Rosas Flamejantes escrita por Borboletas Azuis


Capítulo 5
Capítulo 5




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Melody Sparks

Já havia passado uma semana. Eu estava tranca em “meu quarto”, no segundo andar da casa dos Beaumont. Estava fraca, sentada na cama, abraçando os joelhos. As janelas e cortinas estavam fechadas, porque eu me queimava se chegasse perto do sol.

De frente para minha cama havia um espelho, e eu sentia a vontade de quebrá-lo crescer a cada dia. Uma mulher me encarava do espelho. Do mesmo modo que eu estava, na cama.

Eu não conseguia acreditar que era eu ali. Não podia ser.

Só nessa semana eu já havia mudado tanto... Meus cabelos, antes castanhos escuros, tinham começado a escurecer, a partir da raiz, e em menos de vinte e quatro horas, eles já estavam completamente pretos. Fora que estava o dobro do tamanho.

Meus olhos já eram escuros, mas agora estavam praticamente pretos. Minha pele, pálida. Meus lábios estavam mais vermelhos.

Eu me encarava, encarava aquele reflexo. Mas minha atenção se desviou do espelho para a porta, e após pouco tempo ela se abriu, e Thomas entrou.

– Como você está? – ele fechou a porta atrás de si, se encostando à mesma em seguida.

– Eu to bem. – olhei para as mãos. Unhas longas, bonitas.

– Você está fraca. E a sua transformação está quase acabada. Você precisa de sangue, Melody. Ou vai morrer.

– E morrer seria uma coisa assim tão ruim? Eu me livraria de tudo.

– Eu sentiria a sua falta.

– E de que adiantaria Thomas? Sentiria a minha falta de qualquer maneira. Porque se eu tomar sangue, virarei um monstro, e não vai mais existir essa Melody que você está vendo agora.

– Mas eu posso te ajudar a se controlar. Responda-me, eu sou um monstro para você?

– Thomas... Isso, isso tudo aqui, vai contra tudo o que eu penso. Tudo o que sempre pensei. Se eu deixar isso acontecer, eu vou estar perdida para sempre. E vou ter falhado.

– Você tem certeza? Você pode mudar tudo, Mel. Acha que somos monstros? Prove que nem todos os vampiros são monstros. Seja diferente.

Ri, seca.

– Melody, você quer carregar o peso do mundo inteiro sozinha. Mas esquece que só tem duas mãos.

– O que quer dizer com isso? – encarei-o.

– Quero dizer que você quer salvar tudo e a todos, custe o que custar, e deixa que o peso disso tudo recaia sobre você.

– Se eu não sustentar o peso sozinha, tudo vai cair. Porque não têm ninguém disposto a me ajudar.

– Eu estou aqui por você. Tentando te ajudar. Você se preocupa tanto com os valores que te ensinaram, sobre o que vão pensar de você. Sobre o que vão achar de suas ações. Tenta agradar a todos. Mas me responda, qual foi a última vez que pensou em você? No que você quer?

– O que te faz pensar que a decisão de morrer para não virar uma vampira não é minha?

Tom franziu o cenho, e depois me fitou. Aqueles olhos verdes cheios de mágoa.

– Eu nunca vou te convencer, não é?

– Sinto muito.

– Na verdade, acho que não sente não.

– E talvez você esteja certo. Quanto tempo eu tenho até morrer?

– Talvez até amanhã, do jeito como está fraca, não vai aguentar muito tempo.

Thomas virou as costas e saiu do quarto.

Respirei fundo e deitei na cama, fechando os olhos.

Lutei tanto, para no fim acabar desse jeito. Por mais incrível que possa parecer, eu achava que morreria de velhice. Não sei se em algum momento arrumaria um cara que me amasse e casaria com ele. Nunca pensei que teria filhos. Mas nunca me imaginei morrendo por causa de um vampiro. Tampouco por ser um vampiro.

Isso seria, então, suicídio? No fim, eu estou me matando?

Fazendo isso, eu estou sendo covarde ou corajosa? Por favor, se tiver a resposta, compartilhe. Eu devo morrer, ou lutar pela minha vida?

Se eu lutasse por ela, continuasse a viver, aquela vida de imortalidade com que muitos sonham, será que eu vou viver? Eu que vou estar lá ou será apenas o meu corpo sendo comandado por um monstro?

Passei as mãos pelo rosto.

Estou tão acabada. Estou chegando ao fim. Sinto-me covarde por desistir da minha vida. Não que eu ache que ainda tem salvação para mim se continuar a viver.

Penso que talvez se eu morrer agora, ainda tenha chances de não ir para o inferno. Se eu não matar ninguém, esteja perdoada.

Posso estar só me iludindo também. Porque, se eu chegar lá, e quando for julgada, os vampiros que matei contarem como humanos, eu estarei tão ferrada. Todo esse esforço para não virar um monstro, para permanecer sendo eu mesma, ter sido em vão. Ah, tenho vontade de rir de minha desgraça.

“Os valores que te ensinaram.” O que me ensinaram? Minha família me ensinou a importância de estarmos juntos. A Organização me ensinou que vampiros eram monstros... Eles acabavam com tudo e deveriam ser mortos. Não são dignos de pena. Eu não poderia ser fraca. Protegeria a todos.

Era isso. Thomas estava falando disso. A Organização jogou um peso em mim, mas eu o aceitei. Aceitei tudo o que me falaram e mandaram. Eu protegeria a todos; mataria vampiros; vingaria minha mãe.

Por isso eu estava assim. Agora tudo estava acabado. Eu falhara. Porque agora, por alguma razão que eu não entendia, eu virara o monstro que eu jurei que mataria e manteria afastado dos inocentes. E eu sentia culpa. Culpa por ter errado. Falhado.

Quando foi que fiz uma coisa que eu realmente queria? Sem a influência de ninguém? O que eu faria agora, se não vivesse de acordo com o que a Organização me ensinou?

O que eu quero?

“Sabe o que quer.” Foi o que uma voz em minha cabeça me disse. E realmente sei... Mas odeio a resposta. Odeio a resposta por causa de meus valores. Eu quero viver. Por isso sinto tanta culpa. Quero sangue.

Porque sim, eu quero sangue. Não só quero como sei que preciso, e apesar de tudo não quero morrer agora.

Sinto que estou travando uma batalha interna. Entre correr atrás de Thomas, pedir perdão para ele e também a sua ajuda. Ou então permanecer nesse quarto, e morrer preservando meus valores e sendo aquilo que me ensinaram a ser. O que eu vou fazer no fim? Vou fazer a minha vontade, e acabar com tudo o que eu acreditava, ou permanecerei com as mesmas ideias, e morrerei sendo a caçadora que não foi corrompida?

“Prove que nem todos os vampiros são monstros. Seja diferente.”

Eu poderia ser diferente? E pensar que eu posso continuar a viver... E ainda mudar a crença de todos.

E eu só teria que falar uma simples frase:

– Eu quero viver. – sussurrei.

É a mais pura verdade. Quero viver, e não me preocupar com nada. Viver de verdade. Mesmo que no fundo, eu saiba que estou morta... Se no fim, monstro ou não, eu for julgada por ser assassina, não importa de quem, então eu vou viver. Talvez eu devesse realmente escutar Thomas, e pensar mais em mim. E viver sem ter que segurar o peso do mundo inteiro sozinha. Fazer a diferença.

Encarei a garota no espelho, e consegui aceitar que era eu quem estava ali. Aquele era o meu reflexo. Antes, via olhos escuros e não notava nenhuma familiaridade. Agora, sei que são meus olhos, olhos escuros repletos de determinação.

Achei que havia perdido isso nesses últimos dias. Enganei-me. Eu só precisava achar um motivo pelo qual lutar. E eu o encontrara. Vou lutar pela minha vida. Minha determinação vem da vontade de viver que eu sentia crescer dentro de mim.

Preciso falar com o Thomas. Levantei-me da cama e respirei fundo, fechando os olhos por um breve momento. Ao abrir os olhos e direcionar o olhar para o espelho, vi que agora não mais mostrava uma mulher fraca encolhida na cama, e sim uma mulher que tirou dos ombros um peso que carregava há anos.

Mas ao sair do quarto, vi o quanto o universo conspira contra mim. Eu não tenho sorte. Eu poderia muito bem encontrar o Thomas, isso pouparia o meu tempo, assim não teria que andar por toda a casa, mas não foi ele quem eu encontrei.

Charles estava no final do corredor, encostado na parede, e me encarava. Mesmo estando escuro, eu conseguia enxergar perfeitamente. Ele estava de jeans, camiseta e uma jaqueta de couro. Os olhos azuis de Charles me encaravam.

Eu não estava com paciência, nem um pouco, portanto, continuei andando, e passei pelo vampiro como se ele não existisse.

Desci as escadas e segui direto para a sala, onde eu achava que encontraria Thomas. Por sorte era ali que ele estava, e não encontrei mais nenhum dos garotos pelo caminho.

Thomas estava de frente para a janela, segurando uma garrafa de uísque, e algumas vezes ele tomava longos goles da bebida. Eu não poderia me aproximar muito do loiro, porque a luz do sol provocava ardência em minha pele, e depois disso, só pioraria.

– Thomas? – chamei. Ele pouco se moveu, mas havia me ouvido, porque deu sinal de vida.

– Hm? – bebeu mais um gole.

Eu havia ido até ali, mas agora, eu não sabia o que falar. Sabia o que queria, mas como, depois daquilo, eu falaria alguma coisa? Eu o desafiei, até que ele desistisse. E agora, ali estava eu, para tentar convencer o garoto a me ajudar, porque eu não quero mais morrer.

– Eu preciso da sua ajuda. – passei as mãos pelos cabelos.

O loiro, por sua vez, nem se virou para me olhar. Ele apenas deu um sorriso amargo e bebeu mais um gole de seu uísque.

– Minha ajuda para morrer? – segurou a garrafa com mais força.

– Para viver.

– Então agora você quer viver? – ele se virou. Eu vi raiva em seus olhos. – Você tem certeza, Sparks? Você tem noção de que vai virar um monstro, não é? – as chamas da ira consumiam seus olhos verdes.

Você conseguiu, Melody. Conseguiu irritar a única pessoa que podia confiar nessa casa.

– Por favor, Thomas. – suspirei. – Eu não quero morrer. Me ajuda.

Ele nada falou. Só me encarava, e eu retribuía o olhar, o encarando de volta. Até que ele assentiu e falou:

– Eu não vou deixar você morrer. Vamos sair quando for noite. – ele deixou a garrafa de sua bebida na mesa e se retirou do cômodo.

Eu estava sozinha. De novo.

Fui me esgueirando pelas sombras até as cortinas e as puxei, impedindo que a luz do sol entrasse. Olhei para o lugar escuro e andei até o sofá, onde me sentei encolhida, encarando o nada. Senti os passos de alguém se aproximando e depois avistei Charles na sala, com a mesma roupa que usava quando o vi no corredor.

Ele pegou a garrafa da bebida que Thomas estava e tomou um gole, indo até a poltrona, somente para se encostar enquanto olhava pra mim.

– Não se preocupe tanto assim com ele. – olhou para cima, como se indicasse Thomas. – O bom humor do meu irmãozinho sempre volta. Ele não vai mesmo te deixar morrer, ainda não desistiu. Só está irritado, isso não dura muito.

Eu continuei quieta no sofá, somente observando Charles falar. Ele bebeu mais um gole do uísque e o estendeu em minha direção, mas como não me movi, ele deu de ombros e bebeu mais, para continuar:

– Seja como for, Caçadora, boa sorte na sua nova caçada. Espero que goste do gosto do sangue da vítima inocente. E eu sei que você vai. – ele sorriu torto e saiu da sala, levando a garrafa junto.

Engoli seco e respirei fundo. Deitei-me no sofá e coloquei o braço por cima dos olhos. Tinha que conseguir... Eu teria que matar uma pessoa inocente para viver. Eu conseguiria. Não poderia voltar atrás.

Seria acabar com o Thomas. Onde foi parar toda a minha vontade de viver que eu tinha minutos atrás? Bufei.

Você é uma assassina, Melody. Sempre foi, e nunca se preocupou com isso.

Uma voz interior repetia isso para mim sem parar. E eu sabia que era verdade. Eu sou uma assassina. Uma morte a mais, uma a menos. No fim não faz diferença.

Minha atenção desviou de meus pensamentos para minha garganta seca. Naquela sala escura, eu me sentia torturada, sem poder ver a luz ou ter um relógio para acompanhar as horas. Eu sentiria fome, até o anoitecer.

Ficara encarando o teto por um tempo indeterminado, até que fechei os olhos e tentei dormir, esperando que alguém viesse me chamar. Esse alguém é o Tom. Mas não foi ele que senti que estava vindo. Nesses últimos dias, acabei aprendendo o modo como os garotos andam, o modo dos passos deles. No momento, Ethan que estava vindo.

– Como vocês fazem? – perguntei, assim que ele pisou na sala.

– Como fazemos o que? – ele parou onde estava.

– Andar a luz do Sol. – eu precisava saber.

– Hm... Vocês não têm aulas lá na Organização que falem sobre isso? – quase senti o sorrisinho sarcástico do garoto.

– Não. – respondi sua perguntinha sem fazer questão de parecer educada. – Fale logo. É algum tipo de feitiço? Algo com relações a bruxas?

– Não seja idiota. É uma coisa nossa. Funciona dessa maneira: sua habilidade de andar ao Sol vem da quantidade de sangue que você toma. Se você sair agora, vai virar pó. Você está quase morrendo por conta própria.

– Continue com a explicação. – ralhei.

– Quando se alimentar pela primeira vez, a luz do Sol provocará ardência em sua pele, queimará levemente, deixando avermelhada, se exagerar, com algumas queimaduras mais graves... Bem; quando fizer isso pela segunda vez, será somente a ardência. Na terceira, um formigamento, mas terá que usar óculos escuros, porque seus olhos vão ficar irritados, não se preocupe com isso antes disso, pois não vai poder sair de casa ainda.

– Prossiga.

– Quando fizer isso pela quarta vez, poderá abandonar os óculos e sair para curtir o calor do Sol, porque quase não sentirá mais nada. Depois da quinta vez, está livre. Se parar de tomar sangue, tudo voltará a ser como no início.

– Então... Nunca vou poder parar de me alimentar?

– Se você quiser, pare de se alimentar. Mas não vai aguentar muito. Nem para pegar o jornal de manhã. Acho que dizem assim: “Do pó ao pó”. Bem, o princípio é esse.

– E quanto ao sangue de animais?

O garoto riu irônico.

– Não se iluda com essa de sangue de animais. É uma perda de tempo. Vai precisar do dobro de sangue que pegaria de um humano se for se alimentar de um animal. Sendo assim, matará mais. E você não tem que matar os pobres mortais também, Thomas vai te ensinar a se controlar.

– Já tentou com o sangue de animais?

– Uma vez, para nunca mais colocar na boca. Ora, não faça careta.

E então notei que tinha contorcido o rosto.

– Olhe Melody, não carregue toda essa culpa. Você ainda nem fez nada. E se for viver a eternidade com o peso de cada pessoa que se alimentar nas costas, não vai ser bom. Você não é mais aquela Melody.

– Então agora sou um mostro?

– Pare com isso. Você não é mais uma caçadora, e está na hora de abrir os olhos e ver as coisas de outra forma. Talvez assim enxergue a realidade. Não somos monstros. Se continuar pensando assim, não vai gostar de como as coisas vão acabar.

– É só que... Terei que matar pessoas inocentes. Vocês matam inocentes.

– Escute Melody... Existe um preço para tudo nessa vida. E para voltar da morte não é diferente. Você queimará ao sol. Vai virar pó, ou então se alimentar de sangue humano. E não voltamos à vida para morrer outra vez. Então pagamos esse preço. Pelo resto de nossa eternidade.


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Notas finais do capítulo

Então... Eu quero pedir uma coisa. Duas coisas.
Primeira é que, se tiver algum erro no capítulo, me avisem.
E a segunda: Comentem. Por favor.
Eu estou começando a achar que não tenho leitores, e que sendo assim, estou escrevendo para fantasmas. E isso tá acabando comigo, porque estou perdendo o ânimo para escrever. Então comentem, por favor.
Espero que tenham gostado.
B.A



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