos de chuva. Desejava imensamente estar na abadia, em sua cama quente, ou mesmo no altar, rezando. Poderia estar fazendo algo que goste, talvez comprando alguma coisa para as noviças da cozinha, ou ajudando algum aprendiz, ou cavalgando com Akihiko.

Akihiko!” bradou ela, como se o chamasse em uma esperança vã.

Chamou?” Ela escutou claramente a voz do lorde, que agora era como um alívio extremo para o sentimento que se apossara dela. Virou-se para trás e viu o rapaz em pé. Não conseguia fitá-lo direito, as gotas caíam em seus olhos e mal conseguia mantê-los aberto. Passou as mãos nos orbes azulados, talvez por um cisco ter caído junto com a chuva.

~*~

Flashback

 

O lorde resolveu deixar Akira sozinha um pouco e se virou de costas para ela. Queria pensar um pouco. Refletia sobre os acontecimentos recentes e fatos que o deixavam irrequieto. Sua mente maquinava em cima de informações que ficaram subentendidas com aquela conversa que teve com Kazui. Akihiko conhecia-o, Kazui, O Contador de Histórias, ele era membro do mesmo clã que Dratinor, o lorde das Valquírias, o mesmo clã que Sophie Haineko. Talvez ele soubesse da missão por eles, pode ser que tenha apenas ido para ajudá-los, mas ele não lembrara do menestrel no momento em que ele apareceu, há muitos anos não o via, quando ainda era um rapazote, um cavaleiro inexperiente.

Aquele redemoinho de informações começa a tomar forma e as respostas ameaçam ficar claras quando escutou os passos apressados e vacilantes da garota saírem da tenda e irem para fora. Ele se virou para os outros lordes, mas estavam todos de costas. Sabia que eram guerreiros formidáveis e que uma garota fujona não passaria despercebido por eles. Estavam-na ignorando e sabiam que sozinha em uma chuva daquela no Monte Mjolnir as chances de morrer eram grandes. Ele balançou a cabeça negativamente para eles e fechou a cara.

O rei disse que ela é importante” falou calmamente e se levantou, indo atrás da garota.

Ela deixara uma trilha mais do que visível, remexia mais terra e folhas que qualquer outra pessoa ou animal poderia conseguir. Como bom rastreador que era, pois em muitas perícias era treinado, sabia até em que pontos ela tropeçara e para onde estava indo.

É mais rápida do que eu pensei” foi o que disse pouco antes de escutar o baque de algo contra o chão encharcado. Não se assustou com o som, já esperava que ela acabasse caindo, pois pelos seus rastros ela já vinha trôpega por muitos metros. Parou de correr e caminhou até perto dela.

 

Fim do Flashback

~*~

A sumo estava sentada como uma garotinha no chão, olhava para cima, como se procurasse por algo no céu, talvez uma providência divina. Esperou que ela clamasse pelos deuses ou talvez quem sabe pela sua madre superiora.

Akihiko!” Foi o que ele escutou, completamente surpreso, jamais imaginaria que dos lábios da garota sairia o seu nome e não o de uma divindade.

Chamou?” Respondeu calmamente enquanto mantinha a posição. Ela se virou e ele notou um sorriso se formar em seus delicados lábios, de seu rosto corriam rios, se de lágrimas ou apenas chuva ele não sabia dizer ao certo. Akira piscou algumas vezes ao encará-lo melhor e pôs-se a esfregar os olhos, devia estar emocionada talvez, foi o que ele pensou na hora. “Tudo bem, a chuva já vai parar e poderemos voltar para a tenda” consolou-a.

Aproximou-se mais da jovem e novamente se surpreendeu quando ela pulou em seu pescoço em um abraço forte, mas que tirou completamente seu equilíbrio e o dela. Caíram no barro, ela pela segunda vez em menos de cinco minutos. O lorde tentou se apoiar e ficou de quatro por cima da garota. Os rostos ficaram próximos ao ponto dele conseguir notar a respiração oscilante dela, pelo choro ou pelo susto. Akira sentia seu rosto corar violentamente, mas para o rapaz não passou de uma vermelhidão normal, visto que seu rosto estava muito frio pela chuva. Nenhum homem jamais havia chegado tão perto dela, não face a face como estavam agora. Remexeu-se ali, incomodada com a situação, com vergonha, com medo, com frio, vários sentimentos. Para infelicidade e azar da garota seus movimentos fizeram o chão mole ceder e nenhum dos dois teve tempo de reagir quando desceram vertiginosamente um barranco alto e íngreme.

O que teria lá embaixo? Somente os longos segundos de queda revelariam.

 

~*~


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Notas finais do capítulo

Reviews? *-*