Capítulo 7

O teste

Eu mal acreditava, o sinal havia batido. Eu estava saindo da escola me tremendo e quase morro quando senti alguém me cutucando no ombro.

– AAAAAAH! – Gritei e todos na calçada do colégio me olhavam estranhando. Quando vi, era o John. Revirei os olhos. – John, seu idiota! Quer me matar?

– Você está muito tensa! – Ele disse. Não me diga?!

Desde que nós fomos à Begum aquele dia, eu só treinava e treinava. John não me deixou sozinha um minuto e quando fui contar pra minha mãe semana passada, ela quase tem um enfarte. Implorei pra ela não comentar nada com a Charlie, afinal ela corria o risco de ser uma das avaliadoras. Se ela soubesse, ela iria fazer questão de estar na banca e ia me ferrar.

Charlie andava estranha nessas duas últimas semanas e quase não a via em casa. Mamãe disse que ela estava saindo com algum rapaz e estava chateada por não conhecê-lo ainda. Meu Deus, alguém agüentando minha irmã? Esse vai pro céu. Pagou todos os pecados.

Eu esperava minha mãe nos buscar e iríamos direto para a Begum. Eu iria me trocar lá e adivinha qual roupa eu vou usar? Eu comprei um shorts e personalizei ele, rasgando um pouco, peguei minha meia calça preta favorita e uma blusa rosa com detalhes em amarelo bem folgada. Estou bem kichin! Acho que se ele me visse quando eu estiver pronta, ia rir muito da minha cara, assim com o John riu. Palhaçada.

– Filha... – Estávamos dentro do carro e ainda faltavam uns dez minutos pra chegar lá. – Tem certeza disso?

– Mãe, eu estou treinando há um mês. Algo deve sair.

Minha mãe parecia bem tensa mesmo, estava com uma cara de “meu Deus, não deixe acontecer um assassinato”.

– Ela vai dançar perfeitamente, Lauren. Vai se orgulhar dela. – John disse e eu o abracei, dizendo obrigada.

– Você é demais, menino. – Falei e ele sorriu.

– Mas é claro que eu sou! – Ele disse e eu comecei a rir. Nem se acha, né?

Minha mãe parecia mais tensa a cada segundo, por um momento pensei que ela ia ter um treco ali mesmo. Mas logo chegamos.

Eu pensei em dançar uma música oriental, uma das coreografias do Kichin. Podem me chamar de maluca, mas a cada dia que passa, fico mais louca pelas coreografias dele. John ficava sempre observando calado, ele ria dos trajes, mas no fundo me apoiava. E até falava “legal, mas ele não dança algo mais masculino não?!”. E como no regulamento eles deixam você escolher o seu tema/dança/ritmo, escolhi uma música chamada Panda hero¹, essa música é muito fofa.

Quando eu cheguei lá, pedi informação e disse que eu iria fazer audição naquele dia para a bolsa. A moça me acompanhou até uma sala, onde havia outras pessoas esperando. Pena que nem a mamãe e nem John poderia assistir, mas se bem que eu estaria melhor assim. Já seria constrangedor o suficiente dançar na frente de todos, sendo que eu nunca tinha feito isso antes.

Me troquei no banheiro da sala e fui me sentar em um dos cantos vazios. Todos pareciam bem concentrados e eu comecei a ficar apavorada. Terminei de amarrar meu cabelo pra cima num coque e fiquei mexendo no celular. Nada fazia o tempo passar, estava ficando maluca!

Mas o pior aconteceu. Bom, eu achava (vulgo tinha certeza absoluta). Quem entrou na sala para levar o primeiro concorrente à bolsa foi Charlotte Clarke, minha amada irmã. Quando ela me viu, ficou paralisada. Petrificada, chocada, horrorizada.

– O que está fazendo aqui, pirralha?! Não posso acreditar que vai tentar entrar na Begum! – Ela correu até mim e gritou morrendo de raiva. Todos olharam pra mim assustados e curiosos com a situação e meus olhos encheram d’água. Que vergonha!

– Qual o problema disso, Charlie? Por que eu mereço menos que você? – Falava já querendo chorar. Uma menina gentil me trouxe um copo d’água do bebedouro da sala. – Obrigada. – Tomei a água e Charlie estava fumegando na minha frente.

– Está aqui para acabar comigo?! Saia já daqui! Saia! – Ela gritava explodindo e eu fiquei mais com medo ainda. Nunca vi minha irmã desse jeito.

– O que está acontecendo aqui? – O professor bem musculoso que ajudou aquele rapaz a cuidar da aluna da Charlie apareceu, vendo minha irmã pegando fogo de tanta raiva e minha cara assustada. – Alguém pode me explicar?! – Ele gritou agora e todos pularam de susto.

– Wilson, ela não pode competir. – Ela disse tentando manter a calma.

Wilson olhou torto pra ela e eu só observava.

– Por que não? Ela não se inscreveu?

– Eu me inscrevi sim. E tenho o mesmo direito que todos tem aqui em competir! – Falei e Wilson olhou para mim.

 – Como é seu nome, moça? – Ele disse e eu fiz questão de dizer:

– Megan Clarke! – Falei firme e minha irmã tremeu. Ela estava ao ponto de pular no meu pescoço.

– Clarke?! – Wilson disse e deu uma risadinha. – Então é por isso? Ela é sua irmã?

– Infelizmente essa pirralha é! – Ela disse gritando e Wilson se assustou.

– Se ela fez a inscrição, não posso impedi-la de competir. – Ele disse e minha irmã saiu correndo dali, com muita raiva.

Até agora estou tentando entender esse ataque. De verdade, se ela não acreditava que eu conseguia dançar, por que quer tanto que eu fique longe da Begum e dela consequentemente?

– Desculpem o transtorno. Acho melhor ela ir primeiro para não causar mais confusões... – Ele disse sem graça me puxando pelo braço. Eu estava mais sem graça ainda.

Era isso que eu temia.

– Desculpe mocinha, mas não tem como eu tirá-la da banca avaliadora. Eu estaria te favorecendo. – Ele me disse me levando ate a porta, onde eu entraria e daria o melhor de mim.

– Tudo bem, eu agüento ela há 17 anos. Acredite, sei como lidar. – Falei sem graça e ele deu umas tapinhas nas costas.

 – Não se preocupe. Os outros dois são bem mais calmos. – Ele me tranqüilizou, mas eu estava bem.

Assenti e abri a porta. Entrei com medo, confesso, mas ver somente dois jurados ali me tranqüilizou. O garoto oriental me olhou curioso, com um pequeno sorriso e eu sorri de volta.

– Como é seu nome? – O rapaz de cabelos pretos e porte físico invejável, cujo nome na mesa estava escrito “St3ve”, sim estava escrito dessa forma, perguntou.

– Megan Clarke. – Quando eu falei, os olhos do outro rapaz, o oriental, pularam. Fiz o mesmo.

Antes mesmo dele falar, Charlie entrou respirando fundo e se sentou do lado do oriental, olhando bem pra mim. Ela estava prestes a pular no meu pescoço!

– Bom Megan – Sua voz grossa ecoou na sala, me fazendo pular – O que vai dançar?

Respirei fundo e tentei não olhar a cara raivosa da minha irmã.

– Vou dançar a música Panda hero. – falei sem graça. Mas ele não pareceu escutar. Vi seu nome “Hideki”. Minha irmã rolava os olhos a cada vez que me encarava, eu já estava de saco cheio daquilo. Mas não iria desistir! Não dessa vez! E não pra minha irmã de novo!

A música começou a tocar e tentei imaginar que ninguém me olhava, parecia mais fácil assim. Eu dançava naquele espaço o máximo que eu conseguia e na mente vinha a coreografia. De vez em quando olhava pra frente e todos me observavam atento, e minha irmã me olhava com as sobrancelhas cerradas. Engolia seco de vez em quando, mas no giro final eu pude respirar fundo. Reverenciei e quando olhei pra frente, Hideki mantinha o dedo indicador direito levantado e eu me apavorei. Fiz algo de errado?

– Sim? – Falei morrendo de medo, minha irmã abriu um sorriso vitorioso discreto, cruzando os braços, me apavorei mais ainda. Ele cruzou os braços, cerrando um pouco as sobrancelhas, pensando no que ia falar. Mas saiu uma pergunta simples:

– Há quanto tempo ensaia essa música? – Ele perguntou ainda com as sobrancelhas cerradas e eu me tremi mais ainda.

– Há um mês. – Falei e minha irmã que tomava um copo d’água engasgou e cuspiu a água toda. Os outros dois olharam assustados pra ela. Ela acenou pra eles dizendo que estava tudo bem.

Hideki me olhou curioso.

– Você é uma falsa mesmo. – Minha irmã disse e Steve olhou assustado para a Charlie. – Escondeu da mamãe isso, e de mim! Aposto que o idiota do John está nessa com você.

Revirei os olhos.

– Por favor, Charlotte, ela não está na condição de sua irmã aqui.

Obrigada, Steve!

– Bom – Hideki riu de nervoso. Deve ter sentido o amor da minha irmã por mim – Obrigado por sua colaboração, Megan. – Ele disse e coçou a testa, anotando umas coisas. – Espere na sala onde você estava esperando antes, o resultado sai ainda hoje.

– Ta bom, obrigada. – Falei saindo da sala. Parei depois de fechar a porta e fui deslizando na parede, e comecei a chorar. Muito, mas muito mesmo.

Já era! Está tudo perdido! Minha irmã fará de tudo para eu não entrar.