Coloquei a mão na porta e vi Gale se aproximar. Estava pronta pra soltá-la, mas ele foi mais rápido.

- Você gostava mais de mim antes Jo.

- Antes de você se bandear pra carreirista? Gostava mesmo, mas passou.

- Acho que isso se chama ciúmes – Gale disse enquanto me encostava a parede do elevador.

- Tira a mão Gale. Não preciso te falar como sou boa em matar pessoas.

- Jo – ele disse enquanto tirava meu cabelo do rosto. Eu precisava voltar a prender o cabelo – você e aquele garoto. É oficial?

- Gale, só porque nos tornamos colegas no tempo em que você foi capturado e salvo por mim não quer dizer que somos amigos agora.

- É claro que não. Você vai me trocar pelo garoto do pão também.

- Não é assim que as coisas funcionam.

- E como é? – ele disse apertando o botão de emergência que travava o elevador. O cheiro de Gale era hipnotizante. Eu não sei qual era o seu perfume, mas eu podia viver com aquilo pra sempre. Os braços fortes, o sorriso, a raiva. Gale e eu tínhamos muito em comum. Ele estava pronto pra me beijar quando me desviei e passei por debaixo de seus braços.

- Você tem namorada – disse apertando o botão e indo em direção ao meu andar, o sete.

- Você também tem namorado Jo. – ele se aproximou e me abraçou pela cintura.

- Ótimo. – me soltei de seus braços – Isso quer dizer que devemos ficar longe um do outro. Sai do elevador e entrei no apartamento sem olhar pra trás.

Erick me esperava, sentado no sofá, assistindo um dos programas novos da Capital, um tipo de novela que mostrava a história de pais que perderam seus filhos pros Jogos. Algo para o povo da Capital entender o quanto aquilo era terrível. Caesar não usava roupas tão brilhantes, mas o cabelo continuava colorido. Não dá pra mudar tudo de uma hora pra outra. Me sentei ao lado de Erick e encostei a cabeça em seu ombro.

- Ele está bem?

- Melhor do que eu imaginava – disse sorrindo e me virei em sua direção – obrigado por entender.

- Obrigado por me incluir. – ele respondeu, sorrindo.

O puxei para perto e estava pronta pra o beijar quando a campainha tocou.

- Deixa pra lá – disse Erick, me puxando pro seu colo.

- Pode ser algo importante. Espera aí.

Abri a porta e encontrei Gale, sem camisa, com uma mochila na mão e com aquele olhar de cachorro abandonado. O empurrei pra fora e sussurrei:

- O que você está fazendo aqui?

- Enobaria me expulsou. Falou que eu te despi com os olhos. Como se eu não tivesse te visto nua vezes suficientes.

- Qual seu problema Gale? E você só me viu nua pela televisão então sossegue ai.

- Jo, eu posso dormir aqui? Não quero ficar no mesmo andar de Peeta.

- Não Gale, cai fora. Vai pra outra andar, eu sei lá. Usa o quarto da Annie, no andar quatro.

- Eu não quero ficar sozinho.

- Eu estou acompanhada.

- Ótimo – ele disse me empurrando para o lado e entrando no apartamento – Oi Erick. É Erick né? Tem problema se eu ficar aqui?

Erick me encarava enquanto eu tentava explicar com os olhos que eu não tinha nada a ver com aquilo.

- Sem problemas Gale – Erick se levantou e foi pra perto de Gale – pode dormir no meu quarto. Eu fico no da Johanna.

- Eu posso ficar no sofá. Fique no seu quarto – Gale disse com a cara fechada.

- Bom, se virem. – eu disse – estou cansada e vou dormir. Boa noite.

Fui pro meu quarto, tomei um banho e fiquei esperando pra ver se um deles aparecia lá pra que eu resolvesse alguma confusão. Só silêncio. Acabei pegando no sono, mas acordei no meio da noite precisando de água. Tentei ser o mais silenciosa possível mas Gale era um homem de detalhes.

- Jo? – ele disse com a voz rouca.

- Fala Gale.

- Vem cá. Precisamos conversar.

Peguei meu copo e sentei no sofá, o mais longe possível dele.

- Eu só queria – ele se sentou ao meu lado – te agradecer por tudo. Por me ajudar quando as coisas ficaram difíceis, por me salvar quando ninguém ia lembrar da minha existência. Por convencer eles de que eu era importante. E por ter entrado naquele lugar com aquela arma e ter me tirado de lá.

 Meus olhos se fecharam e eu me lembrei do que Gale havia falado. Ele tinha sido capturado e ninguém estava muito disposto a procurá-lo. Tive que fazer um escândalo, falar sobre como a Katniss se sentiria traída se não salvássemos ele. Então consegui uma equipe e algumas armas e fui em busca de Gale. Atirei em alguns pacificadores e o tirei de lá. Então, quando estávamos voltando sozinhos por uma rua abandonada, Gale me puxou e me beijou. Eu achei que era por gratidão, mas depois daquilo tudo ficou estranho. Era como se ele realmente gostasse de mim. Não que isso fosse possível, claro. Mas não posso negar que pensei naquele beijo por muito tempo.

- Não foi nada Gale – coloquei a mão em sua perna e olhei em seus olhos – e eu não vou te trocar pelo Peeta. Nem pelo Erick. Somos amigos.

Ajoelhei-me ao seu lado e beijei sua testa. Gale segurou meu rosto e me puxou pra perto. Perto o suficiente pra que eu pudesse sentir o perfume que eu tanto gostava. Olhei para o corredor e não vi ninguém. E então ele me beijou. Colocou suas mãos em minha cintura e me puxou para seu colo. Minhas mãos passeavam pelo peito de Gale enquanto ele mexia em meu cabelo. Minha vontade era ficar ali pra sempre, com ele. Mas eu não podia. Gale beijava meu pescoço e voltava aos meus lábios. Me soltei de seus braços e olhei em seus olhos.

- Isso não pode acontecer Gale, não pode.

Nada de resposta. Senti ele empurrando minha cabeça em sua direção e voltamos a nos beijar. Como se não devêssemos explicações a ninguém. Eu gostava do jeito como Gale não se desculpava por me querer. Por me beijar. Ele sabia o que queria e tentava mesmo que isso o fizesse levar um tapa. O beijei pela última vez e levantei. Passei por trás do sofá, encostei-me a seu ombro e sussurrei em seu ouvido:

- Não conte.

Eu já havia feito coisas terríveis. Mas nada me fazia sentir mais vadia do que aquilo.